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Com demandas a equacionar pára atingir o objetivo
mais requisitado e esperado da educação -:o ensino de
qualidade :-, gestores têm de encontrar soluções para
remunerar melhor a peça-chave do processo: o professor
MAI{Ü A\nNCINI
omo equacionar o orçamento
a fim de dar conta das novas demandas relativas ao salário
dos professores? Esta é uma pergunta que provavelmente
está na mente de muitos se-cretários de educação Brasi] afora. Afinal, desde
o início deste ano está em vigor o piso salarial do magistério, que aia uma nova referência para a
remuneração desses profissionais, num contexto
em que se fortalece o discurso de defesa da valori-zação do magistério como estratégia central para
melhorar a qualidade do ensino.
Ou seja, o que está em questão não é somente remunerar melhor os professores, ma$ fazer isso
em meio a um conjunto de ações que permitam
elevar a qualidade do ensino o que, muitas vezes,
é compreendido como a melhoria do desempenho
do sistema nos indicadores e avaHações oficiais, leia-se índice de Desenvolvimento da Educação
Básica Gdeb) e Prova Brasil.
Desse modo, em várias partes do país, os
gover-nos muni(ipais e estaduais estão se reorganizando pam cumprir a legislação, num movimento de
mo-dmcação de padrões de remuneração adotados há
décadas, no qual, não raramente, o salário básico é
mais baixo do que as grati6caçõcs e outros benefícios.
Ao mesmo tempo, está ganhando corça a vinculação
da mmuneração do docente(q em alguns caos, de
integrantes da equipe técnica da escola) com a
melhoria do desempenho dos alunos.
Esse novo modelojá está em fiM(ionamento
em estados como Minas Gerais e São Paulo. No piimeim, existe o '$.corda de Resultados", um con-trato de gestão que prevê uma pmmiação anual para
servidores estaduais proporcional ao cumprimento
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dos objetivos e metas. E adorado en} várias áreas da administração pública; no caso da educação, são
estabelecidas metas para as escolas, as regionais de
ensino e o sistema estadual como um todo.
Em São Paulo, o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica do Estado de São Paulo(Idesp)
tem estrutura semelhante ao Ideb (mede
desem-penho + fluxo) e Goi criado como referência para
medir os avanços das escolas e para o pagamento
de um bónus anual à equipe escolar, proporcional
ao avanço em relação às metas preestabelecidas. Outras unidades da federação seguem o mesmo
caminho. O Distrito Federal começará a pagar, neste ano, o 14' salário aos professores da mde pública com base em um rol de critérios, entre eles os resultados do
Sistema de Avaliação das Instituições Educacionais do Distúto Fedeml(Siade), que abrange a avaliação
do desempenho de estudantes, a avaliação da gestão
das escolas e das políticas educacionais.
Municípios também elaboraram políticas nessa direção: é o caso de Anápolis (GO), cidade com 350 mil habitantes, em que o Plano de Carreira e Vencimentos está sendo reestruturado. 'Até o momento, não existe nenhuma vinculação entre
remuneração docente e desempenho, mas ela está
sendo proposta no novo Plano",'Relata Virginia
Meio, secretária municipal de Educação.
Segundo ela, predomina entre técnicos da
secretaria, membros do Conselho Municipal de F'l--'',.;. p ntÁ ;nteç,rantes do sindicato local a
percepção de que a vinculação é necessária para ''garantir que a melhor remuneração corresponda a um ensino de melhor qualidade"
prjncipa] insmunento para estabelecer metas e definir
prioridades inclusive as relativas à distübuição de
recursos aos muulicípios, estados e escolas.
Os argumentos contrários oscilam da
perspec-tiva trabalhista-sindical à técnica. No primeiro
caso, o pagamento de bónus é considerado uma estratégia para "recompor salários defasados", como defende Hcleno Araújo, secretário de As-suntos Educacionais da Confederação Nacional
dos Trabalhadores em Educação (ENTE).
