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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE DIREITO BRUNA PORTELA MENDES

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CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

BRUNA PORTELA MENDES

A RECUPERAÇÃO JUDICIAL ATRAVÉS DA FUSÃO OU INCORPORAÇÃO: A BUSCA PELO EQUILÍBRIO ENTRE O PRINCÍPIO DA LIVRE

CONCORRÊNCIA E O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DE EMPRESAS

NATAL – RN 2017

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BRUNA PORTELA MENDES

A RECUPERAÇÃO JUDICIAL ATRAVÉS DA FUSÃO OU INCORPORAÇÃO: A BUSCA PELO EQUILÍBRIO ENTRE O PRINCÍPIO DA LIVRE

CONCORRÊNCIA E O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DE EMPRESAS

Monografia apresentada junto ao Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Msc. Michele Nóbrega Elali

NATAL – RN 2017

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AGRADECIMENTOS

A conclusão deste trabalho me proporciona uma sensação de felicidade, por estar finalizando mais um ciclo da minha vida; de orgulho, por ter vivido o sonho de cursar Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Norte; e de gratidão, pelo apoio de tantas pessoas que viveram cada conquista, no decorrer desses últimos cinco anos, ao meu lado.

Gostaria de agradecer, inicialamente e principalmente, aos meus pais, Patricia e Almir, que além de grandes incentivadores, sempre transbordaram amor, educação e bons exemplos para nossa família. Agradeço a dedicação, a torcida e o apoio que me deram em cada objetivo que almejei, bem como o amparo nos momentos de maiores dificuldades. O alicerce que vocês construíram na minha educação, ao longo desses meus vinte e dois anos, talvez, hoje, tenha o maior reflexo e retribuição que eu possa lhes dar, a minha graduação. Obrigada!

Estendo os meus agradecimentos a minha irmã, que mesmo distante, me mostra diariamente o significado de companheirismo, de amor incondicional e de união.

Não poderia deixar de agradecer aos meus amigos por dividirem comigo todos os desafios enfrentados ao longo da graduação. Especialmente direciono minha gratidão a Beatriz Paiva e Beatriz Fernandes, presentes em cada etapa deste trabalho, acompanhando-me nos momentos de pesquisa e produção.

Agradeço, ainda, a Rodrigo, que esteve comigo durante toda a realização deste trabalho, sendo companheiro, compreensivo e grande incentivador dos meus objetivos.

Por fim, serei eternamente grata e levarei sempre comigo as grandes amizades que construí neste curso e os bons exemplos de mestres que tive durante a graduação, dentre os quais destaco aqueles que compõem a banca de avaliação do meu trabalho, os professores Virgílio Macedo, Anderson Lanzillo e Michele Elali. Agradeço a esta última especialmente por toda dedicação e orientação incansável na elaboração da minha pesquisa.

A todos que estiveram ao meu lado e participaram ativamente deste processo, o meu muito obrigada.

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RESUMO

A presente monografia tem por objetivo analisar a recuperação de agentes econômicos em crise através da fusão e incorporação, realizando um estudo dessas duas espécies e apresentando as eventuais consequências - positivas e negativas - que trazem para a sociedade. Para isto, faz inicialmente uma exposição dos aspectos gerais do Direito Falimentar e Recuperacional, abordando o instituto da recuperação judicial e os princípios da função social e da preservação de empresas. O assunto é abordado com enfoque nos casos em que a melhor solução para a manutenção da empresa seria através de um ato concentracionista, pois a união de empresas para superação da crise econômico-financeira resulta em vantagens uma vez que mantém o agente econômico, os empregos que dele dependem e gera uma nova economia no mercado. Nesse sentido, avalia se a preservação da empresa nesses casos irá de encontro ao princípio da livre concorrência, uma vez que tais operações resultam em concentração de mercado e em possível desequilíbrio concorrencial. Assim, surge o alicerce principal e objeto central dessa monografia: o conflito e a necessidade de ponderação nos casos concretos do princípio da livre concorrência e o da preservação de empresas. Para analisar os aspectos inerentes a este conflito principiológico são apresentados fundamentos do Direito Concorrencial e o órgão de Defesa Econômica brasileiro, o CADE, explanando como se dá o processo de análise e aprovação das ações de concentração por este organismo. Por fim, apresenta uma solução para o juízo de ponderação destes dois princípios através da análise de jurisprudência do CADE e da aplicação da teoria norte-americano do failing company.

Palavras-chave: Recuperação Judicial de Empresas. Atos de Concentração. Direito

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ABSTRACT

The following undergraduate thesis has as an objective the recovery of economical agents in crises by merger or incorporation, undertaking a study of these two kinds and presenting the possible consequences – positives and negatives – that they bring to society. For that, a state-ment will initially be made of the general aspects of Bankruptcy Law, addressing the institute of the judicial recovery and the principal of the social function and the preservation of compa-nies. The subject is approached with focus on the cases that the best solution for the mainte-nance of a commercial bussing would be through a act that unites it with another company. That union can result in advantages once it maintains the economical agent, the jobs that de-pendents on it and generates a new economy in the market. However, an evaluation is necessary to ensure that the preservation of the company in these cases will not go against the principles of the free competition, once such operations result in concentration of marketplace and in a possible competitive imbalance. In this sense the main foundation and central idea of this un-dergraduate thesis is emerged: the conflict and the necessity of deliberation in the concrete cases of the principle of the free competition and the preservation of companies. In order to analyse the inherent aspects from this conflict, fundaments of Transaction Law and the council of Eco-nomic CADE, will be presented in means to explain how the process of analyzes and approval of the concentration work. Lastly, a possible solution will be presented to the a fair deliberation about the primacy of these two principles, the application of the north-American theory of the falling company.

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SUMÁRIO

RESUMO………...………...5

ABSTRACT ………...6

1 INTRODUÇÃO………...9

2 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ACERCA DO DIREITO EMPRESARIAL FALIMENTAR, DA FUNÇÃO SOCIAL E DO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA………..….11

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FALÊNCIA ……...11

2.2 A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA...14

2.3 O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DE EMPRESA ...18

2.4 AVANÇOS TRAZIDOS PELA LEI 11.101/05………..…20

2.5 A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS...22

3 ATOS CONCENTRACIONISTAS COMO MECANISMO DE PRESERVAÇÃO DE EMPRESAS...30

3.1 CONCEITO E MODUS OPERANDI DA FUSÃO DE EMPRESAS……….30

3.2 CONCEITO E MODUS OPERANDI DA INCORPORAÇÃO DE EMPRESAS………...34

3.3 FUSÃO E INCORPORAÇÃO COMO MEDIDAS ADOTADAS DURANTE A RECUPERAÇÃO JUDICIAL………..…37

4 A CONCENTRAÇÃO EMPRESÁRIA, O DIREITO CONCORRENCIAL E A PRESERVAÇÃO DE EMPRESAS ………..…40

4.1 CONSIDERAÇÕES BREVES ACERCA DO DIREITO CONCORRENCIAL E O PRINCIPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA………...40

4.1.1 O FUNCIONAMENTO DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE ………...………..43

4.2 ATOS CONCENTRACIONISTAS E AS PRINCIPAIS CONSEQUÊNCIAS ECONÔMICAS À CONCORRÊNCIA E AO CONSUMIDOR ………...…45

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4.3 A ANÁLISE DOS ATOS DE CONCENTRAÇÃO HORIZONTAL PELO CADE…...48 4.4 A TEORIA DO FAILING COMPANY: POSSÍVEL SOLUÇÃO JURÍDICA PARA A PONDERAÇÃO ENTRE PRINCIPIO DA PRESERVAÇÃO DE EMPRESAS E O DA LIVRE CONCORRÊNCIA………...51

5. CONCLUSÃO………...57

6. REFERÊNCIAS………...60

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O presente estudo versa sobre a preservação de empresas através de atos concentracionistas, mais especificamente, através da fusão e incorporação. Aqui, parte-se da indagação se essas operações, quando adotadas por empresas em recuperação judicial, está consonante com as peculiaridades inerentes ao direito concorrencial e ao princípio da livre concorrência.

