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Universidade Católica de Goiás

AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL, AS RELAÇÕES DE

SABER E PODER NA UNIVERSIDADE:

Regulação e Auto-avaliação

Margarida Conceição Cunha Santana

Goiânia

Setembro/2007

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS

MARGARIDA CONCEIÇÃO CUNHA SANTANA

AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL, AS RELAÇÕES DE

SABER E PODER NA UNIVERSIDADE:

Regulação e Auto-avaliação

Dissertação apresentada à Universidade Católica de Goiás, para a obtenção do título de Mestre em Educação Brasileira.

Orientadora: Profª. Drª. Antônia Ferreira Nonata

Goiânia

Setembro/2007

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O que faz com que o poder se mantenha e que seja

aceito é simplesmente que ele não pesa só como força

que diz não, mas que de fato ele permeia, produz

coisas, induz ao prazer, forma saber e produz

discurso.

(4)

Dedico esta dissertação:

À Profª. Drª. Antônia Ferreira Nonata pelo

compromisso e dedicação dispensada a mim durante a

execução deste trabalho de pesquisa e análise;

Às minhas amigas e colaboradoras Profªs. Drªs.

Juliana Santini e Rejane Cristina Rocha

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela graça da vida;

À Profª. Drª Antônia Ferreira Nonata, que me

orientou para a construção desta dissertação e

colaborou para a realização das pesquisas

bibliográficas e documentais, mediando o

conhecimento científico;

Aos membros da banca do Exame de

Qualificação, pelas sugestões que contribuíram

para a conclusão deste trabalho;

À Profª. Drª Juliana Santini e à Profª. Drª.

Rejane Cristina Rocha, que colaboraram para a

realização deste trabalho.

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RESUMO

Esta dissertação discute a universidade brasileira, as relações de saber e de poder e seus efeitos sobre a sua função social de construtora do saber e da cidadania, bem como da autonomia e da alteridade institucional. Focaliza a avaliação institucional, em primeira idéia, como um instrumento avaliativo do Estado controlador e regulador da universidade e, em segunda, como processo capaz de promover o autoconhecimento pela via da auto-avaliação, da pesquisa e da reflexão crítica em todos os níveis do trabalho acadêmico. Essa reflexão fundamenta-se nas análises de Bourdieu (2005) sobre as idéias de habitus e de campo aplicáveis às instituições de Ensino Superior no sentido das desigualdades sociais; nas discussões de Foucault (1996, 2001a, 2001b, 2004) sobre as relações de saber e do poder disciplinador e individualizante do Estado sobre a formação dos sujeitos a partir das relações estruturais por ele vivenciadas; nas propostas de Chauí (2001) sobre a ressignificação da autonomia universitária; no pensamento de Dias Sobrinho (2000, 2005) ante a avaliação da educação superior e de Habermas (1999) sobre a comunicação racional e crítica da auto-avaliação. Neste trabalho, a auto-avaliação é entendida como um projeto administrativo e pedagógico que poderá, por meio da prática dialógica reflexiva e crítica, responder aos questionamentos e às necessidades de qualificação do trabalho acadêmico e fortalecer as relações democráticas, os princípios e os valores de cidadania no grupo de atuação e de ação da universidade como instituição do pensamento superior.

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ABSTRACT

This thesis discusses Brazilian university, the relationship between knowledge and power and their effects on the social function that constructs knowledge and citizenship, as well as institutional autonomy and otherness. The discussion focuses, first, the institutional evaluation as an evaluator instrument of the State that controls and regulates university and, in the other hand, like a process capable to promote self-knowledge by the way of self-evaluation, research and critical reflection in all the levels of academic work. This work is based on Bourdieu’s (2005) analyses on the conceits of habitus and field that are applicable to university in the sense of social inequality; on Foucault’s (1996, 2001a, 2001b, 2004) discussions on the relationships of tutor and individualizer knowledge and power of State on the formation of subjects by structural relationships that are lived by it; on Chauí’s (2001) proposals on resignification of academic autonomy; on Dias Sobrinho’s (2000, 2005) studies on evaluation of superior education; and on Habermas’ (1999) thoughts on rational communication and criticism of self-evaluation. In this work, self-evaluation is understood as an administrative and pedagogical project that could, by the mean of a dialogical practice that is reflexive and critical, answer the questions and the necessities of qualification of academic work and fortify democratic relationships, principals and values of citizenship inside the group of actuation and action of university as an institution of superior thought.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

I - AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL NA UNIVERSIDADE

BRASILEIRA: UM PROCESSO DE REGULAÇÃO E CONTROLE 14 1.1. A Universidade como “instituição social”, a prática avaliativa do

Estado: as conseqüências da regulação e do controle e o esmaecimento da

autonomia universitária 18

1.2. A instituição social: legitimação na construção da alteridade 28 1.3. A cultura da avaliação na universidade: o processo político-social 39

II - AS RELAÇÕES DE PODER NA UNIVERSIDADE BRASILEIRA: O CONCEITO DE “HABITUS”, E DE “CAMPO” EM BOURDIEU E A

CONCEPÇÃO DE SUJEITO SEGUNDO FOUCAULT 44 2.1. O homem disciplinado pelo poder e a Universidade: o campo e o

sujeito 45

2.2. A reprodução e as relações de poder na concepção de Bourdieu: do

habitus e do campo social 53

2.3. O sujeito e as relações de poder na concepção de Foucault: a gênese

social 59

2.4. Avaliação institucional com qual objetivo?: uma emergência na

universidade brasileira 62

III - A REALIDADE DE SUBMISSÃO: A AVALIAÇÃO DE CONTROLE DO ESTADO E OUTRAS POSSIBILIDADES DE

CONSTRUÇÕES AVALIATIVAS 67

3.1. Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras

(PAIUB): uma proposta democrática de Avaliação Institucional 73 3.2. Exames nacionais de cursos (ENC) - vulgo PROVÃO - e ENADE:

dois instrumentos de controle 77

IV - A EMERGÊNCIA DA UNIVERSIDADE BRASILEIRA: A

AUTO-AVALIAÇÃO, UMA ALTERNATIVA? 85 4.1. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) e a

auto-avaliação como meta 89

4.2. A dialogicidade racional da auto-avaliação: possibilidades educativas 94

CONCLUSÃO 105

REFERÊNCIAS 109

(9)

INTRODUÇÃO

O entendimento de que a avaliação institucional implantada até hoje, no Brasil, é presidida por uma concepção de controle e regulação constitui dado fundamental pra ultrapassar a análise simplista desse tipo de avaliação que a universidade vem realizando. Compreender, também, que esse é um assunto complexo por que envolve aspectos diferentes como os da política econômica, social, cultural e os do ensino traz esclarecimentos à visão global do processo de avaliação no Ensino Superior.

A crítica social da ciência que arrasta consigo a crise da razão instrumental, cria novas expectativas para o ensino na era da comunicação e da informação globalizada. De outro lado, as exigências do mercado, se avolumam sob a regência das políticas neoliberais, transformam o Ensino Superior em mercadoria, distribuindo e liberando em módulos o conhecimento fragmentado e dissociado da pesquisa. Nesse sentido, o conhecimento assim transmitido se apresenta sob moldes técnicos, puramente informativos e descontextualizado historicamente.

Caracterizado como Superior, esse ensino só transmite informações intelectuais e científicas que habilitam um indivíduo a se tornar um profissional competitivo no saturado mercado de trabalho, dir-se-ia o empreendedor competitivo e útil à “ordem e progresso” positivista. Esse tipo de ensino se expandiu consideravelmente nos últimos anos, nas chamadas empresas de ensino, se multiplicaram e, cada vez mais, oferecem conhecimento para quem puder comprá-lo.

Nesse ponto, vale lembrar que a denominação empresas de ensino, tanto de âmbito público quanto privado, neste trabalho, é usada para apresentar uma instituição com a função exclusiva de transmitir conhecimentos desvinculados da pesquisa e focados no mercado de trabalho. Portanto, pública ou privada, sua característica principal é a de prestadora de serviços aos interesses da política neoliberal, no que, seguramente, se diferencia da universidade ou da faculdade que, da mesma forma, pública e/ou privada, tem que cumprir atualmente, grandes exigências sociais para manter-se como instituição de excelência.

