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TD ATG 1981 II vol.

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(1)

,. ' '

-COLON DZACAO,

->

-PENETRACAO DO CAPITAL

..:.

A

E

DEPENDENCIA (ANGOLA)

II PARTE

TESE PARA 0 DOUTORAMENTO

APRESENTADA POR

ADELINO A. TORRES GUIMARAES

NO

INSTITUTO SUPERIOR DE ECONOMIA

LISBOA

(2)

I N T R 0 D U

9

i

0

Este trabalho refere-se ~ situagao colonial de Angola.

e, parcialmente, de

s.

Tome e Principe, durante o primeiro quar·~·

tel do seculo XX, mas recorre sempre que necessaria a elementor;

comparatives dos periodos anterior e posterior.

Como tema central e fio condutor, pretendemos demonstr~~

que, embora sa verifique a exist@ncia de capital comercial e de

uma estratificagao social em classes, nao se encontra

implanta-da em Angola uma economia capitalista propriamente dita, na au-·

s@ncia das suas componentes fundamentais: trabalho assalariado

"livrett e mercado interno.

Ness as condigoes, definimos a economia colonial angol<:1.-~

na dos anos 20 deste seculo como uma economia de explora.2a~ .. d,e.

tipo semi-esclavagista, virada essencialmente para a exploragao

de materias-primas e alimentada pelo trabalho escravizado e/ou

servil.

Ate ao fim do periodo de que nos ocupamos, nenhuma. re~·

forma econ6mica ou legislativa, quer monarquica quer republicana,

teve repercussoes praticas profundas no sentido de mudar essas

condigoes. Pelo contrario, com algumas excepgoes episodicas,

to-das as nreformas" mais nao foram do que a confirma.gao desses

con-diciona.mentos retrogrades. 0 fen6meno deve-se a causas complexas1

conjuntura.is e estruturais, que s6 praticamente a partir dos anos

(3)

114

-Na. medida em que as sua.s raizes nao sao a.penas de

indo·-le estri tamente econ6mica, justifica-se su.blinharmos uma vez

mais que entendemos esta investigagao como urn trabalho de

Eco-nomia que utiliza outras disoiplinas num esp:lrito

interdiscipli-.E§:!., dentro dos limites de urn quadro, 'balvez ainda .incompleto,

mas que pretende ser epistemo16gica e teorioamente rigoroso.

A secgao 1.1. do primeiro capitulo precisa dois

concei-tos operat6rios cuja distingao previa e imprescindivel: capital.

e cap~talismo. Complementarmente, para melhor delimitar o

contex-to onde se inscrevem outras problematicas, destacam-se algumas

nogoes-chaves do colonialismo, como as dualidades socio-culturais

"superioridade/inferioridade" e "civiliza.do/:J:laO civilizado"~

0 problema do trabalho "livre" e sua reprodugao

e

objec-to de estudo na secgao 1.2. Ai podemos consta.tar, numa primeira

aborda.gem, que 0 "trabalho livre" (assalariado) nao teve

pra.tica-~

mente nenhuma expressa.o no primeiro quartel do seculo XX. Uma

das formas da sua reprodugao, o aparelho escolar, estava exclu-·

sivamente vira.da para os interesses das "elites'• coloniais. As

populagoes a~ricanas serao reservadas posteriormente algumas

es-colas ditas nprofissionais" cujo mediocre funcionamente e

alea-t6rio e ineficaz: o baixo nivel 'de desenvolvimento da economia

colonial e o tipo de exploragao exercido, tornam desnecessaria

uma preparagao/adaptagao minima da mao-de-obra.

Nas secgoes 1. 3. e 1.4. observa-se a. passagem da

aboli-gao do trafico ~ aboligao da escravatura e desta ao trabalho 19li-·

(4)

e a realidade econ6mica e social. A escravatura perde a

"legi-timidade" tradicional e surgem novaf3 classificagoes do trabalho

(servigal, obrigatorio, compelido, correccional, "livre"). Mas

o problema de ~1ndo permanece: do seculo XIX ao seculo XX, da

Monarquia A Republica, a forma de produgao esclavagista

e

o

principal motor da economia colonial em Angola e o trabalho

assalariado livre e inexistente ou excepoional.

Na secgao

1.5.

salienta-se que a perman@ncia da forma

de produgao esclavagista dependia menos de uma qualquer

politi-ca. voluntarista do que da impossibilidade de viabilizar urn sis~

tema "liberal" (com todos os seus pressupostos teoricos e

impl:i.-cagoes praticas) na aus@ncia total de urn dinamismo £.~i talista

mesmo nas zonas litorais~

Por outro lado, os circuitos comerciais do sertao eram

ainda em pleno seculo XX controlados pelos africanos, que se

moviam num qua.dro ·tecnologico proprio, aparentemente "elementa:r"

mas compatfvel com as necessidades que o meio lhes impU!U1a.

Entre as instituigoes autoctones e o "proto-ca.pitalismo"

-esclavagista ou semi--esclavagista. europeu na.o havia portanto

lu-gar para. a pratica. de "traba.lho assala.ria.do livre", o que tornou

-~

mais violento o confronto entre os dois tipos de organizagao

so-cia.l. A supremacia. da. economia colonia.lista como economia de

ex-plora.gao, so podia conseguir-se

a

custa. da. rufna das socieda.des

africa.nas: nega.ndo os seus va.lores, destruturando a sua. ordem

economica especifica e reduzindo finalmente o "homem-su,jei"to" A

condigao de "indigena-objecto".

(5)

116

-0 capitulo 2 destina-se tao somente a fornecer algumas

informagoes complementares sobre a exist@ncia de metodos

escla

-vagistas, mais como regra do que como excepga.o, a partir doe;

Acordaos do Tribunal da Relagao de Luanda. Fonte

inquestionavel-mente autorizada que apresenta ainda o interesse de, tanto

quan-to sabemos, nunca ter sido utilizada pelos investigadores- Neste

capitulo reaparecem os conflitos entre burguesia do sertao e

burguesia do litoral bern como o importante tema da "exporta.gao"

de trabalhadores de Angola para S.Tome e Principe.

0 capitulo 3

e

mais especialmente consagrado ~ analise

da. estrutura econ6mica. de Angola, vista atraves da mercadoria. e

da moeda.

-Na. secgao 3.1.. examina.mos as duas principa.is mercador:ia.s

da epoca, 0 alcool e 0 a.c;U.car, bern como 0 significado da

"reci-clagem" do aparelho produtivo na passagem da produgao do prime1-·

ro para o segundo.

Ao estudarmos o alcool como mercadoria e sobretudo como

moeda-merca.doria, encontramos-·lhe uma dimensao econ6mica. e soeio-·

16gica ~ primeira vista insuspeita, conf'irmando-se por outro

la-do que a moeda fiduciaria, apesar da exist@ncia de um Banco

emis-sor desde 1865, ocupa um lugar quase insignificante na

circula

-gao interna..

A par do alcool existem ainda outras moedas-mercadorias

bern caracteriza.das. A secgao 3.2. poe em evid@ncia as respectivas

dif'erenciagoes do ponto de vista econ6mico e socia.le

Para alem disso, a diferenc;a instrumental entre as

(6)

~

secgao 3. 3. Ao atribu.irmos ao alcool, como moeda-mercad_oria, um

pa.pel essencial, refor9amos ao mesmo tempo a demonstra.gao sabre

o caracter "rudimentar" da economia.de explora9ao no princ:Lpio

do seculo.