Inicialmente, há de se destacar que não se busca esgotar todos os aspectos pertinentes a recuperação judicial de empresas, ou mais precisamente, a sua manutenção através de fusão e incorporação, mas apenas realizar uma abordagem que possibilite contextualizar o tema central dessa monografia, qual seja, o possível conflito entre o princípio da livre concorrência e o princípio da preservação de empresa.

Para atingir o escopo do trabalho, foi procedida a revisão bibliográfica e documental de diversas fontes. Esclareça-se que, primeiramente, fora realizada uma leitura exploratória, mediante exame das introduções, resumo e conclusões dos materiais encontrados. Depois, uma leitura seletiva definindo que material se mostrou importante para o trabalho, seguida de uma leitura analítica com base nos textos já selecionados. Por fim, teve lugar a leitura interpretativa, com a finalidade de relacionar as afirmações dos autores com a proposta de estudo.

Os resultados da pesquisa são, então, estruturados em três capítulos. O primeiro tratará de apresentar a evolução histórica do instituto da falência e do Direito Falimentar e Recuperacional, com o fito de ratificar a importância da empresa nos dias atuais como ente dotado de função social. Ademais, serão demonstrados os avanços trazidos pela Lei 11.101/05, responsável por revogar a Lei de Falência e Concordata, e por trazer como princípio basilar o da preservação da empresa, uma vez que o exercício da atividade empresarial não interessa apenas ao empresário. Ao final, será abordado o instituto da recuperação judicial, sua importância, modo de funcionamento e ainda, os reflexos que sua positivação trouxe para a sociedade.

O segundo capítulo se voltará para os atos concentracionistas como mecanismos usados pelas empresas em recuperação judicial. Nessa perspectiva, são explorados separadamente alguns aspectos, como a natureza e o fundamento jurídico do instituto da fusão e da incorporação de empresas; bem como se explana como se dá a operação, de acordo com as previsões legais. O desfecho do capítulo ficará a cargo da demonstração de algumas hipóteses de crise empresária onde a melhor solução para superá-la será através da fusão ou incorporação com outro agente econômico.

Por fim, é analisado, no terceiro capítulo, o conflito entre o princípio da livre concorrência e o da preservação de empresas, a fim de demonstrar uma solução adequada para

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sua ponderação. De início, são feitas breves considerações acerca do direito concorrencial e de seus princípios principais: o da livre iniciativa e da livre concorrência. Em seguida, abordar-se-á o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o CADE, analisando seu papel de analisar e decidir sobre os atos de concentração.

Posteriormente, se apresentam as consequências econômicas negativas à concorrência e ao consumidor que, eventualmente, os atos concentracionistas podem vir a causar. Neste sentido, será demonstrado como se dá análise dos atos de concentração horizontal pelo CADE; tal avaliação irá definir se a fusão ou incorporação de empresas que atuam e são concorrentes no mesmo setor deve ser aprovada ou não. Finalmente, o tema será concluído apontando a teoria norte americana do failing company como o mecanismo mais justo para que se possa fazer uma análise e ponderação razoável entre o princípio da livre concorrência e o da preservação de empresas, considerando as peculiaridades de um caso concreto de ato de concentração horizontal envolvendo agente econômico em situação de insolvência.

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2. CONSIDERAÇÕES INICIAIS ACERCA DO DIREITO EMPRESARIAL

FALIMENTAR, DA FUNÇÃO SOCIAL E DO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FALÊNCIA

O instituto da falência é definido pelo ilustre comercialista brasileiro REQUIÃO como "a liquidação judicial da situação jurídica do devedor comerciante que não paga no vencimento obrigação líquida”1. Cumpre destacar que a decretação de falência, a não preservação de uma empresa, atinge não apenas o devedor, mas traz reflexos que alcançam a sociedade como um todo. Logo, com o intuito de evitar prejuízos sociais e econômicos, surgiram mecanismos para evitar a decretação de falência, de modo que uma breve análise histórica desse cenário parece essencial para o desenvolvimento do estudo a que se propõe esse trabalho.

Inicialmente, essencial esclarecer que a insolvência do devedor é traduzida pela falta do cumprimento de uma obrigação. Concluindo-se, assim, que o instituto da falência encontra respaldo na evolução do conceito de obrigação.

Historicamente, a falência era considerada um delito, de maneira que, quando o devedor deixava de cumprir com suas obrigações, o credor tinha o direito de apoderar-se do falido, sujeitando-o a punições como tortura, prisão ou até morte. Ademais, não se exigia a intervenção do Estado, todo problema era resolvido pelas próprias mãos do credor.

Nessa toada, o diploma legal indiano, tal qual o livro IX das leis de Manu, estabelecia que o devedor deveria ser encarcerado, e só readquiriria a sua liberdade após ressarcir completamente o credor, e, caso não o fizesse, poderia sofrer pena de morte.

No mesmo sentido, na égide das XII Tábuas, no direito romano arcaico, foi introduzida a figura do nexum, que de acordo com os ensinamentos de CORREIA e SCIASCIA2, é o contrato formal mais antigo da sociedade romana. Esse instituto basicamente definia que o corpo do devedor responderia por suas dívidas. Conclui-se então, que as obrigações eram honradas de forma demasiadamente pessoal, ou seja, o devedor que não cumprisse com a sua obrigação poderia responder com a sua liberdade ou até mesmo com a própria vida. Era um

1 REQUIÃO, Rubens Edmundo. Curso de Direito Comercial. São Paulo: Ed. Saraiva, 2015, p. 17.

2 CORREIA, Alexandre; SCIASCIA, Gaetano. Manual de direito romano. São Paulo: Saraiva, 1953. Página

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período que tinha como característica rudimentar o rigor das penalidades corporais ao devedor insolvente, conforme se infere do art. 9º, da II Tábua da Lei das XII Tábuas:

“Se são muitos os credores é permitido, depois do terceiro dia de feira, dividir o corpo do devedor em tantos pedaços quantos sejam os credores, não importando cortar mais ou menos; se os credores preferirem, poderão vender o devedor a um estrangeiro, além do Tibre.”

Tal sistema vigorou por dois séculos, até que em 326 a.C foi editada a Lex Poetelia Papiria, responsável por introduzir ao direito romano a execução patrimonial3. Com lastro nesta lei, o instituto do nexum perdeu sua força executória.

