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As agências de regulação norte americanas como paradigma do sistema regulatório brasileiro

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Academic year: 2017

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Universidade

Católica de Brasília

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU EM DIREITO

Mestrado

AS AGÊNCIAS DE REGULAÇÃO NORTE AMERICANAS

COMO PARADIGMA DO SISTEMA REGULATÓRIO

BRASILEIRO

Autor: Altair Gomes Caixeta

Orientador: Professor Doutor

JOÃO REZENDE ALMEIDA OLIVEIRA

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ALTAIR GOMES CAIXETA

AS AGÊNCIAS DE REGULAÇÃO NORTE AMERICANAS COMO PARADIGMA DO SISTEMA REGULATÓRIO BRASILEIRO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação Strictu Sensu da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para a obtenção do Título de Mestre em Direito.

Orientador: Professor Doutor João Rezende Almeida Oliveira

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Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB C138a Caixeta, Altair Gomes

As agências de regulação Norte Americanas como paradigma do sistema regulatório brasileiro. / Altair Gomes Caixeta – 2011.

114f.; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2011. Orientação: João Rezende Almeida Oliveira

1. Direito administrativo. 2. Estado de direito. 3. Autonomia. I. Oliveira, João Rezende Almeida, orient. II.Título.

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RESUMO

Este estudo teve como objetivo geral demonstrar se o fato das agências reguladoras brasileiras terem sido criadas sob o paradigma das agências de regulação norte americanas influenciou a sua estrutura básica ou se ante nosso ordenamento jurídico tomaram feição própria constituindo-se num diferencial próprio criado pelos legisladores brasileiros onde pode concluir que o modelo de agências reguladoras brasileiras teve seu incremento no direito norte-americano, onde não se pode esquecer que suas raízes ainda mais profundas podem estar também fincadas no direito consuetudinário britânico. Assim pode-se concluir que o modelo de agência reguladora que foi adotado pelo Brasil é um modelo considerado na verdade híbrido, pois nasceu em virtude do modelo norte-americano, sendo também filiado ao modelo europeu-continental e através desta adoção norte-americana e inglesa, foi tomando corpo e feição própria para se adaptar a realidade brasileira. No tocante ao controle dos atos das agências reguladoras pelo Poder Judiciário no Brasil este também influenciado pelo direito norte-americano, passa a ser exercido de forma ampla, por meio do judicial review tentando assim como sua implantação, ser

adequado a realidade brasileira tomando uma forma própria através dos tempos.

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ABSTRACT

This study aimed to demonstrate the fact of Brazilian regulatory agencies were created under the paradigm of regulatory agencies in North America influenced the basic structure or against our legal system took its own shape forming itself into a differential created by Brazilian legislators where it can be concluded that the model of Brazilian regulatory agencies had their increment in U.S. law, where one can not forget their roots even deeper can also be embedded in the British common law. Thus we can conclude that the model of regulatory agency that has been adopted by Brazil is a hybrid model in question actually, because born under the American model, is also affiliated to the continental European model, and through adoption of the American and English, was taking its own shape and body to adapt to the Brazilian reality. Concerning the control of the actions of regulatory agencies by the judiciary in Brazil this also influenced by American law, shall be exercised in a broad way, through judicial review as well as trying their location, be adequate to Brazilian reality taking shape itself over time.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 7

1.1 OBJETIVOS ... 8

1.2 JUSTIFICATIVA ... 8

2. A TEORIA DA REGULAÇÃO ... 9

2.1. INTRODUÇÃO ... 9

2.1.1. Do Estado liberal ao Estado social ... 10

3. A CONCEPÇÃO DO ESTADO REGULADOR ... 14

3.1 A REGULAÇÃO TRADICIONAL ... 15

3.2 REGULAÇÃO DE MERCADOS - A REGULAÇÃO MODERNA ... 19

3.3 DELEGAÇÃO, CREDIBILIDADE E COMPROMETIMENTO: ALGUMAS MOTIVAÇÕES BÁSICAS ... 26

3.4 ACCOUNTABILITY E TRANSPARÊNCIA ... 37

4. AS AGÊNCIAS REGULADORAS NO DIREITO POSITIVO BRASILEIRO ... 43

4.1 MUDANÇA INSTITUCIONAL E IDEOLOGIA ... 43

4.2. O PAPEL REGULADOR DO ESTADO: MARCO LEGAL, ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO ... 53

4.2.1 Natureza Institucional das Agências Reguladoras... 54

4.3 AS AGENCIAS REGULADORAS BRASILEIRAS E AS REFORMAS ... 60

4.4 AUTONOMIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS BRASILEIRAS ... 67

4.4.1 Autonomia ... 69

4.5 O CONTROLE DAS AGÊNCIAS REGULADORAS ... 70

4.5.1 Tipos de Controle ... 70

4.5.2 Controle Administrativo ... 71

4.5.2.1 Contrato de Gestão ... 73

4.5.2.2 Controle Social ... 77

4.5.2.3 Recurso Hierárquico Impróprio ... 81

4.5.3 Controle Político ... 83

4.5.3.1 Sustação dos efeitos dos atos ilegais... 84

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4.5.4.1 Princípio da Jurisdição Una ... 87

4.5.4.2 Controle Judicial das Atividades Regulatórias ... 88

5. AS AGÊNCIAS REGULADORAS NORTE AMERICANAS E SUA INFLUÊNCIA NAS AGÊNCIAS REGULADORAS BRASILEIRAS ... 89

5.1 A EVOLUÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NOS ESTADOS UNIDOS ... 89

5.2 A CLASSIFICAÇÃO DAS AGÊNCIAS NORTE AMERICANAS ... 95

5.2.1 Classificação quanto à natureza das atividades ... 96

5.2.2 Classificação quanto ao critério da autonomia. ... 97

5.2.3 Classificação segundo o critério do âmbito de atuação. ... 99

5.3 O CONTROLE DAS AGÊNCIAS NORTE AMERICANAS ... 100

5.3.1 Controle legislativo ... 101

5.3.2 Controle Judicial ... 103

5.3.3 O controle exercitado pelo Poder Executivo ... 104

5.4 A DIMENSÃO DA AUTONOMIA DAS AGÊNCIAS NORTE-AMERICANAS ... 105

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 107

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1 INTRODUÇÃO

O Brasil é um país relativamente novo, onde instituições republicanas completaram somente dois séculos de existência, sendo que no ocidente, o modelo de um Estado unitário, centralizador e hierárquico, implantado por Napoleão na Europa, foram influenciados ainda pelo sistema estadunidense.

Formou-se assim a tradição política montesquiana onde o Estado divide-se em três Poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, conservando independência e harmonia entre si.

Neste sentido, o Estado agigantou-se, tornando-se absolutista hobbesiano. Seguindo-se diversas fases na ordem econômica, através da expansão e contração do Estado em sua participação e intervenção.

Neste cenário, a máquina administrativa, burocratizada, torna-se lenta, pesada e ineficiente, onde o Estado resolve recuar deixando amplos espaços à atividade privada, que demonstrava eficiência, vigor e agilidade.

Nesta retirada, contudo, não era viável deixar a sociedade à mercê de mega corporações, no entanto, não era possível empatar a economia. Assim a solução foi o surgimento do Estado Regulador, onde este delega a uma outra entidade capacidades para regular, fiscalizar, pautar as relações de consumo, reprimindo com uma severidade as práticas abusivas, sendo que estas entidades novas não podem ficar a deriva das conveniências políticas.

Sendo necessário lhes dar independência total dos órgãos de soberania que formam o Estado, sendo este um dos grandes desafios na criação das Agências Reguladoras.