Na secgao

3.4.

vemos que as diferentes camadas da

bur-guesia colonial tinham processes igualmente distintos de

contro-lar ou influencia.:r os circuitos "monetarios". Em tais

circuns-t~ncias, para a burguesia do sertao empenhada num conflito de

sobreviv@ncia com o gran•ie capital urbano (do literal), o alcool

assumiu. uma fun9ao especial que ja nada tinha a ver com a sua

qua-lidade de simples mercadoria.

Finalmente, no capitulo 4 anotamos, em sintese, alguns

aspectos do projecto econ6mico de certos sectores dirigentes da

lll> Republica, em particular atraves da obra desenvolvida por Nor-·

ton de Matos.

AJ3 tentativas deste para romper o equilibria esta,gnado

e estagnante de urn colonialismo arcaico e introduzir em Angola

uma din~mica de tipo capitalista, encontraram fortes

resist~n-cia,s, em especial ju.,"lto das pequ.enas empresa.s cuja viabilidade

repousava sobre o trabalho gratuito dos africanos.

Faltando-lhe na Metr6pole o apoio (talvez decisive) de

uma burguesia industrial ainda demasiado fraca, sem meios

tecni-cos, econ6micos e humanos adequados, os planes ambiciosos de

Norton de Matos acaba.ram por fracassar. Entre outras mul tiplas

-razoes, eles revelaram-se sem duvida extempor~eos e

(7)

118

-Extempor~neOS porque, lla.S condi9oes da epoca, SUpl.tnhalll

rupt~a.s que nem os colonos pod.ia.m aceitar, nem o governo de

Lisboa ousava assumir.

Contradi t6rios na am<Hgama rural ismo/ industrializa9ao

ou pequena propried.ade/grande propriedade, e tambem no

desfaza-mento entre o discurso id.eol6gico humanista e "moderno" do Alto

Comissario e uma actua<;ao "realista." nem sempre isenta de

com-promissos com as pratica.s esclavagistas do trabalho compelido,

(8)

119

-IJ: PA.RTE

1. CAPITAL, "GAPITALISMO" E_.TRA..BALHO NA V IRAC]g:!I_J>..9 SI!;CULO

1.1. ~ QUE.S,TOE3 P~ELIMIN~

Antes de entrarmos propria.mente na analise da prol)lema-·

tica econ6mica e socio-econ6mica angolana do principia do secu···

~

lo

xx,

e

necessaria - por motivos quanta mais nao seja

episte-mol6gicos - fazer duas precisoes: a primeira refere-se ao

pro-blema da definigao do conceito de "capitalismo" e sua aplicagao,

bern como ~ distingao importante entre ~ e E_aE.~_alis~£·

A segunda diz respeito ao enquadramento do termo

"clas-se" ligado, neste trabalho, ~ estrutura socioprofissional e ~

correspondente estratificagao social em Angola. Paralelamente,

procede-se ~ cr:f.tica de alguns conceitos que na sinta.xe

colonia-lista t~m urn conteudo sem~ntico al tamente discutivel ( "superio-·

ridade/inferioridade", "nao civilizado").

Apresentamos na primeira parte alguns elementos referen-·

tes ao seculo XIX q_ue nos permit:iram. apreciar nao s6 o caracter

assaz tardio da ocupagao colonial portugnesa em Angola9 mas

tam-bern certos veiculos e processes da penetragao do capital na

(9)

120

-Esta integra9ao col6nias/Metr6pole ou, mais

precisamen-te nesprecisamen-te caso, Angola/Portugal, com a consecuenprecisamen-te acumula.9ao do

capital na Metr6pole, nao representa sem duvida uma novid0.de

te6rica168, embora, no que diz respeito

~s

col6nias portuguesas,

ainda haja urn enorme campo a investiga.r, apesar das

contribui-1 f d t . 'lt . . 1 169

9oes, a gumas un amen a~s, que nos u ~mos anos v~eram a ume •

Essas invest igagoes sao, e terao de continuar a ser,

interdisci·-plinares, porq_ue uma visao moderna e cientifica dos problemas

assim o exige.

Por outro lado, se ate agora nos referimos ~ "lenta

pe-netragao da economia de mercado" e ~ "acumulagao do capital

co-merciaP' em beneficio das classes possedentes (colonial e

metro-politana), abstivemo-nos de falar de capitalismo propriamente

di-to em Angola como sistema instituido, conceidi-to que, a nosso ver,

poe questoes complexas e exige precau9oes metodol6gicas.

(168) "( ••• ) Les tresors erlorques hors de l'Europe par le travail force des indig~nes reduits en esclavage, par la concussion, le pillage et le meurtre, refluaient ~ la m~re-patrie pottr y fonc-tionner comme capital". Cf. MARX 1960-1971, lQ, III, p. 196.

( 169) Por exemplo, alem de invest igadores es·crangeiros como C. Bo-XER, BIRMINGHAM, G. BENDER, H. PCSSINGER, F. W. HEIMER, R. PELISSIER, W. G. CLARENCE-SMITH, etc., autores portugueses como Eduardo de Sousa Ferreira, Alfredo Margarido, Jose Capela, Valen-tim Alexandre, Carlos Alberto l\'Iedeiros, .M. Villaverde Cabral e Miriam Halpern Pereira, bern como, evidentemente, Vitorino M. Go-dinho, J. Borges de Macedo, sem falar de autores conhecidos das decadas anteriores a 1974: Marcelo Caete.no, Adriano Moreira, Hen-rique Galvao que, independentemente do acord.o ou desacordo que se possa ter COm OS SeUS pontes de vista, nao podem ser de modo al-gum ignorados. Entre OS autores africanos e necessario seguir OS

(10)

em riq~eza usuraria ou, quanta muito, na perpetuagao do capital

comercial e nao no capitalismo170• Por outras palavras, a

pre-senga de capital, como nota Ruggiero Romanol7l, nao significa

automaticamente capi talismo. 0 ponto principal para se poder

fa.-lar de capitalismo sao as rela9oes internas de produgao e nao

1 t d d . t "b . - . 1172 M ·t

as re agoes ex ernas e 1s r1 u1gao comerc1a • u1 os

au-tores173, a proposito tanto da Africa como da America do Sul,

nao dispensaram talvez a este problema toda a atengao que ele

mereceria - sobretudo para o periodo do seculo XVI ao seculo

XIX - abordando as questoes em termos de "economia capitalista"

(por exemplo Gunder Frank no caso da America do Sul), criteria

que esta lange de fazer a unanimidade dos investigadores. A

tese de Ruggiero Romano parece-nos aqui particularmente

suges-tiva. De facto:

"Se havia capitalismo no seculo XVI, com mais forte

razao o haveria hoje. Se, pelo contrario, existiam no seculo XVI alguns capitais, mas nao capitalismo,

isso pode significar, mas nao obrigatoriamente, que

nao ha capitalismo actualmente ou entao que ele esta

misturado com fortes sobreviv~ncias de uma outra

coi-sa (a que poderiamos chamar feuda1ismo?). POr o pro-blema doutro modo e decidir previamente a qualquer

(170) Cf. ROMANO 1972, pp. 126-127

(171) Ibd. (172) Ibd.

(11)

122

-in.vestigac;ao q_ue as desgra9as da America central e

meridional de ontem e de hoje devem imputar-se ao

capitalismo constitui uma simplifica9ao, inexacta do ponto de vista da honestidade cientifica e

inu-til ao nivel do combate politico"l74.