Valendo-se das palavras do grande historiador da Roma Antiga, TITO LIVIO4, pecunia creditae bona debitoris, non corpus obnoxium. Esse postulado, resume bem os efeitos da Lex Poetielia Papiria, ao obstar a satisfação de dívidas na pessoa do devedor e criar mecanismos de execução meramente patrimoniais.

Sobre tal diploma legal, expõe, ainda, ABRÃO5:

“A Lex Poetelia Papiria, imprimindo um abrandamento sensível nos meios de execução das dívidas do devedor insolvente, porquanto a execução não mais poderia recair sobre a pessoa do devedor, mas apenas sobre o seu patrimônio. Essa modificação no sistema de execução coletiva das dívidas, através da cessio bonorum, inspirou o legislador medieval a criar o instituto da moratória e da concordata preventiva da falência, que, a sua vez, perduraram também por muitos séculos, chegando aos nossos dias. A moratória e a concordata preventiva da falência fizeram surgir uma situação inusitada no processo de insolvência, pois não mais se buscava apenas a satisfação dos credores, mas a composição entre devedor e seus credores.”

Foram também os romanos os idealizadores da Lex Julia Bonorum, diploma legal responsável por criar a cessio bonorum, considerado por muitos doutrinadores como o berço do Direito Falimentar, por ter editado dois princípios fundamentais: o direito dos credores de dispor de todos os bens do devedor e da par condictio creditorum. Com a cessio bonorum, o

3 Muitos doutrinadores, como Alexandre Correia e Gateano Sciascia, consideram que a edição da Lex Poetelia

Papiria, em Roma em 326 a.C, foi o primeiro passo para o surgimento de alguns dos institutos do Direito

Falimentar que vigoram até os dias atuais.

4 Tito Livio conhecido simplesmente como Lívio, foi um importante filosofo e historiador da Roma antiga nascido

em 59 a.C. Foi também o autor da obra histórica intitulada Ab urbe condita ("Desde a fundação da cidade"), onde tenta relatar a história de Roma desde o momento da sua mítica fundação em 753 a.C. até ao início do século I da Era Cristã, mencionando desde os reis de Roma, tanto os primeiros como os Tarquínios.

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credor passa a tomar iniciativa da execução em seu benefício e também dos demais credores, surgindo assim, o conceito de massa falida6.

Prosseguindo na evolução histórica do instituto da falência, é preciso pontuar que, curiosamente, durante determinada época, que séculos depois fora batizada como Idade das Trevas, houve um marco importante na evolução do Direito Falimentar: enquanto que no período anterior, a iniciativa era dos próprios credores, durante a Idade Média, pela primeira vez, a satisfação dos créditos passa a ser tutelada pelo Estado que condiciona a atuação dos credores à disciplina judiciária. O concurso creditório era rigidamente disciplinado, com a obrigatoriedade dos credores habilitarem-se em juízo, por onde se processava a arrecadação dos bens do devedor, atribuindo ao juiz a função de zelar por eles e partilhá-los entre os credores.

É justamente nessa época que o concurso de credores se transforma na falência. Insta salientar que, as repressões penais ainda não eram completamente coibidas, uma vez que os devedores continuavam a ser vistos como fraudadores. A própria expressão falência origina-se do verbo latino fallere, que significa enganar, falsear, faltar com a palavra ou com a confiança, incorrer em culpa, cometer falha.

Nesse passo, foi somente na Idade Moderna que o instituto da falência assumiu forma parecida com a conhecida hodiernamente. Com o advento do Code de Comerce francês, de 1807, conhecido como Código Napoleônico, a falência assumiu a natureza de fato econômico e social7. A partir daí, houve o aperfeiçoamento do processo falimentar e a criação de normas totalmente desprendidas do direito penal.

Entretanto, a principal mudança ideológica aconteceu no período pós-guerra, quando várias empresas, devido a devastação que a Grande Guerra causou, encontravam-se a beira da falência. Neste contexto, surgiu a preocupação com a empresa, como unidade, por seus reflexos sociais e econômicos que impactavam toda a população.

Diante de tais acontecimentos, surge um direito falimentar que busca satisfazer o direito dos credores sem paralisar as atividades da empresa, dada sua natureza econômico-social. Isto é, tendo em consideração a situação de insolvência da empresa, o Estado passou a procurar soluções com o objetivo principal de salvá-las da crise, mantendo-as como unidade produtiva de riquezas, conservado os empregos, preservando a tecnologia por ela produzida e viabilizando novas formas de satisfação dos credores, evitando danos desnecessários ao agente econômico em crise.

6 ROQUE, Sebastião José. Direito de Recuperação de empresas. São Paulo: Ícone, 2005. p. 82. 7 ROQUE, Sebastião José. Direito de Recuperação de empresas. São Paulo: Ícone, 2005. p. 85.

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Desta forma, nota-se uma evidente evolução que desencadeou uma maior preocupação do Estado com os impactos que a satisfação dos créditos do credor poderiam trazer para a coletividade, ponderando os dois fatos sociais, o desejo de satisfação dos credores e a a necessidade de preservar a empresa.

Por fim, resta definir a falência, juridicamente falando, como um ato ou fato que denota um desequilibro no patrimônio do devedor. E, ainda, pontuar que no estado capitalista contemporâneo, se alguém não cumprir com sua obrigação, legal ou contratual, de pagar o que deve, o sujeito ativo pode promover, perante o Poder Judiciário, a execução dos bens do patrimônio do devedor que sirvam para satisfazer seu direito.

2.2 A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA

Com o avanço da sociedade e devido a atenção voltada às consequências trazidas pela declaração de falência de uma empresa, surgiu também uma outra grande preocupação: a da existência de uma função social para tais agentes econômicos.

O início desta cobrança pela responsabilidade social das empresas surgiu nos Estados Unidos, na década de 60, quando grande parte da sociedade, inconformada com a guerra americana contra o Vietnã, começou a contestar também as políticas que estavam sendo adotadas pelas empresas que subsidiavam a guerra, principalmente aquelas que estavam diretamente envolvidas na fabricação de armamento bélico8.

Foi diante desses movimentos e da pressão realizada pela população americana que algumas sociedades empresárias começaram a produzir seus primeiros relatórios que davam publicidade as suas ações sociais. Tais relatórios eram denominados de Balanço Social e objetivavam delinear as relações da empresa com a sociedade, a fim de adquirirem mais prestígio e recuperarem a imagem desgastada.

Pode-se dizer que este foi o ponta pé inicial para que o conceito de função social da empresa começasse a se difundir pelo mundo, chegando também ao Brasil. De modo que, atualmente, não se admite mais que as empresas retirem lucros da comunidade sem uma contrapartida significativa de responsabilidade social.

Desta forma, algumas empresas tiveram que redefinir valores e voltar sua atenção para as exigências da sociedade que passou a preocupar-se não somente com a qualidade de produtos

8 ARNOLDO, Paulo Roberto Colombo; MICHELAN, Taís Cristina de Camargo. Função Social da Empresa.

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ou serviços que estaria consumindo, mas também se com o processo de produção de tal produto, se a empresa visou a preservação do meio ambiente e realizou ações sociais junto a comunidade, dentre outros fatores. São essas ações que, quando conjugadas, compõe a função social da empresa.