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1.1 OBJETIVOS

O objetivo geral da pesquisa é investigar se o fato das agências reguladoras brasileiras terem sido criadas sob o paradigma das agências de regulação norte americanas influenciou a sua estrutura básica ou se ante nosso ordenamento jurídico tomaram feição própria constituindo-se num diferencial próprio criado pelos legisladores brasileiros, bem ainda, se esta transposição do sistema regulatório norte americano para seara do ordenamento jurídico brasileiro trouxe alguma inovação que pudesse significar uma mudança de pensamento em relação aos entes estatais e sua importância na prestação dos serviços públicos constitucionalmente garantidos.

Quanto aos objetivos específicos, a presente pesquisa pretende definir qual o regime jurídico adotado pelas agências reguladoras brasileiras; delimitar o alcance do poder normativo das agências reguladoras e estabelecer os limites do controle judicial sobre as decisões das agências reguladoras.

1.2 JUSTIFICATIVA

O Estado já adotou diferentes modelos em períodos históricos até o advento do Estado Regulador, que visa orientar, fiscalizar atividades econômicas, desempenhando diretamente apenas as atividades essenciais.

No Brasil, com o advento do Estado Regulador, foram criadas sob a forma de autarquias especiais, agências reguladoras para regulares atividades econômicas em sentido amplo, apresentando características específicas, dentre elas a independência técnica.

(10)

2. A TEORIA DA REGULAÇÃO

O tema Regulação, hoje, é de capital importância no estudo do direito administrativo econômico, pois traz reflexos diretos sobre a economia nacional, em um aspecto geral, bem como em relação aos setores regulados. Assim, antes de se tratar do tema, necessária se faz uma abordagem introdutória, na tentativa de delimitar uma noção de Regulação.

Inicialmente, para atingir o objetivo proposto nesse trabalho, buscamos introduzir alguns conceitos relativos ao assunto, bem assim a teoria de regulação, que Marques Neto (2002) definiu da seguinte maneira:

A Teoria da Regulação destacou-se no pensamento econômico institucionalista como um dispositivo conceitual mais particularmente adequado pela formalização que produziu do quadro de compromissos institucionalizados, sendo que foi a partir deste ponto que tal teoria procurou explicar a estabilização do crescimento econômico alcançado pelos países desenvolvidos nos chamados "trinta anos gloriosos".

A regulação da economia é um fenômeno complexo, multifacetado, dotado de grande heterogeneidade, não apenas ao longo da história, mas também dentro dos Estados singularmente considerados, que empregam distintas estratégias regulatórias em função das necessidades concretamente verificadas na sociedade e na economia. Assim passa-se a observar esta teoria a partir de conceitos sobre o Estado Liberal, Social e Essencial.

2.1. INTRODUÇÃO

Para uma análise ampla do Estado Regulador e da Teoria da Regulação os tópicos abaixo si dividem em Estado Liberal, Social e Essencial, fazendo uma verificação destas fases e desenvolvimentos.

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privadas, que, junto com a regulação, constituem espécies do gênero da intervenção do Estado na economia.

SALOMÃO FILHO (2001, p. 14) estabelece que

A teoria da regulação pode representar a contribuição mais útil de um Estado que decide retirar-se da intervenção econômica direta (...) para sua função de organizador das relações sociais e econômicas e que, por outro lado, reconhece para tanto ser insuficiente o mero e passivo exercício do poder de polícia sobre os mercados”. Por estas razões, a regulação “engloba todas as formas de organização da atividade econômica através do Estado, seja a intervenção através da concessão de serviço público ou o exercício do poder de polícia. (...) Na verdade, o Estado está ordenando ou regulando a atividade econômica tanto quando concede ao particular a prestação de serviços públicos e regula sua utilização - impondo preços, quantidade produzida etc. - como quando edita regras no exercício do poder de polícia administrativo. É, assim, incorreto formular uma teoria que não analise ou abarque ambas as formas de regulação.

A noção de regulação implica a integração de diversas funções: pressupõe que um quadro seja imposto às atividades econômicas, devendo respeitar certo equilíbrio dos interesses das diversas forças sociais presentes.

Este quadro normativo é estabelecido por decisões gerais e abstratas, constantes geralmente de regulamentos; pela aplicação concreta das suas regras e pela composição dos conflitos que delas advêm, dando lugar, nestas duas últimas hipóteses, a decisões individuais.

2.1.1. Do Estado liberal ao Estado social

A evolução histórica do Estado demonstra as diversas fases pelo qual passou e os diferentes modelos adotados. O Estado Absolutista se caracterizava pela figura do Rei, que concentrava amplos poderes, sendo responsável pela economia e subsistência da sociedade. (DALLARI, 2002)

(12)

Este Estado limitava-se a desempenhar atividades reduzidas de serviços públicos, como segurança e justiça, havendo uma liberalização de atividades econômicas, deixando que fossem desempenhadas pela iniciativa privada. Apresentando o mínimo de interferência na vida econômica e social ficou conhecido com o Estado mínimo.

Smith (apud Di Pietro, 2009) estabeleceu que a sociedade era guiada por uma mão invisível, propagando sua crença no laissez-faire para o comércio e entendendo que a intromissão do governo na economia é desnecessária e indesejável. Apesar desta característica omissiva, com o Estado Liberal advieram diversos fatores significativos, dentre eles o progresso econômico, a valorização do indivíduo, liberdade de iniciativa, propriedade privada e autonomia da vontade. Por outro lado, a valorização do indivíduo foi tão excessiva a ponto de acarretar um comportamento egoísta, com privilégios para os economicamente mais fortes, trazendo, conseqüentemente, desigualdades na ordem social.

Já no final do século XIX, começaram as críticas contra este Estado mínimo, principalmente diante das conseqüências de injustiças sociais que causou. Posteriormente, no século XX, com a consciência da necessidade da justiça social, ocorreu o advento do Estado Social que visava atuação mais forte na economia e no atendimento das necessidades da população.

Assim, o próprio Estado desempenhava a produção da riqueza e sua redistribuição pela sociedade, além de tomar decisões quanto aos produtos a serem produzidos, sua quantidade e qualidade. Era um Estado ativo tanto na área econômica e social.

Ressalta-se que esta interferência estatal foi tão intensa a ponto de afastar a aplicação do princípio da livre concorrência e desestimular fornecedores, visto que as escolhas eram realizadas pelo Estado.

Este modelo de Estado suscitou críticas e uma série de fatores levou ao seu fim, dentre eles o esgotamento da capacidade de financiamento do setor público, tendo em vista a insuficiência de recursos públicos para todos os investimentos necessários, e, conseqüentemente, a falta de condições de atender com qualidade a sociedade.

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mecanismos de seu financiamento: “a multiplicação da população e a redução da eficiência das atividades desempenhadas diretamente pelo Estado contribuíram decisivamente para o fenômeno denominado crise fiscal”.

Souto (2002) observa que o modelo intermediário surge acolhido pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que é chamado de Estado Bem-Estar, o qual busca colher elementos tanto do Estado Liberal como do Estado Social. Segundo o referido autor, esse modelo estabelece a liberdade de iniciativa e, por outro lado, autoriza a intervenção no domínio econômico com base nos princípios constitucionais previstos no artigo 170 e seguintes da Constituição da República Federativa do Brasil. Dentre esses princípios destaca-se o princípio da subsidiariedade, que consiste na atuação do Estado apenas naquilo que é realmente essencial, transferindo funções que serão mais bem desenvolvidas pelos particulares. Assim se refere o citado autor sobre o princípio da subsidiariedade:

Os grandes desafios de sobrevivência postos ao Estado-Providência centralizador e concentrador, interveniente em domínios que não são e não lhe poderiam ser próprios, sobrevieram, destarte, juntamente com a redescoberta do princípio ressureto da subsidiariedade e as consequências avassaladoras da mundialização econômica, à Constituição Cidadã brasileira de 1988, que se abeberara, em muitas de suas disposições inovadoras, na Constituição portuguesa de 1976 já duas vezes revista ou flexibilizada.

