P O D E R J U D I C I Á R I O D O E S T AD O D O P A R A N Á F o r o R e g i o n a l d e A l mi r a n t e T a ma n d a r é 2ª Vara Cível e da Fazenda Pública AUTOS N° 0008627-41.2016.8.16.0024
Vistos.
1. Em atenção à decisão de Mov.447, proferida pelo Ilustre Desembargador Relator do agravo interposto pelas autoras, segundo a qual deve ser dispensada a apresentação de certidões negativas de débito fiscais no presente momento processual, passo a deliberar nos termos do artigo 58, da Lei n° 11.101/2005.
2. Da análise da ata da assembleia geral de credores realizada neste feito (Mov. 373.2), percebe-se que compareceram apenas credores quirografários, classe única dos créditos habilitados contra as recuperandas segundo informado pelo Administrador (Mov.373.1). Naquela ocasião, o plano proposto obteve anuência do maior credor das recuperandas, a quem estas devem mais da metade do seu passivo (61,31% - Embrart Indústria de Embalagens e Artefatos de Papel Ltda.). Porém, a princípio, o plano teria sido rejeitado pela maioria simples dos credores presentes (Bradesco Cartões S.A. e Banco Bradesco S.A. 2X1 Embrart Indústria de Embalagens e Artefatos de Papel Ltda.) na votação “por cabeça”.
Pois bem, diante de tal cenário, é imprescindível estabelecer como premissa que a viabilidade econômica das recuperandas não pode servir de critério para que este Juízo se pronuncie a respeito da homologação do plano, vez que dita decisão há que ser alicerçada tão somente na análise do preenchimento dos requisitos legais para o deferimento da recuperação.
Nessa esteira, o art. 58, da Lei 11.101/2005 traz regra que estabelece que “Cumpridas as exigências desta Lei, o juiz concederá a
recuperação judicial do devedor cujo plano não tenha sofrido objeção de
credor nos termos do art. 55 desta Lei ou tenha sido aprovado pela assembleia-geral de credores na forma do art. 45 desta Lei.”. Já no § 1º,
do referido dispositivo legal, consta que:
“O juiz poderá conceder a recuperação judicial com base em plano que não obteve aprovação na forma do art. 45 desta Lei, desde que, na mesma assembleia, tenha obtido, de forma cumulativa:
I – o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia, independentemente de classes;
II – a aprovação de 2 (duas) das classes de credores nos termos do art. 45 desta Lei ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 (uma) delas;
III – na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores, computados na forma dos §§ 1° e 2º do art. 45 desta Lei.”
Nota-se, do teor da regra acima transcrita (art. 58, §1º), terem sido conferidos poderes de decisão ao magistrado, objetivando o sopesamento entre os interesses dos credores, os princípios formais que regem a deliberação em assembleia e a função social da empresa. Tal hipótese é denominada pela doutrina de “cram down”, e “significa,
literalmente - “empurrar goela abaixo” - ou seja, reside na possibilidade de o juiz intervir no resultado da votação que rejeitou o plano de recuperação, para impor a aprovação da proposta aos credores.” (TJPR -
18ª C. Cível - AI - 1293930-7 - Campina Grande do Sul - Rel.: Athos Pereira Jorge Junior - Rel. Desig. p/ o Acórdão: Espedito Reis do Amaral - Por maioria - J. 13.05.2015).
Todavia, cotejando-se o resultado da assembleia geral com os requisitos legais cumulativos estabelecidos para o “cram down”, constata-se que não se afigura viável homologar o plano com base em tal instituto, vez que, a princípio, a regra do inciso II não teria sido atendida.
Ademais, acaso o requisito do inciso II houvesse sido atendido, sequer seria necessário socorrer-se do “cram down” para que se homologasse o plano e, consequentemente, fosse deferida a recuperação, já que, como mencionado, cuida-se de recuperação judicial de classe única de credores.
Diante de tal conjuntura, a conclusão é justamente esta, a dizer, de que a questão se resolve com as regras formais ordinárias da assembleia de credores, sem que seja necessário lançar mão das normas afetas ao “cram down”.
Segundo exige o art. 45, caput, da LFRE: “Nas
deliberações sobre o plano de recuperação judicial, todas as classes de credores referidas no art. 41 desta Lei deverão aprovar a proposta.”,
sendo que, de acordo com o § 1º do mencionado dispositivo, “Em cada
uma das classes referidas nos incisos II e III do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores presentes.”
(destaquei).
Levando-se em conta o teor da ata de assembleia, não há dúvida de que o credor titular de mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia (61,31%) aprovou o plano apresentado, restando atendida a exigência da primeira parte do §1°, do artigo 45, da Lei n° 11.101/2005.