A refer~ncia ao canitalismo nas colonias africanas,

em particular nas que estavam sob dominio portugtt~s, tambem

exige precauc;oes metodol6gicas. Karl Marx, ao debruc;ar-se

so-bre esta problematica, afirmava ja. na segunda rnetade do

se--culo XIX:

" ( ••• ) A formac;ao do capital s6 pode realizar-se na

base da circula9ao mercantil (que inclui a.

circula-9ao monetaria), por conseguinte a urn nivel comercial

bastante elevado; inversamente a produc;ao e a

circu-1ac;ao mercantis nao pressupoem de maneira alguma 0

modo de produc;ao capitalista ( ••• )"l75

Mais tarde, referindo-se de novo ao assunto, escrevia:

n( ••• ) Wakefield descobriu nas col6nias q_ue a posse

de dinheiro, de subsist@ncias, de maq_uinas e doutros

meios de produ9ao, nao faz de um homem urn capitalista,

a menos q_ue haja urn certo complemento, que e o

assala-riado, urn outro homem numa palavra, for9ado a vender-se voluntariamente. Descobriu assim q_ue em de ser uma

coi-sa, o capital e uma rela<;ao social entre pessoas,

rela-t , l . t ~d. d . ' 1 7 6

9ao que se es aoe ece por ~n erme ~o as co~sas' •

(174) ROMANO 1972, pag. 126.

(175) MARX 1972, pag. 450.

(12)

A verdadeira questao

e,

pais, saber como e quando esse

capital comercial pede cria.r uma economia capitalista stricto

sensa, dado que:

"para se falar de capitalismo

e

necessaria pelo menos haver urn mercado generalizado com base no salario"l77.

Esta uti1izag~o - por vezes polemica - do conceito de

cani ta1ismo (para ja, nao falar noutros como "c1asse",

"imperia-lismo", etc.) merece a nosso ver uma chamada de ateng~o sobre

o desejavel rigor epistemologico de todo o discurso que se

pre-tende cientifico.

Sem querer alongar demasiadamente as cita9oes,

relembre-mos todavia os esforgos nesse sentido de Max ;nJeber em :::;conomia

e Sociedade178 ou na sua

~ica

onde sublinha a proposito:

livre:

(177) (178)

(179) (180)

"Nos tempos modernos foi perten9a do Ocidente uma

outra forma de capitalismo: a organiza9ao racional

capita1ista do trabalho (formalmente) livre de que

nao se encontra..m em mais parte alguma senao vagos

esbo9os"179•

Sabre a presenga indissociave1 do trabalho assalariado

"Todas est as part icularidades do capi ta1ismo ocidenta1

s6 receberam a sua significagao moderna, pe1a sua

asso-ciagao com a orga.11izagao capi talista do trabalho ( ••• ).

0 ca1culo exacto, fundamento de tudo 0 resto, so

e

pos-s:lvel na base do trabalho livre"180•

Ro:r.wro

1972, pag. 61 (sublinhado por ROKiUW).

WEBER 197L

(13)

- 124 -·

Para termos uma ideia urn pouco mais clara da

penetra-gao da "economia de mere ado" em Angola. e, concomi tanternente, da.s

suas conseq_u~ncias sobre as estruturas tradicionais africanas

(tomadas no sentido amplo do termo) importa adoptar urn metodo

de analise' mesmo relativamen.te precario ou discutivel' que nos

permi ta construir um rnodelo coeren-te e oper2.t6rio.

Assi::n, nesta 2§ parte, u"tilizando e prolongando os

da-dos do seculo XIX, entra.r-se-a no seculo XX tor:~ando como fulcro

duas q_uestoes principais e cor:~plernentares: a evolugao do regime

de trabalho e a formagao do mercado interno •

• •

A segunda questao preliminar e a que se refere ~

divi-sa.o socio-profissional correlacionada com a estratificagao ern

classes, pararnetros de devem ser determinados sucinta mas tao

rigorosamente quanta possivel. Infelizmente o lQ Censo geral da

populagao de Angola data apenas de 1940 e dispomos de

pouquissi-mos elementos estatisticos referentes ao primeiro quartel deste

seculo. Contudo o Censo de 1940 podera dar-nos, por

extrapola-gao, algumas indicagoes gerais sobre a estrutura social dos anos

30 e mesmo ate sobre o periodo imediatamente anterior.

Bern entendido, nao pretendemos entrar na discussao

epistemol6gico-formal sobre o conceito de "classe". Ficamos nos

limi tes daquilo que nos interessa imedie.tamente, ou se ja apenas

(14)

181 trabalho •

Consideremos como adquirid.a a tese de Max Heber

segun-do a qual "a burguesi.a, como estasegun-do, existiu antes segun-do

clesenvol-. t d f • f • t d d . • t 1' I 182

v~men o a orma espec~· ~camen e mo erna o capJ. a J.smo' •

Deixando de lado, por demasiado complicada para o nosso

proposito, a famosa tentativa de teoriza9ao de Heber e a sua

d.i-visao em "classes de posse" e "classes de produgao", com as

res-+. • bd. . ~ 18 3 d d . t. . 1 h. 't

pecv~vas su J.V~soes , po emos a mJ. J.r, como s:~.mp es 1po ese

de trabalho, que a burguesia compreende as classes superiores,

as classes medias e mesmo, eventualmente, certas camadas das

nclasses baixas". :I!: pelo menos assim que vemos a estrutura social

do colonialismo em Angola neste periodo.

Para evitar ambiguidades na terminologia, empregamos o

conceito de camada como uma simples subdivisao da "classe" e o

conceito de fracxao como uma subdivisao da camad~.

Em Angola, os individuos brancos constituem a componente

principal dessa burguesia (mas 0 criteria nao

e

apenas 0 da

rique-za), encontrando-se ainda nas diversas camadas e fracgoes da classe

(181) Sobre a questao do conceito de classe de que nao nos podemos ocupar aqui, vd. por exemplo: ALTHUSSER, Teoria das classes sociais, Porto, 1976; ALT1ITBSER, Poder politico e classes sociais do Estado capitalista, Porto, 1971; R. ARON, La lutte de classes, Paris, 1964; R. DAHRENDORF, Classes et conflits de classes dans la societe industrielle, Paris, 1972; G. GURVITCH, As classes so-ciais, Lisboa, 1966; l'i"EBER 1971: vd. em particular pp. 309-317.

(182) HEBER 1967, pag. 22.

(183) WEBER 1971, pp. 31C-3ll.

I

(15)

· 126

-media uma minoria de mestigos e, por vezes, alguns neg;ros.

Todos eles se situam juridicamente n:=t categoria oficial

dos chamados "civilizados" e estao, em rela9ao ~ grande massa da

populagao dita "nao civilizada." (a.fricana), numa posigao de

ev:i-dente "superioridade" ( comentaremos mais adiante est a no9ao).

Essa vantagem pode ser de ordem econ6mica, juridica, social, de

instrugao ou mesmo psicossociol6gica (o pequeno colona

analfa-beto que trata 0 africano por tu mesmo se este e mais instruido).

Essas camadas que optamos por chamar globalmente burp;uesas,

com-partilham a varies niveis e com 6pticas eve.ntualmente diversas,

certos modelos culturais ("civiliza<;ao europeia", "progresso",

familiaridade empirica com a tecnologia moderna), adoptam

simbo-los (vestuario, moeda fiduciaria) e normas de conduta (no campo

da irioral, do (re )conhecimento das leis), etc. Numa palavra, apesar

de todas as diferengas e desniveis, podemos talvez considerar

que entre os elementos aglutinadores, o trago que aparece como

mais caracteristico da "burguesia colonial" (mesmo nas camadas

mais baixas da classe mediae tambem da "classe baixa")

e

0 que

se refere ~ distanciagao (no sentido psico16gico e social) em

re-lagao ~ populagao africana dita "nao civilizada".