A intervenção regulatória deve ser pautada não pela imposição de objetivos e comportamentos ditados pelo Estado, mas pela mediação, arbitrando interesses, o que envolve maior transparência e participação social. Assim dispõe Marques Neto (2002) a respeito do princípio da subsidiariedade,

O princípio da subsidiariedade diz respeito à relação entre níveis de concentração de poder e respectivos níveis de interesses a serem satisfeitos. (...) A subsidiariedade escalona atribuições em função da complexidade do atendimento dos interesses da sociedade.

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3. A CONCEPÇÃO DO ESTADO REGULADOR

A exploração direta de atividades econômicas pelo Estado, crescente desde o surgimento do Estado Democrático de Direito no início do século XX, apesar de encontrar-se em declínio, subsiste e é muito difícil que, pelo menos em algumas áreas e com algumas flexibilizações, o Estado se retire totalmente de todas as atividades econômicas que hoje gere diretamente.

O Estado Regulador adveio de uma enorme evolução da Administração Pública em que o interesse público passou a ser custeado por recursos privados, buscando com isso a diminuição da atuação do Estado através da desestatização da qual são espécies a privatização, concessões, permissões e terceirização.

Este modelo de Estado Regulador foi adotado pelo Brasil o qual admite a intervenção do Estado diretamente na atividade econômica nas hipóteses estabelecidas no artigo 173 da Constituição da República Federativa do Brasil, quais sejam “imperativos da segurança nacional” ou “relevante interesse coletivo”.

Assim, a nova ordem econômica constitucional, inaugurada pela Constituição da República de 1988, em seu art. 173 no caput prescreve o seguinte:

Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

Assim sendo, a regra é a proibição da exploração direta pelo Estado da atividade econômica, somente cabendo exceção quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, o que poderá variar de acordo com a ideologia histórica. Destarte, o Estado somente poderá exercer a atividade econômica quando não for possível que um particular a exerça, para que a Administração pública se volte às suas atividades-fim.

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Aragão (2009, p. 119) relata a dificuldade existente na classificação dos instrumentos de regulação estatal da economia e verifica esta substituição do Estado, destacando a criação das agências reguladoras nos seguintes termos,

Em lugar de protagonista na execução dos serviços, suas funções passam a ser de planejamento, regulação e fiscalização. São nesse contexto histórico que surgem, como personagens fundamentais, as agências reguladoras.

Marques Neto (2002, p. 74) estabelece que a distinção entre intervencionismo estatal direto e indireto não pode significar uma redução no intervencionismo estatal:

Porém, paralelamente a este intervencionismo direto, podemos identificar outra ordem de intervenção estatal no domínio econômico, que designaríamos de intervencionismo indireto. Trata-se, aqui, não mais da assunção pelo Estado da atividade econômica em si, mas de sua concreta atuação no fomento, na regulamentação, no monitoramento, na mediação, na fiscalização, no planejamento, na ordenação da economia. Enfim, cuida-se da atuação estatal fortemente influente (por indução ou coerção) da ação dos atores privados atuantes num dado segmento da economia.

Cabe ainda observar que, antes do surgimento das agências reguladoras, já existiam no ordenamento jurídico brasileiro órgãos e entidades reguladores que exerciam a função regulatória, cite-se os exemplos do Conselho Monetário Nacional - CMN, Banco Central do Brasil, Instituto do Álcool e do Açúcar - IAA, Instituto Brasileiro do Café - IBC e a Comissão de Valores Mobiliários.

3.1 A REGULAÇÃO TRADICIONAL

É importante ter como premissa que a regulação já foi utilizada em diversos períodos históricos. Cumpre frisar que adquire cada vez mais força, principalmente no Direito Administrativo e Constitucional.

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estabelecendo regras e fiscalizando sua execução. No período do Estado Social, este passa a regular o mercado. Mas foi com o surgimento do Estado Regulador que o vocábulo regulação, já consagrado no artigo 174 da Constituição da República Federativa do Brasil, passou a ser bastante utilizado.

O Estado Regulador surgiu em uma época na qual o Estado não tinha condições de satisfazer todas as necessidades da sociedade, contratos de concessão eram firmados sucessivamente, estimulando a competição, e empresas estatais passavam pelo processo de privatização. Desta maneira, o Estado Regulador é legitimado a exercer funções de regulação através de orientação e fiscalização de atividades econômicas.

É neste contexto que o Estado Regulador está intimamente relacionado ao exercício da regulação, pois exerce a regulação na intervenção da liberdade econômica.

Ao conceito etimológico de regulação, segundo Moreira (2004, p. 17), estão ligadas duas idéias: estabelecimento e implementação de regras, de normas; e de manutenção ou restabelecimento do funcionamento equilibrado de um sistema. Assim, segundo o citado autor, constitui o conceito operacional de regulação econômica “o estabelecimento e a implementação de regras para a atividade econômica destinadas a garantir o seu funcionamento equilibrado, de acordo com determinados objetivos públicos”

No que concerne à amplitude do conceito regulação, o autor menciona três concepções de regulação.

No primeiro sentido, o conceito de regulação cobre todas as atividades do Estado em relação com a economia, incluindo o exercício de atividades empresariais, empresas públicas em sentido genérico, e as tarefas de condicionamento e disciplina da atividade privada.

No segundo sentido, mais restrito, o conceito designa toda a intervenção do estado no comportamento econômico das empresas privadas, ficando de fora a participação direta do Estado na própria atividade econômica.

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Mendes (2002) entende que a regulação adota um sentido amplo, ou seja, trata de orientar atividades econômicas em sentido amplo, incluindo os serviços públicos e as atividades econômicas em sentido estrito. Assim, o autor estabelece que o Estado desempenha a regulação, tanto quando tem um vínculo genérico com o administrado (livre iniciativa da atividade econômica em sentido estrito), quanto no caso de possuir um vínculo específico (serviços públicos prestados mediante concessão ou permissão).

Da mesma forma, Salomão Filho (2001, p.14) adota uma concepção ampla da regulação, estabelecendo que a teoria da regulação quando bem aplicada pode representar a contribuição mais útil de um Estado que se retira da intervenção econômica direta para função de organizador das relações econômicas.

Por outro lado, reconhece ser insuficiente o exercício do poder social e polícia sobre os mercados. Salomão Filho (2001, p. 15) estabelece a amplitude da regulação da seguinte forma,

Engloba toda forma de organização da atividade econômica através do Estado, seja a intervenção através da concessão de serviço público ou o exercício de poder de polícia. A concepção ampla justifica-se pelas mesmas razões invocadas acima. Na verdade o Estado está ordenando ou regulando a atividade econômica tanto quando concede ao particular a prestação de serviços públicos e regula sua utilização - impondo preços, quantidade produzida etc.- como quando edita regras no exercício do poder de polícia administrativo. É assim, incorreto formular uma teoria que não analise ou abarque ambas as formas de regulação.

Para Sundfeld (2002, p. 18), a regulação não pertence ao mundo jurídico, mas trata de uma opção de política econômica:

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públicos”, exploração de “bens públicos” e de “monopólios” estatais).

Segundo Souto (2002, p. 50), a regulação é uma atividade administrativa:

A regulação é uma atividade administrativa de intervenção do Estado no domínio econômico, mediante a ponderação entre interesses em tensão, buscando maximizar os benefícios em relação aos custos criados por esta restrição da liberdade.