Impossibilitada, portanto, em termos econômicos de exercer a sua função social no ensino, na pesquisa e na extensão, a universidade e/ou as faculdades perdem autonomia, por que encontram-se descaracterizada enquanto instituição social de excelência, dada as dificuldades que encontra para construir novos paradigmas propulsores e credenciadores da racionalidade contemporânea do seu fazer acadêmico.

Essa realidade requer permanente estudo e desenvolvimento de pesquisas, enfim, muitos debates sobre o papel e a função da universidade na sociedade atual. A natureza

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histórica dessa instituição, principalmente, no que diz respeito à avaliação externa, mostra que apesar de dotada de autonomia, ela sempre esteve regulada e controlada pelo poder do Estado e, por isso, encontra dificuldades para construir sua verdadeira autonomia e legitimidade.

Desse modo, a problemática que se discute nessa dissertação é a seguinte: que papel a universidade deve assumir frente às categorias clássicas do poder (Estado) e do saber (Razão), considerada sua função social de produtora do saber? O questionamento reporta-nos, em princípio, para a questão da submissão da universidade ao Estado em virtude da avaliação institucional por ele realizada com objetivos de regulação e de controle.

Entendida como espaço da pesquisa científica e tecnológica e como espaço de produção do conhecimento, a universidade procura responder a necessidades sociais amplas e tem como preocupação tornar-se expressão do real, mas sem ilusão de respostas prontas e acabadas. Essa instituição, assim expressa por Fávero (2004, p.101), nos remete ao fato de que a universidade, além de ser o espaço da constituição do conhecimento é, também, o espaço das relações de saber e de poder, por tornar-se expressão do real.

Esse fato requer uma análise das relações de saber e de poder no interior da universidade como reprodutora, construtora e transmissora do conhecimento científico, cultural e social.

Diante desta realidade, cabe a questão: a universidade poderia, pelas relações de saber e de poder estabelecidas nas instâncias externas e internas, escapar da submissão estatal e construir outros paradigmas de atuação como instituição observadora, questionadora e provedora de processos sociais? A universidade poderia, através dos processos de avaliação que nela se instituem, garantir mais autonomia e mais possibilidades de superação das suas contradições? Se sim, qual o modelo de avaliação capaz de viabilizar essa mudança?

Para discutir, analisar e esclarecer essas questões acredita-se que o estudo, aqui desenvolvido, “Avaliação Institucional, as relações de saber e de poder na universidade: regulação e auto-avaliação” poderão contribuir para o desvendamento dessa realidade de intervenção do Estado na universidade e colaborar com a formação de um olhar mais crítico sobre essa problemática.

O problema nos remete para a pesquisa da Avaliação Institucional externa da universidade como instrumento de regulação do Estado controlador em busca dos fundamentos foucaultianos dessa cultura de avaliação do “vigiar e punir”. Para analisar as relações de poder e de saber no interior da universidade, é preciso buscar em algumas categorias os conhecimentos necessários para este estudo. Assim, as categorias de análise dessa pesquisa tomam por base o estudo da universidade como instituição social, da avaliação

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institucional como instrumento de controle do Estado, das relações de poder e saber como cultura disciplinadora do sujeito, da razão instrumental como ativismo puro e da auto-avaliação como alternativa para a construção de outra cultura de auto-avaliação no Ensino Superior.

A metodologia, ou seja, o caminho para a investigação dessas questões, se assenta na análise bibliográfica e documental, leitura e análise dos conteúdos para fazer emergir as categorias para a análise interpretativa das teorias modernas; coleta de dados, documentação e análise de dados acerca da avaliação institucional na produção acadêmica e publicações como as do INEP para a coleta de informações gerais sobre a avaliação externa dos programas de governo como: o PAIUB, o PROVÃO, o SINAES e nele, o ENADE.

O problema exposto para a pesquisa dessa temática requer, como objetivo principal, discutir a universidade como instituição submissa, historicamente instituída nas relações de saber e poder e, por isso mesmo, reprodutora da ordem capitalista vigente.

Para isso, é necessário fazer uma análise da Avaliação Institucional no Brasil, para entender o processo de regulação do Estado sobre a universidade; refletir, à luz das teorias, sobre os modelos de avaliação excludentes e a cultura de avaliação disciplinar na instituição de Ensino Superior e identificar as relações de poder na universidade e suas influências na realidade geradora do saber, pela reflexão e auto-avaliação provedoras da autonomia e da alteridade. Enfim, reunir subsídios teóricos para a (re) significação do conceito de Avaliação Institucional na universidade do mundo globalizado, ou seja, a universidade das novas realidades, das novas demandas e das novas contradições.

A Avaliação Institucional, objeto desta pesquisa, entendida como processo complexo, implica um debate teórico, estrutural e político principalmente pelo valor das questões que suscita, discute e avalia. A princípio, entendida como exame e julgamento, traz na sua concepção a idéia de medida, de ajuizamento de valores e de classificação.

Mesmo assim, mostra como a avaliação institucional exerce grande força instrumental e uma considerável densidade política, pois mesmo que seja caracterizada como uma questão técnica, ela tem uma dimensão mediadora de significado político.

As disputas em torno das questões de fundo se travam no terreno dos valores políticos e filosóficos e requerem mais estudos, debates, análises e pesquisas em torno da avaliação institucional. Esse estudo justifica-se porque, na sua totalidade, abre diferentes questões para o debate em torno dessa temática, procura articular as discussões da avaliação institucional com outras discussões sobre o saber e o poder de regulação, a qualidade do ensino superior, a função da universidade no contexto atual e as possibilidades da auto-avaliação. A maior

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relevância deste trabalho porém, está na sua pretensão de contribuir para o avanço do conhecimento no campo da avaliação institucional, tanto externa quanto interna, e da auto-avaliação como processos de fortalecimento da universidade como instituição social.

Este intento não se orienta diretamente na promoção de lutas sociais, porque, este, sem dúvida, não é o papel da universidade, mas, para promover o avanço e a socialização do saber e do saber-fazer e com isso, formar o indivíduo capaz de se organizar para as lutas de classe, para as lutas pela diminuição da desigualdade social e pela inclusão daqueles que se encontram à margem do mundo acadêmico.

A estruturação dessa dissertação apresenta uma progressão discursiva em torno da Avaliação Institucional como processo regulador do Estado que submete a universidade a situações de competitividade frente às políticas neoliberais, o que tem provocado forte impacto sobre a educação superior.

No que se refere à universidade, ela mesma iria apontar as conseqüências dessas políticas para o seu ser e fazer e para a formação de uma atitude investigativa capaz de discutir os critérios e os princípios dessas avaliações. A origem dessa atitude, como não podia deixar de ser, está nos seguintes questionamentos: Por que avaliar? Qual é o sentido dessa atividade?

A princípio, é preciso lembrar que toda instituição de educação tem um compromisso com a vida, por isso, todo trabalho com a formação e com a educação merece, da parte dos que estão envolvidos com ela, um tratamento que passe pela clara definição dos objetivos, que já deverão contemplar o que é mais importante em cada situação e pela relação constante entre o teórico e o prático.

Esses dois critérios remetem-nos à consideração de que precisamos delimitar, no ensino superior, as expectativas de aprendizagem, pois delas dependem tanto nossos critérios de avaliação quanto nosso nível de exigência. A avaliação é funcional porque se realiza em função dos objetivos propostos e essa relação entre teoria e prática precisa ser mediada por ações reflexivas e, cuidadosamente, avaliadas em suas dimensões e resultados.