Isto significa que o conceito de burguesia colonial

apli-cado ~ sociedade de que nos ocupamos, apresenta cam.biantes

par-ticulares onde a componente econ6mica nao

e

necessaria~ente (ou

pelo menos exclusivamente) o elemento fundamental.

Uma vez feita esta precisao, voltemo-nos para a estrutura

(16)

socio-profissional dos anos 30 suge:dda pelo Cenr.;;o Geral

de 1940184•

Vemos no quad.ro nil 6 (pag. seguinte) todas as

activi-dades econ6micas da epoca, pelo menos nas zonas urbanas .. As

in-formagoes quanto ~s zonas rurais devem ser utilizadas com mais

reservas.

A populagao esta dividida em grupos somaticos: brancos,

mestigos e negros (ignoramos a categoria "outros tipos" cujo

nu.-mero era insignificante). As colunas 1, 2, 3 e 4 de cada grupo

racial indicam o numero de indiv:l.duos (na populagao di ta

''civili-zada'' e.:x:clusivamente) exercendo uma profissao, respectivamente:

1) Por conta do Est ado, etc.

2) Por conta de empresas

3) Por conta propria

E ainda:

4) Membros da fami.lia au.:x:iliando o respective chefe.

0 quadro nQ

6

necessita ser articulado com outros

elemen-tos de s:l.ntese para maier operacionalidade das informagoes

esta-tisticas. Elaboramos assim, a partir clo Censo de 1940, os

qua-dros n2 7, 8, 9, 10 e 11 que apresentaremos mais adie.nte.

Constata-se em primeiro lugar o escasso numero de

afri-canos di tos "civilizeydos" que tambem, e talvez mais precisamente,

(184) 0 censo de 1940 e 0 primeiro levantamento estat:Lstico que

Oferece garant iaS m:LnimaS • Em CertOS aSpeCtOS

e

ffiaiS detalha- I

(17)

LEGENDA DAS COLUNAS 1,2,3 c ~ (ao lado):

(N~mero de individuos e~ercendo uma profiss~o)

1 - Por conta do Estado,dos Muni.cipios, Corpos, Corpora~oes

e Colectividades diversas.

2 - For conta de empresas ou de ~articulares.

3 Por conta ~rOpria. .

4 -Membra da fareilia auxiliando o respective chefe.

I'xabal.hos aevricol as ••••••••••••••..••...•••••••••••••••••••••••••••••••••••

Ieee a e Ca:;.a • ~ ... • •• • •. ~ •·• ... • .... • •. • • .. • • • • • • • • • • • • Blx:pl ora9ao tie minas ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••.•••••••• 8xp1 orag~o tie p;; d:re iraa •••••••••••..•.•.•.••••••••••••••••••••••••••••••••• 8xpl o:ra<;_;ao dB r::a:riuhas ••• , •••....•...•.•••.••••••••••••••••••.••••••••••• Indlist:rias texteis . . . . IndUs trias de cou.ros .e pales . . . •.· . . . . lndl5etrias ~1s n1acie iran ... ., .... ·. I.nrl.ustriae de metaluxgia . . . • •••••• • •• Industrias oor&micas ••.•••••••••••••.•••••••••••••••••••••••••••••••••••••

IndUs trias dB produtos ou.imicos e ar,8J. oeos ••.•••.•••••••••••••••••••••••••• Inzhlstr:i.as :relativas ao ·fab2'ico ci.e generos al:i.menticios . . . .. lndustrias dB vastuaxio e cal9a<io . . . • •• • • •• • • • • • •• • • • • • • • • • • .. • • IndUs trias de rnobiJ i ,\rio ••...••••••.••• • .••••••• • •. • ••• • ••••• • •.••• • •. lndlletrias relativas a constru<.;eo civil •••.••.•••••••••.•••..••••••••••••• IndUs trias rel ativas a constr-Lly;;;o <i.e me ios de trans r•orte ••.••••••••••••••• Indus trias :relativae a produ9;0 € transmiss;o dB for9aS fisicaB . . . .. IndUs trias relativas·. as letras:, artes e ciGnoiae . . . . Industria de tabacos . . . • • • •• •• • • • • • IndUe tria dB papel ••••••••••••••••••••••••••• • • •• • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • · • • Indus trias n~o especificadae nos grupos .anterioreEr .••••••••••••••••••••••••• :'x·,(:i.llsportes maritimes e fluviais •..•.• .,. .... 1o . . . .. . . .

i'rananortes em caminho dB ferro . . . .

r~ansportes por autom6vel •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• Corre ios:, telegrafos e tel~ fones ••••••••••••.•••••••••••••••••••••••••••••• Indlistrias de .trans porte nao espe ci:fioada.s . . . .. Bancos, ·estabelecimentos de credito, aeguros ••••••••••••••••••••••••••••••• Corretagens e comissOes ···~···6···•••••••••••

Comercio de madeiras •••••••••••••••••••••••••••• • ••• • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • .. Comercio dB metais • , •••••••••••••••••••••••••••••••••.• • ••• •. • •• • • • • • • • • • • • Comercio de produtos quimicos ••••••••••••••••••.••.•••••••••••• • • ••••• • •••• Hoteis, :restaurantes, tabernas . . . . Comercio de generos alimenticios . . . • ... .. Comercio de artigos de vestuario e cal9ado ••••••••••••••••••••••••••••••••• Comercio de m6veis . . . • •••••• • ... • •••• • Comercio dB oonstru9oes •••••••••••••••••••••••••••••• • •• •• • · • • • • • • • • • • • • • • • PEQUENO COMERCIO LOCAL •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• • •••••••••••• Comercio de combustive is ••••••••...••••.••••.•.••••• • •.•..•••••.• • ••• • • • • • • Comercio dB objectos relatives as letras., artes e ciEl'ncias ... . Comercio nao especificado nos grupoB anteriores •••••••••••••••••••••••••••• Jl'JR!tA ARi•iADA •••••••••••••••••••••••••• • ••• •• • ••••• • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • F\JNCION ARIOS DO EST ADO E DOS CORNS .fj),.;INlS'l'liATI VOS •••••••••••••• • ••••• • ••• Cultoe ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••. •••• • ••••••••• ••· ••••••••••• Profissoes judiciaries ••••••••••••••••••••••••••••••••• • • .••. • • • • • • • • • • • • • • Saude publica ••••••••••••••••••••••••••••••••••.••••.• • • • •.•• • • • • • • • • • • • • • • Profess ores • , ••••••••• , •••••••• , •••••.•.••••••••••••••••••••••••••••••••••• Profissoes 1 iberais rel ativas as ci~ncias, 1etras e artes •••• , . . . . Peseoal vivendo exclusivamente doe seus rendimentos . . . • ... .. Se:r.rigos domesticos, inc1uindo criado~ e criada.s . . . . Individuos definitivamente sem ocupa<;ao . . . •. •• ... •• .•• • ••• • .. .. Profiesoe£ e ocupa<;oes n;i.o abrangidas em qualquer dos gru:;Jos anteriores ••••

'POTAL

Q.UADRO NO 6

.ANGOLA: JDRTLA(;AC EXEi<CENDO mtt. PRO!"ISSAO, SEGlJJ:'DO 0 GRUKl l'ROFISSION.A.L (.Ceneo 1940)

1

60 3 45 2 1 3 7 147 2 31 22 1 16 336 42 154 3 2 1443 1712 393 63 329 260 12 6 310 5411

BRAN

COS

21314

680 114 52 1 6 1 18 l7 210 18 8 54 201 40 313 16 93 18 9 3 159 285 252 229 3 1 156 10 20 ~, 7 10 7 2 2604 3 2 2 4 7 67 20 21 3B 1121 6923 1393 190 22 2 3 l 4 14 42 17 3 18 270 39 240 14 23 2 282 32 164 1 l 2 2 2 ~8 7 7 2 2320 2 l3 35 43 33 22 66 317 640 6348 92 6 4 25 3 4 1 l 3 2 2 l 5 95 1 1 4 2 7 259 MESTt<;:OS

1

2l314

8 I 182

39 1 4 ll " .)