O autor leciona que a regulação deve ser considerada sob três aspectos:

Ao mencionar que a regulação busca compatibilizar a eficiência econômica com a satisfação do consumidor (protegendo-o contra os altos preços e baixa qualidade de bens e serviços), já se teve oportunidade de dizer que ela deve ser considerada sob três aspectos, a saber, a regulação de monopólios, em relação aos quais devem ser minimizadas as forças de mercado por controles sobre os preços e a qualidade dos serviços (já que nem sempre a competição é viável), regulação para a competição, para viabilizar a sua existência e continuidade, e regulação social, assegurando prestação de serviços públicos de caráter universal e a proteção ambiental. (SOUTO, 2002, p. 51)

Aragão (2009, p. 06) observa que o conceito de regulação exclui a atividade direta do Estado como produtor de bens ou serviços e como fomentador das atividades econômicas privadas, “que, junto da regulação, constituem espécies do gênero da intervenção do Estado na economia”.

O autor entende que a noção de regulação implica um conjunto de funções:

A regulação estatal da economia é o conjunto de medidas legislativas, administrativas e convencionais, abstratas ou concretas, pelas quais o Estado, de maneira restritiva da liberdade privada ou meramente indutiva, determina, controla, ou influencia o comportamento dos agentes econômicos, evitando que lesem os interesses sociais definidos no marco da Constituição e orientando-os em direções socialmente desejáveis. (ARAGÃO, 2009, p. 07).

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deve-se buscar o equilíbrio na atuação da regulação.

Cumpre verificar que, em sentido oposto, Ferraz (2004) entende que a atividade reguladora é uma atividade jurídica, se fazendo da interpretação das leis e dos diplomas normativos a elas pertinentes. Para o autor, a consideração jurídica é a primacial, sendo a consideração técnica apenas instrumental.

Segundo Justen Filho (2002, p. 15) as perspectivas acerca da intervenção do Estado no domínio econômico têm sido relacionadas a um modelo regulatório. A compreensão mais perfeita dessa concepção depende da sua inserção num quadro cultural mais amplo.

Diante das colocações apontadas, parece mais acertada a posição que entende que a regulação é uma atividade administrativa para intervir em determinada atividade econômica em sentido amplo, por meio de fiscalização, planejamento, orientação e incentivo.

O objetivo é alcançar o equilíbrio entre os interesses existentes em determinado segmento regulado, por meio da ponderação entre custos e benefícios.

3.2 REGULAÇÃO DE MERCADOS - A REGULAÇÃO MODERNA

Embora nos últimos anos se tenha falado muito na profusão do “Estado Regulador” na América Latina, a atividade regulatória sempre esteve entre as atribuições do Estado.

Em geral a atividade regulatória ocorre de dois modos, diretamente, por meio do provimento de bens e serviços públicos pelo próprio Estado, via empresas estatais que atuam em setores de monopólios naturais ou não, ou a partir de sua própria estrutura tradicional como ministérios ou órgãos a eles subordinados. Até o início dos anos noventa predominou na Europa e na América Latina a primeira opção.

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industrialização no século XIX e apresentam características de monopólios naturais. A propriedade do Estado nesses casos era tida como importante não apenas porque eliminava a ineficiência dos monopólios privados, mas também assim se estimulava o desenvolvimento econômico em favor de regiões ou grupos particulares desfazendo assimetrias, protegendo consumidores e garantindo a segurança nacional. No entanto, dentre as várias justificativas apresentadas se destaca mesmo a afirmação central na qual a propriedade pública poderia aumentar a habilidade do governo para regular a economia e proteger o interesse público.

Em sua análise da atividade regulatória na Europa, Majone (1999, p.23) aponta que

(...) essa questão tornou-se problemática quando a experiência subseqüente à nacionalização das empresas no pós-guerra demonstrou que a propriedade pública e o controle público não poderiam ser assumidos como a mesma coisa.

Após a segunda guerra a insatisfação com o desempenho das empresas nacionalizadas em vários países europeus provou que o principal objetivo para o qual elas haviam sido criadas, regulação da economia voltada para o interesse público, estava quase esquecido. As falhas da nacionalização eram observáveis não apenas no campo da regulação econômica, mas também quanto aos objetivos socioeconômicos.

Adiciona-se a isso a desconfiança em relação aos administradores públicos fiduciários do interesse público. As falhas da propriedade pública como modo de regulação adquiriram popularidade em todo o mundo nos últimos trinta anos e foram somadas à consciência crescente quanto ao esgotamento da capacidade fiscal do Estado e as decorrentes dificuldades em prover políticas públicas de qualidade devido aos baixos níveis de crescimento que vinham sendo experimentados. Esses fatores somados explicam a abertura na América Latina dos anos 90 para a consolidação do argumento no qual se baseia a moderna teoria da regulação.

Segundo Justen Filho (2002, p. 20):

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com o modelo anterior, para identificar mais apropriadamente o fenômeno.

Contudo, cumpre ressaltar que o Estado Regulador, com suas instituições características expressas por agências independentes especializadas criadas em substituição à propriedade privada teve origem nos Estados Unidos. A natureza dessa forma assumida pelo Estado pode ser brevemente resumida em três grandes momentos ou ondas de inovação institucional na América: a era Progressiva, o New Deal e a era da nova regulação social dos anos 60. Ao longo desse período se observou um grande impacto na vida política americana com a transformação das relações entre as organizações do governo e o sistema de espólio das empresas privadas, além da difusão de valores e idéias de profissionalismo, especialização técnica e científica, competência e neutralidade administrativa e observação de eficiência tanto na atuação do governo quanto no desempenho do mercado.

Justen Filho (2002, p. 21) é bem otimista ao afirmar que houve uma sensível redução na intervenção do Estado, veja-se:

No modelo desenvolvido ao longo dos últimos trinta anos, a atuação e a intervenção estatal diretas foram reduzidas sensivelmente. A contrapartida da redução da intervenção estatal consiste no predomínio de funções regulatórias. Postula-se que o Estado deveria não mais atuar como agente econômico, mas sim como árbitro das atividades privadas. Não significa negar a responsabilidade estatal pela promoção do bem-estar, mas alterar os instrumentos para realização dessas tarefas. Ou seja, o ideário do Estado de Bem-Estar permanece vigente, integrado irreversivelmente na civilização ocidental. As novas concepções acentuam a impossibilidade de realização desses valores fundamentais através da atuação preponderante (senão isolada) dos organismos públicos.

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por telecomunicações, saúde, energia e transportes.

A mobilização de alguns setores sociais juntamente com o governo brasileiro nesse sentido foi notável nos anos 90. Com uma afiada construção retórica fundamentada no ideal de sociedade capitalista moderna e dotada de um aparato regulatório moderno, o Brasil se viu em meio a reformas afinadas com as propostas de desregulamentação. Bresser Pereira (2001) que por longo período esteve à frente das mudanças institucionais regulatórias implementadas no Brasil sempre argumentou favoravelmente ao direcionamento dado às instituições pelas reformas. Pode-se mesmo considerá-lo um dos mentores de tais transformações. Suas palavras são expressivas do entusiasmo contido no movimento de transformação das instituições do Estado, sem que isso acompanhe qualquer crítica ou restrição às implicações das mudanças, sobretudo da delegação de poderes às comissões independentes, como pode ser observado pelo então Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira:

(...) Creio ser quase que desnecessário explicar a razão do meu interesse no ‘novo’ e porque sustento que algo novo está surgindo, embora a gestão pública e o Estado sejam instituições antigas. Em um mundo em que a tecnologia muda tão rapidamente, onde o ritmo do desenvolvimento econômico tende a acelerar-se secularmente e onde as relações econômicas e sociais tornam-se cada vez mais complexas, espera-se também que as instituições políticas mudem. As três instâncias políticas que agem nas sociedades capitalistas modernas – a sociedade civil, o Estado (organização e instituições) e o governo – deverão assumir novas formas, novos papéis, novos modos de relacionar-se umas com as outras e, assim produzir uma nova governança democrática. (PEREIRA, 2001)

Além do entusiasmo pelo “novo”, observado na fala de lideranças políticas daquele momento, o apoio de organismos internacionais como o Banco Mundial (BIRD), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi essencial para a consolidação e difusão da crença na qual os esforços como a privatização, associados a outros fatores, levariam ao desenvolvimento.