Então, a finalidade da avaliação é, antes de tudo, uma necessidade permanente no processo de construção da excelência da universidade, já que ele se faz nas diferentes instâncias do saber. Assim, deve-se avaliar para reorganizar um caminho, um processo de ensino, de pesquisa, de experiência, de gestão, de docência e de formação das pessoas que compõem a comunidade acadêmica. Avaliar para garantir que os processos internos e externos, na universidade, não se percam vindo a servir a objetivos, propósitos e grupos diferentes daqueles estabelecidos pela comunidade acadêmica.

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Quanto ao sentido da atividade de avaliar, o que Dias Sobrinho (2000, p.16) ressalta é que a universidade não pode ficar imóvel e se recusar a se transformar, e, “[...] toda transformação que ela assumir como necessária deve estar de acordo com alguns princípios, dentre eles o mérito, a eqüidade, a pertinência e a relevância social”. Embora não tenha sido esse o entendimento da avaliação na universidade, o sentido dela se fará significativo se ela contribuir para a formação do cidadão responsável, em condições de aprendizagem permanente, e submetendo suas atividades às exigências da ética e do rigor científico.

A universidade atual, gerenciada pelas políticas do capitalismo eficientista, defendido como ideologia e financiada por organismos internacionais como o Banco Mundial, estará, sempre presa às condições às quais se submete ou questionará essa realidade investigando outras possibilidades de reorganização interna para se adequar às exigências externas?

O primeiro capítulo faz uma análise da avaliação institucional na universidade brasileira, apresentando, no contexto, a ação do Estado controlador e a perda gradativa da legitimidade da universidade como “instituição social” em conseqüência da regulação e do controle.

No segundo capítulo, para articular essa real situação das universidades, no país, com o processo de avaliação institucional proposto atualmente, pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), e nele, o ENADE e a auto-avaliação, buscou-se trabalhar a idéia de campo e de habitus de Bourdieu no contexto da universidade, de um lado. Do outro lado, buscam-se em Foucault, as bases teóricas para analisar as relações de saber e de poder na universidade brasileira, especificamente no que se refere a sua concepção de sujeito, para explicar o disciplinamento do sujeito da modernidade, para o qual a avaliação reflexiva se constitui um instrumento efetivo e exemplar.

Frente à realidade de submissão do sujeito moderno, o terceiro capítulo discute a avaliação democrática do PAIUB e, em contrapartida, os instrumentos de avaliação de controle do Estado e a ação do sujeito no contexto da universidade.

Para concluir, o quarto capítulo apresenta a auto-avaliação como uma oportunidade para refletir e criticar o atual sistema de avaliação e se sustenta na teoria da comunicação racional, mas alicerçada em instrumentos significantes como o diálogo, a reflexão e a interação que são analisadas como recursos propulsivos da avaliação interna da universidade, em termos educativos.

Nesse capítulo, a auto-avaliação, por sua vez, é discutida como instrumento do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES). Entendida como construção coletiva no interior da universidade, a ação comunicativa crítica e a dialogicidade interativa

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da auto-avaliação poderiam ser reconhecidas como possibilidades educativas para os sujeitos agentes de um projeto acadêmico mais coerente com as reais necessidades da universidade brasileira.

A ênfase dada à auto-avaliação como uma alternativa educativa propulsora da alteridade individual e, conseqüentemente, institucional, tem sustentação teórica na racionalidade comunicativa, uma teoria crítica da razão instrumental que conduziu o homem moderno a valorizar mais a técnica. Esse valor dado ao que é mais objetivo, ao que é prático e utilitário distanciou o indivíduo da sua subjetividade, da prática da reflexão sobre o valor, o sentido e o significado das suas ações. O ativismo próprio da modernidade individualizou o homem na sua dimensão física e psicológica. No entanto, está na pessoa a razão da ação que a move para esse ou aquele ato que pode ser o começo da intersubjetividade, um grande feito que assim se faz, por tornar-se coletivo. Talvez a premissa básica para inaugurar um modo diferente de agir na universidade está em acreditar nas pessoas que nela atuam.

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CAPÍTULO I

AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL NA UNIVERSIDADE BRASILEIRA:

UM PROCESSO DE REGULAÇÃO E CONTROLE

A discussão sobre o problema da avaliação regulatória, no Brasil, tomou dimensões diferentes com a proposta de reforma da Educação Superior que, de fato, pouco tem avançado como reforma. Haja vista, o resultado do último ENADE dos cursos superiores no Brasil publicado em maio de 2007, em que a média geral da grande maioria dos cursos, ficou entre 20 e 30, ou seja, menos de 1% dos cursos alcançaram médias 40 e 50.

Para analisar essa realidade da avaliação da regulação e do controle, é preciso, antes, analisar a prática das políticas do Estado controlador e, em conseqüência, a perda da autonomia da Universidade como instituição comprometida com o ensino, a pesquisa e com o seu papel social.

O estudo de autonomia, neste trabalho, refere-se ao conceito de “direito ou faculdade de se reger por leis próprias. Liberdade ou independência moral ou intelectual” (FERREIRA, 1988, p.74). O último sentido aí apresentado indica que o conceito de autonomia será entendido e direcionado para o significado da independência moral e intelectual associada à idéia de qualidade intelectual e social. Ou seja, uma qualidade que refuta o preconceito, a discriminação e todo tipo de desigualdade social. Autonomia para pensar e para exigir uma reforma de boa qualidade, é o que se discuti posteriormente.

A Reforma do Ensino Superior provoca novos debates sobre a Avaliação Institucional, e as reflexões em torno desta questão, suscitam mais pesquisas e análises sobre o papel e a função do ato avaliativo nas e das universidades. Tanto numa quanto na outra situação, a realidade atual requer grandes mudanças. Não só na dimensão pedagógica mas, acredita-se, que da mesma forma e/ou com a mesma importância, na dimensão administrativa, gestora da instituição como organismo de produção do conhecimento científico, crítico, reflexivo e, por isso mesmo, de formação processual e investigativa.

O debate em torno da Reforma do Ensino Superior tem sido contínuo e de difícil consenso, principalmente pela complexidade do contexto no qual se insere a universidade das reformas e da atualidade. As novas realidades, as novas demandas e os desafios do mundo globalizado, requerem posturas diferentes e formas de agir conectadas com as transformações vertiginosas da sociedade em rede.

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As marcas deste novo, conforme Dias Sobrinho (2005, p.51) descreve, constituem, “o uso intensivo das tecnologias de informação, as novas relações entre capital e trabalho, a diminuição da presença do estado na promoção da educação e da justiça social, com a conseqüente expansão da privatização e do mercado educacional”.

Os rumos da vida no mundo globalizado estão tomando dimensões diversificadas e, de certa forma, assustadoras, tanto nos aspectos físicos como nos aspectos subjetivos do ser humano. No que concerne aos aspectos físicos, a interdependência dos mercados exige que a universidade diversifique suas atividades para dar respostas a expectativas do alargamento das fronteiras culturais e sociais. Quanto aos aspectos subjetivos, o sujeito globalizado e disciplinado se fragmentou na sua dimensão prática e reflexiva. A formação superior, mais do que nunca, conclama por mudanças radicais em todos os níveis. Fundamentalmente, essas transformações devem partir de estudos e muitas pesquisas sobre a vivência e a gerência dos homens no seu lócus e no universo global. Nos tempos atuais, a urgência é a preparação do indivíduo para viver o seu meio, administrar bem sua profissão no mundo da globalização que o universaliza cada vez mais.

Segundo Dias Sobrinho (2000, p. 19) “Pensar prospectivamente a educação é uma necessidade, se queremos evitar traições maiores da juventude, que desse modo e inevitavelmente são uma condenação a toda a humanidade”. Concordar com esse pensamento exige entender que, pensar o futuro é pensar um ideal de vida para a humanidade. Para isso, a universidade precisa, como instituição social que é, inserir-se mais nos movimentos da sociedade e buscar neles os sentidos e os significados de sua prática com mais interação, participação e criticidade para tomar conhecimento das contradições desses movimentos, do sentido das mudanças que deseja propor a partir do ensino, da pesquisa, da extensão e da formação.