Já no que toca à maioria simples dos credores presentes, tem-se, inicialmente, que, conforme registrado pelo Administrador Judicial, o procurador dos credores que haviam apresentado objeção, requereu que seus votos fossem considerados como voto único, de modo que, não havendo qualquer insurgência a respeito por parte de outros credores ou mesmo das recuperandas, impõe-se a contagem dos votos “por cabeça”, tomando por base tal pretensão, o que redunda no resultado de 1 x 1.
Estabelecido o pressuposto de que na votação “por cabeça” houve empate, bem como diante da lacuna legal a esse respeito na LRF, deve ser considerado aprovado o plano, à luz do princípio da preservação da empresa, princípio este que, inclusive, serviu de paradigma normativo para que o Juízo ad quem decidisse afastar a
exigência de apresentação de certidões negativas de débitos fiscais (Mov.447). A respeito do princípio em questão, Fabio Ulhoa Coelho assim leciona:
“No princípio da preservação da empresa, construído pelo moderno Direito Comercial, o valor básico prestigiado é o da conservação da atividade (e não do empresário, do estabelecimento ou de uma sociedade), em virtude da
imensa gama de interesses que transcendem os dos donos do negócio e gravitam em torno da continuidade deste; assim os interesses de empregados quanto aos
seus postos de trabalho, de consumidores em relação aos bens ou serviços de que necessitam, do Fisco voltado à arrecadação e outros.” (COELHO, Fábio Ulhoa: Manual
de Direito Comercial: Direito de Empresa - 22 ed. -São Paulo: Saraiva, 2010. p.13).
No caso em tela, deve-se lançar mão da analogia como forma de integrar a norma especial, a fim de que se atenda o princípio da continuidade empresarial no caso de empate na votação da assembleia de credores. Para tanto, há que incidir a regra do disposto na Lei nº 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações), que em seu 129 § 2º, estabelece que “No caso de empate, se o estatuto não estabelecer
procedimento de arbitragem e não contiver norma diversa, a assembleia será convocada, com intervalo mínimo de 2 (dois) meses, para votar a deliberação; se permanecer o empate e os acionistas não concordarem em cometer a decisão a um terceiro, caberá ao Poder Judiciário decidir, no interesse da companhia.”(destaquei).
Igualmente, aplica-se o Código Civil, que em seu art. 1.010, § 2º, prevê que “Prevalece a decisão sufragada por maior número
de sócios no caso de empate, e, se este persistir, decidirá o juiz.”(destaquei).
Diante do empate, assim como porque não há tratamento diferenciado conferido aos credores quirografários, componentes da única classe de credores, o que atrairia a incidência da vedação do artigo 52,
§2º, da Lei nº 11.101/2005, deve ser considerado aprovado o plano, em homenagem ao princípio da continuidade da empresa. Aprovado o plano, e porque atendidas as formalidades legais pertinentes, há que ser ele homologado, para que a recuperação siga seu trâmite.
Finalmente, é digno de destaque que a própria credora que votou contrariamente à aprovação do plano, requereu que seus votos fossem considerados como voto único ao Administrador, o que traduz seu desejo de ver concedida a recuperação judicial nos termos do que proposto no plano, ou, ao menos, de que este não seja rejeitado e, consequentemente, seja decretada a falência das autoras. Tomando-se em conta a postura adotada na assembleia pela única credora que se opõe ao plano, qualquer insurgência de sua parte em relação à presente deliberação é, no mínimo, contraditória.
3. Diante do exposto, e nos termos do art. 45, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, c/c artigo 129, §2º, da Lei nº 6,404/1976 e art.1.010, §2º, do Código Civil, HOMOLOGO o plano de recuperação judicial, considerando-o aprovado na assembleia geral de credores. Com isso, nos moldes do artigo 58, caput, da Lei nº 11.101/2005, CONCEDO A RECUPERAÇÃO JUDICIAL às empresas Rojean Pack Indústria e Comércio
de Embalagens de Papelão Ltda. - ME e Prospel Embalagens Ltda. - ME, cabendo a elas, sob a supervisão do Administrador Judicial e dos credores, adotar as medidas elencadas no plano de recuperação, com as modificações decididas na Assembleia Geral de Credores, respeitando-se o disposto nos artigos 59 a 61, da LRF.
4. Intimem-se as partes e demais interessados, bem como cientifique-se o Ministério Público (4ª Promotoria de Justiça).
5. Cientifiquem-se as Fazendas Públicas Federal, Estadual e Municipal, uma vez que deferida a recuperação judicial sem a apresentação das certidões negativas fiscais.
6. Decorrido o prazo de 15 (quinze) dias sem que haja requerimento das partes, Ministério Público, Fazendas Públicas, Administrador ou credores, ARQUIVEM-SE provisoriamente pelo prazo de 2 (dois) anos.
6. Decorrido o prazo acima indicado sem requerimentos, desarquivem-se, intimando-se o Administrador para que, em 30 (trinta) dias, apresente relatório final.
Almirante Tamandaré, 29 de novembro de 2017. ALEXANDRE MOREIRA VAN DER BROOCKE
JUIZ DE DIREITO