• Nenhum resultado encontrado

O Mini-Planetário e a Biblioteca Escolar

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O Mini-Planetário e a Biblioteca Escolar"

Copied!
181
0
0

Texto

(1)

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

O MINI-PLANETÁRIO E A BIBLIOTECA ESCOLAR

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM LITERATURA PORTUGUESA:

ESPECIALIZAÇÃO EM LITERATURA INFANTO-JUVENIL

Anabela Maria Neves Martins

(2)

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

O MINI-PLANETÁRIO E A BIBLIOTECA ESCOLAR

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM LITERATURA PORTUGUESA:

ESPECIALIZAÇÃO EM LITERATURA INFANTO-JUVENIL

Anabela Maria Neves Martins

Orientador: Professor Doutor José Barbosa Machado

(3)

“Há três coisas que nunca voltam atrás: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida.”

(4)

Índice

Introdução... 9

1. Literatura Infantil... 13

1.1 A Literatura Oral como berço da Literatura Infantil ... 14

1.2 Do aparecimento da Literatura Infantil aos nossos dias... 16

1.3 Os impulsionadores da Literatura Infantil em Portugal ... 28

2. Motivar a Leitura... 41

2.1 Os leitores e a escola ... 41

2.2 Arte do Conto ... 44

2.3 O professor como mediador da aprendizagem ... 45

2.4 A família na promoção da leitura ... 48

2.5 Requisitos da competência da leitura ... 49

2.6 Definição, objectivos e importância do acto de Ler ... 50

2.7 Objectivos da leitura e sua competência ... 53

3. Conceito de Biblioteca ... 58

3.1 Importância das bibliotecas ... 59

3.2 Tipos de bibliotecas e sua evolução ... 61

3.3 A rede de bibliotecas escolares... 70

3.4 O contributo da biblioteca escolar para o sucesso educativo dos alunos ... 72

3.5 Gestão dos recursos humanos... 73

3.6 Gestão e localização do espaço ... 75

3.7 Formas de utilização... 77

4. Breve história da Astronomia... 79

4.1 Astronomia, a mais velha das ciências ... 79

4.2 A Astronomia primitiva – a idade da magia... 79

4.3 A Astronomia na antiguidade – a idade da mitologia ... 81

4.4 Para além do sistema solar ... 89

4.5 A astronomia das estrelas ... 90

4.6 Origem das estrelas... 93

5. O Mini-Planetário – Aprender a olhar o céu ... 94

5.1 Âmbito e objectivos do trabalho (visita de estudo à biblioteca escolar) ... 94

(5)

5.3 Normas e regras de comportamento na visita de estudo ... 95

5.4 A biblioteca escolar que acolherá os visitantes ... 96

5.5 A utilidade da visita de estudo... 97

5.6 Conteúdos programáticos relacionados com a visita... 98

5.7 Concepção do vídeo motivador a apresentar na biblioteca ... 102

5.8 História do filme... 105

5.9 Adaptação da história “Noites Turbulentas”... 108

5.10 Análise simbólica − Noites Turbulentas ... 111

5.11 Construção de um Mini-Planetário... 113

5.12 Requisitos para a execução e utilização do Mini-Planetário ... 114

5.13 A esfera celeste... 116 5.14 Desenvolvimento do Projecto... 117 5.14.1 Mini-Planetário... 126 5.14.2 Considerações Gerais ... 127 5.14.3 Instalação... 127 5.14.4 Características... 127 5.14.5 Funcionamento ... 128

6. Viagem à biblioteca do Caneiro ... 130

6.1 Apresentação do filme Noites Turbulentas ... 130

6.2 Trabalho experimental - Mini-Planetário ... 131

6.3 Bibliografia referente ao tema na biblioteca ... 132

6.4 Breve reflexão/avaliação sobre a actividade desenvolvida na biblioteca da escola... 134

6.5 Principais deficiências da biblioteca ... 136

Conclusão ... 141

Bibliografia... 146

(6)

Agradecimentos

Chegado o final do trabalho, não poderia deixar de exprimir o meu agradecimento a todos aqueles que contribuíram, de um modo ou de outro, para a sua execução.

Ao Professor Doutor José Barbosa Machado, pela paciência que teve nas leituras que lhe foram entregues, nas conversas que tivemos, na motivação que está subjacente ao trabalho, pela disponibilidade com que me recebeu, pela confiança que sempre me transmitiu, pelo trato afável com que continuamente me presenteou e com à-vontade que me fez sentir; um orientador amigo e sempre presente.

Às minhas irmãs Alexandra e Patrícia, pelo apoio incondicional que me dispensaram; à Teresa, por me ter apoiado constantemente e convencendo-me de que aprender mais não é um risco, mas sim um investimento. Agradeço-lhe por todas as ideias que me concedeu e que foram preciosas na conclusão deste trabalho. À Carla devo muito, por estar presente em todos os momentos; obrigada pela disponibilidade, pelo apoio e carinho sem limitações.

Deixo aqui o agradecimento às minhas colegas e amigas Alexandrina, Ana Lídia e Manuela Tender, pelos bons momentos que passámos nas deslocações de Chaves até Vila Real e vice-versa, e por me terem incentivado e dado confiança, ajudando a criar mais auto-estima. Há outros amigos que implicitamente estão no grupo dos bons, que realmente se preocuparam comigo e me estimularam a nunca desistir dos sonhos. Ao António Santos, à Ana Maria André, à Helena Ramos, à Lucinda Lameirão e à Sandra Fernandes, um obrigado especial; pela vossa amizade e por estarem sempre presentes, nos bons e maus momentos.

Aos meus filhos Miguel, Francisco e Ana por terem tido paciência comigo nos momentos de maior tensão e mau humor, por tantas vezes não ter sido a mãe mais presente. Ao meu marido deixo também o meu agradecimento, pela sua compreensão e paciência e na ajuda constante no sistema informático, onde ainda tenho tanto para aprender.

Aos meus pais, em especial à minha mãe, por me motivar na procura do saber, na confiança que em mim depositou e no seu bom senso e capacidade de dar a volta às situações mais complicadas com que se deparou ao longo da sua vida. Foi sempre um óptimo exemplo de coragem. Ao meu pai por, apesar do seu silêncio, demonstrar um forte apego e amor por todos nós.

(7)

Resumo

No nosso trabalho, começamos por reflectir acerca da herança, da recolha e adaptação de histórias da Literatura de Expressão Oral, como salvaguarda da memória colectiva de um povo. Foi nossa preocupação salientar aqueles que, através da palavra, transmitiram testemunhos, constituindo a base da actual Literatura Infanto-Juvenil.

Intencionalmente, fizemos uma abordagem ao aparecimento e evolução da Literatura Infanto-Juvenil a nível internacional e em Portugal

Pretendemos que todos os agentes educativos tomem consciência de que a capacidade da leitura condiciona fortemente a participação na sociedade, pois é uma ferramenta insubstituível, permitindo aos sujeitos leitores aceder a um conjunto de experiências, conhecimentos e a uma nova visão do mundo.

Damos a conhecer propostas em que a escola e a biblioteca escolar/centro de recursos educativos podem promover entre si uma escola de sucesso, não só convencionalmente, mas através da apresentação de novos projectos e do espírito de entreajuda entre ambas, apelando à responsabilidade e à criatividade.

O recurso às Novas Tecnologias para a concepção do filme Noites Turbulentas e o recurso a outras tecnologias foram de grande importância na construção do Mini-Planetário. Levam-nos a pensar que já não basta saber ler, mas que o indivíduo tem de se socorrer do progresso tecnológico.

Apresentamos uma escola viva, onde a biblioteca escolar/centro de recursos educativos seja uma fonte inesgotável de informação, com um espaço próprio, que necessita de um acervo diversificado, actualizado, com recursos humanos adaptados às novas necessidades, com metodologias e avaliação correctas, com coerência em toda a planificação, promovendo o estudo da Astronomia, acompanhado do espírito de inovação.

(8)

Summary

In this Project we started to reflect about the heritage, gathering and adaptation of stories of the oral literature as a way of keeping the memory of a people. It was our concern to point out those that through the word passed on testimonies which are now part of the juvenile literature.

It was our intention to approach the appearing and evolution of the juvenile literature in an international level and in Portugal.

We intend that every educational agent has the conscience that the capacity of reading leads to a high participation in society as it is an irreplaceable tool which ables the readers to find a group of experiments, knowledges and also a new vision of the world.

We also present proposals in which the school and the library can promote and thus become a successful school, not only conventionally but also through the presentation of new projects and the helping between both, not forgetting the importance of a responsability and creativity. The using of new technologies to the conception of the film “Noites Turbulentas” and the use of other technologies were of great importance in the construction of the “miniplanetário”. This way it is not enough to know how to read but the individual has to use the technological progress.