16 1 201

3

1

10

6 234

2 30 31 155

4 3

19 73

43 76

1

38

..) I .J.L; 55 55

20 201

50 15

- 4

3 38

13 320 30 1 l 1 2 9 4 543 l 3

11

I

4

82 40

41 6

1

6 l 165

235 l 256

354 42 1 l 23 1 297 12 78 2 4 2 24 4 37 l 3 1 8 124 1 l 6 4 2 18 544

66 i i 50 4 2 5 l 19 l 2 1 2 l 3 4~· 3 l l l l

I

:::::

...

; I···

1 . . .

NEGROS

112

15 19 4 l7 6 103 1 19 35 1 4 39 17 41 134 228 251 4 219 7? 74 ll63 d3 99 21 l 17 128 5 7 363 76 314 3 25 69 3 l7 '. '--50 86 19 4 6 2 J.

I

~

I

L

I

l70

l

-~ I

12

I

7°:

I

I

3C7 2642

3

746 39 23 20 2 3 535 16

27:

I

5

I

18

l

l:

I

1

I

- I

I

r~

I

L~ I ' I

- I - I

l

6

I

": s i

.: I

I - I

I

2~

I

' 6 !

- I

2'·

I

4G;

122

2~73

(18)

se poderiam classificar de ~ltt~os. Eles nao re-presentam mais

do q_ue

o,

66

%

da populagao negra tota.l, o que, entre outrt:~.s

coi-sas, vem confirmar o caracter extrernamente tardio da efectiva ocu-·

~

pe.gao colonial port.ugu.esa.

0 quadro nQ 6 inclui apenas OS numerOS brutos (embora

sintetisa.dos) da populagao exercendo uma profissao, com

exclu-sao dos individuos que vivem a cargo da.queles.

No quadro nQ 8 (pag. 130) incluimos, em sintese, as

duas componentes. Partimos da hipotese que a maioria, senao a

totalidade dos individuos da coluna 2 (que vivem a cargo daqueles

que exercem uma profissao)

e

constituida par criangas e donas de

casa. Cs desempregados deveriam normalmente ser incluidos na

populagao activa mas, estando confundidos com os invalidos e

respectivas familias (num total de 1 967 pessoas), consideramos

para simplificar que a populagao activa "civilizada" se

encon-tra apenas definida na coluna 1 (individuos exercendo uma

pro-fissao), enquanto que a populagao inactiva "civilizada" figura

na coluna 2 (individuos que vivem a cargo dos primeiros). 0

"erro"

e

relativamente insignificante e OS resultados guardam

a sua validade.

Agregando a.s actividades profissionais par sectores,

construimos o quadro n9 9 (pag. 131). Dentro deste fizemos uma

subdivisao no sector terciario destacando os quatro ramos com

mais tra.balhadores :

Pequeno comercio

Forgas Armadas

Funcionalismo

(19)

-

130-QUADHO NO

7

POPULAQAO DE ANGOLA (1910)

BRANCOS i>'::Ei.S T I

g

OS NEGROS

- Popu1agao "civilizada"

....

44 o83 23 244 24 221

- Populagao "nao civi1izada".

-

4 791 3 641 6o8

TOTAL ••••••••• 44 o83 28 035 3 665 829

FONTE: Censo Geral da Popu1agao de Angola - 1940.

GRUPOS

BRA.1"'iCOS MESTIQOS NEGROS

Total

QUADRO NQ 8

POPULACAO "CIVILIZADA" ACTIV A

POR GRUPOS SOMATICOS

Nlimero de individuos H1imero de individuos recenseados exercendo recenseados e

viven-uma profissao do a cargo dos que

trabalham

(1) (2)

18 941 25 142

5 354 17 890

7 619 16 602

31 914 59 634

rroTAL

91 548

3 646 399

3 737 947

TOTAL

44 o83 23 244 24 221

91 548

FONTE: Dados elaborados a partir do Censo de 1940 (Angola)

NOTA: A coluna (1) congrega os individuos que exercem uma profissao por conta do Estado, de empresas particulares, por conta propria, assim como individuos que auxiliam o respective chefe de familia.

(20)

(WADRO NR 9

Nillnero de individuos assa1ariados e por conta propria, exercendo uma profissao (popu1a9ao "civilizad.a")

BR.A.NCOS ME3TIQOS

1) SECTOR PRIM!RIO •••••• 2 624 685

2) SECTOR SECUND!RIO •••• 2 455 1 440

3) SECTOR TERCIARIO ••••• 13 862 3 229

-TOTAL •••••• 18 941 5 354

S.UBDDliSAO DO SECTOR TERCIARIO

(Os

4 principais ramos):

- Pequeno comercio misto 5 019 712

- Forga Armada 1 443 13

- Funcionarios 1 712 320

- Servigos domesticos

(inc1uindo criados) 363 726

TOTAL •••••• 8 537 1 771

FONTE: Censo Gera1 d.a Popula9ao de .~-mgo1a (1940)

NEGROS TOTAIJ

988 4 297

2 176 6 071

4 455 21 485

7 619 31 853

235 5 966

134 1 590

228 2 260

1 183 2 272

(21)

1J~-se de imedi2.t0 que OS colonos sao particularmente

numerosos no pequeno comercio local e os africanos nos servigos

domesticos (como criados essencialmente).

Se articularmos os q_uadros nQ 9 (pag. 131) e n2 10 (pag.

133), apercebemo-nos o_ue nestes guatro ra.mos de actividade nao

directamente produtiva, os brancos (8 537 indiv:Lduos)

represen-tam 39,8

%

do total da populagao activa do sector terciario

(21 485 individuos).

Por outro lado, esses 8 537 brancos ocupam 45

%

dos postos de traba1ho "reservados" ~ populagao act iva branca.

No quadro nQ

9

indica-se que so os brancos empregados

no funciona1ismo e nas forqas armadas representam quase 17

%

do

total da populagao activa branca. ~ essa caracteristica da

colo-niza9ao portuguesa em .Angola que ja fazia dizer a Fra.ncisco

Tra.n-coso, na sua Memoria apresentada durante os trabalhos da

Comis-sao E:x:ecutiva da Confer§ncia de Paz (1920) que

"so se colonizou Angola com torrentes de funcionarios

publicos, incompetentes muitos deles, e aumentando

extraordinariamente os encargos da Provincia sem nada

produzirem de util. Angola foi sempre em geral urn covil

de parasitas ( ••• ). Ainda hoje a pecha infelizmente se

- 185

nao perdeu" •

Deixamos natura1mente a responsabilidade da afirmagao

ao seu autor, mas e1e era considerado lli~ perfeito conhecedor dos

problemas de Angola.

(22)

QUADHO JI{Q 10

Percentagem da populagao activ:;J. "civilizada" nos 4 mais importantes ramos do sector terciirio

(1940)

BRANCffi ~T.ES'rrgos NlflGROS

(1) ( 2) (1) (2) (1) (2)

- Pequeno comercio misto 23,4 26,4 3,3 13,4 1,9

3,1

- For9as Armadas

...