Na Europa, a França, segundo TINOCO9, foi o primeiro país do mundo a ter uma lei que obriga as empresas que tenham mais de 300 funcionários a elaborar o Balanço Social. Depois da França, outros países europeus, como Inglaterra, Portugal e Espanha passaram a discutir sobre o tema e hoje exigem sua publicação.

No Brasil, a discussão sobre a função social da empresa só surgiu com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Tal princípio não foi trazido de forma explicita pela Constituição Federal, mas entende-se como um desdobramento do princípio da função social da propriedade, como ensina EROS GRAU10:

“(...) incidindo pronunciadamente sobre a propriedade dos bens de produção, é que se realiza a função social da propriedade. Por isso se expressa, em regra, já que os bens de produção são postos em dinamismo, no capitalismo, em regime de empresa, como função social da empresa”.

O Princípio da Função Social da propriedade é previsto pelo ordenamento legal e está inserido no bojo da Constituição da República Federativa do Brasil, em seu arts. 5º, XXIII11; 170º, III12; 173º § 113; 182º §214, 184º caput 15, e, por fim, art. 185º, § único16. Evidentemente,

9 TINOCO, João Eduardo Prudêncio. Balanço Social: uma abordagem da transparência e da responsabilidade

das organizações. São Paulo: ed. Atlas, 2001, p. 130.

10 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.

258.

11 Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos

estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXIII – a propriedade atenderá a sua função social;

12 Art. 170 . A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim

assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) III – função social da propriedade;

13 Art. 173. §1o. A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de

suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (...) I – sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;

14 Art. 182, § 2o. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de

ordenamento da cidade expressa no plano diretor.

15 Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que

não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

16 Art. 185, § único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o

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a Carta Maior Brasileira tratou de analisar a propriedade como bem capaz de produzir riquezas e frutos que devem ser gozados não só pelo proprietário, como por toda coletividade.

RIZZATO NUNES afirma que a Constituição Federal deve observar os princípios para o desenvolvimento mais humano e não se limitar aos interesses econômicos e financeiros, ainda esclarecendo, segundo suas palavras, que a dignidade da pessoa humana é o valor supremo do direito17. Dito isso, resta evidente que deve ser preservado a qualquer custo, não podendo nenhuma empresa adquirir lucro de modo a desconsiderar este princípio.

Para MAGALHÃES18, a função social surge, no Estado moderno, como um meio de limitar o individualismo e garantir o interesse coletivo. Para a empresa, é atribuído o exercício de uma função social, quando atende não só os interesses dos sócios, mas também o da coletividade.

Neste sentido, pondera BESSA19:

Pensar a função social da empresa implica, assim, posicionar-se a empresa em face da função social da propriedade, da livre-iniciativa (autonomia privada de empreender) e da proporcionalidade (equilíbrio na consecução de interesses privados diante das necessidades sociais).

A fim de garantir o cumprimento do mandamento da Carta Magna, a função social também recebeu relevante destaque nos diplomas infraconstitucionais. Dentre eles, o Código Civil, em seu artigo 42120 e, no Direito Empresarial, no artigo 116, parágrafo único, da Lei nº. 6.404/7621, e art. 47 da Lei nº. 11.101/0522. Nas palavras de MAGALHÃES23, os referidos artigos trazem os seguintes mandamentos:

17 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Saraiva, 2006.

Página 49-52.

18 MAGALHÃES. Rodrigo Almeida. A função social e a responsabilidade social da empresa. In: Revista

Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. Vol. 5, nº. 28 – ago./set., Editora Magister, 2009. Página 4.

19 BESSA, Fabiane Lopes Bueno Netto. Responsabilidade Social das Empresas. Práticas Sociais e Regulação

Jurídica. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2006, p. 102.

20 Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

21 Art. 116 Parágrafo único. O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o

seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.

22 Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise

econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

23 MAGALHÃES. Rodrigo Almeida. A função social e a responsabilidade social da empresa. In: Revista

Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. Vol. 5, nº. 28 – ago./set., Editora Magister, 2009. p. 6.

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Toda esta preocupação em atribuir tal importância para a propriedade empresarial, se deve ao fato de que na estrutura atual da sociedade é inegável o papel fundamental das empresas por possuírem grande potencial transformador, e, ainda, por serem as principais responsáveis pelo desenvolvimento de tecnologia e produção de bens. É por isso que a empresa e, por consequência, o seu controle, ficam sujeitos a tal preceito constitucional, qual seja, o de exercer uma função social.

Nas palavras do ilustre LAMY FILHO24, co-autor da Lei das Sociedade por Ações, tem-se que:

O fenômeno da empresa é recente na história econômica e social da atividade humana. E, no entanto, o mundo de hoje seria incompreensível sem a onipresença da empresa que ocupa, praticamente, todos os espaços na vida do homem moderno. Com efeito, dependemos da empresa para o nosso trabalho, e nosso lazer, para nos transportamos e nos comunicarmos, para a produção de alimentos ou de mobiliário, e vestuário, para a defesa de nossa saúde, para a habitação, para a produção de todo essa parafernália de utilidades empregadas no dia a dia do homem moderno. Numa palavra, para o professo econômico e a conquista do bem estar social.

Dessa forma, é evidente que a atuação empresarial não repercute apenas nos funcionários, credores ou fornecedores de determinada sociedade empresária, uma vez que sua influência ultrapassa o âmbito interno e atinge toda a sociedade atual.

Pode-se definir a função social da empresa como o poder-dever do empresário de ponderar, enquanto que visa o lucro, suas decisões em observância ao interesse da sociedade em geral, e mais especificamente levando em conta os interesses daqueles que dela dependem. Assim, é necessário que haja uma preocupação com os reflexos que suas decisões têm perante a sociedade.

Resta clara a preocupação da Carta Magna Brasileira em proibir que o empreendimento atue somente em prol do lucro e prosperidade do próprio empresário. A performance empresarial deve sempre visar a criação de empregos em condições adequadas, a qualificação de seus empregados, gerar riquezas, estimular o desenvolvimento cientifico por intermédio de novas tecnologias, a melhoria da qualidade de vida por meios de ações sociais, culturais e educacionais, e por fim, a defesa do meio ambiente.

24 LAMY FILHO, Alfredo. A empresa – formação e evolução – e responsabilidade social. Rio de Janeiro:

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Importante frisar que tal princípio não busca limitar ou condicionar a atuação da empresa, mas sim contribuir para que esta atue como instrumento de promoção de justiça econômica e social a ser garantido pelo Estado.

Neste sentido, necessário frisar que é de fundamental importância que haja a observância de alguns princípios que regem a atividade empresarial enquanto que garantem o cumprimento dos interesses sociais. Dentre eles, temos o princípio da dignidade empresarial, o da boa-fé empresarial, o princípio da livre iniciativa e o princípio da dignidade da pessoa humana.