Essa função social se caracteriza como desafiadora na universidade contemporânea. Sobre esse desafio, Dias Sobrinho (2005, p.14) destaca: “[...] é igualmente necessário que a universidade se mantenha livre e aberta para intencionalizar suas ações de acordo com sua pertinência ética e social”. Pelo fato de não ser uma instituição fechada em si mesma, ela sofre os efeitos da globalização no sentido ético, filosófico, ideológico e econômico. Em conseqüência dessa especificidade da sua condição de existência, a universidade precisa ser avaliada e se avaliar constantemente tanto na sua exterioridade, como na sua interioridade.

Neste caso, a avaliação institucional é concebida numa dimensão ampla porque é vista como um processo global, sistemático, contínuo e funcional na busca de subsídios para melhoria e aperfeiçoamento da instituição em face de sua missão científica e social. Para

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Belloni (2000, p.40) a “Avaliação Institucional em Educação busca ser um instrumento de e para o aprimoramento da gestão acadêmica e administrativa, tanto das instituições quanto dos sistemas educacionais, com vistas à melhoria da qualidade e da sua relevância social”.

Desta forma, observa-se que a avaliação na universidade adquire duas dimensões: uma administrativa externa – controlada pelos instrumentos do sistema de avaliação institucional e que, de certa forma, pode ou não contribuir com a qualidade social da instituição - e a outra, a dimensão pedagógica que garante a qualidade do ensino, da aprendizagem, das relações interpessoais e da função social do processo avaliativo como um todo (a auto-avaliação) e que deve ser feita na esfera interna.

A avaliação interna, entendida como processo de auto-avaliação desta avaliação institucional, no entanto, ainda não se configura como uma prática concreta e madura em toda as instituições de ensino superior. Talvez, na maioria delas, ainda se constitua como um embrião, porque falta às Instituições de Ensino Superior (IES) uma estrutura organizacional que possibilite formar a determinação, a cultura, o conhecimento da própria validade e a união para fazer acontecer uma proposta de avaliação que garanta, pelo menos, a oportunidade de todos crescerem juntos da forma mais justa e democrática possível. Livrar-se do estrelismo, do egoísmo profissional, dos privilégios advindos das relações de poder impostas e assegurados pelo controle dos grupos dominantes não é coisa tão simples assim e tão pouco se faz em curto prazo. Aprender a se auto-avaliar-se no grupo e avaliar o grupo dentro da instituição é premissa básica para o crescimento e o amadurecimento das relações no interior da universidade.

No interior da avaliação interna, a prática da auto-avaliação é exercício de aprendizagem urgente na universidade, e pode garantir o equilíbrio entre a avaliação interna e a externa. As relações de saber e poder, germinadas nesses dois tipos de avaliação, e cultivadas pelo Estado, são efetivadas na forma de pensamento que, por sua vez, utiliza ferramentas poderosíssimas como o discurso para legitimar situações de barbárie social. A questão mais grave é que esse discurso se faz pelo pensamento construído além dos muros da universidade, mas que, na maioria das vezes, é por ela incorporado e reproduzido através das relações interinstitucionais.

É o que esclarece Dias Sobrinho (2005, p. 14) quando diz que “neste como noutros campos de sua atividade, a universidade encontra-se envolvida em notáveis e difíceis dilemas entre, por exemplo, os interesses locais e os globais que ora se confundem, ora se confrontam entre si”. Aprender a avaliar os interesses locais e os globais é uma urgência da universidade. A articulação entre avaliação interna e externa com certeza constitui um caminho viável para

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a reflexibilidade e a criticidade dos significados de hegemonia e legitimidade da universidade vivida de fato e sentida pela comunidade como instituição social.

Para articular os interesses locais e globais no processo de avaliação institucional é preciso que o processo de avaliação interna aconteça de forma concomitante ao processo de avaliação externa. São os programas de formação desenvolvidos no interior das IES, que permitem à universidade executar projetos de auto-avaliação, projetos pedagógicos de qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão. E, ainda, é preciso garantir interesses locais como a autorização para abertura de novos cursos, aumento de vagas para cursos já autorizados, ou mesmo, garantir o conceito excelente nos exames nacionais de cursos e, assim, adquirir o respeito perante a comunidade local, fazendo-se necessária a ela pelas ações que desenvolve como entidade cultural e política.

Por isso, pode-se dizer que, quando a avaliação interna for capaz de sustentar e dar clareza a todos os objetivos profissionais no âmbito das atividades educacionais, o ensino, a pesquisa e a extensão, a universidade terá adquirido maior legitimidade em suas ações. Conseqüentemente, adquirirá autonomia para analisar e refletir a avaliação externa e, só então, ressignificar sua atuação na sociedade.

Neste caso, a avaliação externa, através dos mecanismos do Ministério da Educação e Cultura (MEC) como o PROVÃO, o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (SINAES) e outros que poderão surgir, não terão mais tanto poder de controle ou de regulação sobre as universidades. Isto porque, antecipando-se ao Estado, elas terão condições de saber, através de um conhecimento científico de qualidade e de uma avaliação mais democrática, quais as demandas, as necessidades, as contradições, os dilemas e, enfim, as perspectivas da sociedade globalizada.

A avaliação interna terá que ser conduzida pela própria universidade que se vê refletida na sociedade e dela mesma extrai os objetivos de que necessita para ressignificar sua ação e, conforme expressa Goergen (2005, p.18), no prefácio do livro Dilemas da Educação Superior no Mundo Globalizado de José Dias Sobrinho (2005), é preciso: “conceber-se [a universidade] como espaço onde se cultiva a consciência crítica que não dá tréguas à violência, às agressões contra a dignidade humana, contra a justiça social e a democracia; deve conceber-se também como o espaço onde se pode refletir publicamente sobre ela mesma”.

Os interesses globais e locais conjugados dos quais se falou antes, poderão, concomitantemente, contribuir para uma avaliação institucional mais eficaz em relação ao processo interno da Instituição de Ensino Superior (IES) e com mais qualidade de resultado

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final, quando alcançadas as metas da avaliação externa. Neste entendimento de mão dupla, o processo interno e externo de avaliação poderia ser concebido como instrumentos de melhoria da qualidade do fazer universitário. Esta tarefa, porém, demanda tempo, muito trabalho e vontade política da parte de todos aqueles que, direta ou indiretamente, compõem a administração, a organização e a institucionalização da universidade. É uma tarefa que vem na contra-mão da ação reguladora do Estado em relação ao Ensino Superior no Brasil, o que tem provocado o enfraquecimento da autonomia da Universidade brasileira.

1.1. A Universidade como “instituição social”, a prática avaliativa do Estado: as

conseqüências da regulação e do controle e o esmaecimento da autonomia universitária

A prática avaliativa do “Estado Mínimo” para a Educação Superior abriu oportunidades para outras demandas nesse nível de ensino. As empresas privadas do Ensino Superior têm ganhado o campo comercial oferecendo educação mercadológica para a competição no mercado de trabalho. A idéia de que a questão do desemprego no país se resolve com a qualificação da mão-de-obra para o trabalho leva cada vez mais pessoas a fazer um curso superior. Destituído do poder econômico, o Estado, encontra dificuldades para atender essa demanda, cria mecanismos políticos (bolsas, sistemas de cotas) que beneficiam a empresa privada de ensino e colabora para o seu crescimento. Sobre a destituição do poder do Estado-Nação, Castells (2002, p. 287) observa que:

O controle do Estado sobre o tempo e o espaço vem sendo sobrepujado pelos fluxos globais de capital, produtos, serviços, tecnologia comunicação e informação. A apreensão do tempo histórico pelo Estado mediante a apropriação da tradição e a (re)construção da identidade nacional passou a enfrentar o desafio imposto pelas identidades múltiplas definidas por seus sujeitos autônomos. A tentativa de o Estado reafirmar seu poder na arena global do desenvolvimento de instituições supranacionais acaba comprometendo ainda mais sua soberania. E os esforços do Estado para restaurar sua legitimidade por meio da descentralização do poder administrativo, delegando-o às esferas regionais e locais, estimulam as tendências centrífugas ao trazer os cidadãos para a órbita do governo, aumentando, porém, a indiferença destes em relação ao Estado-Nação.