6,7

7,6 0,1 0,2 o,6 1,8

- E"..mcionarios • • • • • • • fl II 8,0 9,0 1,5 6,o 1,1 3,3

- Servigos domesticos

..

_L]__ 1,9 __ _3,4 13,7 ....5..0_._ 1.5..t.2_

TOTAL DOS 4 R.A .. MOS

.

,

..

39,8 45,0 8,2 33,4 8,3 23,4

FONTE: Dados elaborados a partir do Quadro nQ 9 LEGENDA: COLUN.AS

da" activa total Por exemp1o: Os 5

nQ 9) representam sector terciario.

1 : Percentagens em re1ac;ao ~ popu1a9ao "civiliza-brancos, mestigos e negros) do sector terciario, 019 brancos do pequeno comercio misto (cf. quadro 23,4

%

dos 21 485 indiv:iduos de todas 3.S rac;as do

COLUN.AS (2):Percentagens em re1ac;ao ~ popu1ac;ao "civilizada" activa do seu proprio grupo som<Hico. Por exemp1o: os mesmos 5 019 brancos do pequeno comercio representam 26,7% dos 18 941 brancos actives dos tr@s sectores de actividade (primario, secundirio e ter-ciirio).

Sector Primario Sector Secundario Sector Terciario

TOTAL DOS ASS ALAR I ADOS

ANGOLA (1940)

POPULAQAO ACTDJ A ASSALJI .... t1IA.DA ( "civili-zados11 de todos os gru-pos somaticos)

1 286 3 639 16 074

20 999

PE1i.CEHTAGENS EN RELA-CAO A POPULARELA-CAO TOTAL

C"civilizado~" e "nao

oivilizados" dos 3 gru-1 pos som<H ioos)

0,03

%

o,

09

0,4

0,5 d ;o

(23)

134

-Do mesmo modo, se olho..rmos, ainda no quadro nQ 10 (

p<i-gina 133), para a popu1agao africana negra "civilizada," e activ~

do sector terciario, vemos que 15,5

%

estao empregados como

criados nos servigos domesticos. Os 235 africanos negros que

figuram no "pequeno comercio misto local" nao ul trapassam 3' 1 ~;,

dessa mesma camada socio-profissional: trata-se em geral df?- ven~·

dedores ambulantes.

Passando ao quadro n2 11 (pag. 133) verificamos que a

populagao assalariada empregada ("civilizada") corresponde a

0,5

%

da populagao total (3 737 947 individuos) o que da uma

ideia da fraquissima implantagao do trabalho assalariado.

Recor-damos que estes dados se referem a 1940.

m

legitime deduzir que

no periodo 1900-1925 era ainda mais fraco o numero de

assalaria-dos. Se fosse possivel separa.r OS africanos dos colones, e mais

do que provavel que o nUmero de africanos assa1ariados em 1900-25

devia ser praticamente nulo. 0 trabalho assalariado "livre" nao

tinha qua1quer expressao para os africanos no primeiro quartel do

secu1o XX ..

No quadro n2 12 (pag. 135), correlacionando-o alias com

o quadro n2 13 (pag. 135 igua1mente), constatamos que o namero de

pessoas traba1hando por conta propria e, por seu turno,

conside-rave1 em relagao ~ populagao activa "civilizada". Se tivessemos

alguma d1ivida o q_uadro n2 13 comprovaria esse facto. Neste ultimo

quadro (pag. 135) vemos que no sector primario o n1imero de

tra-balhadores por "empresario"

e

de 0,46 ou seja menos de urn tra-ba,lhador assalariado por cada 2 empresarios. l\fo sector

secunda.-rio a proporgao e de 1,57 assalariados par empresasecunda.-rio e so no

(24)

em-- Sector

-

Sector - Sector

~UADRO IJ!:! 12

(1940)

Popu1agao "civilizada" ac·tiva traba1hando por con·ta pr6pria

BRA.NCOS II!:ESTIQO..S NEGHOS

- 3ector Primario 1 610 397 785

- Sector Secundario 969 444 899

- Sector Terciario 3 769 820 689

----TCYrAL 6 348 1 661 2 373

FONTE: Dados e1aborados a partir do quadro n9 6.

QUADRO N9 13

Nf.JM.ERO DE TRA.BAL.HADORES .A...SSALA.lt I ADOS

POR EMPRES.~IO (todos os grupos etnicos) (1940)

N11MERO DE

EMPRES.!RICB Ntl"MERO DE

(individuos TRA.!3ALHADORES

traba1hando ASSALARIADOS

por conta propria)

Primario 2 792 1 286

secu..11.dario 2 312 3 639

Terciario 5 278 16 074

Numero de assa1ariados por

empresario

0,46 1,57 3,04

(25)

136

-presario. E so atingimos este montante porque es·bao i.ncluidos

neste sector OS funcionarios do IDstado,

as

Forgas Armadas,

etc. Se fosse possivel separar os assalariados da.s empresas

(as estatisticas nao permitem detalhar) a proporgao de

assala-riados par empresa.rio privado seria, no terciario, muito

infe-rior a 3,04.

Se estes elementos definem a situagao econ6mica nos

comegos da 2~ guerra mundial, e evidente que, com mais forte

razao, poderemos concluir que 0 primeiro quartel do seculo se

caracteriza pela inexist~ncia de uma economia capitalista

propriamente dita e pela presenga de uma "simples" economia de

exploraoao, fornecedora de materias-primas ~ economia

metropo-litana e mundial, dependente e subdesenvolvida, onde o ''trabalho

assalariado" e excepgao e o tra.balho escra.vizado ou

semi-escravi-zado sob as mais diversas formas, a regra •

Dissemos que uma das caracteristicas da burguesia

colo-nial, independentemente da posigao na hierarquia social, era o

facto de se definir como "superior" em relagao

a

popula.gao

afri-ca.na di ta "nao civilizada".

Nao temos bern entendido a pretensao de nos aventurarmos

no campo da antropologia. cultural, mas parece-nos necessaria fa.zer

pelo menos refer§ncia a certas nogoes-chaves presentes em todo

0 discurso colonialista., quer ele seja monarq_uico, republica.do ou

do "Estado Novo", e ~s quais nao basta opar um contra-discurso

(26)

se segue.

Qu~nto a nos a nogao de "super:ioridade" (da civilizagao

colonizadora) contraposta ~ ":i.nferiorida.de" admitida a ~lriori do

"nao civilizado" (africano)'

e

nao somente uma oposigao fidicia

mas um false problema.

Em primeiro lugar, porque a categoria de "nao

civiliza-do" e urn abuse sem~ntico: e-se sempre civilizado em relagao a um

modele determinado. A civilizagao africana integra valores, normas

e modelos sui generis (visiveis na escuHura e na literatura oral,

por exemplo).