Entre os pesquisadores, há uma tendência que
enfatiza a necessidade de se criar procedimentos
que legitimem o estabelecimento de conexões
entre os sistemas de informação e avaliação e as
consequências para os profissionais da educação, como explica Nigel Brooke, pesquisador do Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais, ligado à
Faculdade de Educação da Uli'N'IG.
Brooke enfatiza que "um sistema que cria ânus para a escola" não deve ser implantado de maneira isolada de "sistemas de apoio e capacitação" para
que as escolas saibam interpretar os resultados do diagnóstico e disponham de condições para superar
os pmblemas identificados. Os ânus mencionados porBrooke dizem respeito a medidas administmtivm t
i
Bónus z,ez:sm
qualidade
Embora a tese da vinculação da remuneração (de professores e demais integrantes das equipes
escolares) com responsabilização (por meio do
estabelecimento
de
metas) esteja se difundindoampla e rapidamente no país, não existe um
con-senso sobre sua validade.
Essa proposta começou a ganhar Garça a partir de 2007, com o lançamento do Plano de
Desenvol-vimento da Educação(PDE), que tem no Ideb seu
ou gratificações não recebidas em consequência do
não cumprimento de metas. Isso geraria um
senti-mento de injustiça entre os integrantes da equipe
da escola, em especial num contexto em que a bu-rocracia é tida como ineficiente, como ocorre com
o serviço público brasileiro.
O professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo(USP) Romualdo Po!
tela agrega outros argumentos à crítica: ''O que
ie mede nas provas não é tudo que a escola tem
de fazer bem", ah'ma. Há também, continua o
educador opcrigo de se desenvolver uma "cultura de educar para o teste, que é daninha".
"Esses programas se assentam em um pé de barro
importante: lembrando Einstein, nem tudo o que se
mede é importante, mas nem tudo que é importante
se mede", conclui Portela.
Estaduais de Educação(Consed), Mana Auxilia-dora Seabra Rezende.
E nesse contexto que as políticas de
responsabi-lização se inserem. Mas elas devem scr implantadas
de maneira isolada e precisam ser associadas a
ações de valorização profissional e de formação.
Embora não exista uma evidência inquestionável de que os bónus ou prêmios produzam(ou recitam)
a melhoria da qualidade do ensino, é possível dizer que existe um consenso quanto à necessidade de se
remunerar melhor o professor brasileiro.
"Um bom salário representa uma condição de
profissionalismo, permitindo que o professor viva só de educação e possa se dedicar exclusivamente
a uma escola", afirmaJuçara Dutra Vieira,
vice-presidente da Internacional da Educação,
organi-zação mundial com sede em Bruxelas.
Contudo, ponderaJuçara, a relação entre
sa-lário e qualidade precisa ser analisada ao lado de outros dois componentes, a formação e a carreira.
"0 salário sozinho não responde totalmente pela
qualidade",diz.
Desempenho: a centralidade da escola
Entretanto, o ponto de vista dos gestores é
outro. "Ê verdade que não existe uma relação
direta entre melhoria do desempenho dos alunos nas avaliações e remuneração, mas a escola tem o
papel de assegurar o bom desempenho", ah'ma a
presidente do Conselho Nacional dos Secretários
\
Salárioou remuneração
E em ta] cenário que o piso salarial, aliado à
criação das leis estaduais e municipais do magisté-rio, desponta como instrumento capaz de catalisar
um processo de mudança no exercício profissional
dos docentes, com eventuais impactos sobre a
qualidade de ensino a serem conferidos.
A Lei 1 1 .738, dejulho de 2008, estabelece o
pa-tamar mínimo de vencimentos a serem pagos aos docentes para ajornada máxima de 40 horas. Há
um ano, quando Eoi aprovada, o valor a ser pago
aos profissionais sem formação de nível superior üoi fixado em R$ 950. Aplicados os critérios dc
reajuste para 2009, passou para R$ 1 . 132,40.
De acordo com a legislação, o piso salaHal do
magistério deve ser reajustado na mesma proporção que o piso nacional do Fundo de Manutenção e De-senvolvimento da Educação Básica e Vãorização dos
Professor do CEF Fercal, em Sobradinho:
Profissionais da Educação(Fundeb). O aumento do piso do Fundeb 6oi de 1 9,2% entre 2008 e 2009.