O Estado controlador, como instituição de avaliação da universidade, tem trazido conseqüências sérias para a Educação Superior no país, como diminuição de verbas para a pesquisa científica e, a mais grave delas, a situação de competitividade a que expôs as universidades, em virtude da sua finalidade operacional. O “fluxo global”, ou seja, a globalização da educação, exige mudanças radicais nos sistemas de ensino das instituições, no entanto, elas ainda permanecem centradas em objetivos impostos pela lógica da política

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neoliberal. As mudanças vertiginosas da sociedade global desestruturam a legitimidade de suas ações e questionam sua atuação. Afinal, se considerado o eixo estreito das relações universidade-estado, cabe indagar se a universidade do terceiro milênio poderá construir outros rumos dentro do contexto do Estado controlador. Na era da transformação da economia, da sociedade e da cultura que outros propósitos ela poderá construir?

O que Castells (2002, p.386) explica, nesse sentido, é que o Estado cuja formação remonta à Idade Média, não pode ser entendido apenas como Estado do controle econômico. Na sua integralidade, a Estado-Nação 1é o Estado do bem estar social, o Estado da singularidade cultural, da especificidade científica, o formador da consciência política para essas autonomias e, por isso, pode ser conceituado como o Estado da Nação de um povo. “Desse modo, a nação moderna é um produto do Estado. Esse conceito não mais se aplica aos dias de hoje” (idem, p.386). O Estado atual perde, gradativamente, sua soberania em relação à mídia, às comunicações e ao poder de controle sobre a política monetária, embora detenha ainda certa autonomia para o estabelecimento de regulamentações e relativo controle sobre seus sujeitos, no nível interno.

O que Castells (2002) considera a respeito é que a capacidade instrumental do Estado-Nação está comprometida de forma decisiva pela globalização das principais atividades econômicas, da mídia e da comunicação eletrônica e pela globalização do crime. Observa-se que os Estados-Nação, embora venham perdendo efetivamente o controle sobre componentes fundamentais de suas políticas econômicas, continuam ainda fortes internamente a ponto de regular a universidade. Ao referir-se às dificuldades cada vez maiores do controle exercido pelos governos sobre a economia, Castells (2002) acentua a questão da crescente transnacionalização da produção, considerando não apenas o impacto causado pelas empresas multinacionais, mas principalmente, pelas redes integradas de produção e comércio dessas empresas. Para concluir, Castells (2002, p.289) avalia as implicações dessa forma:

A conseqüência é a capacidade cada vez mais reduzida de os governos assegurarem em seus próprios territórios a base produtiva para a geração de receita. À medida que as empresas e indivíduos com grandes fortunas vão descobrindo paraísos fiscais em todo o mundo, e a contabilização do valor agregado em um sistema internacional de produção se torna cada vez mais onerosa, surge uma nova crise fiscal no Estado, expressão de uma contradição crescente entre a internacionalização do investimento, produção e consumo, por um lado, e a base nacional dos sistemas tributários por outro.

1 Estado-Nação – para Castells (2002), é a manifestação e/ou estruturação da identidade de um povo por meio de

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Pelo que se pode ver, esse processo de crescimento das empresas privadas e o empobrecimento econômico do Estado controlador afeta diretamente o Ensino Superior no Brasil. As universidades, ao longo do tempo, ficaram desprovidas das condições necessárias para atuarem com eficiência. Cada vez menos verbas são destinadas para a pesquisa, para a atualização do acervo bibliográfico das universidades, para os projetos de extensão e ensino; isto sem falar nos planos de cargos e salários para os professores que, cada vez mais, necessitam de formação continuada e, cada vez menos, têm oportunidades para tal formação.

A erosão sistêmica do poder do Estado-Nação incapacita-o para agir por conta própria e o obriga a buscar volumosos empréstimos no Banco Mundial, endividando-se cada vez mais. Em conseqüência disso, internamente, com sua “mão de ferro” controla o sistema de ensino obedecendo às regras do sistema capitalista internacional. Essa situação, sem sombra de dúvidas, destitui a universidade de sua legitimidade deixando-lhe como alternativa procurar definir suas áreas de atuação e tentar construir vida própria. Diante desse panorama, Castells (2002, p.320) busca lançar luz sobre as conseqüências que se delineiam socialmente:

Conseqüentemente, crescentes pressões sociais ameaçam o equilíbrio da nação inteira. A incapacidade cada vez maior demonstrada pelo Estado de responder a tais pressões, dada a descentralização de seu poder, continua comprometendo a legitimação de seu papel de protetor e representante das minorias discriminadas. Ato contínuo, tais minorias procuram refúgio em suas comunidades locais, em estruturas não-governamentais auto-suficientes. Portanto, um processo iniciado como uma tentativa de recuperação da legitimidade do Estado mediante a transferência de poder do âmbito nacional para o âmbito local. Isso pode agravar ainda mais a crise de legitimação do Estado-Nação, bem como a tribalização da sociedade em comunidades construídas a partir de identidades primárias.

Nesse contexto de enfraquecimento do Estado como financiador da Educação Superior e, ao mesmo tempo, de seu fortalecimento como órgão avaliador e regulador da instituição, surgem dificuldades principalmente para a garantia de legitimidade da universidade. É esse o seu maior desafio na sociedade da era da comunicação, criar outras formas de comunicar e construir seu potencial de formação. As universidades da atualidade sentem o peso do mercado global e os seus efeitos no campo da educação e da cultura. A instauração de novos processos de busca do conhecimento para fazer frente a transformações sociais tão sérias, transforma-se numa urgência para elas e novos objetivos necessitam ser traçados, a partir das reais necessidades da comunidade acadêmica. Assim, outros paradigmas devem articular o global e o local, o que exige das instituições de ensino superior a legitimação de suas funções e/ou de seus papéis enquanto promotora do pensamento superior.

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O mundo das pessoas cresceu e “As fronteiras físicas se esboroaram”, na visão de Dias Sobrinho (2005, p. 145-147), para quem as realidades locais estão expostas aos conflitos, às contradições e às novas ameaças do mundo virtual. Neste contexto, necessidades globais e locais são latentes e o controle sobre a economia desterritorializada praticada no âmbito global da educação superior se torna muito complicado. Neste contexto surge a questão: a quem compete regular? Se essa é uma função do Estado, a ele mesmo cabe o papel de garantir à universidade as condições para que esta legitime sua função social.

O Estado assume o papel de regulador dos resultados da educação superior. A ele não interessa o processo de construção das aprendizagens, e o que ele cobra das instituições é apenas a qualidade do conhecimento prático para atender às exigências da política neoliberal internacional. Ou seja, o Estado precisa atender aos interesses da política global do Banco Mundial, mas como cobrar das instituições aquilo que a ele cabe subsidiar? Já não resta dúvida de que a qualidade da Educação Superior, por exemplo, só pode ser alcançada pelo incremento do ensino, da pesquisa e da extensão. É por esse tripé que a formação do professor e do acadêmico, desenvolvida através de programas e projetos sustentados pelo Estado (se a universidade é pública, se é privada, através das bolsas), pode promover a qualidade das ações da instituição. Investimentos são necessários em bibliotecas, laboratórios, aquisições e manutenção de equipamentos e materiais que sustentam tais programas.

Para sobreviver a essa adversidade como organização do ensino, as Instituições de Ensino Superior (IES) tiveram que criar, no seu interior, programas de cursos pagos. Para fazer complementação salarial, as instituições desenvolveram pesquisas financiadas por empresas e organismos privados e esses sistemas de parcerias puderam subsidiar a montagem e a manutenção de laboratórios, bibliotecas e equipamentos, congressos e simpósios, publicações e bolsas, viagens e cursos no exterior.

Como uma universidade que não é só pública, nem só privada, se avalia? Ela deverá prestar contas ao cidadão ou prestar contas aos financiadores que fazem uso privado da instituição?