A nao exist~ncia de escrita (ou pe1o menos a convicgao

des sa "nao exist~ncia"), entendendo por escri ta a comunicagao

gra.-fica da voca1izagao (T. Obenga), facilitou durante muito tempo

a consolidagao de preconceitos etnocentristas por demais

polemi-cos. Alias, mesmo este problema da exist~ncia ou nao de escrita,

como linha divis6ria da historicidade das civi1izagoes africanas,

e, ele proprio, urn problema controverso em que nos abstemos de

in-. 186

terv~r •

(186) Sabre a problematica da "exist~ncia ou nao exist@ncia de es-cri tan e suas repercussoes, vd. eventua1mente: POIRIER (Jean), Ethnologie Generale, Paris, Gallimard, 1968, pp. 1439, 1444-1460* Este autor considera que devem sem recusadas como escritas as gra-fias sudanesas ou os nsimbolos mnemotecnicos amerindios" (p.l446). 0 ponto de vista contrario e defendido pelo professor congol~s,

Theophile Obenga ao afirmar: "Quanta aos negros africanos decre-ta-se demasiado facilmente que eles ''preferiram" a palavra ~ ~s­ crita, querendo dizer com isso que os povos da Africa Negra sao "povos sem escrita". Esse julga~ento deve ser recusado: ele nao repousa sobre nenhuma observagao dos factos" (p. 360) e lamenta que ainda hoje todos "os clas dos etn6logos e soci61ogos africa-nistas ocidentais, particularmente os a:fricaafrica-nistas anglo-sax6nicos

( ••• ) sigam as ,teorias ul trapassadas de Levy-Bruhl ( ••• ) ".

(27)

1.38

-Na perspectiva colonialista porem, a visao

e

sempre de

fora para dentro (ignorgncia etno-cultural) e, sobretudo, de

cima para baixo (domina9ao/superioridade). Desde logo o

coloni-zador impoe a logica do seu proprio discurso civilizacional.

Por outro lado, a nogao de ''superioridade"

e

rigorosa-mente vazia de sentido, porque a verdadeira

(?)

superioridade

pressuporia pelo menos urn discurso bi-univoco comparative,

ba-seado num dialogo previo.

Ora a coloniza9ao aplicou precisamente urn discurso

uni

-YQ££ onde havia, para utilizar uma expressao de L. de Broglie~

"uma. correspond~ncia univoca entre o mundo e a imagem que

faze-:-mos dele". Por outras palavras, o colonizador projectou no

co-lonizado uma imagem arbitrariamente deformada, identificou-o a

ela e reduziu o homem africano ~ condi9ao uniforme e

culturalmen-te amorfa de "indigena". Negando o direito ~ identidade (na

di-ferenQa especifica propria) a coloniza9a0 "mostrou" mas naO

"de-monstrou".

Por urn lado mostrou, quando muito, que os africanos (a

maioria) nao tinham adoptado o seu leque de refer@ncias culturais

e por isso eram considerados "nao civilizados", o que, como

ar-~

gumento,

e

sem o menor alcance e ao fim e ao cabo nao passa de

uma tautologia.

Por outro lado, ignorando quase totalmente as culturas

africanas (sao conhecidas as limita9oes da Antropologia, e muito

em particular da "lmtropologia" portuguesa) e colocando-se numa

Optica parcial e parcelar para "avaliar" OS pOVOS dominados, nao

(28)

cultu-~

ras por nao ter encontrado os argumentos cientificos para tal

(veja-se a indig~ncia da A.ntropologia fisica muito em voga

ha poucos anos ainda).

~ ~

Na verdade, parece ev:i.dente que o problema nao se -poe

em termos de superioridade ou inferioridade (axiomas gastos), mas

em termos de diferenoa.

Ignorando ou recusando essa diferenQa, o colonialismo

nao podia naturalmente reconhece-la.

Nio estavam portanto reunidas as condi9oes para uma

intercomunicabilidade entre as culturas (europeia e africanas) e

fal tavam instrument as para dar ~ tese etnocentrista a

inclispen-savel credibilidade cientifica, o que obrigou a construir urn

dis-curso unila.teral que formulava as perguntas e impunha as

respos-tas. Era, em ultima analise, 0 "argumento" da forya.

Desde logo, as dualidades "superior/infer:i,or",

"civili-zado/nao civilizado" revelavam-se, em termos epistemol6gicos,

meras figuras de ret6rioa.

?.~esmo a conhecida questao da "inferioridade"

tecnol6gi·-ca dos povos afritecnol6gi·-canos nao

e

assim tao simples como por vezes

aparenta. :Marshall Sahlins observou justamente que a tecnologia

nao se apreende apenas nem principalmente do ponto de vista. das

propriedades fisicas. ~Iuito mais importc:mte

e

a _Eelas;ao entre o

utilizador e 0 utensilio (e nao considerando apenas 0 utensflio

(29)

quali-- 140

-dade hist6rica duma tecnologia"

187.

Sempre que as necessidades os obrigaram, os povos ditos

"primitives" encontraram as respostas adequadas ~ resolugao dos

problemas que a economia ou o meio natural lhes impunha. "Os

po-vos mais primitives do ponto de vista da complexidade cultural

em geral, criaram obras-primas tecnicas sem igual"

188

diz Sahlins.

E relembra que as armadilhas Bochimanes que foram desmontadas e

enviad.as para Londres e Nova Iorque, ainda hoje esperam, "nas

caves de centenas de museus" quem seja capaz de as montar de

no--vo, tal a sua complexidade

189 •

• •

~

Este secgao tentou, antes de mais, adoptar urn criterio

coerente no emprego, por vezes indiscriminado, de conceitos

fun-damentais. Em particular, a ligagao de causa a efeito entre

capitalismo. e colonia1ismo em Angola como caracteristica

a-tempo-ral, parece-nos urn erro de tecria e uma distorgao da realidade.

(187)

SAHLINS

1976,

pag. 123

(188)

Ibd.

(189)

Sabre esta curiosa questao~ vd. eventualmente

REDINHA 1968a,

(30)

A analise cientifica, nomeadamente no campo econc.Smico, nad.a ganha.

com a utilizagao abusiva e ax:iomatica de postulad.os nao

verifi-cados.,

A distin9ao entre 9_~pi tal e capi talismo permi tiu

intro-duzir um primeiro elemento de verifica9ao da hip6tese segu.ndo a

qual nem no seculo XIX nem mesmo no primeiro quartel do seculo

actual se pode falar com propriedade de ,9apitalismo em Angola.

Na sec9ao seguinte veremos alguns aspectos referentes

ao factor trabalho e, indirectamente, ao merca.do interno, a fim

(31)

- 142 -·

1.2. 0 TRABALHO E SUA REPRODUQAO

Entendemos por "reprod.ugao do trabalho", nao so a forma

como 0 sistema. econ6mico assegu.ra a substi tuigao da sua.

mao-de--obra ao longo das sucessivas geragoes, mas tambem as condic;oes

-

-

""

de qualificagao, remuneragao e nivel de vida que sao oferecidas

aos tra.balhadores e que traduzem, nos seus mul tiplos aspectos

(saude, assist@ncia, instrugao, etc.) a 16gica e os mecanismos·

que regem esse sistema.

0 aparelho escolar e justamente urn dos revela.dores da

maneira como a organizagao social responde ~ suas pr6prias

ne-cessidades de funcionamento e acumulagao. Justifica-se portanto

que lhe fagamos refer@ncia particular.

Uma economia ?apitalista obedece a uma din~ica

comple-xa e exige uma Escola que assegure em maior ou menor grau a

adap·-tagao da mao-de-obra a habitos, ritmos e exig@ncias radicalmente

diferentes dos adoptados ancestralmente nas sociedades rurais

afri-canas.

Uma economia de exploraQao utilizando trabalho

escravi-zado ou semi-escraviescravi-zado nao esta condicionada pelos mesmos

impe-rativos; de "eficacia", nem pela observ~ncia de regras que ditam

a operacionalidade e viabilidade do modelo anterior. Ela pode

con-tentar-se com uma mao-de-obra de baixo nivel de qualificagao, sem

necessidade de adaptagao "tecnica" na sua passagem da relativa

(32)

para. ser rentavel, que a mao-de-obra seja facilmente substitu:f.vel

e que as des pes as de reprodu9ao ( da. nascen9a ~ idad.e act iva e os

encargos na doen9a e na velhice) estejam, na sua totalidade ou

maior parte, a cargo da economia domestica africana, Nessas

con-di9oes, a Escola dirige-se exclusivamente ~ "elite" colonial.