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reformas em direção ao mercado como condição para a concessão de empréstimos. Os países vinculados à OCDE, por exemplo, deram início a uma revisão das suas práticas e instrumentos regulatórios. Também incentivaram os movimentos de reformas nos demais países e, sobretudo, o rompimento com qualquer estilo administrativo que se reportasse ao desenvolvimentismo, ou seja, às estratégias de desenvolvimento econômico e tecnológico baseados em financiamentos estatais.

A proposta de Reforma Regulatória da OCDE influenciou amplamente os países latinos, entre eles o Brasil. A partir do âmbito de atuação do Estado, essa proposta apresenta três categorias da atividade regulatória: a regulação econômica, a regulação social e a regulação administrativa.

A regulação econômica caracteriza-se pela intervenção direta nas decisões de mercado tais como definição de preços, competição, entrada e saída de novos agentes nos mercados. Para a OCDE, nessa categoria a reforma deve se propor a aumentar a eficiência econômica por meio da redução de barreiras à competição e à inovação utilizando a desregulamentação, a privatização e fornecendo uma estrutura para o funcionamento e supervisão das atividades do mercado.

Sobre a regulação econômica Aragão (2009, p.93) afirma que:

O Direito deve buscar analisar o setor econômico a ser regulado, as circunstâncias em que se encontra e as possibilidades de regulação exógena, para, de forma inteligente, lograr maior efetividade para as suas normas, articulando impulsos regulatórios pertencentes a diferentes lógicas sistêmicas, por exemplo, ligando incentivos econômicos às regulações jurídicas.

A regulação social destina-se a proteger o interesse público nas áreas de saúde, segurança, meio-ambiente e em questões nacionais. Em muitos casos a regulação deve atuar sobre recursos sociais que não estão sujeitos a transações de mercado, mas que, no entanto são importantes ou mesmo imprescindíveis à produção de um bem ou serviço regulado. Segundo a OCDE, cabe nesse plano da reforma aferir a necessidade de intervir em decisões relativas à provisão de bens públicos e proteção social reduzindo os efeitos das externalidades geradas por outros agentes sobre a sociedade.

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substanciais sobre o desempenho do setor privado. De acordo com a OCDE, para evitar esse efeito os governos devem buscar em suas reformas regulatórias eliminar as formalidades desnecessárias, simplificar aquelas que são necessárias e melhorar sua transparência e aplicação. Segundo Aragão (2009, p. 97) “a administrativização da regulação estatal encontra-se dentro da perspectiva de remodelação das funções da Administração Pública em razão da sua preponderância no Estado contemporâneo”.

Nota-se que esse compacto conjunto de instruções, aparentemente simples, compôs a rationale das mais diversas reformas observadas na América Latina, umas

mais fiéis que outras. Com intervenções como essa se ampliou na região a percepção de que com a adoção de tais medidas e do aparato regulatório apropriado ter-se-ia, enfim, uma regulação moderna capaz de conduzir cada país que a adotasse rumo ao desenvolvimento esperado. A enormidade de reformas também tendeu mais a orientação econômica, todavia as outras categorias também adquiriram importância e tornaram-se expressivas dentre as intervenções estatais.

É importante salientar que a literatura contemporânea parte do pressuposto de que como o pensamento regulatório está alinhado à agenda neoliberal, isso implicaria que regulação e competição são indissociáveis. No entanto, o padrão de interação pode variar indicando a direção das reformas. Os autores consideram que desregulação, re-regulação, regulação da competição, regulação por competição e meta-regulação trazem distintas e algumas vezes até mesmo dimensões conflitantes do amplo fenômeno da reforma regulatória e da liberalização.

Segundo Pereira (2006, p.33) a administração pública gerencial envolve uma mudança na estratégia de gerência, mas essa nova estratégia deve ser posta em prática em uma estrutura administrativa reformada. “A idéia geral é descentralizar, delegar autoridade”. Mas é preciso ser mais específico, definir claramente os setores que o Estado opera, as competências e as modalidades de administração mais adequadas a cada setor. Assim se refere o citado autor sobre a reforma da estrutura do Estado.

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estratégico. No caso do sistema ser federal, também integram esse núcleo os governadores e seus secretários e a alta administração pública estadual. (PEREIRA, 2006, p. 36).

Como se vê, a desregulação é para esses autores a redução econômica, política e social das restrições sobre o comportamento dos atores sociais, especialmente daqueles que atuam no mercado. Com uma contribuição significante nesse sentido é citado Stigler, que nos anos 70 quando discutia a relação entre competição e regulação, sustentou que a eliminação da regulação, isto é a desregulação, era a condição necessária para a competição.

Já a noção de re-regulação é utilizada com freqüência significando que reforma regulatória e liberalização em geral resultam em um novo cenário de regulação antes que em desregulação. Os autores reconhecem que a noção de re-regulação é tão vaga quanto à natureza e os objetivos da nova re-regulação, por esse motivo seu uso é limitado ao tentar esclarecer a analogia entre competição e regulação.

Por sua vez os autores apontam vantagens no uso da regulação da competição e da regulação por competição sobre a noção de re-regulação porque elas refletem uma relação positiva entre regulação e competição. A diferença entre regulação da competição e regulação por competição está no grau de interferência do Estado e na sua capacidade de monitorar e reforçar a competição.

Enquanto ambas requerem o estabelecimento e o fortalecimento da estrutura de governança, regulação por competição requer uma estrutura menos invasiva.

A meta-regulação da competição, finalmente, implica que ao se adicionar a regulação direta sobre as ações dos indivíduos e das corporações, o processo de regulação torna-se ele mesmo regulado. No contexto em que se verifica a competição via poder político, isso significa que o governo acompanha o auto-monitoramento das corporações tanto quanto a obediência de seus empregados às regras da competição. (PEREIRA, 2006).

No que tange a interferência do Estado, esse tipo de regulação pode ser julgado tão invasivo quanto à regulação por competição. Nota-se pela análise dos focos da regulação e ainda pela relação entre competição e regulação uma diversidade de ambientes regulatórios, uns mais outros menos competitivos, que contam com menor ou maior participação do Estado nas decisões de mercado.

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característica genuína do Estado Regulador. O funcionamento dessas estruturas de governança atrai cada vez mais o interesse acadêmico e leituras de outra sorte surgem e trazem consigo notas tão ou mais relevantes, completando respostas que ajudam a compreender de onde vieram as agências reguladoras e porque, embora não sejam as únicas opções institucionais para regulação, elas são cada vez mais adotadas pelos governos.