We present a school full of life where the library is an endless source of information with a proper space which needs a great diversity and actualized information with human resources adaptated to the new needs, with uniformization in every planification, promoting the study of the astronomy side by side with a spirit of inovation.

(9)

Introdução

As razões que presidiram à elaboração do presente trabalho são de natureza diversa. Estão relacionadas com o âmbito da docência e mais especificamente da didáctica do ensino da Astronomia. Foi nossa intenção, ao abordar esta temática, trazer algum contributo, no seio da escola e da comunidade escolar, de actualização constante e de alteração de práticas pedagógicas.

A índole desta produção está relacionada com a experiência de acção no terreno, mostrando que ainda há muito a fazer para se colmatarem dificuldades nos hábitos de leitura, de investigação, de apresentação das matérias, em tudo o que concerne à prática diária, na sala de aula. Este projecto de investigação permitirá alargar horizontes e com ele colaborar com outros colegas, ajudando-os a co-responsabilizarem-se ainda mais, em relação ao trabalho do dia-a-dia, tanto a nível da planificação, como da motivação de que resulta o sucesso ou insucesso escolar.

A escolha do tema do nosso trabalho, O Mini-Planetário e a Biblioteca Escolar, serviu para o iniciar de uma série de estudos mais aprofundados, para produzir mais e melhor, retirando partido dos serviços que a escola possui e que estão ao alcance de toda a comunidade educativa. Entre eles, situa-se a biblioteca escolar/centro de recursos educativos, com a função de divulgação e manifestação na busca de saber, de melhores competências, de comunicação, de troca de ideias e de partilha de tempos mortos, do espaço, do material e, principalmente, na promoção de valores. Pretendemos que este local seja revelador e propiciador de estudo e de apresentação de novas metodologias, com recurso a materiais diversificados.

Tal como a escola, a família tem um papel primordial na educação e na motivação para a leitura; é fulcral esta determinação e o seu desempenho facilita o papel da escola.

A escola tem como missão promover, entre outros ensinamentos, a leitura, utilizando como recurso as visitas à biblioteca escolar. Neste espaço, alunos e professores deverão ser protagonistas da sua própria aprendizagem, desenvolverão o espírito crítico, a criatividade, reconhecendo a importância das diferentes fontes de informação, das Novas Tecnologias, aprendendo a laborar e a seleccionar as mesmas.

Atribuímos valor especial à Literatura de Expressão Oral, por ser aquela que traduz e relata com maior intensidade a originalidade de um povo, sendo transmissora do imaginário

(10)

colectivo, e testemunho importante de algumas convicções colectivas quanto à maneira de educar as crianças.

A invenção de Gutenberg proporcionou novas apostas e os livros passaram de poucos exemplares a grandes tiragens. As leituras em grupo, sobretudo a Bíblia, como um dos maiores empreendimentos culturais da história da Humanidade, efectuada pela burguesia, era restrita a pequenos grupos. Para a grande maioria das populações, continuava a ser a cultura oral a fonte de conhecimento e do enriquecimento do imaginário. De realçar que, embora “a obra literária oral e a escrita tenham estruturas e suportes diferentes, é frequente que um mesmo tema dê origem simultaneamente a uma obra literária oral ou escrita” (Pires 1994: 49). Ambas adoptam características que são específicas da outra.

Ao estimularmos a leitura, teremos professores, pais, encarregados de educação e alunos, como coadjuvantes do ensino/aprendizagem, socorrendo-nos da magia de toda a Literatura Infanto-Juvenil. O contributo de pedagogos, filósofos e autores como Lock, Dewey, Verney, Rousseau, Pestalozzi e de tantos outros permitiriam encarar a criança de maneira diferente.

A Revolução Industrial, no século XIX, vem fazer com que a Literatura Infantil seja mais abrangente, como toda a Literatura. O Romantismo, redescobre o gosto pelo popular, pelo antigo, pelo tradicional. Altera-se a forma da transmissão dos contos que andavam de boca em boca.

Um dos maiores êxitos da Literatura Infantil é o de cultivar a fantasia, a invenção, a evasão para o desconhecido e de motivar na infância o desejo de auto-afirmação. A Literatura Infanto-Juvenil proporcionará o desenvolvimento e formação das crianças e jovens, colaborando na transformação em adultos cheios de conquistas, tanto a nível intelectual, como afectivo. Proporciona e favorece o sentido crítico, abrindo novos mundos e desenvolvendo a memória. O conto pressupõe a narração que precisará de ser colorida, emocionante, que surpreenda e que tenha um carácter lúdico. “ Seja como for, e porque o leitor infantil é, desde há muito, um leitor a cativar, a função lúdica do objecto livro é fundamental” (Diogo 1994: 42).

O projecto da visita de estudo à biblioteca escolar do Caneiro, com a finalidade de aí se proporcionarem experiências novas e a obtenção de sucesso na sua consecução determinam que, num certo momento do percurso educativo, haja sucesso e prazer, encontrando na escola um local de estímulo, de trabalho e de afectos, contribuindo para tal muitas e sãs aprendizagens. Uma parte importante da nossa pesquisa e das nossas orientações apoiam-se em contributos, já antigos, em que se crê que o sujeito, para aprender, necessita de

(11)

conhecimentos funcionais, práticos, e que é importante revelar-lhe que ele não está sozinho neste processo de ensino/aprendizagem, mas que interage permanentemente com os meios que o rodeiam. “O meio escolar é um deles, com o seu espaço, com o seu tempo, o seu ritmo, os seus ritos, a sua população. Para a criança que está na escola este meio é essencial: estruturado e estruturante, deveria ser um ponto de apoio, um local de integração, de experimentação, de realização, de confronto, de conflito, de sucesso, de preparação para a vida social… Em suma, um lugar de construção dos poderes sociais” (Jolibert 1998: 25).

O ambiente escolar permite o desenvolvimento do espírito de solidariedade e de cooperação, necessários à consecução/concretização de projectos que ajudam e têm por finalidade a obtenção de mais prazer, responsabilidade, e valorizarem mais e melhor o tempo e o espaço escolares, e o próprio educador. Conjuntamente, pretendemos aprender mais, decidindo em parceria a melhor forma de atingir os nossos objectivos ao organizarmos a saída de visita de estudo à biblioteca, atrás referida.

O projecto de construção, tanto do filme motivador Noites Turbulentas, como do

Mini-Planetário, foi pensado para apresentar o ensino com uma componente mais lúdica e

experimental da aprendizagem, mas não menos exigente, mais cooperativa e menos centrada no manual escolar, mais organizada, porque passou a haver um conjunto de apostas e de regras a cumprir na saída do espaço escolar, no estabelecimento de normas e regras de vida e de funcionamento, que se pretende sejam o espelho para além do espaço escolar e da vida presente.

Intentaremos ensinar conteúdos próprios desta faixa etária e deste nível de ensino (dos oito anos e do terceiro ano de escolaridade), partindo do princípio de que os mesmos são do inteiro agrado dos alunos e que fazem deste período uma fuga ao habitual, ao palpável, ao concreto, fazendo-os viajar através do espaço, mexendo com a sua fantasia interior e curiosidade da noite e do Universo. Pretender-se-á, fora do contexto da sala de aula, apreciar os seus comentários, valorizando-os, estimando as suas alegrias, os seus conflitos e permitir a realização de experiências mais complexas.

Neste local, serão facultadas aos alunos as regras atrás referidas, explicitando as aprendizagens que serão realizadas e posteriormente avaliadas.

Com o projecto de ensino dos primeiros passos em Astronomia, será nossa intenção mostrar que é matéria de interesse e de expectativa nesta fase etária. É de realçar o papel da leitura relacionada com as matérias em estudo e a observação atenta, pois todas as crianças sabiam ao que iam e aquilo com que contavam, tendo uma percepção global do que nos move, das iniciativas, da organização, da exigência de se levar a actividade até ao fim, de

(12)

colaborarmos na promoção da autonomia, na avaliação, e promovendo a confiança em si mesmas.

Olhar o Universo é talvez um dos actos mais antigos da humanidade.

Podemos dizer que a Cosmologia preenche o imaginário de muitas crianças e jovens, ajudando a pintar a noite e o dia como se de uma arte se tratasse. Se for Verão, teremos noites e céu estrelados e brilhantes, com pores-do-sol multicolores. Se for Inverno, as noites serão negras e cinzentas e os dias transformam-se, sendo mais pequenos, taciturnos e doentios. Cada um de nós, seja artista, filósofo, religioso ou cientista, constrói o Universo à sua maneira.