Nesse contexto, ao constatar que só a universidade forma os pesquisadores, fica claro que ela está cedendo seus espaços e sua infra-estrutura aos financiadores, e quem, na verdade, se apropria dos resultados, são as fontes de financiamento. Ao avaliar esta situação, Chauí (2001, p. 140) assegura: “[...] esse tipo de escola é visto como modelo de modernidade porque desincumbe o poder público da responsabilidade com os custos da pesquisa e recebe o nome de cooperação entre a universidade e a sociedade civil”. Ou seja, a universidade se sustenta -

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já que a precariedade do financiamento público é constatação - e forma os pesquisadores que vão servir aos interesses capitalistas.

A idéia de universidade prestadora de serviços, que se mostra pois, mais produtiva do que construtiva, serve aos interesses mercadológicos do primeiro mundo de onde absorveu o conceito de qualidade de ensino. Essa idéia de qualidade advinda dos critérios da Organização Mundial do Comércio (OMC) é descrita por Dias Sobrinho (2005, p. 148):

A qualidade passou a ser definida por critérios supranacionais baseados em determinantes econômicos. Estão sendo criados instrumentos supranacionais de controle, tais como agências de acreditação para assegurar os padrões gerais de qualidade. Essa tendência de adoção de instrumentos de controle e de padrões supranacionais tende a adquirir mais força caso a educação venha a ser formalmente definida como serviço regulado pelos acordos firmados no âmbito da Organização Mundial do Comércio.

Na seqüência de seu pensamento, Dias Sobrinho (2005, p.149), apresenta a “acreditação” como um processo capaz de garantir a qualidade de uma instituição ou de um programa educativo. É um modelo de avaliação externa que pode ser feita por agências de outros países. Com o processo de transnacionalização da educação, o Acordo Geral sobre Comércio e Serviços (AGCS), criado em 1994, pode assumir o controle transnacional de regulação e “acreditação” das universidades nos países ligados à Organização Mundial do Comércio (OMC). Todavia, essa possibilidade não garante a qualidade social do ensino, nem da formação dos profissionais que a educação superior coloca na sociedade, sobretudo se se entende que a qualidade está ligada à democratização. A “acreditação”, obviamente, continuará sendo processo de regulação transnacional, que segundo Dias Sobrinho (2005, p.150), atende aos “[...] poderosos interesses que o mercado traz à mesa das negociações”. Então, a “acreditação” é processo de regulação, instrumento de controle e pode até contribuir com a eficácia da avaliação externa, no entanto não deve ser confundida com qualidade em educação.

Se uma universidade legitima-se enquanto instituição do saber socializado pela qualidade dos serviços que presta à sociedade a que serve, o conhecimento filosófico, e científico por ela oferecido não pode transformar-se em mercadoria para ser vendida num mercado que lhe dita as regras.

Ao posicionar-se sobre essa questão, Dias Sobrinho (2005, p. 150), ao esboçar seu entendimento sobre a educação de qualidade, desenha o mapa das implicações do processo:

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A qualidade em educação não pode estar desgarrada das políticas e das finalidades das sociedades em que as instituições educativas realizam suas atividades de formação e de construção do conhecimento e da cidadania. Em outras palavras, a qualidade requer pertinência. Por sua vez, a pertinência social, que se articula com a ética, tem também de ser promotora da justiça. Educação de qualidade é aquela que, ademais de cumprir com rigor os imperativos da ciência, ajuda a construir patamares mais elevados de uma sociedade plural, justa e democrática. Isto se dá, sobretudo, pela produção de ciência e de tecnologia com valor estratégico para cada sociedade e, obviamente, a formação de profissionais e cidadãos que saibam desempenhar bem suas funções de trabalhadores do conhecimento.

Para uma melhor compreensão do termo “qualidade” em educação, é preciso prosseguir na análise de várias fontes que vão do sentido etimológico ao termo que vem do latim qualitate e que significa, segundo Ferreira (1988, p.541), “propriedade, atributo ou condição das coisas ou das pessoas capaz de distingui-las das outras e de lhes determinar a natureza. [...] Filos. Aspecto sensível, e que não pode ser medido, das coisas.”

Para falar do conceito de “qualidade em educação”, Rios (2006, p.68) entende que “o termo qualidade já carrega em sua compreensão uma idéia de algo bom. Isto nos permite entender por que encontramos na maioria dos documentos a referência a uma ‘educação de qualidade’, sinônimo de boa educação”.

Na tentativa de explicitar melhor essa idéia de qualidade em educação, Rios (2006, p.68-69) acrescenta ao termo a idéia de conjunto de atributos como a indicar complexidade, assim:

[...] quando se fala em educação de qualidade, está se pensando em uma série de atributos que teria essa educação. A qualidade, então, não seria um atributo, uma propriedade, mas consistiria num conjunto de atributos, de propriedades que caracterizariam a boa educação. Poderíamos dizer, então, que a Qualidade, com maiúscula, é, na verdade, um conjunto de “qualidades”.

Em Demo (1994, p.18-19) a idéia da “qualidade” em educação ganha um sentido dinâmico e está ligado à idéia de construção: “qualidade é competência construtiva e participativa” e tem seu lugar em todos os níveis de ensino porque fazer qualidade é construir crítica, criatividade e competências para mobilizar recursos em busca da autonomia e da alteridade.

Articular avaliação institucional com esse entendimento de “educação de qualidade” é reconhecer, na conjugação do processo de avaliação externa e interna da instituição, uma oportunidade ímpar de socialização de culturas, de valores e de conhecimentos. Melhor ainda se se adotar o conceito de “qualidade” como Demo (1994, p. 9) assegura: “[...] qualidade, por sua vez, aponta para a dimensão da intensidade. Tem a ver com participação e criação. [...] A

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intensidade da qualidade não é da força, mas da profundidade, da sensibilidade, da criatividade.”

Então, controlar, regular a construção dessa qualidade na universidade certamente passa não só pela avaliação de órgãos externos mas, também, pela avaliação interna da instituição que, no dia-a-dia, constrói programas, processos e resultados na educação superior. A grande luta interna das universidades, hoje, consiste em “aprender a aprender” (Delors, 1998) em se auto-avaliar. Esse é um processo de construção individual e, ao mesmo tempo, coletivo no seio da universidade. Essa busca pela construção da avaliação interna é a mesma busca pela construção da legitimidade da universidade como instituição social.

Como construção individual, Rios (2006, p.120) entende que ela traz as marcas históricas da busca da identidade social:

É no convívio que se estabelece a identidade de cada pessoa, na sociedade. Abrigada nos múltiplos papéis que se desempenham socialmente, a identidade conjuga as características singulares de um indivíduo à circunstância em que ele se encontra, à situação em que ele está. Aparece, assim, como algo construído nos limites da existência social dos sujeitos. Somos o que somos porque estamos numa

determinada circunstância. E não podemos deixar de ressaltar que essa

circunstância se configura de uma determinada maneira porque estamos nela, e a construímos de maneira peculiar. Somos porque estamos, ganhamos nossa identidade enquanto a construímos (grifos da autora).

Os grifos apontados pela autora e as expressões nesta citação, chamam a atenção para a forma de construção da singularidade e da coletividade acadêmica. Se essa similaridade pode se feita, o destaque está no fato de que nenhuma instituição pode construir singularidade sem situar-se num contexto, ou seja, as características de uma instituição só lhe são peculiares se comparadas a outras. Então, a singularidade se faz, também, nas contradições de cada dia, porque ela é algo em permanente construção e numa articulação dinâmica com a alteridade.

No que diz respeito à construção da coletividade, no caso específico da universidade, o processo é semelhante. É algo em constante construção porque o processo, nunca está acabado, pronto ou finito. Ele está se fazendo, onde a construção torna-se infinita na sua finitude. Mostra-se, pois, como movimento constante de relações no contexto ou na situação posta pela instituição no que se refere a sua atuação externa e interna. Nesse caso, com uma complicação a mais, uma vez que põe em jogo os interesses individuais e coletivos variados e de dimensões locais e globais.