3.3 DELEGAÇÃO, CREDIBILIDADE E COMPROMETIMENTO: ALGUMAS MOTIVAÇÕES BÁSICAS

Sobre a reforma do Estado, Fernando Henrique Cardoso (2006, p. 15) faz uma reflexão há um tempo realista e criativa sobre os riscos e as oportunidades do processo de globalização. Defende que “somente assim será possível transformar o Estado de tal maneira que ele se adapte às novas demandas do mundo contemporâneo”. Continua o autor:

Reformar o Estado não significa desmantelá-lo. Pelo contrário, a reforma jamais poderia significar uma desorganização do sistema administrativo e do sistema político de decisões e, muito menos, é claro, levar à diminuição da capacidade regulatória do Estado, ou ainda, à diminuição do seu poder de liderar o processo de mudanças, definindo o seu rumo.

Nesse sentido, a delegação de poderes para as agências reguladoras, assim como a necessidade de elevar o grau de comprometimento do poder público com a manutenção de decisões, leis e normas que afetam diretamente os agentes do mercado são os fatores chaves que motivaram a criação dessas instituições. Do mesmo modo, esses são também os fatores que concentram as maiores críticas entre aqueles que se opõem a esse modelo regulatório.

Nesse item serão apresentados os argumentos de um e de outro a fim de esclarecer o real significado tanto da delegação quanto do comprometimento para o ambiente regulatório.

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fracasso da regulação através da propriedade estatal explica toda a mudança para um modo alternativo de controle, no qual serviços e setores inteiros, considerados importantes para o interesse público são deixados em mãos privadas, mas sujeitos às regras desenvolvidas e aplicadas por agências especializadas.

Conforme foi exposto anteriormente, para Majone (1999) a propriedade e o controle público não podem ser assumidos como similares. O problema do controle efetivo sobre as empresas nacionalizadas provou que os principais objetivos para os quais elas foram criadas eram freqüentemente esquecidos. Embora essa tenha sido uma discussão interessante nos anos 60 nos EUA sobre as chamadas “falhas de governo”, Majone (1999) acredita que só nos anos 90 essa discussão chegou a outros países.

Fernando Henrique Cardoso (2006, p. 15) é enfático ao afirmar;

Mudar o Estado significa, antes de tudo, abandonar visões do passado de um Estado assistencialista e paternalista, de um Estado que, por força de circunstâncias, concentrava-se em larga medida na ação direta para a produção de bens e de serviços. Hoje, todos sabemos que a produção de bens e serviços pode e deve ser transferida à sociedade, à iniciativa privada, com grande eficiência e com menor custo para o consumidor.

Na mesma linha Przeworski (2006, p. 69) afirma:

A reforma do Estado deve ser concebida em termos de mecanismos institucionais pelos quais os governos possam controlar o comportamento dos agentes econômicos privados, e os cidadãos possam controlar os governos. A questão quanto a se um Estado neoliberal é ou não é superior a um Estado intervencionista não pode ser resolvida em termos gerais, uma vez que a qualidade da intervenção estatal depende de um desenho institucional específico. Porém, o Estado neoliberal é, pelo menos, um parâmetro pelo qual se pode aferir a qualidade da intervenção estatal: como as alocações do mercado não são eficientes, desaparelhar o Estado não é um objetivo racional de reforma do Estado.

Alguns doutrinadores e críticos de economia identificam falhas de governo, baseadas na teoria da escolha pública. Dentre os problemas descritos, alguns são recorrentes e que caracterizam as restrições da atuação do governo na economia, tais como a patronagem, as falhas institucionais, o rent-seeking e a captura.

Ocorre o rent-seeking quando grupos de interesse se envolvem com a política

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defesa do interesse público fosse possível na teoria, na pratica os interesses particulares se sobrepõem ao interesses públicos.

Já a captura ocorre quando os organismos regulatórios se encontram muito próximos dos regulados, favorecendo o aumento dos riscos de interferência de interesses particulares nas decisões públicas, conseqüentemente afetando a independência e a qualidade da regulação. Isso ocorre muitas vezes devido à assimetria de informação entre o governo e a firma, o que faz com que o regulador ser aproxime do regulado visando obter informação e identifique seus reais objetivos. A captura também pode ocorrer quando o governo propriamente faz com que a agência assuma posições que reforçam sua política para determinado setor. Além disso, existe ainda a captura burocrática que ocorre quando os objetivos da agência passam a refletir os interesses de seu staff.

Reforçando ainda mais a existência da referida teoria, Marçal Justen Filho (2002, p. 269) leciona em sua obra:

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organizações como uma oportunidade para trocar apoio ou pagar favores políticos, comprometendo por vezes o quadro de pessoal das agências.

CRUZ (2009) ressalta que essas falhas de governo compõem os argumentos que permitiram o revigoramento da doutrina do laissez-faire, diante de um setor público estatal submetido a diversos problemas político-administrativos. Nesse ambiente, onde a avaliação do setor público era desprestigiada, o ideário do livre mercado logo conquistou espaço. Por outro lado é válido esclarecer que ao mesmo tempo se observava que nem todas as experiências de liberalização dos mercados estavam sendo bem sucedidas. Nesse período ficou evidente a polarização do debate sobre o “tamanho” ideal do Estado, se mínimo ou não. Parte das tendências ideológicas pertencentes aos dois pólos convergiu para o ponto de vista que apontava o Estado como necessário para corrigir os vícios do mercado como os monopólios, as externalidades negativas e a assimetria informacional.

A obra de Levy e Spiller (1996, apud CRUZ, 2009, p.63), em certa medida, também se insere nesse prisma, embora esteja implícito em uma análise que a maior ameaça ao bom desempenho do mercado tem origem mesmo na ação discricionária do poder público. Pelo lado das idéias, o financiamento de projetos de pesquisas apoiando as privatizações como um fator de desenvolvimento também foi utilizado, esse é o caso dessa obra. O trabalho desses autores figurou como um destacado estudo na economia política, sendo considerado amplamente demonstrativo do poder das novas instituições para solucionar os conflitos regulatórios no ambiente pós-privatizações.

Eles analisam o problema da regulação dos serviços públicos por meio das lentes da economia neo-institucional. O argumento central é que a credibilidade e a efetividade da estrutura regulatória, bem como sua habilidade para encorajar investimentos e apoiar a eficiência na produção e uso dos serviços varia com as instituições políticas e sociais de cada país, o contexto, portanto. O desempenho pode ser satisfatório dentro de uma ampla variedade de procedimentos administrativos desde que três mecanismos sejam adotados: restrições substantivas sobre as ações discricionárias do regulador, restrições formais e informais sobre mudanças do sistema regulatório e instituições para reforçar essas restrições.

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tenham a habilidade de restringir a ação administrativa discricionária, as instituições políticas e sociais devem ter um efeito independente sob cada tipo de regulação e um equilíbrio adequado entre o comprometimento com um sistema regulatório particular e a flexibilidade para responder às mudanças tecnológicas.

É com base nesse paradoxo entre o comprometimento com um sistema regulatório e a flexibilidade frente às novas tecnologias que os autores desenvolvem toda sua argumentação sem, no entanto, o reconhecer como tal.

Além disso, para eles o compromisso com o sistema regulatório deve ser cultivado sempre, mesmo quando o ambiente parece o mais problemático possível, pois sem o comprometimento de longo prazo não há como manter os investimentos. Porém, ao mesmo tempo os autores parecem considerar, em último caso, as peculiaridades institucionais de cada país e reconhecem que alcançar um nível de comprometimento pode requerer um regime de inflexibilidade regulatória em alguns casos, e em outros, só mesmo a propriedade pública dos serviços é possível.

De acordo com a abordagem de Levy e Spiller (1996, apud CRUZ, 2009, p.63), para se entender a capacidade de um país em comprometer-se com um determinado sistema regulatório e suas instituições deve-se estar atento ao desenho regulatório que possui dois componentes: a governança e os incentivos. A estrutura de governança incorpora os mecanismos sociais úteis para restringir a ação discricionária do regulador e solucionar os conflitos que essas restrições venham suscitar.