Diante do exposto, é de fácil percepção o importante papel social e econômico que a empresa pode e deve exercer na sociedade, ou seja, a importância de sua Função Social que tem como finalidade trazer maior grau de justiça nas relações empresariais. Sem a presença desse principio, as empresas atuariam de forma a objetivar exclusivamente o lucro, dando brechas para o aparecimento de relações abusivas entre a coletividade e as sociedades empresárias. Nesse contexto, podemos concluir, que a Função Social da Empresa tem a finalidade precípua de colaborar com o desenvolvimento social, sendo princípio indispensável nos dias de hoje.

2.3 O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA

Em primeiro lugar, cumpre destacar que o princípio da preservação da empresa é corolário do princípio da função social da empresa. Isto é, essencialpreservar a empresa para que ela cumpra a sua função social25.

Conforme explanado anteriormente, nos dias atuais, a empresa é tida como um organismo de grande importância sócio-econômica para o país e não é mais vista unicamente uma atividade lucrativa dos sócios, pois é, antes de tudo, uma instituição social.

Nesse contexto, justamente por ocupar um importante espaço na sociedade, a empresa deve ser preservada, e mantê-la como unidade produtiva engloba tanto o interesse individual dos sócios quanto o interesse coletivo dos indivíduos que compõem a sociedade. Nesse sentido, MAGALHÃES26 ainda assevera:

25 MAMEDE, Gladson. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. Vol. 1. – 4ª ed. – São

Paulo: Atlas, 2010. p. 85.

26 MAGALHÃES. Rodrigo Almeida. Direito Civil da autonomia privada nas situações jurídicas patrimonais e existencias: atualidades II. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2007. p. 340.

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Em nome do desenvolvimento econômico, o ser humano jamais poderá ser desprezado e, para o desenvolvimento social, o progresso e a produção não serão esquecidos.

Pode-se definir como o objetivo principal do princípio da preservação da empresa o estabelecimento de diretrizes para o tratamento da sociedade empresária que se encontra em crise econômico-financeira, com a finalidade de evitar que a sua quebra traga consequências negativas, tanto de cunho individual - para o empresário - mas, principalmente, para toda a sociedade.

Nesta trilha, um dos princípios norteadores do direito recuperacional é o da supremacia da recuperação da empresa em detrimento do interesse de cunho pessoal do sujeito que pratica a atividade ou seus credores, pelo qual tem-se a separação da figura da empresa da figura do empresário.

Desta forma, quando necessário, ao momento de se tentar preservar a empresa, proceder-se-á com a substituição do seu administrador por uma gestão técnica profissional. Assim notamos que não há mais confusão entre a empresa – atividade econômica – e empresário. Na lição de Waldo Fazzio Junior:27

Insolvente ou não, a empresa é uma unidade econômica que interage no mercado, compondo uma labiríntica teia de relações jurídicas com extraordinária repercussão social. É uma unidade de distribuição de bens e/ou serviços. É um ponto de alocação de trabalho, oferecendo empregos. É um elo na imensa corrente do mercado que, por isso, não pode desaparecer, simplesmente, sem causar seqüelas. (...) O regime jurídico da insolvência não deve ficar preso ao maniqueísmo privado (...). A empresa não é mero elemento da propriedade privada.

Por fim, é de importância fundamental destacar que nem toda empresa merece ser recuperada e um dos desdobramentos da função social da empresa é a retirada do mercado de empresas inviáveis.

Isto é, não existe no Direito Falimentar Brasileiro um principio da “preservação da empresa a todo custo”, pois quando os agentes econômicos que exploram a atividade empresária não estão aptos a criar riquezas, desenvolver tecnologia e gerar empregos, ou seja, não estão contribuindo para a coletividade, pode ter-se como consequência um prejuízo da

27 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falências e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2005. p.

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segurança e confiabilidade da economia do pais, devendo ser retirados do mercado o mais brevemente possível.

2.4 AVANÇOS TRAZIDOS PELA LEI 11.101/05

Em sentido contrário ao contexto externo global, no ano de 1945, foi promulgado no Brasil o Decreto-lei nº 7.661, conhecido como Lei de Falências e Concordatas, que já nasceu ultrapassada. Tal lei ficou marcada por atribuir ao crédito o caráter de uma relação obrigacional, mas também por desprezar a repercussão da insolvência no mercado.

Tal diploma legal ficou vigente por mais de cinquenta anos no ordenamento jurídico nacional, entretanto, no fim dos anos 50, após o governo de Juscelino Kubitschek, a situação do pais já apresentava mudanças significativas. De modo que a legislação falimentar, tornou-se totalmente incompatível com a realidade nacional e restou presa a objetivos que ainda buscavam satisfazer exclusivamente os interesses dos credores em detrimento da continuidade da empresa, sem refletir sobre as possíveis consequências28.

Neste sentido, vejamos os ensinamentos de CLARO29:

O Decreto Lei nº 7.661 de 1945 vigorou no Brasil por quase 60 anos, e seu objetivo era apenas e tão somente evitar maiores prejuízos aos credores (…) Interessava a solução das pendências perante o credor, especialmente quando se tratava do processo falimentar. O devedor, por sua vez, colava nas mãos do Estado - juiz a responsabilidade pelos atos de alienação do eventual conjunto de bens existentes e arrecadados. Esse mesmo Estado acabava assumindo a responsabilidade pela tentativa de pagamento dos débitos, ficando o devedor na qualidade de espectador.”

Diante disso, o Decreto Lei nº 7.661/45 foi bastante criticado pelos juristas e economistas, que acusavam o diploma legal de não refletir as consequências sócio-econômicas que o segundo conflito mundial provocou nas diversas economias do mundo.

Além disso, a citada norma foi também amplamente criticada por dirigir-se quase que exclusivamente ao comerciante individual, sem dar nenhuma importância a empresa como ente

28 Neste contexto, o Brasil permitiu que grandes empresas, como Hermes Macedo S.A e Disapel Eletrodomédicos,

Lojas de Departamento Mappin, Mesbla S.A. e Construtora Encol S.A, empresas importantes para a economia brasileira fossem retiradas do mercado.

29 CLARO, Carlos Roberto. Recuperação Judicial: Sustentabilidade e Função Social da Empresa. São Paulo.

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economicamente organizado. E, ainda, por ter como sua maior preocupação a regulação da situação obrigacional entre devedores e credores, sem importar-se com os efeitos derivados da decretação de falência de uma sociedade empresária.

Podendo-se concluir que a Lei de Falências e Concordatas não trazia resultados satisfatórios, extinguindo empresas recuperáveis e acabando com seu potencial de se fazer fonte produtora e geradora de riquezas do país. Diante da latente necessidade de reformulação do diploma legal, finalmente, em 9 de fevereiro de 2005 foi sancionada a Lei. n. 11.101, que institui e regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, tendo como propósito viabilizar a superação da crise econômica financeira das empresas.

A Lei de Falência e Recuperação de Empresas inovou ao trazer a compreensão da relevância das atividades econômicas para o desenvolvimento da sociedade e por passar a se preocupar com a função social da empresa, fazendo surgir o principio da preservação da empresa, através da recuperação extrajudicial ou judicial.