Nessa questão de formação da singularidade e da coletividade das universidades Dias Sobrinho (2005, p.156), evidencia uma contradição instalada no interior mesmo das Instituições de Ensino Superior (IES) quando escreve que: “Elas não são universidades, e sim,

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organizações sociais prestadoras de serviços. Agem em conformidade com as tendências do Banco Mundial, e insistem na tese de que a educação superior é fundamental para desenvolver ainda mais a economia global e alavancar o avanço dos países pobres e emergentes”.

Por outro lado, há universidades que são “instituições sociais”. Ou seja, são instituições, de qualidade educativa que não se limitam à racionalidade técnica e instrumental, bem como aos interesses comerciais, mas são concernidas também, e sobretudo, por valores sociais da humanidade e têm compromisso com as condições de vida, o que não combina, portanto, com uma relação de competitividade ou de estrelismo individual.

A universidade prestadora de serviços é oriunda do descompromisso do Estado com o financiamento da Educação Superior enquanto direito, no Brasil, o qual tem início com a Reforma do Estado, definida pela Emenda Constitucional nº 19/98 que propõe a institucionalização dos contratos de gestão que assumem papel central nos processos de privatização e mercantilização dos serviços públicos. Com a proposta de transformar as universidades em “organizações sociais”, essa institucionalização é definida por Bresser Pereira (1995, p. 13) assim:

Organizações sociais serão organizações públicas não-estatais _ mais especificamente fundações de direito privado _ que têm autorização legislativa para cobrar contrato de gestão com o Poder Executivo, e, assim, poder, através do órgão executivo correspondente, fazer parte do orçamento público federal, estadual ou municipal.

A maior gravidade desta questão é que o Estado nem cumpre seu papel como gestor de bolsas e cotas nas organizações de ensino superior, o que aumenta, com certeza, a precariedade dos benefícios por ele prestados a essas instituições, nem administra uma política comprometida com a inclusão social.

Em entrevista ao jornal O Globo, em 06/02/2004, o Ministro Tarso Genro disse que o Ministério da Educação e Cultura (MEC) planeja criar vagas públicas nas universidades particulares e filantrópicas. Ele se referia ao Programa de crédito educativo e do financiamento estudantil, o FIES, que consolida e naturaliza a divisão de classe, ao oferecer aos filhos dos pobres a oportunidade de formação mercadológica que lhe permitam competir numa sociedade de classes, economicamente regulada pela lei do valor e socialmente assentada na extração da mais-valia. Esse fato não só reflete, como fortalece, a proposta de uma reforma da educação superior condizente com a lógica neoliberal para a educação.

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Outra questão grave com relação às organizações sociais2 segundo Chauí (2001), é que a maioria das Instituições de Ensino Superior (IES), privada ou pública, uma vez que concentra sua atuação em atividades sobremaneira lucrativas, oferece cursos pagos e de menor duração, é composta por professores menos qualificados e com menor tempo de dedicação aos estudos e à pesquisa, possui número reduzido de laboratórios, e não possuem bibliotecas. Enfim, nelas não viceja ambiente propício a uma formação de nível superior adequada. O Estado, por sua vez, com sua política de cotas e bolsas, colabora para aumentar o índice de matrículas nas instituições privadas, mas, em contrapartida, não cumpre seu compromisso de pagamento em dia, o que gera constrangimentos para as faculdades e para os estudantes destinatários desses recursos.

Diante desse quadro, a conclusão a que se chega é que os recursos destinados pela política do Estado acabam sustentando os filhos dos pobres nas universidades para continuarem pobres por que não têm, aquilo que por lei lhe é assegurado: ensino, pesquisa e extensão de qualidade. Porém, o que mais constrange neste contexto é verificar como nele vicejam a falta da formação, de reflexão, de criatividade e de crítica, uma vez que não há o combate político à ideologia dominante de cunho capitalista, que propicia esta exclusão.

Se, como observa Chauí (2001, p. 187), a organização social é uma “entidade isolada cujo sucesso e cuja eficácia se medem em termos da gestão de recursos e estratégias de desempenho e cuja articulação com as demais se dá por meio da competição”, no ensino superior, como em toda administração, ela é regida pelas idéias de gestão, planejamento, previsão, controle e êxito. Nesse caso, a instituição oferece um ensino fragmentado, desarticulado da formação social, portanto, sem visão de globalidade e sem efetivas condições de desenvolvimento das atividades de pesquisa em grau significativo.

Nesta mesma linha de pensamento Sguissardi (2000, p.44), afirma que as organizações sociais são “universidades de ensino”, isto é, são universidades de informação e de transmissão dos conteúdos curriculares que, instituídas com força de lei, não recebem nenhuma garantia do poder público para a manutenção da qualidade e do compromisso com a coletividade e o bem comum.

Na esteira dos conceitos de Chauí (2001) e Sguissardi (2000), anteriormente citados, Casagrande (2005, p.6) explica essa situação quando mostra que “não compete à organização

2 A expressão “Organizações social” é aqui entendida conforme o conceito de Chauí (2001). São as faculdades

ou organizações prestadoras de serviços que, como tal, pretendem gerir seu espaço e tempo particulares aceitando como dado bruto sua inserção num dos pólos da divisão social, e seu alvo não é responder às contradições, e sim vencer a competição com seus supostos iguais.

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discutir ou questionar sua própria existência, sua função, seu lugar no interior das lutas de classe”, uma vez que ela se orienta por objetivos radicalmente capitalistas.

A propósito, creiamos ser oportuno acrescentar mais elementos para essa reflexão, discutindo o comportamento do capitalismo atual, tal como o descreve Chauí (2001, p.188):

A forma atual do capitalismo se caracteriza pela fragmentação de todas as esferas da vida social, partindo da fragmentação da produção, da dispersão espacial e temporal do trabalho, da destruição dos referenciais que balizaram a identidade de classe e as formas de lutas de classes. A sociedade aparece como uma rede móvel, instável, efêmera de organizações particulares definidas por estratégias particulares e programas particulares, competindo entre si. Sociedade e Natureza são reabsorvidas uma na outra e uma pela outra porque ambas deixaram de ser um princípio interno de estruturação e diferenciação das ações naturais e humanas para se tornarem, abstratamente, “meio ambiente” ; e “meio ambiente” instável, fluido, permeado por um espaço e um tempo virtuais que nos afastam de qualquer densidade material; “meio ambiente” perigoso, ameaçador e ameaçado, que deve ser gerido, programado, planejado e controlado por estratégias de intervenção tecnológica e jogos de poder. Por isso mesmo, a permanência de uma organização depende muito pouco de sua estrutura interna e muito mais de sua capacidade de adaptar-se celeremente a mudanças rápidas da superfície do “meio ambiente”. Donde o interesse pela idéia de flexibilidade, que indica a capacidade adaptativa a mudanças contínuas e inesperadas. A organização pertence à ordem biológica da plasticidade do comportamento adaptativo.

Essas considerações de Chauí (2001, p.188) sobre o capitalismo e a atuação da organização no seu contexto social podem revelar as características singulares e coletivas das atuais universidades operacionais. O esmaecimento da autonomia acadêmica, da alteridade da instituição e a degradação interna na área da docência, da pesquisa e da extensão, ao nível local, trazem, com certeza, grandes prejuízos para a formação global do acadêmico. Concretamente, esta nova forma de fazer a educação superior sem dúvida indica duas coisas: a primeira, a entrada em ação de mais um mecanismo de manutenção do poder neoliberal; a segunda, a observação de que o capitalismo está se reorganizando, estrategicamente, para manter-se como sistema dominante, fortalecendo fragmentação econômica, social, política e a efemeridade do tempo, ambas comprometedoras das estruturas duradouras dos sentimentos, dos valores, do caráter e da moral.

Nessa nova realidade, o ensino transformou-se em uma mercadoria a serviço do mercado, e o professor, um prestador de serviços para as instituições de ensino que se identificam como “empreendedoras” e usam o discurso da transformação do universitário em um empreendedor.