A história da Astronomia, e em especial da Cosmologia, leva-nos a acreditar que em determinadas épocas a verdade científica do Universo tinha sido descoberta. Cada qual, desde Ptolomeu, Copérnico, Kepler, Servetus, Thomas Digges, Galileu, Fraunhofer, pintou/descreveu a sua verdade como certa.

Como ciência mais antiga da humanidade, a Cosmologia é detentora de um dos maiores empreendimentos intelectuais, tendo o homem tentado explicar o mundo que lhe era dado observar e perceber. Em Noites turbulentas, poderemos ver que, a partir de qualquer janela, se o céu estiver limpo, é possível admirar e retirar aprendizagens do espaço, tal como as diferentes leituras; os livros são como janelas abertas para o Universo. Através destas janelas, podem ser observados objectos de inúmeros tamanhos e estruturas, que estão às mais variedades distâncias da Terra.

A estratégia do nosso trabalho está assim lançada: reconhecer a Literatura Oral como um bem imaterial e colectivo da Humanidade; fazer de todos os cidadãos leitores aplicados e regulares, sendo seus promotores a família, como berço de todos os valores que estão subjacentes ao saudável crescimento; a escola como incrementadora de desafios constantes; o local da biblioteca escolar como um refúgio de conforto, de investigação e um lugar aprazível que estimula a aprender mais e melhor.

O desafio de incrementar novos projectos, como o estudo da Astronomia e Cosmologia dentro do espaço escolar, faz da infância um estádio único preenchido pela curiosidade, pela busca do prazer imediato através de leituras e do fascínio do inatingível.

(13)

1. Literatura Infantil

A Literatura Infantil é uma ponte entre adultos e crianças, pois promove a relação entre os diferentes pares. Como tal, não merecendo nem mais nem menos mérito, está integrada no grande conceito de Literatura, como uma realização comunicativa complexa, em que a descodificação e codificação dos textos se realiza de uma forma artística, associando a arte à gramática, à criação artística expressa por palavras, isto é, sentir prazer sobre o que alguém escreveu. Diz Novaes Coelho que “a literatura infantil é, antes de tudo, literatura; ou melhor, é arte: fenómeno de criatividade que representa o mundo, o homem, a vida, através da palavra. Funde os sonhos e a vida prática, o imaginário e o real, os ideais e sua possível/impossível realização” (2009: 27). Ela expressa-se numa linguagem específica, que, como toda a linguagem, expressa uma experiência humana, que não poderá ser definida com exactidão.

Não poderemos dissociar a Literatura Infantil da Literatura Infanto-Juvenil, pois a fronteira entre ambas é ténue. A Literatura Infanto-Juvenil faz parte de um conjunto de ensinamentos e experiências que se vão adquirindo num período de vida, com base na existência, na aquisição das brincadeiras do dia-a-dia, nas histórias contadas pelos pais à cabeceira da cama ou mesmo pelos avós com efeitos de transmissão de alguma moralidade e que fazem dela uma arte maior. São verdades de valores adquiridos, do não esquecimento de um nobre passado. É a um determinado tipo de leitores/ouvintes que se dedica esta literatura, processo cada vez mais contínuo, de promissores entusiastas, cuja inexperiência beneficiará com a reiteração das mensagens literárias que lhes são dirigidas. Com o decorrer dos anos, esta literatura foi deixando de ser uma literatura de furto ou roubo, “literatura roubada”, “ literatura adquirida” (Diogo 1994: 9), tendo como exemplo os Robinson, Os Gullliver, D.

Quixote, e passou a ser uma literatura mais acessível, com mais escolhas e visivelmente mais

bela, partindo do pressuposto de que, se houvesse na época uma produção literária como há hoje, as crianças não necessitariam de a furtar. Sempre houve livros destinados às crianças, cabendo-lhes a escolha entre o que era a sua literatura e aquela que era produzida para si. Compete à criança saber escolher aquela literatura que preenche o seu imaginário e não aquela que outros intencionalmente escreveram a pensar neste grupo etário, mas que a elas nunca interessou. Hoje já há quem considere a Literatura Infanto-Juvenil como conhecimento independente dos aspectos psicopedagógicos, proporcionando à criança uma literatura que lhe convém, uma literatura que esta aceita, que lhe proporciona prazer, e não aquela que lhe está destinada.

(14)

Ao determinar-se a essência da infância, reconhecendo que ela se desenvolve harmoniosamente, as crianças não existem simplesmente, mas passam a existir, com autonomia cognitiva, mostrando-nos a sua capacidade de selecção, o que lhes dá mais prazer e manifesta saber escolher, muitas vezes com a ajuda de um adulto. A criança passa a ter maior responsabilização na sua educação, tem a função de escolher o que deseja ler entre uma Literatura que, à partida, não foi escrita nem pensada para este estádio da infância “literatura gañada” (Diogo 1994: 68), porque não foi escrita a pensar nela, mas passa a pertencer às suas preferências. Coloca-se então a questão: Quais são os livros mais adequados para as crianças? Têm de ser literários e atrair o público infantil; a convivência entre os livros e as crianças não leva ao acto da leitura. É preciso mediar. É nesta situação, entre o acto de ler e o de ouvir, na mensagem (comunicação) entre o autor-adulto, aquele que possui experiência do real e da criança que se transforma o fenómeno literário num acto de aprendizagem.

1.1 A Literatura Oral como berço da Literatura Infantil

A Literatura Oral foi um dos elementos impulsionadores da Literatura Infantil. Os irmãos Grimm contaram e reproduziram contos e histórias que oralmente foram passando de geração em geração, ou seja, uma cultura oral que se insere num conceito mais amplo que se denomina património imaterial; representa a fonte vital de uma identidade profundamente enraizada na história e compreende o conjunto de formas da cultura tradicional e popular ou folclórica, quer dizer, as obras colectivas que emanam de uma cultura e se baseiam na tradição.

A Literatura de Expressão Oral, por vezes confundida com a Literatura Popular, Literatura Tradicional, ou simplesmente Literatura Oral, por estar conotada com a palavra

povo, com tradicionalismo, ou por excluir as composições orais que foram fixadas pela

escrita, é hoje uma designação usada “ para mencionar os contos, lendas, fábulas, anedotas, provérbios, adivinhas, canções e outras rimas que, de autor desconhecido, têm circulado oralmente ao longo dos tempos entre camadas não hegemónicas da população” (Diniz 1993: 47).

Estas práticas transmitem-se oralmente, ou mediante gestos, e modificam-se com o decorrer do tempo através de um processo de recreação e recriação colectiva. Incluem-se nestas tradições a medicina tradicional e a farmacêutica, as artes culinárias, as bruxarias e todas as habilidades especiais relacionadas com os aspectos materiais da cultura, tais como as ferramentas e o habitat.

(15)

A índole efémera do património Oral intangível torna-o vulnerável. A sua salvaguarda deve partir da iniciativa individual e receber o apoio das associações, especialistas e instituições. A salvaguarda deste património deve partir da iniciativa individual e receber o apoio das associações, especialistas e instituições. Cabe a todos nós salvá-lo e preservá-lo, para que a nossa identidade colectiva ainda se mantenha firme.

A Literatura de Expressão Oral é uma forma de expressão integrada num campo mais vasto de estudo por parte de um conjunto de indivíduos. Integra o indivíduo num determinado grupo a quem confere marcas de identidade. Em determinadas comunidades, onde a escrita não é um veículo normal de expressão, é esta forma de Literatura que ganha dimensão, que reflecte a história dos povos, a sua cultura, os seus valores mágico-religiosos, a sua maneira de viver a vida, enquanto na literatura escrita o emissor é o escritor, indivíduo historicamente situado num tempo preciso e num espaço. Compete à comunidade, na Literatura de Expressão Oral, a responsabilidade da produção de macrotextos, actualizando-os a nível discursivo, segundo as necessidades do momento. Apesar de esta literatura não ser antes fixada num suporte material, tem resistido ao longo dos tempos e permanecido no espírito de todos aqueles que se preocupam com a sua preservação. São estas comunidades que a veiculam e a perpetuam. A sua longevidade deve-se ao facto de a mesma retratar problemas do mundo, do homem de hoje e de sempre: a luta pela autonomia, a rivalidade parental, a rivalidade fraterna, a construção de uma identidade adulta, a solidão do homem na terra, a realidade trágica e cruel das relações humanas e também as brincadeiras de infância.

“ Adolfo Coelho, já em 1879 ao questionar-se sobre a existência de versões semelhantes de um mesmo conto, em diferentes partes do globo, numa época em que as comunicações eram lentas e difíceis, atribui o fenómeno a uma unidade estética elementar tão completa, pelo menos, enquanto a receptividade, que nada, a priori, nos impede de julgarmos essas raças diversas dotadas de igual grau de produtividade artística elementar, sujeito nas suas manifestações a leis idênticas” (Idem, 47- 48). Portanto, poderemos afirmar que cada indivíduo é portador de uma identidade, de uma herança, comum a toda a humanidade, aquilo a que Jung chamou de inconsciente colectivo.