Já a estrutura de incentivos compreende as regras governamentais que definem preços, subsídios, competição e a entrada de novos competidores, as interconexões. Eles sustentam que a ênfase apenas nos incentivos regulatórios é um equívoco, pois embora os incentivos afetem o desempenho, o maior impacto é sentido apenas se a estrutura de governança tiver seu lugar.

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Essa determinação e influência ocorrem na medida em que essas instituições endógenas restringem as ações arbitrárias do governo. Ao analisar empiricamente as experiências de Chile, Argentina, Jamaica, Filipinas e Reino Unido, os autores demonstram que cada país resolve seus conflitos regulatórios de um modo. O que explica essa variação na forma de solucionar as tensões regulatórias é a diferença entre o desenho institucional de cada país. Isso significa que se um país dispõe de instituições que se mostrem mais capazes de conter a ação discricionária do regulador do que outro esse país provavelmente irá dispor de mais credibilidade e, por essa razão, poderá contar com mecanismos regulatórios que outro país com menos credibilidade não teria sucesso se o adotasse.

Segundo CRUZ o que Levy e Spiller, parecem ignorar é que em busca da credibilidade para atrair investimentos, muitas escolhas e decisões de elevado custo social são assumidas pelos governos. Os autores trabalham essencialmente dentro da lógica de mercado e não absorvem aspectos relativos à promoção da equidade, distribuição de renda, ampliação da cidadania ou outros aspectos relativos à democratização das políticas nos setores em que os serviços são ofertados pelo mercado. A necessidade de oferecer salva-guardas ao mercado a todo tempo, reduz o papel das instituições políticas a meras retificadoras de acordos comerciais e sobrepuja inteiramente a política à economia.

Os autores, possivelmente, pelo viés economicista da análise, não vinculam em nenhum momento as instituições regulatórias com as instituições democráticas. Tratam do poder Legislativo e Judiciário apenas nos seus aspectos liberais, ou seja, legais ou normativos voltados para a eficiência econômica e não no que tange a preservação dos direitos enquanto cidadania, deixando de lado a representação de interesses, ou outros princípios mais ligados ao equilíbrio democrático.

No que se refere à Expertise, as agências reguladoras estão mais próximas

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Quando abordamos o tema referente ao compromisso com credibilidade, podemos afirmar que as agências reguladoras são insuladas das influências políticas e das pressões eleitorais rotineiras. Seus dirigentes, tendo mandatos mais longos, têm também a possibilidade de trabalhar com perspectivas de longo prazo, ao contrário dos políticos. Desse modo, as agências adquirem credibilidade junto ao mercado e às comissões governamentais voltadas para a busca de uma regulação justa. Isso ocorre mesmo na presença de conflitos de interesses quando, por exemplo, o Estado acumula os papeis de acionista e regulador. Evidentemente, que a credibilidade é importante para atrair investimentos. Sobre esse aspecto, é interessante destacar a autonomia administrativa das agências reguladoras mencionado por Menezello (2002, p. 73):

A gestão e o controle inicial ocorrem internamente nas agências por meio das diretorias, nomeadas com mandatos fixos e com responsabilidade para esse fim. Tal controle pode ser exercido de ofício ou por provocação recursal de qualquer agente regulado. Nessa esfera de decisão ocorre o reexame da questão apresentada e há possibilidade jurídica de reconsideração, restabelecendo-se com isso a legalidade e a legitimidade. É mediante o recurso administrativo que usuários e agentes econômicos podem pedir um reexame por parte da diretoria da agência de um ato que julguem inadequado, desarrazoado, ilegal e/ou imotivado.

Outro aspecto a se destacar é o da estabilidade, a fim de que as agências reguladoras favoreçam um estável e previsível ambiente regulatório. Por estar contida no desenho das agências faz com que o mercado não tema uma mudança inesperada das regras. A estabilidade se diferencia do compromisso com a credibilidade uma vez que este último é francamente assumido em favor do investidor enquanto que a primeira apenas cria uma ambiente amigável ao investidor, assegurando-lhe que os mecanismos regulatórios não sofrerão mudanças súbitas.

Como resultado dos fatores citados anteriormente, as agências reguladoras conduzem a um melhor resultado regulatório que podem ser traduzidos em melhor desempenho dos mercados, o que se reflete em eficácia e eficiência.

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particulares, como das indústrias reguladas, por exemplo. Isso contribui para uma melhor regulação. Abertura e transparência no processo decisório não são apenas meio, mas um fim em si mesmo e estão relacionados ao accountability.

Da mesma forma, a delegação para as agências reguladoras reduz os custos da tomada de decisão, como pode ser observado na presença de desacordos sobre determinadas políticas, nas quais maiorias são mais facilmente formadas para “deixar alguém mais decidir”, especialmente se as perdas e ganhos não são muito claros.

CRUZ (2009) ressalta que as agências reguladoras permitem aos políticos evitar responsabilidades quando ocorrem falhas ou quando decisões impopulares são tomadas. Esse comportamento não é adotado pelo custo ou busca de um acordo, mas pelo desejo de transferir responsabilidade nos casos em que os problemas tendem a atingir maiores proporções e os custos políticos podem pesar mais que os benefícios.

Corroborando a interpretação de que os atores políticos adotam estrategicamente a delegação de poderes para agências independentes, Thatcher (2004, apud CRUZ 2009, p. 68) afirma que seguramente os políticos o fazem porque vêem na delegação inúmeras vantagens, como as já citadas: transferência de responsabilidade, evitar medidas impopulares, insular políticas, evitar oportunismos, assegurar credibilidade e leis de longo prazo. Assim, as agências na verdade atuam de forma complementar aos governos e não como concorrentes. Se concorrentes fossem os políticos, cuja preocupação principal é concentrar poder, não lhes delegaria nada. Segundo esse autor, por meio de redes informais com as agências, os governos podem criar estratégias e implementar políticas sobre as quais há acordo.

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autor, a despeito do crescente interesse acadêmico sobre as agências reguladoras, ainda resta explicar de onde elas vêm e como a delegação de poderes para as mesmas pode ser explicada.

Para esse autor a rational choice sugere que o estabelecimento das agências

reguladoras pode ser a solução para os problemas de escolha ao longo do tempo. São consideradas as duas principais características dessa abordagem: primeiro sua concepção dos atores como racionais, voltados para a maximização dos seus interesses cujo comportamento é moldado e restrito pelas instituições, definidoras das regras do jogo. Segundo, as instituições são vistas como resultado de um arranjo deliberado. Sua forma é determinada pelos benefícios que elas podem trazer aos atores relevantes. Além de solucionar os problemas de escolha na regulação, esta abordagem sustenta que a regulação via agências ocorre porque os políticos desejam melhorar a credibilidade de suas políticas e também buscam solucionar o problema da incerteza.

De acordo com CRUZ (2009), o institucionalismo histórico tem suas raízes fincadas na teoria das organizações e conta com uma ampla definição de instituições, que inclui normas formais e informais. Essa abordagem enfatiza o impacto cognitivo das instituições, os quais fornecem as diretrizes para o comportamento dos atores. Para essa abordagem a mudança institucional não é vista como resultado de um arranjo propositivo, mas como um fenômeno que tem fortes dimensões simbólicas. Assim, a regulação via agências ocorre porque elas representam a garantia de uma forma adequada de regulação.