Os estados e municípios têm prazo até 2010 para pagar o valor
integral do piso. Em 2009, é preciso pagar dois terços da di6epença entre
a remuneração anual e a prevista no
piso. Exemplo: um professor que
recebe R$ 500 tem direito a um
rea-juste de R$ 300 em 2009, recebendo
um salário de R$ 800 por mês.
A implantação do piso âoi motivo
de greve de pro6asores em algumas partes do país, como no Ceará, onde
os professores da rede estadual cruzaram os braços
durante 24 dias. A greve, considerada ilegal
pe:la:Justi-ça, 6oi suspensa emjunho, mas os docentes ameaçam
retomar a mobilização neste mês de agosto.
beneãcios respondem por
parce-la significativa dos vencimentos quando não é maior que o
salá-Ho-base. E o que ocorre, segundo a
CINDE, em estados comoo Ceará,
onde um professor com formação
de nível médio recebe, por 40
horas de trabalho, R$ 437,58 de
salário, mas tem uma
remunera-ção total de R$ 950.
A secretaria estadual de Edu-cação do Cleará estima que esse
arti$cio tenha beneficiado 2,3 mil
docentes cuja remuneração era
inferior ao mínimo leÉ:al. em um universo de 13,6 mil eGetivos e 9 mil temporários.
A remuneração média no estado, contudo, é de
R$ 2.477,82, pois 80% dos proGusort:s na atava têm
li-cenciatura na área em que atuam e pós-graduação.
"0 piso é importante para a recomposição da carrega docente e o Brasil está atrasado nesse
processo", analisa Mana AuxMadora, do Consed.
Se os professores não forem bem remunerados, será difícil atrair bons profbsionais, diâcultando a solução de problemas crónicos, como o déâcit
do-cente nas redes públicas, estimado pelo Ministério
da Educação(h4EC) em 350 mil, alerta ela. A estimativa é que, a partir de 20 10, 45% dos professores da atava soam beneficiados pelo piso, considerando quc apmximadamente 800 mil deles recebem menos do que o seu valor.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicí-lios, realizada em 2007 pelo IBGE, calculou em R$ 1.369 a remuneração média dos professores
no país, valor que. inclui todos os profissionais
-- daqueles em início de carreira com formação de nível médio até os que estão prestes a se aposentar
e têm diploma de ensino superior.
':A. atratividade da carreira é um dos segredos
de sistemas bem-sucedidos", lembra Romualdo Portela, da USl! citando os exemplos da Finlândia,
Inglaterra e Cubo. "Isso só se consegue com a
valorização económica e social da profissão." Esta
ainda não é, contudo, a realidade do Brasil.
]uçara Vieira. da Internacional da Educação:qualidade se
vincula a formação e carreira
Atmtividade, meta desejável
A lei aprovada pelo Congresso Nacional e
san-cionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Salva
considera que, durante 2009, grati6cações e outros
benefícios podem ser computados para efeito de cálculo do piso salarial. A partir'do ano que vem, o piso deverá corresponder ao salário-base.
Esse dispositivo, no entanto, está em suspenso por
causa de uma Ação de ]nconstituciona]idade(AD])
movida por cinco estados Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarjna, Rio Grande do Sul e Ceará no Supremo THbunal Fedeml(STF). Em resposta
à demanda dos governadores 6oi concedida uma
liminar que autoriza, entre outra coisas, a inclusão
das gratificações e outras vantagens como parte do
piso até ojulgamento final da ADI no Supremo o que ainda não tem previsão para ocorrer.
A liminar agrada a gestores, que alegam
difi-culdade para obter recursos para cumprir a lei. Ao mesmo tempo, opera uma modi6cação conceitual importante: o piso deixa de ser o salário-base e
ganha a condição de remuneração-base.
Isso é relevante quando se considera que, em
valias locaHdades, as gratmcações, bónus e outros !
ANO11iNÜMERO 10 + JULHO/AGOSTO 2009 e R$ 7,90
©
g.8