Mircea Elíade recorda que “o conto não é uma criação imediata e espontânea do inconsciente (como o sonhar, por exemplo): ele é, em primeiro lugar, uma forma literária, tal como o romance e o drama” (Ibidem, 48).

A Idade Média foi fértil no conto e reconto de histórias que andavam de boca em boca (lendas e mitos). Em algumas sociedades de cultura oral (onde os indivíduos são iletrados ou que, sendo letrados, não têm o hábito de ler) compete ao griot (nalgumas sociedades

(16)

africanas, o griot continua a manter o estatuto que o contador de histórias deteve na Europa até ao fim deste século) a sua transmissão e actualização.

Com o avanço das tecnologias, a função de contador de histórias, de intérprete de um sentir de um grupo tende a desaparecer, perdendo a literatura de expressão oral alguma vitalidade, não esquecendo que grandes obras como a Bíblia, a Odisseia, a Ilíada, o Livro dos

Mortos, o Gilgamesh, são recolhas culturais que se mantiveram durante séculos na sua forma

oral.

Até ao século XIX, os livros foram feitos à mão, eram muito caros, difíceis de encontrar e pertenciam aos mosteiros onde os iluministas desenhavam gravuras, com cores de produtos naturais, sendo o vermelho sangue de animais. No scriptotium dos conventos faziam-se mais ou menos três bíblias por ano, com vinte copistas em trabalho diário. A proporção de edições foi evoluindo com o decorrer dos anos, pois passaram a ser impressos e mais tarde facturados por máquinas industriais.

As obras de Literatura de Expressão Oral produzidas são adaptadas em países de expressões diferentes, nascendo obras diferentes, pois o reconto de boca em boca obrigou a adaptações novas a mentalidades e meios culturais opostos. É nestas sociedades que, através dos contos, das anedotas, das fábulas, das lendas, dos mitos, das rimas infantis, quadras e provérbios, se transmitem os valores da natureza, da família e da sabedoria, os costumes e as regras de vida de determinada comunidade. “ O culto dos livros resulta da tradição oral” (Pennac 1993: 72).

1.2 Do aparecimento da Literatura Infantil aos nossos dias

Qualquer obra bem escrita, destine-se ela a quem se destinar, é uma obra de arte. (Villasante 1977: 11)

O que há muitos anos era considerado um género menor, às vezes até motivo de depreciação, considera-se hoje uma obra de arte, de entretenimento, de saber e fonte de conhecimento.

Raramente e muito recentemente se começou a estudar e a analisar, nas escolas, este tipo de textos. A Literatura Infantil é filha da oralidade e da tradição e a sua origem está inserida na literatura adulta, nas sagas, lendas, fábulas e mitos e o público que os tinha lido com curiosidade exigia a continuação desta tarefa tão pouco comum, e, tal como Rousseau proclamou, a criança tem natureza e vida próprias. Repartimos a sua evolução, no presente capítulo, por cinco grandes países, que foram os notáveis impulsionadores desta Literatura

(17)

maior e de alguns autores, talvez os nomes mais sonantes, que ficaram para a história universal, com obras que ainda hoje são lidas e apreciadas por diversificados públicos.

− Na Alemanha pode encontrar-se uma rica fonte da literatura infantil no folclore e nos relatos tradicionais, em livros para adultos apreciados pelas crianças, fazendo-se posteriormente versões infantis populares, nos primeiros livros escolares, sendo a Bíblia um dos livros com numerosas edições e que foi e é lido por todas as idades, com diferentes finalidades. Os conselhos e lições da História Sagrada foram a base da literatura posterior. O investigador Karl Hobrecker escreveu Antigos Livros Infantis Esquecidos, de leitura simples e amena que é a base da literatura alemã infantil, tal como Irene Dyrenffuhrt-Graebsch e Arthur Rumann que escreve já com muitas ilustrações, inspirando-se em Hobrecker. De inspiração nas terríveis lendas germânicas, nas aventuras de cavaleiros e em obras moralistas lidas em diferentes escolas eram fonte de alimento de alunos em idade escolar, sendo a Bíblia uma das fontes de motivação.

Em 1478, inspirado em pequenos tratados religioso-morais inspirados na Bíblia e que eram a fonte do conhecimento escolar do aluno, surge o primeiro livro deste estilo, que se intitula Consolação da Alma (Der Seele Trost), e que se dirige a um menino cristão (Liebes

Kind) e o autor, um monge, será uma referência na formação das crianças com uma selecção

das melhores histórias dos livros sagrados.

Com a Reforma Protestante, os Catecismos, Bíblias e Cancioneiros são a base da mesma, convertendo-se no livro básico da família e, por vezes, único.

As Fábulas de Esopo lêem-se na Alemanha como noutros países, pois as suas traduções estão na moda na Europa, atingindo edições muitíssimo numerosas.

Em 1658, Amos Comenius, exilado de Praga, publica o livro Orbis Sensualium Pictus, que vem revolucionar a pedagogia e influenciar a literatura infantil. Publica-o na Alemanha, pois era o berço da imprensa, o local das melhores produções em madeira e fazem-se várias edições. Quase todos os livros científicos e técnicos de imagens se inspiraram no Orbis pictus.

Se na Alemanha o livro de Amos Comenius foi muito divulgado, não poderemos esquecer que em princípios do século XVIII as traduções de livros e de autores como Locke em A Educação dos Jovens, o livro de Fénelon, Telémaco e a Educação dos Jovens, e o

Emílio, de Rousseau (1762) ficaram para a história como belas obras de estimado valor.

Em 1774, Johan Bernhard Basedow inaugura a sua escola em Dessau, a que chama

Philantropin. Em 1770 publicou a sua Obra Elementar dedicada à juventude, belamente

ilustrada e que foi uma verdadeira enciclopédia infantil, abordando variadíssimos temas, havendo já autores que realizam trabalhos dirigidos às crianças das aldeias, livros simples, tal

(18)

como Eberhard Von Rochow. A obra de todos estes pedagogos, interessados na literatura infantil como meio de formação cultural, moral e de entretenimento, origina o crescimento e aperfeiçoamento dos livros de texto, como o nascimento de jornais para crianças e uma série de livros de contos e novelas morais e instrutivas seguindo sempre as directrizes do Iluminismo. Joachim Campe, pedagogo e escritor, empreendeu a criação de uma Biblioteca Infantil a Kinderbibliothek diferenciando as diferentes fases da criança, representando um grande avanço no conhecimento da criança, incluindo também a formação artística onde incluía poesias e canções. O modelo de inspiração para Robinson der Jungere era Robinson, de Defoe, escritor inglês, que apareceu em Inglaterra em 1719 e foi traduzido para alemão em 1721. Rousseau proibia a Emílio todos os livros com excepção de Robinson que o julgava adequado às crianças.

Baseado nos contos populares e na época do Romantismo, os irmãos Grimm, Jacob Ludwig (1785-1863) e Wilhelm (1787-1859), tornam-se famosos graças à recolha de contos. Deram ao país uma das melhores colecções de contos populares infantis, percorridos por traços dos mitos germânicos e muita elaboração poética. São contos que os dois irmãos foram compilando e alterando, tendo em conta as crianças. Conhecem Arnim que motivou a que os irmãos publicassem os seus contos, ajudando-os na edição. Quando publicam Kinder und

Hausmarchen (Contos de crianças e do lar), Wilhem, o poeta, dedica o primeiro exemplar a

Bettina Brentano, esposa de Arnim, que tinha sido mãe. Ludwig Grimm, outro irmão, pintara o retrato de uma mulher velha, a qual tinha contado mais de metade dos contos dos Grimm. Wilhelm diz que os contos encerram tudo o que há no mundo: príncipes, princesas, reis, servos, pescadores, pastores, figuras muito próximas da natureza. Entre outros contos publicaram Branca de Neve, repleto de beleza poética e cor, Rapunzel, em alemão e que em português se deveria chamar Campânula, embora se traduza em português de Maria

Rabanete, retrata a beleza feminina de enorme formosura. Em Hansel e Gretel e no Pequeno Polegar há florestas sombrias, bosques escuros, mães que abandonam os filhos, onde impera

a poesia. Permanecerão já como personagens na memória das crianças, como contos de fadas, e o maravilhoso pauta este universo de fantasia, de magia e criatividade próprio da força do Romantismo. Os contos de Grimm adquirem enorme protagonismo na Europa, o mesmo acontecendo aos de Perrault e aos de Andersen. No século XVIII aparecem umas folhas impressas, chamadas de Bilderbogen (folhas com imagens ou estampas) que são uma variante das estampas populares que descreviam festas, mercados, cenas bíblicas, jogos de crianças, animais, etc. A Literatura Infantil desenvolve-se, provando-o as inúmeras edições que se

(19)

fazem de todo o tipo de livros. No século XIX o romance de aventuras tem a predilecção de grande parte do sector juvenil.