O institucionalismo histórico, finalmente, sugere uma marcada visão histórica das instituições cujo estudo implica em uma análise dos processos ao longo do tempo. As preferências dos atores podem ser endógenas, isto é podem ser influenciadas pelas instituições. Há também uma forte tendência a focalizar os macro-contextos e a combinar efeitos das instituições e dos processos nas análises dos resultados dos conflitos de interesses. Além disso, o institucionalismo histórico enfatiza o processo de path dependency que limita as possibilidades de mudanças,

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Para Gilard (2004, apud CRUZ, 2009, p. 70) a principal crítica que se faz às três teorias é o fato de todas possuírem um viés em relação à estabilidade, sendo inadequadas para explicar a mudança institucional. Já o ponto positivo encontra-se no fato do novo institucionalismo focalizar não apenas as instituições, mas a relação existente entre atores e instituições. Porém, o autor conclui que tais abordagens de análise do neoinstitucionalismo não são as melhores teorias para explicar a mudança institucional na regulação, sendo mais adequado afirmar que são teorias apropriadas para responder algumas questões, umas mais que outras. Assim, se há interesse em realizar amplas comparações o institucionalismo histórico não é um bom ponto de partida. Se o foco é a dinâmica de longo prazo, a teoria da escolha racional não é suficiente. Se o objetivo é analisar as funções racionais o institucionalismo sociológico tem pouco a contribuir.

Entre as principais conclusões dessa análise se destaca a crítica à visão funcional das instituições de acordo com a abordagem da rational choice. Embora a

função das agências reguladoras seja dar credibilidade às políticas, pois a falta de credibilidade desencoraja os investimentos, o processo político democrático, por outro lado, permite que as políticas possam ser mudadas ou suprimidas quando um novo partido ou coalizão ganha o poder. Do mesmo modo, quando o institucionalismo sociológico enfatiza a importância da estrutura normativa e a difusão simbólica das agências revela, na verdade, que essas instituições são criadas para legitimar escolhas sem ter que justificá-las.

Nesse caso agências são criadas não pela função que desempenham, mas por seu poder simbólico. Por fim, o institucionalismo histórico sustenta que as pressões por reformas são mediadas pelas instituições nacionais, o que em outras palavras significa afirmar que são conduzidas por ao longo de bem estabelecidos caminhos institucionais.

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estreitas ou marcadas pela dependência com esses países, como é o caso dos países latino-americanos.

Nesse sentido, autores como Majone (1996, apud CRUZ, 2009, p. 71) e Moran (2003, apud CRUZ, 2009, p. 71) explicam porque o “estilo americano” de regulação predominou nas reformas regulatórias ao longo dos anos 90. Para Majone o estatuto da regulação por meio de corpos ou comissões independentes tem uma longa tradição nos Estados Unidos, vigorando desde 1887 no nível federal com o

Interstate Commerce Act e o Interstate Commerce Comission, que regulavam as

estradas de ferro. Porém, na Europa esse ainda é um fenômeno relativamente recente. Segundo esse autor, a ideologia não é o único, mas é, certamente, um importante fator nessa diferenciação.

O estilo americano de regulação que deixa a indústria nas mãos do mercado expressa amplamente a crença de que o mercado trabalha melhor sob circunstâncias normais e deve sofrer interferências apenas em casos específicos de falhas de mercado. Na Europa, por outro lado, o sistema de mercado e a estrutura de direito de propriedade tal como o atual sistema impuseram, tem sido aceita pela maioria dos eleitores apenas recentemente. Por um longo período histórico um largo segmento da opinião pública era abertamente hostil à economia de mercado e cética quanto á capacidade do sistema de sobreviver às crises recorrentes.

Majone recorda que em resposta às falhas de mercado a Europa adotou a tradição de dirigismo estatal e centralização burocrática rejeitando o estilo americano simplesmente por não acreditar no mercado. Contudo a filosofia e a prática regulatória americana passaram a influenciar fortemente o processo decisório na Europa em três distintos momentos: durante os anos de formação da Comunidade Européia; nos anos 70 durante o período de expansão da regulação social, especialmente quanto ao meio-ambiente e à proteção dos consumidores e; nos anos 80 na era da privatização e da desregulação.

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pensamento, bem como padrões de comportamento não são facilmente modificáveis.

3.4 ACCOUNTABILITY E TRANSPARÊNCIA

A palavra accountability é um termo de origem inglesa que pode ser traduzido por “responsabilidade” ou por “imputabilidade”, qual seja “a obrigação de que alguém responda pelo que faz”. É a obrigação dos agentes do Estado em responder por suas decisões, ações e omissões, o que já é universalmente consagrado como norma nas sociedades mais desenvolvidas.

No fim dos anos oitenta, com a onda de democratização na América Latina, as ciências sociais passaram a incorporar em suas análises a necessidade de desenvolvimento de instrumentos de accountability e transparência das decisões

públicas como tarefa inadiável das novas democracias. Cidadania, sociedade organizada, engajamento cívico, interesses, representação, prestação de contas, controle, punição, boa governança e poder.

Esses são alguns dos conceitos-chave aos quais a prática do accountability

se vincula, direta ou indiretamente. Eles estão presentes em todo o debate sobre o tema e auxiliam no seu entendimento.

Na verdade, entender e identificar práticas de accountability de um modo

geral há alguns anos na América Latina, África, ou mesmo em países centrais não era tarefa simples. Todavia, juntamente com o crescimento da idéia de Estado Regulador, atualmente os conceitos de accountability e transparência assumem

papéis centrais, tendo em vista o deslocamento de poder que se observa nessa nova ordem pós-reformas. Hoje ambos são cruciais para manter o regime regulatório em um subsistema de resultados e políticas.

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Public Management, que incorpora a introdução de novos conceitos como o de

“cidadão consumidor” e “boa governança”, por exemplo.

Além disso, essa ideologia incorpora uma presunção da necessidade do predomínio da razão sobre a política, fundamentada na superioridade da especialização técnica e em detrimento da representação de interesses. Em um ambiente regulatório com as características citadas, accountability e transparência

seriam favorecidas e ocorreriam quase que naturalmente. Porém, na prática essa naturalização não se observa e a introdução de mecanismos de controle é quase sempre acompanhada de fortes resistências.

A proclamada mudança para o Estado Regulador trouxe ênfase ao debate sobre accountability e transparência mais pelo lado negativo do que pelo lado

positivo, ao contrário do que se poderia pensar. A percepção dos limites de

accountability e transparência nos regimes regulatórios têm sido um dos principais

pontos de crítica pela mídia, pela opinião pública, pelos investidores e os chamados grupos de interesses, segundo Lodge (2004, apud CRUZ, 2009, p. 73). O debate compreende desde a questão dos reguladores serem continuamente obrigados a se reportarem às comissões do parlamento, até quão transparentes devem ser as decisões públicas tomadas no âmbito das agências vis-à-vis outros departamentos do governo, a indústria ligada ao setor, os investidores e mais amplamente os cidadãos.

Apesar de accountability e transparência terem se tornado uma característica

proeminente da governança, promovida atualmente por diversos grupos e instituições como OCDE, Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional, além de diversas ONGs pelo mundo, sua operacionalização ainda exige a ruptura com inúmeros fatores institucionais e culturais que permitam seu real estabelecimento. (LODGE 2004, apud CRUZ 2009, p.74)

Questões como quem é ou deve ser accountable para quem e sob quais

termos representa hoje uma dimensão crucial de qualquer regime regulatório, bem como a arquitetura dos mecanismos de controle e a relação entre os atores envolvidos. Essas questões antes de tudo merecem análise crítica e suas respostas informam também sobre o impacto que a mudança política no padrão regulatório proporcionou à extensão e à qualidade dos direitos de cidadania.

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