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RELAÇÕES DE TRABALHO E SUBJETIVIDADE EM EQUIPES INTERDISCIPLINARES DE ATENÇÃO À SAÚDE 1 ELIANE MATOS 2 DENISE PIRES 3

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Academic year: 2021

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RELAÇÕES DE TRABALHO E SUBJETIVIDADE EM EQUIPES INTERDISCIPLINARES DE ATENÇÃO À SAÚDE1

ELIANE MATOS2

DENISE PIRES3

Nas últimas décadas a interdisciplinaridade vem sendo colocada como uma necessidade e uma condição do conhecimento atual, resultado do desenvolvimento das forças produtivas e do desenvolvimento da ciência. Para Jantsch e Bianchetti (2002) são as condições concretas de existência do ser humano que determinam o avanço da perspectiva interdisciplinar na atualidade. Em se tratando da atenção a saúde, os questionamentos acerca da validade e aplicabilidade do conhecimento fragmentado são relevantes para as instituições e para os profissionais preocupados com uma assistência de qualidade e com a realização de um trabalho mais sensível, mais motivador e de qualidade. O trabalho em saúde possui uma dimensão necessariamente complementar, de articulação dos saberes e fazeres, No entanto, pouco se conhece acerca das experiências interdisciplinares existentes e de como estas práticas acontecem. A necessidade de conhecer estes aspectos da prática interdisciplinar nos levou a investigar o cotidiano de duas equipes interdisciplinares de atenção à saúde, uma delas em um serviço de atenção ao idoso e outra de atenção ao doente em cuidados paliativos. Na investigação realizada mereceu destaque a natureza das relações de trabalho nestas equipes. O trabalho interdisciplinar pressupõe novas

1 Este estudo é parte integrante da tese de doutorado de Eliane Matos e intitulada: a Contribuição da prática interdisciplinar na construção de novas formas de organização do trabalho em saúde, orientada pela Dra. Denise Pires.

2 Enfermeira chefe da Divisão de Enfermagem de Emergência e Ambulatório do HU da UFSC, Membro do centro de Educação e Pesquisa em enfermagem, Especialista em Saúde Pública pela UFSC e Fundação Osvaldo Cruz, Mestre em Enfermagem (Área de Concentração Filosofia, Saúde e Sociedade) pela UFSC. Membro do Grupo PRÁXIS. elianematos@hotmail.com . Rua Europa, 150, apto 634, Florianópolis, SC. 3 Professora do Departamento de Enfermagem da UFSC e Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC, Mestre em Sociologia Política pela UFSC, Doutora em Ciências Sociais pela UNICAMP, Pós-Doutorado pela University of Amsterdam/Holanda. Membro do Grupo PRÁXIS.

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formas de relacionamento, tanto no que diz respeito à hierarquia institucional, à gestão, à divisão e à organização do trabalho, quanto no que diz respeito às relações que os trabalhadores estabelecem entre si e com os usuários do serviço e a manifestação de subjetividades. Metodologia: trata-se de um estudo de natureza qualitativa realizado em dois hospitais públicos de referência em um estado do sul do Brasil. A investigação foi orientada pelo referencial do materialismo histórico e dialético e a perspectiva da complexidade. A coleta de dados consistiu de observação sistemática, entrevista semi-estruturada com profissionais de saúde, pacientes e familiares e estudo documental. Foram entrevistados 19 profissionais de saúde nas duas equipes investigadas (médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, nutricionista, assistente social, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, psicólogo e farmacêutico) e a pesquisa respeitou as diretrizes da resolução 196/96 do MS. Resultados e Análise: Os integrantes do estudo expressaram que as relações de trabalho nas equipes interdisciplinares estão dentre os fatores mais positivos deste modelo de atenção. Destacaram aspectos fundamentais da prática interdisciplinar para a construção de modos mais satisfatórios de realização do trabalho em saúde, tanto para trabalhadores como para os usuários dos serviços, como: a necessidade de relações com base na comunicação autêntica; no respeito ao outro e ao seu conhecimento, no acolhimento às diferenças; na cooperação e na troca entre as disciplinas; na interação entre profissionais; na articulação dos saberes e fazeres; na horizontalização das relações e na participação coletiva na tomada de decisões. Ao avaliarem as relações de trabalho em suas equipes consideram que estas são satisfatórias, constituindo-se em um dos fatores que motivam a permanência dos profissionais nas equipes estudadas. Há nas equipes preocupação com o acolhimento dos profissionais que chegam para integrar o grupo, em valorizar a criatividade, bem como o respeito aos componentes das equipes. No entanto, as relações modificam-se a cada momento, definindo a maior ou menor abertura para a interação entre os profissionais. Os problemas que surgem na realização do trabalho afetam as relações entre os integrantes das equipes e entre eles e os