Karl May foi um dos escritores alemães que retratou a sua vida tumultuosa e escreveu, entre outros, O Último Moicano, uma novela de índios, preocupando-se cientificamente com a escrita e narração dos factos, podendo considerar-se o equivalente a Salgari na Itália, Júlio Verne na França e F. Cooper na América do Norte.

No início do século XX, Heinrich Wolgast publica um livro intitulado A Miséria da

nossa Literatura Juvenil, em que o autor exige educação estética da juventude e mostra a

necessidade da poesia. Deste movimento estético há a salientar Waldemar Bonsels, que escreve o livro Maya. Com Erich Kastne, a novela de aventuras toma um aspecto muito moderno e detectivesco, escrevendo Emílio e os seus amigos. A Erich Kastne foi-lhe atribuída a medalha Andersen. De destacar que, em 1946, funda-se a Biblioteca Internacional da Juventude, em Munique, em 1951, Jella Lepman funda a Organização Internacional do livro Juvenil, em Zurique e em 1956 institui-se o prémio Anual da Literatura Juvenil.

− Hans Christian Andersen, nascido na Dinamarca, no século XIX, será o grande continuador dos Grimm, salvaguardando alguns valores como o da generosidade e fraternidade humanas. “Não faz mais do que revalorizar o folclore dinamarquês, tal como os Grimm fizeram na Alemanha” (Villasante 1977: 56). Muitas das suas histórias são realistas: situam-se no mundo real, do quotidiano, com personagens simplesmente humanas, em luta com as adversidades da vida e, em geral, vencidos por elas, mas vitoriosos na conquista do céu, como: A Menina dos Fósforos; Nicolau Grande, Nicolau Pequeno; O menino Mau; A

casa Velha. Em O conto da minha vida Andersen disse que “A minha vida é um conto

maravilhoso” (Idem, 54). Em o Soldadinho de Chumbo; Boneco de Neve; A Agulha de Cerzir;

Os namorados; O Pinheirinho, aborda, com objectos ou cenas da natureza, problemas reais

dos homens. Após a morte do pai e brincando com o teatrinho que este lhe legou, vai redescobrindo aos poucos os autores que o pai lhe lia e descobre o teatro de Shakespeare, por quem sente grande estima. Recriou muitos dos contos que escreveu e as suas histórias retratam o dia-a-dia com realidade, prevalecendo a ternura nos relatos, denuncia a falta de fraternidade, relata o sofrimento dos pobres e dos humildes sempre com sarcasmo. Frederico VI concede-lhe uma pensão anual para que ele se dedique inteiramente à literatura. Escreveu

A princesa da ervilheira, O velho farol, A casa velha de Andersen, O abeto, O patinho feio, a bala e o pião, A flor da felicidade e Os cisnes selvagens fazendo sobressair nos seus contos a

beleza da natureza, a formosura das planícies e dos bosques. Como grande contador de histórias e solidário com as crianças infelizes, por ter sido vítima da sociedade, foi o autor

(20)

escolhido para patrono do 2 de Abril, Dia Internacional do Livro Infantil. Todavia, a literatura dinamarquesa não se esgota com Andersen, existindo outros autores notáveis como Karin Michaelis autora da série de novelas de Bibi, muito ao gosto dos jovens, ou Estrid Ott (1900) com as suas novelas para adolescentes.

− Em França, e à semelhança do resto da Europa, as primeiras leituras para crianças, sem fins pedagógicos, foram cartilhas e catões para principiantes da leitura, livros religiosos e formativos e livros de cavalaria. Uma literatura de cordel, constituída por lendas piedosas e obras profanas, era lida por pais e jovens. Os contos de velhas e as tradições folclóricas constituíam, à falta de livros, uma herança rica que era ouvida por crianças e adultos. A partir destes relatos, Charles Perrault (1628-1703) publica o livro Contos da Mãe Ganso, com onze contos, que será impresso milhares de vezes, transformando-o num clássico da literatura infantil. “Entre os valores ético-sociais aí realçados temos o servilismo atribuído aos afazeres domésticos, a exaltação da beleza, da submissão, bondade, cortesia, paciência, gentileza… como qualidades fundamentais da mulher; o prémio da recompensa futura” (Coelho 2009: 100). Deu forma literária a narrativas que andavam de boca em boca, ou que circulavam como literatura de cordel. La Fontaine transformará em francesas as fábulas de Esopo e de Fedro, dando-as a conhecer a toda a Europa. A Moça e o Pote de Leite é uma das mais famosas fábulas da Antiguidade. Recolheu-a no folclore francês, no século XVII. Nos seus contos predominam o maravilhoso onde há encantamentos e bruxedos, fadas boas e más, e ogres sanguinários. Deixou como legado “Grisélia, Os três desejos, a princesa Pele de Burro, A

bela adormecida, As fadas, A gata borralheira, O Capuchinho Vermelho, Barba Azul, O gato das botas, O pequeno polegar, e Henrique da poupa” (Villasante 1997: 65).

Jean de La Fontaine (1621-1695), estudante de direito, é o exemplo de um literato dedicado à sua arte. Começa a escrever fábulas elogiando Esopo e Febro e servindo-se destes como exemplo, que aos poucos foi esquecendo, escrevendo narrativas cheias de diálogos dramáticos, colocando de parte, por vezes, a simplicidade pueril, encobrindo estas puerilidades muitas verdades. O essencial era instruir, divertindo. Entende que é através das fábulas que as crianças distinguirão o bem do mal, chegando à conclusão de que os animais são os mestres dos homens. Como diz Armindo Mesquita, “ actualmente, o papel da fábula ainda continua a ser muito importante na literatura para crianças, apesar dos novos desafios, dos novos suportes e das novas tecnologias, porque a presença dos animais permanece bem viva no imaginário infantil, tal como nas tradições orais, nos mitos e nas lendas” (2001: 68). La Fontaine traduziu em verso fábulas de Esopo e Fedro, como A Cigarra e a Formiga, O

(21)

crianças do mundo. “O ensino moral, que é o fim, e a ficção, que é o meio, devem entrar numa justa proporção. Aliás, o grande fabulista francês La Fontaine diz que o corpo é a fábula, a alma a moralidade” (Idem, 69). A fábula comporta em si corpo e alma, narrativa e moralidade. A verdade a ser falada aos homens através de animais irracionais, que desempenham o papel de personagens, animais e ou seres inanimados, transfiguram-se em seres humanos (não o sendo), que sofrem, vivem, amam (moralidade), enquanto a narrativa trabalha o corpo dinâmico e figurativo da acção.

A obra de Madame Le Prince de Beaumont tem interesse, pois nela se vêem as correntes do século de Luís, o Grande, e anunciam-se as correntes do século XVIII, onde a moralidade

cede lugar à razão. O livro Le Magasin des Enfants (O Armazém das Crianças) ainda hoje é recordado como tendo sido o livro preferido, por alguns, durante a infância. Adaptou o conto maravilhoso A Bela e o Monstro, com a finalidade de demonstrar que o amor pode transformar o feio em formoso.

Na literatura francesa, convém referir a figura de Jean-Jacques Rousseau. Rousseau nasceu em Genebra em 1712 (século XVIII) e foi educado pessoalmente pelo pai, depois de ter ficado órfão. Logo que o pequeno Jean-Jacques Rousseau iniciou a leitura, o pai colocou-lhe nas mãos todo o tipo de livros, desde romances a Plutarco. Rousseau relaciona a felicidade individual e a felicidade geral numa relação de conquista. “ Num homem que declara de si próprio: «Em qualquer pessoa imaginável, tudo o que eu não faço com prazer bem depressa se me torna impossível de fazer” (Abbagnano e Visalberghi: 497). Ele mudou a maneira de valorizar o Iluminismo; para ele o critério supremo não é a razão mas sim o sentimento. Escreveu Emílio, romance pedagógico, e é nele que baseia pela primeira vez a arte da educação na concepção científica da criança, com a finalidade de tornar mais concretos os critérios educativos aí sugeridos. “As finalidades educativas são não só internas a cada indivíduo, mas também próprias de cada idade: É preciso considerar o homem no homem, e a criança na criança” (Idem, 508).

Rousseau pretende que a educação das crianças seja baseada essencialmente na natureza, na relação educativa e natural entre o indivíduo e o ambiente natural.