Isto é, a citada norma foi pioneira no âmbito nacional ao reconhecer a empresa como organização geradora de riqueza econômica, emprego e renda, contribuindo para o crescimento e o desenvolvimento social do País. Além disso, a extinção da empresa provocaria a perda do agregado valor econômico representado pelos chamados bens intangíveis como nome, ponto comercial, reputação, marcas, clientela, rede de fornecedores, know-how, treinamento, perspectiva de lucro futuro, entre outros.

A Lei 11.105 foi responsável por extinguir o instituto da concordata, e por criar a recuperação extrajudicial e judicial de empresas que tem como princípio norteador a preservação da sociedade empresária e sua função social. A recuperação judicial é considerada de fundamental importância para a manutenção das empresas e será melhor abordada posteriormente.

O diploma legal inovou ao separar os conceitos de empresa e empresário, sendo empresa o conjunto de capital e trabalho para a produção ou circulação de bens ou serviços; e o empresário, a pessoa natural ou jurídica que controla a empresa. A consequência dessa distinção é que passou a ser possível a preservação de uma empresa ainda que haja a falência do empresário, desde que a empresa seja alienada a outro empresário ou sociedade que possa continuar sua atividade em bases eficientes.

A LREF também se preocupou em trazer uma maior proteção aos trabalhadores, haja vista as grandes políticas públicas governamentais voltadas para a diminuição da desigualdade social e da erradicação da pobreza da através da luta pela diminuição da taxa de desemprego.

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Desta forma, é evidente que a recuperação de uma empresa em crise atualmente não só afeta seus sócios, mas afeta diretamente o desenvolvimento social da nação, pois tem como consequência também a preservação do emprego de inúmeros trabalhadores.

Além disso, a Lei 11.101/05 intensificou tal proteção na norma que estabelece que o crédito cedido a eles não será considerado quirografário, isto é, possuirá a precedência no recebimento de seus créditos na falência e na recuperação judicial uma vez que trata-se de credito trabalhista.

Outro aspecto positivo trazido pelo advento da nova Lei foi a simplificação das normas procedimentais na falência e na recuperação judicial, que conferiu maior celeridade e eficiência nos processos judiciais, ao reduzir a burocracia que atravanca seu curso. Também houve a desburocratização da recuperação de microempresas e empresas de pequeno porte, uma vez que estas sociedades não possuem o mesmo capital que empresas de grande parte, não sendo razoável que fossem regidas pelas mesmas regras, sobretudo em virtude da excessiva onerosidade do procedimento. Portanto, a lei passou a prever, em paralelo às regras gerais, mecanismos mais simples e menos onerosos para ampliar o acesso dessas empresas à recuperação.

Mais um objetivo declarado da lei é a maior participação dos credores no processo de falência e recuperação, a fim de que diligenciando para a defesa de seus interesses, em especial o recebimento de seu crédito, otimizem os resultados a serem obtidos com o processo, com a redução da possibilidade de fraude ou malversação dos recursos da empresa ou da massa falida. Houve a criação do comitê de credores e ainda, da assembleia geral de credores que tem a finalidade de aprovar ou aprovar com modificações o plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor. O credor passa, então, de coadjuvante a protagonista na cena dos regimes da LREF.

Por fim, mas não menos importante, a Lei 11.101/2005 também trouxe um maior rigor na punição dos crimes fraudulentos realizados na seara recuperacional ou falimentar, com o intuito de tutelar o interesse dos credores, bem como, o próprio mercado e desenvolvimento econômico do país.

2.5. RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS

É evidente que as empresas assumiram um papel de demasiada importância nos dias atuais, pois a sociedade empresária que atende sua função social e arrecada corretamente seus tributos, contribui para o financiamento do Estado e, consequentemente, auxilia os objetivos da

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República, como erradicação da pobreza através da geração de empregos, avanços tecnológicos e a redução da desigualdade social.

Não há mais nenhum espaço para a ideia do direito falimentar ultrapassado trazido pelo Decreto lei 7.661/45, que vislumbrava somente atender os interesses do credor e via na liquidação a solução para isto. Uma vez que, é certo, a liquidação de uma empresa provoca consequências sérias para o Estado por atingir toda uma rede de pessoas que dependem dessa fonte geradora de empregos e riquezas, trazendo um negativo efeito cascata para a sociedade.

No Brasil, conforme explanado anteriormente, o primeiro diploma legal a reconhecer a importância da manutenção da empresa foi a Lei 11.101/2005. Ciente que a reorganização econômica de uma sociedade empresária auxilia na observância de sua função social, o diploma legal foge da regra da liquidação e passa a enfatizar o instituto da Recuperação.

Neste sentido, o art. 47, da citada lei dispõe sobre a Recuperação Judicial de empresas, in verbis:

Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

Sobre o tema, aduz RAMOS30:

O dispositivo deixa clara a sua finalidade: permitir a recuperação dos empresários individuais e das sociedades empresarias em crise, em reconhecimento à função social da empresa e em homenagem ao principio da preservação da empresa. Perceba-se, todavia, que a recuperação só deve ser facultada aos devedores que realmente se mostrarem em condições de se recuperar. A recuperação é medida, enfim, que se destina aos devedores viáveis. Se a situação de crise que acomete o devedor é de tal monta que se monstra insuperável, o caminho da recuperação lhe deve ser negado, não restando outra alternativa a não ser a decretação de sua falência.

O primeiro passo para a recuperação judicial da empresa é o pedido. Não existem pré-requisitos no que concerne o tamanho da sociedade empresaria. Dessa forma, com lastro no art. 48º, da Lei 11.101/2005, poderá requerer recuperação judicial qualquer devedor que exerça

30 RAMOS, André Luiz Santa Cruz, Curso de Direito Empresarial, O novo Regime Jurídico-Empresarial Brasileiro. 3ª edição, Editora JusPodivm, 2009. p. 711.

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regularmente suas atividades há mais de 2 anos31, e que atenda aos requisitos cumulativos, trazidos pelo citado artigo, in verbis:

I - não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;

II - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;

III - não ter, há menos de 8 (oito) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo; III - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo; IV - não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei. Este processo tem como objetivo criar um ambiente adequado de mediação entre o devedor e credor, com a apresentação de um plano de recuperação. De modo que, o empresário e as classes de credores interessados atuem juntos para a manutenção do organismo empresarial. Com fulcro no art. 3º da Lei 11.101/05, a competência para julgamento da recuperação judicial é o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil. Importa pontuar que, não necessariamente, corresponderá à sede administrativa, mas sim ao local onde se concentra o maior volume de negócios dela32. No caso das comarcas que possuam varas especializadas em Falência e Recuperações Judiciais a competência é absoluta.

A princípio, o pedido de recuperação judicial deve ser requerido antes da crise da empresa chegar a uma situação mais danosa, como, quando surge o pedido de algum credor pela decretação de falência do empresário devedor. Entretanto, é possível que o pedido de recuperação judicial seja feito mesmo depois do requerimento de decretação de falência de um dos credores. Seria o pedido de recuperação judicial incidental ao pedido de falência, que deve

31 Ao enfatizar como pré requisito, para entrar com pedido de recuperação da empresa perante o judiciário, que a

empresa exerça regularmente suas atividades há mais de 2 anos, o legislador quis ressaltar que o empresário individual irregular e a sociedade empresaria irregular não tem direito a recuperação judicial.