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usuários e familiares. A organização interdisciplinar assegura espaço para a conversação, para trabalhar as diferenças e é nestes espaços que os conflitos podem ser resolvidos. As equipes identificaram um objetivo único, que é a assistência ao doente, e os conflitos, geralmente, são frutos de discordâncias sobre tratamentos e condutas assistenciais, e podem ser resolvidos quando há abertura para a expressão da opinião das diversas profissões. Entendemos que a articulação e a interação na equipe interdisciplinar acontecem considerando a assimetria das relações sejam elas entre os trabalhadores ou entre trabalhador e usuário, uma vez que envolvem conhecimentos e práticas distintas, reconhecidos e valorizados diferentemente no conjunto do trabalho em saúde. Nesta perspectiva, ouvir o outro, considerar cada contribuição para a tomada de decisões é parte da construção de um trabalho de natureza interdisciplinar. Para os profissionais das duas equipes estudadas, a prática interdisciplinar proporciona um entendimento sobre o usuário e sobre a sua vida, que distancia-se da visão focada na doença e aproxima-se da visão dos mesmos como seres humanos com suas individualidades e relações familiares e sociais. O modo de funcionamento dos serviços, a partir da experiência interdisciplinar auxilia os familiares e doentes a enfrentar os problemas de saúde-doença, facilitando a resolução dos problemas mais rapidamente, evitando o sofrimento do doente e o desgaste dos familiares. Propicia, também, um melhor acesso aos serviços de saúde e aos profissionais, a formação de vínculos profissional/paciente/família e acolhimento às necessidades dos usuários. O conjunto de aspectos que caracterizam as relações profissionais nas equipes estudadas, bem como as relações entre eles e usuários aproxima-se do que tem sido destacado nos debates recentes acerca da efetivação do Sistema Único de Saúde (SUS) na realidade brasileira, como a humanização da assistência, a integralidade em saúde, a produção de sujeitos no processo de atenção à saúde, a necessidade de formação de vínculos entre os profissionais e entre estes e os usuários, o acolhimento, a necessidade de ampliação do acesso das pessoas aos serviços de saúde. Acredita-se que é a aproximação com o conjunto destes fatores que caracteriza o SUS, segundo os princípios defendidos a

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partir movimento da reforma sanitária brasileira. Não há humanização sem vínculo, sem garantia de acesso, sem acolhimento aos usuários, sem participação de trabalhadores e usuários na definição dos serviços necessários e na forma de utilização dos recursos disponíveis. Sobre estes aspectos, a atuação em equipes interdisciplinares parece contribuir para a construção dos princípios e diretrizes favoráveis à construção do SUS, bem como possibilita modos mais solidários dos trabalhadores se relacionarem entre si e com os usuários, contribuindo para a efetivação de novas formas de organização do trabalho em saúde. Um dos aspectos fundamentais para a conformação de novas formas de organização do trabalho é pensar possibilidades de abertura para a expressão da subjetividade no trabalho. No entanto, nas organizações de saúde, os limites impostos pela organização do trabalho, firmado na cultura administrativa tecnicista, com fortes bases taylorista e burocrática, tendem a encarar normas, condutas e regras institucionais como definidas, deixando pouco ou nenhum espaço para a manifestação da subjetividade. Para os integrantes do estudo, o trabalho é fonte potencial de realização. Contudo, da mesma forma que o trabalho traz elementos de valorização pessoal e profissional, este é cercado de elementos que dificultam e limitam a expressão da subjetividade, bem como ocasionam sofrimento. Para a totalidade dos trabalhadores envolvidos neste estudo, gostar daquilo que faz se constitui em fator motivador para o trabalho. Contribui para a realização pessoal e profissional no trabalho, ser reconhecido e respeitado em suas competências pelos colegas, pela instituição e, especialmente, pelos usuários e familiares. Dejours (1999, p. 34) destaca que para vencer os obstáculos do trabalho real, o trabalhador necessita colocar muito de si, de suas emoções, paixões e investimento pessoal e com isso é justo que seu esforço seja reconhecido. O desejo de reconhecimento não constitui para o autor uma reivindicação secundária daqueles que trabalham, ao contrário, “mostra-se decisivo na dinâmica da mobilização subjetiva da inteligência e da personalidade no trabalho”. Na análise das equipes interdisciplinares, parece que é forte a identidade dos participantes da pesquisa com o projeto pelo qual se propuseram a trabalhar e os efeitos desta experiência

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nas vivências subjetivas ou na constituição das subjetividades dos envolvidos. A existência e defesa de um projeto de trabalho comum, compartilhado pelos trabalhadores, produz efeitos sobre a construção da identidade individual e coletiva e sobre os desejos de reconhecimento dos integrantes do estudo. Os integrantes do estudo manifestam um forte componente de realização e valorização pessoal e profissional, quando se referem às relações interpessoais nas equipes e aos espaços internos conquistados de autonomia e participação. Considerações Finais Considerar as experiências motivadoras, os fatores que valorizam e desvalorizam o trabalhador nas instituições de saúde, bem como os modos de resistência que estes desenvolvem para a superação das dificuldades, são os aspectos centrais que discutimos ao tratar do trabalho interdisciplinar e dentro dele, as relações de trabalho e a expressão da subjetividade dos atores envolvidos (trabalhadores e usuários). Neste sentido a prática interdisciplinar aponta para a construção de relações de trabalho que contribuem para a realização de um trabalho mais criativo e motivador para os trabalhadores envolvidos com conseqüências positivas para os usuários dos serviços.

Referencias

DEJOURS, C. A Banalização da injustiça social. 2 ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999. 158 p.

JANTSCH, A.P. BIACHETTI, L. (orgs). Interdisciplinaridade: para além da filosofia do sujeito. 6 ed. Petrópolis, RJ: Vozes; 2002. 204p.

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