” A maior, a mais importante, a mais útil, regra de toda a educação, afirma Rousseau, «não é ganhar tempo, é perdê-lo». Trata-se, obviamente, de não deixar a criança criar mofo no ócio, mas também de não embaraçar, perturbar, apressar, um processo natural de maturação e de actividades espontâneas que Rousseau quer seja respeitado com religiosa atenção. Em suma: o «método inactivo» é tornado possível somente pela existência de «um princípio activo» no íntimo da criança. E este desdobrar de forças é a educação natural.” (Ibidem, 502)

(22)

O mesmo autor abomina as lições teóricas. Todas as coisas devem ser aprendidas de modo activo, a linguagem através da conversação e da leitura, as ciências mediante experiências práticas e aparelhos simples construídos pelo próprio Emílio (personagem ficcional da obra). Parte do pressuposto de que as grandes paixões, quer no bem, quer no mal, encontram, na sua génese, uma única paixão fundamental, o “amor de si próprios” (Ibidem, 506). Para Rousseau, o homem é um animal social.

Em Emílio, Rousseau valoriza o papel das mães pelo contacto directo do dia-a-dia com os seus filhos “ É a ti que me dirijo, terna mãe e previdente mãe, que soubeste afastar-te do caminho principal e proteger a arvorezinha, acabada de nascer, do choque das opiniões humanas! Cultiva, rega a jovem plantinha, antes que ela morra; um dia os seus frutos farão as tuas delícias” (Rousseau 1990: 15-16).

Faz o apelo à educação através dos valores proclamados pela natureza, aprendendo a criança por si própria, oferecendo-lhe a liberdade necessária para que cometa erros e os saiba superar. “A grande preocupação é conservar o filho; isso não basta; é preciso ensinar-lhe a conservar-se, sendo homem, a suportar os golpe do destino, a enfrentar a opulência e a miséria, a viver – se for necessário (…) Viver não é respirar, é agir; é utilizarmos os nossos órgãos, os nossos sentidos, as nossas faculdades, todas as partes de nós mesmos, que nos dão o sentimento da nossa existência. O homem não é o que viveu mais de 100 anos, mas aquele que mais sentiu a vida” (Idem, 22).

É na natureza, segundo ele, que brotam os ensinamentos mais valiosos ao crescimento e à forma de adquirir os conhecimentos. Pede aos homens que saibam amar a infância, a idade das alegrias, para que nunca haja saudades desse período. Também foram muito influentes os livros do pedagogo e autor suíço Johann Heinrich Pestalozzi, (1746-1827), “para quem a vida é educação, e em que se acentua a feição pedagógica das obras destinadas aos mais jovens” (Pires 1981: 57).

Madame de Genlis, filha de uma família rica de Borgonha, teve uma educação dedicada à literatura e à música, tendo uma vida facilitada até que os seus pais se arruinaram e casa com tenra idade com Mr. Genlis, marquês de Sillery. Publicou, para além de livros para crianças, várias novelas e alguns estudos interessantes sobre literatura francesa; Armand Berquin que ataca a fantasia, seguindo as doutrinas de Rousseau, dedica os seus livros às crianças de ambos os sexos e Jean Pierre Claris de Florian autor de umas fábulas muito difundidas e adaptadas por outros autores.

(23)

O movimento romântico que floresceu na Alemanha e na Inglaterra e que fez com que atingisse as áreas da fantasia e da imaginação, favorece também em França o conto romântico, como referência às tendências excessivamente didácticas do Iluminismo. O escritor romântico sente-se atraído pelo reino das fadas, pelo maravilhoso, coexistindo em simultâneo com as fábulas animistas mais atrevidas, graciosas, convertendo-se em narrativas simbólicas servindo tanto adultos como crianças. Assim acontece com Cenas da Vida Privada

e pública dos Animais, editado por Hetzel, com a colaboração de Balsac, Nodier, Georges

Sand, Musset, Stael e outros, com ilustrações de Grandville. Grandville, de forma satírica, foi um modelo imitado imensas vezes, pois são inesquecíveis a forma como se vestiram animais com roupas de homens, macacos de smoking, leões e leoas elegantes e foram a delícia da pequenada e jovens.

A Condessa de Ségur, de nacionalidade russa e por ter casado com o francês Eugène de Ségur, adquirindo a nacionalidade francesa, escreveu sempre em francês, língua que já era familiar na Rússia à classe aristocrática, e teve muita influência na literatura infantil de carácter universal. Começou a escrever já com idade avançada os relatos que fazia às suas netas Camila e Madalena. Escreveu As Meninas Modelo e dando continuidade a este livro/série escreve As aventuras de Sofia, seguindo-se outras publicações como novelas. Retratam uma infância real e viva, activa e espirituosa com recordações autobiográficas da infância da autora que viveu a sua infância na Rússia. A História de Blondina, de Corçalinda

e de Gatobelo, consta da reunião de cinco narrativas: História de Blondina, de Corçalinda e de Gatobelo; O bondoso Menino Henrique; História da Princesa Rainha; A Ratinha Cinzenta e Ursino, obedecendo à estrutura básica dos contos de fada, opõem sempre as virtudes

neutralizadoras, que levam a situação em conflito a um final feliz.

Júlio Verne, pleno de imaginação e que aos trinta anos inicia a escrita, herdando a fantasia romântica e os conhecimentos científicos que vai projectar as suas novelas, nasceu em Nantes e tentou fugir muito jovem, sem o consentimento de seu pai, para as Índias, mas sem êxito, pois foi descoberto. Depois desta tentativa frustrada de fuga estuda para advogado e escreve obras teatrais subordinando os temas das suas obras à fantasia, ao sonho que lhe vai na alma; as viagens. Júlio Verne escreve Os Primeiros Navios da Marinha Mexicana, Uma

Viagem de Balão, Martin Paz, Um Inverno de Gelo, Cinco Semanas num Balão, Viagem ao Centro da Terra e o prestígio e a posição económica do novelista aumentam e compra um

barco ao qual dá o nome do seu filho Michel. É neste barco que nasce a famosa novela Vinte

Mil Léguas Submarinas. O interesse pelas viagens e pela investigação “previu o surgimento

(24)

o cinema novo, os canhões de longo alcance, a matéria plástica, os foguetes espaciais, ou o submarino nuclear, como no livro aqui em questão” (Coelho 2009: 128-129).

Em pleno século XIX (1873), caracterizado pela evolução da ciência, fazendo dela o

seu brinquedo, leva-o a escrever a novela A volta ao mundo em oitenta dias. Produziu muitas mais novelas, sendo incansável na escrita e na criatividade, no conhecimento e no cálculo, fazendo das suas personagens super-homens, fortes e robustos, ficando conhecido na história como escritor de aventuras. Escreveu, entre outras novelas, A Ilha Misteriosa em 1874, em 1876 Miguel Strogoff e em 1877 As Índias Negras.

O século XX é marcado pela escrita de Antoine de Saint-Exupéry (1900-1944) em O

Principezinho. René Guillot, que ganhou o Prémio Jeunesse em 1948 e o Prémio Andersen,

em 1944, é um dos autores mais lidos em França pelas crianças e pela juventude.

Brunhoff, um ilustrador, começou a desenhar elefantes e esta família é baptizada de

Babar, edições que foram traduzidas para diferentes línguas.

− A Literatura Infantil inglesa foi estudada e classificada antes de qualquer outra literatura e por tal teve um papel específico, na Cambridge History of English Literature (História de Cambridg da Literatura Inglesa) sendo considerada um ramo da grande literatura, o que não aconteceu noutros países. Começa-se a escrever muito cedo para crianças e jovens.

O editor Caxton, em 1484, traduz do francês as fábulas de Esopo e publica-as no mesmo ano com 185 gravuras em madeira. Imprime livros de cavalaria como a História do Rei Artur

e dos Cavaleiros da Távola Redonda. No século XV já há uma espécie de cartilhas escolares,

com o alfabeto, os algarismos e as orações correntes, coberta de uma película protectora e rodeada com uma pega. No século XVI, quase todas as crianças possuem um livro, fácil de manusear e com grande durabilidade, chamado de “horn-books”. Os “chap-books”, ou livros baratos, equiparados à nossa literatura de cordel, eram livros pequenos, muito económicos e populares, alcançando sucesso até ao século XVIII.