32 Como exemplo, podemos citar o caso do pedido de recuperação judicial da Viação Aérea Rio-Grandense, mais

conhecida como VARIG, pois apesar da sociedade empresária ter sua sede administrativa em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, teve seu pedido de recuperação judicial ajuizado e processado na comarca do Rio de Janeiro.

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ser feito durante o prazo de contestação da ação principal, qual seja, a do requerimento da falência, conforme previsto nos arts. 9533 e 96, VII34, da LREF.

Na Inicial, o pedido deve expor ao juiz as razões específicas da crise econômica financeira e a atual situação patrimonial do devedor, o que é de extrema importância para que o juiz e os credores analisem a efetiva viabilidade da empresa. Além disso, é exigido que a petição seja acompanhada das demonstrações contábeis, a relação nominal completa dos credores e dos empregados constando as funções, salários, indenizações e demais parcelas a que tem direito, dentre outros requisitos trazidos pelo art. 5135 da Lei de Recuperação de Empresas.

Após a análise da inicial o juiz irá decidir se defere o processamento de recuperação judicial, e ainda, nomear o administrador judicial que terá o papel de fiscalizar o devedor na administração da empresa. Imperioso frisar, que nesse primeiro momento não se fala ainda em aprovação do plano de recuperação judicial, mas somente no deferimento do pedido de processamento da recuperação.

Depois desse primeiro momento, que dá inicio ao processo de recuperação, a empresa tem dois anos para recuperar-se. Com base no art. 53, da Lei 11.101/0536,após a publicação da decisão que defere o processamento do pedido de recuperação judicial, o devedor terá prazo de 60 dias para apresentar ao juiz o seu plano de recuperação, sob pena de ter sua falência decretada.

33 LREF, art. 95. Dentro do prazo de contestação, o devedor poderá pleitear sua recuperação judicial.

34 LREF, art. 96, VII. A falência requerida com base no art. 94, inciso I do caput, desta Lei, não será decretada se

o requerido provar: apresentação de pedido de recuperação judicial no prazo da contestação, observados os requisitos do art. 51 desta Lei.

35 Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com: I – a exposição das causas concretas da

situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira; II – as demonstrações contábeis relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável; III – a relação nominal completa dos credores, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço de cada um, a natureza, a classificação e o valor atualizado do crédito, discriminando sua origem, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente; IV – a relação integral dos empregados, em que constem as respectivas funções, salários, indenizações e outras parcelas a que têm direito, com o correspondente mês de competência, e a discriminação dos valores pendentes de pagamento; V – certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores; VI – a relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores do devedor; VII – os extratos atualizados das contas bancárias do devedor e de suas eventuais aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras; VIII – certidões dos cartórios de protestos situados na comarca do domicílio ou sede do devedor e naquelas onde possui filial; IX – a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados.

36 Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta)

dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter:

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De acordo, com o artigo supracitado, o plano de recuperação deverá conter a discriminação detalhada dos meios de recuperação a serem empregados, demonstração de sua viabilidade econômica, e o laudo econômico financeiro e avaliação dos bens e ativos do devedor. Devendo, ainda, propor medidas viáveis para a superação da crise que atingiu a empresa. Dentre essas medidas, o art. 50 da LREF37, oferece um extenso rol exemplificativo de alternativas, tais quais, as que serão objeto desse estudo: a incorporação ou fusão de empresas.

Após a apresentação do plano de recuperação, o juiz deve ordenar a publicação de edital informando aos credores sobre o recebimento do plano de recuperação e abrindo prazo de 30 dias para a manifestação de eventuais objeções. Em seguida, é realizada uma assembleia, fiscalizada pelo administrador judicial, onde os credores votam o plano apresentado, após a verificação de todas as cláusulas.

Após essa análise, a assembleia de credores pode tomar basicamente três decisões sobre o plano de recuperação judicial, quais sejam: aprovar sem alteração; aprovar com alteração38; ou não aprovar. No caso da aprovação, cabe o juiz homologar tal decisão. Caso o plano seja rejeitado, o juiz deverá decretar a falência do devedor, uma vez que a decisão dos credores é soberana.

Ao contrário do que acontece no processo falimentar, no procedimento da recuperação o empresário, ora devedor em crise, não perde a administração da empresa. Contudo, suas ações são fiscalizadas pelo Comitê de credores e pelo administrador judicial.

Após a aprovação do plano, a sociedade empresária inicia o processo de recuperação judicial, cumprindo as cláusulas do plano durante o restante dos dois anos. O objetivo do processo de recuperação judicial é propiciar ao devedor as condições necessárias à superação

37 Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre

outros: I – concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas; II – cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente; III – alteração do controle societário; IV – substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos; V – concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar; VI – aumento de capital social; VII – trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados; VIII – redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva; IX – dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro; X – constituição de sociedade de credores; XI – venda parcial dos bens;\ XII – equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, aplicando-sem prejuízo do disposto em legislação específica; XIII – usufruto da empresa; XIV – administração compartilhada; XV – emissão de valores mobiliários; XVI – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.

38 Eventuais alterações propostas ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor poderão ser

aprovadas pela assembleia-geral dos credores, desde que haja expressa concordância do devedor em ternos que não impliquem na diminuição dos direitos exclusivamente dos credores ausentes.

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de sua crise econômico-financeira39. Desta forma, as medidas propostas no plano devem ser seguidas conforme o esperado para que surtam os efeitos desejados.

O encerramento do processo de recuperação judicial é previsto no art, 63 da LRE, que determina que cumpridas as obrigações vencidas no prazo previsto no caput do art. 6140 desta Lei, o juiz decretará por sentença o encerramento da recuperação judicial. E ainda, deverá determinar uma serie de medidas arroladas nos incisos I a V do art. 63:

I – o pagamento do saldo de honorários ao administrador judicial, somente podendo efetuar a quitação dessas obrigações mediante prestação de contas, no prazo de 30 (trinta) dias, e aprovação do relatório previsto no inciso III do caput deste artigo; II – a apuração do saldo das custas judiciais a serem recolhidas; III – a apresentação de relatório circunstanciado do administrador judicial, no prazo máximo de 15 (quinze) dias, versando sobre a execução do plano de recuperação pelo devedor;

IV – a dissolução do Comitê de Credores e a exoneração do administrador judicial; V – a comunicação ao Registro Público de Empresas para as providências cabíveis.

Feita esta breve análise do processo de recuperação de empresas cabe destacar que segundo dados apurados pelo SERASA41, tal procedimento tem se destacado como mecanismo principal para a manutenção das sociedades empresárias e a superação de suas crises. O gráfico abaixo aponta que, já no primeiro ano de vigência a nova lei apresentou ótimos resultados: o número de quebra de empresas passou de uma média de 318 casos para 181, o que representa uma redução de 43%. A figura a seguir ilustra bem a evolução do número de falências decretadas no Brasil no período de janeiro de 2004 a maio de 2006.