Essa preocupação com o empreendedorismo da organização, é visível a olho nu, com a criação da função do professor horista, que recebe pela quantidade de horas de ensino dadas.

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Esse aumento insano de horas-aula sem o compromisso com a pesquisa por parte do acadêmico e do professor, compromete a formação de ambos, enquanto cidadãos.

Enfim, a organização social fornecedora de conhecimento caracteriza-se como uma organização operacional voltada para dentro de si mesma, o que não significa, segundo Chauí (2001, p.187), “um retorno a si, e sim, antes, uma perda de si mesma”.

A perda do rigor científico, da intelectualidade dos professores e estudantes destas instituições as conduz, pois, ao descrédito político e social. A formação técnica vazia de humanismo, ou seja, a formação sem significado para a vida, pela pura formação, se fecha no círculo da competitividade, e, sob a lei do “que vença o melhor”, a política social dos tempos atuais não valoriza o indivíduo que tem formação crítica, reflexiva e criadora. Essa formação, contudo, não se faz apenas nas universidades que ministram o ensino técnico-científico. Ela ocorre também e de forma concomitante na formação humanística, o que justifica o porquê da Reforma do Ensino Superior ter que se comprometer com o aumento de verbas para a pesquisa, também nas áreas das ciências humanas.

Neste aspecto, observa-se pouco ou nenhum avanço de fato, já que os recursos destinados à Ciência e Tecnologia, no Brasil, têm sido cada vez mais escassos, principalmente para a chamada área social. Na falta deles, as universidades vão, aos poucos, comprometendo-se com as empresas, através das parcerias, em busca dos recursos necessários a sua sobrevivência. Conseqüentemente, vão perdendo sua autonomia e significado como instituição social formadora do princípio da alteridade. É o que se busca entender no próximo item.

1.2. A instituição social: legitimação na construção da alteridade

A universidade, enquanto instituição social, continua ameaçada na proposta de Reforma do governo Lula, por que, uma vez ferida em seus princípios de alteridade, enfraquece-se na sua legitimidade como instituição de “boa educação” (RIOS,2006). Conforme histórico apresentado na Exposição de Motivos do Anteprojeto de Lei da Reforma da Educação Superior, no seu Art.3º, escrito pelo ex-ministro da educação, Tarso Genro (2005, p.3-4), a universidade brasileira, construída na segunda metade do século XX, postula legalmente o equilíbrio entre a qualidade acadêmica e o compromisso social de democratização da sociedade. Essa prerrogativa da universidade brasileira vem assim expressa no texto:

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No Brasil, a universidade se formou tardiamente na primeira metade do século XX, embora tenha havido, durante o império, escolas e faculdades profissionais. É nesse contexto histórico-institucional que a Reforma Universitária de Córdoba se tornou a principal referência para definir a identidade da universidade latino-americana baseada nos seguintes princípios: autonomia universitária, gestão democrática, gratuidade de ensino superior e compromisso social. Hoje, a construção de uma universidade pública, democratizada e comprometida com um projeto de nação, guarda sua inspiração básica nessas conquistas históricas, embora tenhamos assistido posteriormente a uma diversificação institucional da educação superior. Tal dinâmica, porém, incluindo a expansão da educação superior privada, não nos deve afastar da missão fundadora da universidade latino-americana. Atualmente, o grande desafio é o de construir um sistema de educação superior que realize o equilíbrio entre qualidade acadêmica e compromisso social. Sem a combinação desses objetivos institucionais, a universidade perderia sua identidade originária como instituição social estratégica para o desenvolvimento cultural, científico e tecnológico e comprometido com o projeto de uma sociedade democrática mais justa.

Os princípios da autonomia das Instituições de Ensino Superior, citados no texto, parecem fragilizados na prática do Estado, quando se trata do compromisso com o social, já que, a estas instituições faltam os recursos necessários à pesquisa, ao ensino de qualidade e à extensão.

Por conseguinte, marcadas pelas políticas neoliberais, orientadas por interesses unicamente voltados à cultura de avaliação de resultados, as Instituições de Ensino Superior no Brasil, clamam por melhores condições de ensino, de pesquisa e de extensão.

Salvo engano, é o que o texto do INEP define sobre o significado do SINAES (2005, p.21): “Daí ser prioridade implantar uma verdadeira e sólida cultura avaliativa que traga como resultado a melhoria da qualidade da educação superior”. Neste contexto, então, como representante do poder estatal:

O novo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), em plena implementação sob a coordenação da CONAES e a execução operacional do INEP, tornou-se um instrumento necessário para promover a vinculação entre qualidade acadêmica e compromisso social. A avaliação deve decorrer de um processo abrangente por meio da integração de três instrumentos: a avaliação das instituições (interna e externa); o exame nacional dos estudantes (ENADE) e a avaliação dos cursos de graduação.

No bojo dessa compreensão, o entendimento de qualidade acadêmica fica reduzido aos parâmetros da avaliação de resultados, o que evidencia o objetivo do Estado em regular e controlar o sistema de ensino superior. Não seria, também, objetivo do Estado promover e assegurar a qualidade acadêmica garantindo a pesquisa e a extensão em função do atendimento das demandas da sociedade e o avanço dos conhecimentos científicos, tecnológicos e humanísticos? Por que não o faz? Esta é a pergunta.

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A singularidade da universidade, então, com certeza se constrói por este caminho: garantir a sua autonomia, legitimada pela construção da alteridade, tendo em vista que o equilíbrio dinâmico entre a expansão da qualidade acadêmico-científica e o compromisso com a sociedade são indissociáveis e intransponíveis. Por isso mesmo é que, entendida como corpo instituído, a instituição universidade, terá que dar conta de duas funções: a formativa e a educativa.

A função formativa que é mais objetiva e, por isso, técnica no sentido do ensino acadêmico, se institui no ensino superior pela ação pedagógica, administrativa, quantitativa e formal. Assim, essa função formativa é ritualística e está fortemente acentuada nas micro-relações internas e externas do estabelecimento ao fazer-se instituição.

Concomitante a essa construção formativa, a constatação da outra função: a educativa, se institui, também de forma inerente à universidade como instituição, pois é condição básica da participação. Trata-se da dimensão subjetiva da educação, a de formação da consciência para a alteridade do ser humano que, ao formar-se profissionalmente, precisa formar-se Ser coletivo, Homem social, cidadão, portanto, predestinado a viver em grupo. Nesta linha de pensamento, a formação não pode ser vista e entendida apenas com finalidade técnica, pois à educação cabe construir os meios e os fins de uma vida. A formação, além de técnica, precisa dar-se, também, no âmbito das relações e das atuações dos sujeitos acadêmicos.

Ao considerar essas duas funções da Educação Superior, Demo (1994, p.14) relacionando-as às dimensões da qualidade, assim caracteriza-as:

Qualidade formal significa a habilidade de manejar meios, instrumentos, forma,

técnicas, procedimentos diante dos desafios do desenvolvimento. Entre eles, ressaltam manejo e produção de conhecimento. São o expediente primordial de inovação.

Qualidade política quer dizer a competência do sujeito em termos de se fazer e de

fazer história diante dos fins históricos da sociedade humana. É condição básica da participação. Dirige-se a fins, valores e conteúdos. É naturalmente ideológica, porque definição política é a sua marca, perdendo qualidade, se ideologia se reduzir a justificações desumanas e a partidarismos obtusos. Inclui ética na política.

Essa distinção das duas funções feita pelo autor acima citado, reflete bem as características de ambas, a função formativa é formal e a educativa é política. No entanto, a divisão é apenas didática, pois, não se pode segregar as duas, porque não são duas dimensões estanques, mas faces do mesmo todo.

Assim, construir ou formar o Homem na sua subjetividade é, também, objetivo fundamental da universidade como instituição social. Se as perguntas endereçadas a essa instituição são, formar quem, para quê e para quem? As respostas poderiam ser as seguintes:

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