Nos finais do século XVII e princípios do século XVIII (1632-1704), John Locke abre caminho a uma nova pedagogia. Como estudou medicina e ciências naturais em Oxford, aproveitou a sua experiência para escrever um livro intitulado Thoughts Concerning

Education (Reflexões sobre Educação). “Aconselha as crianças a lerem as fábulas de Esopo e

o Romance da Raposa para primeira leitura, pois considera a literatura infantil como um meio de formação cultural e moral” (Pires 1981: 57), pretendendo distrair e ocupar a mente das crianças, podendo sugerir boas formas de reflexão ao homem. Neste século começa-se a escrever sistematicamente para crianças; em Inglaterra, J. Newbery publicou vários textos,

(25)

desde contos e versos e as célebres nursery rhimes (rimas infantis) sendo a poesia, considerada por muitos como campo privilegiado desta expressão de aparência infantil e que reflecte o pensamento do adulto, de carácter moralizador. Abriu uma livraria, a Juvenile

Library, ao lado da Igreja de Saint-Paul, e edita um livro chamado Bonito livrinho de bolso para a instrução e divertimento do menino Tommy e da bonita menina Polly (Villasante 1977:

113), os quais eram quase gratuitos, pois o escritor só pedia um penny pela encadernação. Daniel Defoe nasceu em Inglaterra (1660-1731) foi jornalista e escritor, publica The

family Instruction, numa época em que se denota preocupação pela pedagogia e pela

educação. Publica The Life and the Strange Surprising Adventures of Robinson Crusoe, of

York, Mariner, fazendo a apologia do homem forte, de energia individual, inventor, solitário,

capaz de viver isolado do mundo. Muitos jovens identificam-se com Robinson. O seu sucesso com os pequenos ouvintes ou leitores deu origem às primeiras adaptações que simplificaram o texto original, concentrando-se no dinamismo das aventuras. O realismo deste livro enfatiza a grandeza da condição humana.

Jonathan Swift (1667-17145) escreveu Gulliver Travels (As viagens de Gulliver) e, tal como Daniel Defoe, ambas as histórias envolvem naufrágios e a habilidade do homem em se defender perante as adversidades. A evidência de anões e gigantes, aventuras fantásticas em que Gulliver é envolvido, fogem ao realismo e verosímil, mas são oferecidas ao leitor como verdades absolutas, afastado da realidade, torna-se uma divertida e insólita narrativa, destinada às crianças, sensíveis a estas imagens e a estes mitos.

O século XVIII também é marcado por mulheres escritoras como: Hannah More, Sarah Trimmer, Mary Edgeworth e outras todas atraídas pela literatura infantil.

Charles Dikens vem denunciar a forma despótica como é vista a infância, denunciando maus tratos de que é vítima a criança, tema ainda hoje da actual sociedade

Dickens dedica grande parte da sua obra às crianças e sobretudo aos jovens, tendo sido lidos por jovens e crianças. Escreve Oliver Twist, Conto de Natal, Pickwick, Nicolas Nickleby

e David Copperfiel, dando a conhecer heróis, representando infâncias infelizes, como a sua,

com excessos de maldade, hipocrisia, advertindo os jovens para os perigos da sociedade. Os livros de Dickens servem de pretexto para alertar a falta de formação dos professores de então, criticando a sociedade por negligenciar a educação dos seus filhos.

Por volta do século XIX, Edward Lear escreveu o divertido Book of nonsense (Livro do

Absurdo) com desenhos magníficos, algo absurdos, e muita graça. Transcrevemos um

(26)

“Havia um homem com barba Que disse: Bem o temia, Dois mochos e uma galinha, Duas cotovias e uma perdiz Fizeram-me o ninho em cima.”

(Villasante 1997: 133)

Estes versos fizeram imenso sucesso na época, sendo a sua riqueza brincalhona e humorística muito grande, fazendo com que as crianças aprendam mais facilmente o alfabeto, através da repetição das rimas e letras.

Neste período surge uma das obras mais surpreendentes de toda a literatura infantil, considerada como notável obra artística: Alice`s Adventures in Wonderland (Alice no País das

Maravilhas). O mundo do nonsense era habitual, tal como o «mundo às avessas». Alice no País das Maravilhas de Lewis Carrol, pseudónimo de Charles Dodgson, surge como o

primeiro livro pensado com a finalidade de distrair, desenvolver a imaginação e fazer uma crítica social. “Na verdade, Carroll realiza em Alice no País das Maravilhas uma lúcida crítica aos costumes ou equívocos da civilização do seu tempo, atingindo as falhas do sistema de ensino vigente” (Coelho 2009: 127).

A criança passa a ser a protagonista, passa a ser o leitor, o destinatário e personagem. O enredo leva os leitores/ouvintes numa viagem de ilusão e falsa coerência enquanto mergulhamos num estranho universo habitado por criaturas surpreendentes, com um estilo subtil ou sofisticado. Depois do êxito deste livro, Lewis Carrol editou Alice do Outro Lado do

Espelho, uma continuação das aventuras de Alice, repletas de jogos de lógica e linguagem. Na

origem destas obras está a filha do reitor da universidade onde Lewis trabalhava. Durante um passeio de barco com Alice e as suas irmãs, o autor contou-lhes a história de uma menina que habitava um universo fantástico onde o insólito e a estranheza caminhavam lado a lado. Elas ficaram tão entusiasmadas com a história que pediram que a passasse para o papel, nascendo assim uma das obras mais famosas da Literatura Infanto-Juvenil a nível mundial. A própria Alice pediu que o absurdo nonsense (Villasante 1997: 138) fizesse parte da história. Vendem-se milhares e milhares de exemplares e o matemático obscuro tornou-Vendem-se famoso com o Vendem-seu livro. Apresentamos um excerto de uma tradução do original da história, onde se verificam as características das nursery rhymes e o segredo do nonsense quotidiano.

(27)

“Então, num silêncio imprevisto, Perseguem na imaginação A criança de sonho vagueando Num reino de maravilha sem par, Com bestas e aves falando; E quase chegam a acreditar”.

(Carroll 2010: 11)

Nos finais do século XIX e princípios do século XX surgem novos livros na literatura infantil inglesa. Óscar Wilde publica O Príncipe Feliz e O Gigante Egoísta, de simbolismo moralizador, James Mathew Barrie (1860-1937) é o autor de Peter Pan e Wendy, um dos clássicos da literatura infantil inglesa. No século XX a riqueza da literatura inglesa é muito grande.

− Itália é um dos países com uma cultura milenar, onde floresceu a civilização romana com grandes obras literárias, onde é fácil encontrar livros dedicados às crianças e aos jovens.

Esta tradição estende-se desde Catão (239-149 a.C.), Fedro (30 a. C.− 44 d. C.) e Plutarco (50-120 d.C.) que influenciarão toda a Europa. No século XIV surge um Esopo vulgarizado por um autor de Sena, bem como tratados de boas maneiras para crianças, sendo a literatura oral a principal fonte de diversão das crianças. Neste século, um escritor anónimo escreveu Fiorecillas de San Francisco (Florinhas de São Francisco), livro no qual se narram a vida do santo, muito bem acolhido por adultos e jovens, obra posteriormente utilizada para o ensino das crianças.

Giambatista Basile (1575-1632) autor de Pentamerone o lo Cunto delli Cunti faz um relato de cinquenta contos feito por velhas para se entreter, onde se inclui a de Cenderella

(Cinderela) ou seja A Gata Borralheira, que inspirará Perrault.

No apogeu dos fabulistas do século XVIII surge uma série de obras utilizadas para as crianças. Passam a estar na moda os contos morais e um intenso movimento a favor do ensino escolar, revelando a escassez dos livros escolares, despertando a atenção de professores e pedagogos. Ao falarmos da história da literatura infantil no século XIX não poderemos esquecer o enquadramento social e político de uma «Itália Una», com forte apego ao patriotismo. O autor Alessandro Parravicini escreve Gianetto (Joãozinho), ganhando um prémio promovido pela Sociedade Florentina. A finalidade deste livro era ajudar os professores e as mães na arte de educar os filhos. Outros houve que contribuíram para que os livros para a infância e juventude se multiplicassem. Estavam lançadas as sementes para que um escritor mais atento à verdadeira educação do que à instrução criasse uma verdadeira obra

(28)

da literatura infantil italiana; Carlo Lorenzzini escreve Minuzzolo com fins educativos e que é recebido muito bem pelas crianças. Mais tarde escreve Le Aventure di Pinocchio (As

Aventuras de Pinóquio). Através da fantasia renovou o conto tradicional do menino bom e do

menino mau, com um simbolismo muito profundo e um estilo descontraído e bem-humorado. No mundo quotidiano, do maravilhoso ou mágico, está a criação do boneco Pinóquio, que há um século encanta crianças e adultos do mundo todo. O sucesso é enorme, o que levou ao estudo internacioanl desta obra. Edmundo D’Amicis, Oreste Boni, Luigi Capuana, Ida Baccini, autora versátil, escreveu novelas, contos e teatro e fundou o Giornalino per bambini.