39 RAMOS, André Luiz Santa Cruz, Curso de Direito Empresarial, O novo Regime Jurídico-Empresarial Brasileiro. 3ª edição, Editora JusPodivm, 2009, pág. 711.

40 O citado artigo prevê que a recuperação judicial deve durar ate o cumprimento das obrigações previstas no plano

que tiverem vencimento no período de ate 2 anos após a concessão da recuperação pelo juiz competente.

41 Apud ARAÚJO, Bruno; FUNCHAL, Bruno. A nova lei de falências brasileira: primeiros impactos. In: Revista

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Essa diminuição de falência e aumento do número de pedidos de recuperação judicial que foram concedidos foi crescendo ainda mais nos anos seguintes, conforme gráfico da SERASA Experian:

Fonte: SERASA EXPERIAN

Demonstrado isto, é necessário pontuar que a Lei de Falências e Recuperação de Empresas, através do instituto da Recuperação de Empresa, vem cumprindo seu propósito que é o de manter preservada a atividade econômica empresarial, os postos de trabalho, o crédito público e, ao mesmo tempo, atender o interesse dos credores.

De fato, as turbulências na economia afetam o desenvolvimento da empresa, e assim reciprocamente, mas uma legislação efetiva associada a políticas empresariais é capaz de amenizar tais impactos negativos e dar o suporte necessário para que uma empresa em situação desfavorável saia da crise e cumpra sua função social.

Do exposto, é indispensável afirmar que ao regulamentar a recuperação de empresas, através da recuperação judicial e, ainda, da recuperação extrajudicial, o legislador consolidou o pensamento da manutenção da empresa como regra, devendo os credores e o devedor conspirarem pela função social e pela preservação do agente econômico. Uma das formas de agir nesse sentido é a recuperação de empresas em crise através de atos concentracionistas.

Assentadas tais premissas, passa-se a estudar o fenômeno da fusão e incorporação de empresas como meio de alcançar a recuperação de uma empresa a fim de possibilitar a discussão sobre o conflito entre os princípios da livre concorrência (norteador do direito

(29)

concorrencial) e da preservação da empresa (norteador do direito falimentar) – alicerce principal e objeto central dessa monografia.

(30)

3. ATOS CONCENTRACIONISTAS COMO MECANISMO DE PRESERVAÇÃO DE

EMPRESAS

Realizada a abordagem inicial dos aspectos gerais atinentes à necessidade de preservação da empresa e do processo de recuperação judicial, é possível perceber que as empresas deixaram de ser consideradas apenas um instrumento de ganho pessoal dos empresários para assumir a conotação de um verdadeiro mecanismo de implementação de valores previstos na Carta Magna de 1988, que passou também a tutelar a função social da empresa de forma mais contundente e evidente.

Conforme explanado, através do instituto da recuperação é possível manter em funcionamento a empresa devedora, preservando a manutenção da fonte produtora, os empregos por ela gerado e o interesse dos credores. Neste capítulo, será abordado a recuperação judicial, mediante a utilização da fusão ou incorporação, analisando, de modo isolado, cada conceito e formas de procedimento.

3.1 CONCEITO E MODUS OPERANDI DA FUSÃO DE EMPRESAS

A fusão de duas empresas pode ser vista como um negócio jurídico complexo, que envolve inúmeros interesses e uma pluralidade de vontades representadas pela autonomia dos sócios das duas empresas envolvidas.

Esse ato concentracionista está disciplinado na Lei das Sociedades Anônimas, a Lei n. 6.404/76, e no Código Civil. De acordo com a LSA, a fusão é a união de duas ou mais sociedades com o intuito de formar uma nova em que haverá sucessão em todos os direitos e obrigações e a preservação dos sócios, desde que estes desejem proceder desta maneira42.

Neste sentido, BERTOLDI e RIBEIRO43, assim a conceituam:

Trata-se de uma operação de concentração de empresas, na qual duas ou mais sociedades se unem, resultando desta união uma nova sociedade que, diante da extinção de todas as sociedades envolvidas, a sucederá em todos os direitos e obrigações.

42 Lei n. 6.404/76. art. 228. Art. 228. A fusão é a operação pela qual se unem duas ou mais sociedades para formar

sociedade nova, que lhes sucederá em todos os direitos e obrigações.

43 BERTOLDI, Marcelo; RIBEIRO, Maria Carla Pereira. Curso Avançado De Direito Comercial. Editora

(31)

Com lastro no art. 1.199 do Código Civil, após a concretização do ato de fusão, as sociedades que se uniram serão extintas, sem dissolução ou liquidação, e uma nova sociedade será criada. Seria o efeito extintivo associativo, explicado por FAZZIO JUNIOR44, in verbis:

Já a fusão é a união de duas ou mais sociedades que se extinguem dando lugar à criação de uma nova, que as sucede em todos os direitos e obrigações. É, simultaneamente, modo de extinção e forma de constituição, porque as sociedades participantes desaparecem, nascendo uma nova. É o que a doutrina costuma denominar “efeito extintivo-associativo” resultante da fusão. Após a conceituação, é possível concluir que a natureza da fusão é de um contrato plurilateral de constituição de sociedade, porém com algumas nítidas peculiaridades. É evidente, que esse ato de concentração de empresas trata-se de um complexo negocio jurídico que envolve bens corpóreos, incorpóreos e a própria atividade empresarial.

Sendo assim, é inegável que, além da junção dos bens materiais - imóveis, veículos, maquinário -, dos bens imateriais -marcas, patentes, tecnologia, know how -, haverá também a sinergia das atividades empresariais entre as empresas fusionadas.

Definido o ato da fusão, passar-se-á à analise de aspectos que envolvem as partes envolvidas nesta operação concentracionista, quais sejam, as empresas que desejam fusionar. Importante destacar, conforme ensina MAMEDE45, que a operação de fusão poderá ocorrer entre sociedades de tipos iguais ou diferentes.

Cabe também salientar que, de maneira geral, todos os tipos de sociedades poderão figurar em uma fusão, pontuando-se apenas sobre a obrigatoriedade das fusionadas, nas deliberações societárias, respeitarem a lei e, igualmente, seus estatutos ou contratos sociais. Deste modo, além de que os sócios podem deliberar acerca do tipo societário da nova sociedade, mesmo que seja diversa do tipo das empresas fusionadas.

Geralmente, por meio de análises empíricas46 das operações de fusões, o que se percebe é que as empresas interessadas em fusionar tendem a ser semelhantes em tamanho e poder econômico, com a finalidade de estarem em posição de igualdade nas negociações.

Delineado esses primeiros aspectos vale ressaltar, por conseguinte, o modus operandi, isto é, a maneira em que se processa a fusão. Para a validade do ato de fusão, é necessário que

44 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falências e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2005. p.

35-36.

45 MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro. Vol. 1. Empresa e Atuação Empresarial. São Paulo:

Atlas, 2008, p 178.

46 RODRIGUES, Vasco. Fusões e aquisições: a evidência empírica. Tese de Mestrado apresentada na Faculdade

de Economia do Porto, 2013. p. 6. Disponível em: <http://www.porto.ucp.pt/feg/repec/WP/WP-98-003.PDF>. Acesso em 17 nov. 2017.

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