Luigi Bertelli usa o pseudónimo de Vamba e, tal como Collodi, tem grande vocação para a escrita e dedica-se ao jornalismo e começa a escrever para crianças a partir do jornal, tornando-se uma criança entre crianças.

Emílio Salgari escreve Sandokan, povoado de corsários e naufrágios, selva, explorações perseguições sem conta, com dinamismo, com linguagem simples que foram traduzidas em todas as línguas.

A Literatura Infanto-Juvenil pretende criar uma emoção duradoura e autêntica nas crianças e jovens, sensibilizando-os para o prazer estético, pois a poesia é a verdadeira obra de arte com finalidade de educar na sensibilidade, no treino para um assumir futuro dos papéis sociais. Ela é uma porta aberta para o belo e sensível; ensina a beleza da língua, ela é música, ritmo, ela excita a imaginação e a criatividade das crianças e jovens.

1.3 Os impulsionadores da Literatura Infantil em Portugal

Rousseau é um dos pedagogos do século XVIII que tal como Locke, vem fazer a diferenciação entre crianças de pequeno porte e crianças que, ouvindo o que os adultos lêem ou ouvem, têm a capacidade de reter o que lhes interessa ou aquilo que podem reter. “A literatura infantil é, antes de mais, literatura, ou melhor, é arte: fenómeno de criatividade que representa o mundo, o homem, a vida, através da palavra. Funde os sonhos e a vida prática, o imaginário e o real, os ideais e a sua possível/impossível realização” (Coelho 2009: 27).

A literatura utiliza uma linguagem específica que em cada época foi compreendida mediante as regras desse tempo. Deram-lhe forma e foi produzida. Tem como função actuar sobre as mentes, nas quais se decidem as vontades ou acções, os desejos, os sentimentos de toda a ordem, transformando a própria existência humana.

Literatura Infantil é uma expressão que vulgarmente denota puerilidade, apresentando

livros belos, repletos de imagens com a finalidade de que as crianças os leiam, os folheiem ou oiçam histórias, contadas por alguém. Normalmente estes livros estão ligados à diversão e

(29)

muitas das obras escritas para adultos foram adaptadas para crianças. A valorização da Literatura Infantil, como um fenómeno significativo entre nós, de dedicação, de formação e ensino para as classes infantis e juvenis, dentro da cultura das sociedades, é uma conquista recente onde se pretende que haja um envolvimento da pessoa numa experiência de vida, e não puro entretenimento.

Julgar que a Literatura Infantil só surgiu entre nós no século XIX com a geração de Antero de Quental, Eça de Queirós e Guerra Junqueiro é manifestamente errado, pois a Literatura Infantil portuguesa seguiu praticamente os mesmos caminhos que “no resto do mundo” (Pires 1981: 27) e, não é nem mais pobre nem mais rica. Muitas obras não foram escritas para crianças, mas apropriaram-se delas, através da leitura por outros, em voz alta, pois os livros eram muito caros.

Desde a Idade Média que se encontra uma forma de afirmação, para se integrar na Literatura Infantil toda a riqueza da literatura tradicional oral.

A audição de contos populares era uma das formas de distracção da sociedade, onde apenas alguns sabiam ler e escrever.

Os romances de cavalaria, como o Livro da Saudade – História da Menina e Moça, de Bernardino Ribeiro, de 1557, eram ouvidos e conhecidos pelas crianças. À evolução do tempo, também se dá a evolução do conhecimento, da maneira de ver o mundo, das narrativas, elaboram-se adaptações do que se julga ser uma obra-prima para a infância, fazendo este registo parte da evolução da história da Literatura Infantil.

O século XVI é marcado por obras pedagógicas, não podendo deixar de mencionar todas as obras literárias ligadas à educação, como cartilhas para aprender a ler e catecismos. A primeira dessas cartilhas para leitura, Cartinha para aprender a ler, é da autoria de João de Barros, destinada às crianças e ao povo, constitui a primeira parte da Gramática da Língua

Portuguesa com os Mandamentos da Santa Madre Igreja, publicada em 1539, em dois

tratados. A função moralizadora e didáctica da obra perdurará vários séculos, acompanhada por imagens e jogos dos objectos com a palavra correspondente, e a letra inicial. É de realçar a obra do mesmo autor Diálogo de Ioam de Barros com Dous Filhos seus sobre Preceptos

Moraes em modo de Jogo, de 1563. Escrito em forma de diálogo, faziam parte das leituras das

crianças. Além de aprenderem a ler nestes livros, as crianças tinham também que estudar a doutrina cristã, e para isso, além da leitura escutada da Bíblia, serviam-se dos catecismos ou livros de doutrina. Os exemplários, contos moralizantes, eram outras narrativas medievais também ouvidos pelas crianças que preconizavam o aspecto didáctico e de formação que a literatura infantil iria tomar posteriormente, sobretudo no século XVIII.

(30)

Ambas, literatura oral e literatura escrita, se apoiam mutuamente, produzindo entre si, como obras literárias diferentes e não menos belas. Particularmente, a literatura de viagens com relatos associados às Descobertas, com o seu cortejo dos naufrágios, medos, Adamastores, corsários, heróis e mártires e o conhecimento de novas realidades, com encontros com culturas diferentes, certamente não ficaram alheias ao nascimento da Literatura Infantil, revelando as crianças fascínio por um mundo totalmente desconhecido.

As fábulas têm grande importância no que concerne à literatura infantil. São pequenas histórias de animais que retratam a vida dos seres humanos, explicando com a sabedoria popular um facto da natureza.

“Com o declínio da literatura oral durante o Renascimento e com a invenção da tipografia, as narrativas populares, que antes se transmitiam de boca em boca e de avós para netos, começaram a surgir sob forma impressa” (Idem, 40). Surge a literatura de cordel sob a forma de folhas volantes ou magros folhetos (Ibidem, 40) e que eram vendidos por cegos, constituídas por histórias rimadas, para facilitar a fixação mnemónica, relatando feitos extraordinários.

Na obra de Gil Vicente, encontram-se muitos dos temas que estão na origem da Literatura Infantil, sendo muitas destas peças, publicadas em folhetos de cordel o que aumentou a sua popularidade entre o público, e de certo também nas crianças. Teve alguns continuadores, mas, apesar disso, o teatro, depois dele desenvolveu-se, surgindo no público infantil português interesse pelo teatro, apesar da actividade censória da Inquisição,

O século XVII é bastante pobre na produção literária, tanto para o público infantil, como da literatura em geral. Portugal acompanhou a Europa com algum atraso e neste período foram as fábulas e as obras pedagógicas as mais apreciadas, escritas e adaptadas no nosso país.

No século XVIII, depois de estar assente o conceito de infância, com o contributo do Iluminismo, de que a literatura destinada às crianças não se podia alhear da grande Literatura, começa a haver em toda a Europa grandes preocupações com a educação e a fazer-se sentir com o contributo de pedagogos, já anteriormente referidos, como Locke, Rousseau e Pestalozzi. Em Portugal achava-se necessário inculcar princípios morais nas crianças, que precisavam de ser corrigidas, escrevendo Martinho da Mendonça de Pina e Proença

Apontamentos sobre a Educação de um Menino Nobre, em 1734. As famílias ricas

juntavam-se à noite para conversar, transmitindo valores sociais e religiosos, jogar e ler em voz alta. A literatura infantil era um dos meios que os pais possuíam para exercerem influência e moldarem a personalidade dos seus filhos.

Referências

Documentos relacionados

A democratização do acesso às tecnologias digitais permitiu uma significativa expansão na educação no Brasil, acontecimento decisivo no percurso de uma nação em

A motivação para o desenvolvimento deste trabalho, referente à exposição ocupacional do frentista ao benzeno, decorreu da percepção de que os postos de

de lôbo-guará (Chrysocyon brachyurus), a partir do cérebro e da glândula submaxilar em face das ino- culações em camundongos, cobaios e coelho e, também, pela presença

O movimento cognitivista enfatiza o funcionamento do sistema cognitivo, esta- belecendo uma ruptura no domínio da in- vestigação na psicologia. A pesquisa tradi- cional

utilizada, pois no trabalho de Diacenco (2010) foi utilizada a Teoria da Deformação Cisalhante de Alta Order (HSDT) e, neste trabalho utilizou-se a Teoria da

Finally,  we  can  conclude  several  findings  from  our  research.  First,  productivity  is  the  most  important  determinant  for  internationalization  that 

segunda guerra, que ficou marcada pela exigência de um posicionamento político e social diante de dois contextos: a permanência de regimes totalitários, no mundo, e o

and generally occur associated with mafic mineral aggregates, where titanite forms continuous rims around ilmenite (Fig.. Table 1- Modal composition of the studied rocks