Do estadio de desenvolvimento do aparelho escolax

depen-de portanto - pelo menos em gra.ndepen-de parte a resposta ~

per-gunta: ~ual e 0 sistema econ6mico dominante?

• •

Urn dos elementos que caracteriza a situa9ao de Angola

e a fei9ao essencialmente comercial da sua pol:f.tica

colonizado-ra, antes mesmo da explora9ao mineira ou agricola, ate pelo menos

-~ 2~ guerra mundial. Poucas excep9oes houve para tentar sair da

\"retina", No seculo XVIII o governo de Francisco Inoc~ncio de

S ousa ou 1 C t . nh o1 d. 1gno represen an e t t d a a m1n1s ra9ao pom a 1na d . . t - b 1" l90 1

criou as instala9oes siderUrgicas de Nova Oeiras em Angola e

ten-tau dar novas orienta9oes ~ politica oficial naq_uele territorio.

Esfor9o notavel mas sem continuidade, que nao resistiu ~ retirada

para a Metr6pole do seu inspirador,

No seculo

XIX

os liberais chefiados pelo Marqu@s de

Sa

da

(33)

144

-Bandeira tiveram uma acgao de relevo e nao sem consequ@ncias

sobre a questao do trabalho em Angola, ·como veremos no capitulo

seguinte, mas os resultados concretes ficaram muito aquem das

in-ten<;oes e o problema do trabalho "livre" manter-se-a de

ac·tua-lidade ate ao fim da ocupa9ao colonial nos a.nos

1970.

J'a no

se·-culo XX, Paiva Couceiro, Norton de !V~atos, Vicente Ferreira e ate

mesmo Freitas Morna, tentaram a titulos diversos, introduzir

no-vas dinamicas no processo de "desenvolvimento" de Angola, mas

tambem est as' mormente nos seus aspectos mais posi tivos' nao

ti-veram repercussoes decisivas. As incapacidades, hesitagoes,

defi-ci~ncias dos periodos anteriores, sucedeu o marasma dos anos

1928-1961

cujo mecanisme a revolta nacionalista de

1961

iria

par-cia.lmente quebrar.

-A inoper~ncia ou nao continuidade das esporadicas

poli-ticas "desenvolvimentistas" em Angola nao

e,

todavia., devida' a

urn qualquer fatalismo indefinivel, nem separavel das condi9oes

concretas da sociedade portuguesa metropolitana., a.s quais se

ins-crevem, por sua vez, na estrutura das rela9oes internacionais.

Como afirmou III. Villaverde Cabral, demasiadas vezes se

tern adjectivado, nas analises do desenvolvimento do capitalismo

em Portugal, sabre as lutas politicas e sobre o concei to de

"po-vo" que apa:rece de permeio, assim como se tern confundido por

ve-zes o desenvolvimento das forgas produt~vas e o desenvolvimento

das relagoes d~ produQao. Queremos dizer com isto que o

capitalis-mo nao se caracteriza somente pela fabrica moderna de grandes

di-mensoes, mas tambem se encontra expresso na pequena industria ou

manufactura, onde as rela<;oes de produ<;ao se definem na dualidade

"capital/trabalho", dualidade articulada em func;ao do salario, da

(34)

deter-~inando a acumula9ao deste, fez-se em proveito das classes

domi-nantes portuguesas (ao mesmo tempo na :Mei;r6pole e nas col6nias)

o que explica a exploragao e mesmo a rniseria da grande massa dos

trabalhadores portugueses no primeiro quartel do seculo

xx

191•

A explora.gao sistematica de parte da mao-de-obra (neste

caso os angolanos) est

a

patente nos proprios relat6rios e

monogra.-~

fias oficiais de todos os tempos, nao se podendo p6r em duvida,

para rnuitos deles, enquad.rando-os bern entendido nas epocas

respec-tivas, nem a nobreza da sinceridade nem a lucidez.

Esta dupla exploragao dos trabalhadores portugueses e

angolanos e justamente a contrapartida da acumulagao de que

bene-ficiou a classe dorninante192• 0 baixo nivel de vida em Portugal

nao se explica unicamente por condicionarnentos geograficos ou

fal·-ta de recursos~ Alias Portugal nao e apenas e exclusivamente urn

-"pais agrario", desprovido de materias-primas e com "vocagao

ru-ralista". In urn preconceito ao qual nem os mais brilhantes

te6ri-cos como Oliveira Martins, Bazilio Teles ou Elvino de Brito

esca·-param, como Albano de Sousa pOs oportunarnente em evid~ncia: "A

fal-ta de estudo previa no nosso sub-solo negando-nos a exist~ncia de

-"' - t~ ~

d'

. d

j.. • • n

193

t .

.1. erro e carvao, en ao on l.n J.ces J.n us·url.aJ.s: , es 1veram na

origem dessa interpretagao da Economia Portuguesa.

Contudo, desde

1907

Eug~ne

Ackerrnarut194 mostrou que

Por-(191)

Vd. BAPTISTA

1965

(192) A1illRADE

1926

(193)

SOUSA

1930

(35)

vol-. '

- 1~6

-tugal -Ginha todas e.s condigoes para se tornar, eventual mente,

uma media pot@ncia industrial a.o mesmo ·titulo, por exemplo, que

a Belgica ou a Holanda. Ainda hoje essa ideia algo negativista

se mantem em certos sectores da opiniao.

No que se refere a Angola, tun dos veiculos mais

reve-ladores para apreciar a dupla questao da penetra9ao do capital e

da depend~ncia, e o modo como o capital submeteu o trabalho

pro-d.utivo ate ao limite maximo que lhe foi permitido pelas

condi-c;oes politicas e economicas. Essa apropriagao do "trabalho

exce-dente" foi aos seus. extr@mos com a escravatura e o trabalho

for-c;ado, compelido ou mesmo "contratado"~ Que 0 trabalho "livre" nao

tenha tido praticamente expressao ate A 2a. guerra mundial, revela

que a colonia permaneceu num estadio atrazado de economia de

ex-Elora2ao e que pelo me nos ate essa epoca (a nosso ver ate mesmo

fins·. da decada de 50) " falar de implantagao de

aos nao se pode

ca-Eitalismo .. Jr] evidente que nao se trata de uma simples questao de

terminologia.

Se a colonizagao ja e, em si, urn fenomeno de graves

con-sequ@ncias para o colonizado, sobre a forma de economia de

explo-ragao e uma tenaz esmagadora das populagoes africana~ e so a

re-lativa fraqueza (militar, policial, politica) pode temperar os

excessos que lhe sao inerentes19

5.

Sob tal pressao (todos OS

au-tores concord~~) a sociedade tradicional viu declinar a

natalida-de, aumentar o envelhecimento demografico, desmoronar a

organiza-gao costumeira e instalar-se em muitos povos o desenraizamento e

(195) Vd. por exemplo: FL'N'ON (Frantz), Les damm~s de la terr.e_,

(36)

a aliena9ao/ acul tu.t'a9ao. As refer~ncias culturais perdern-se, os

conceitos choca.rn-se. Por exemplo a propria no9ao de trabalho

e

heterogenea porq_ue (como no trabalho for9ado, compelido ou

"con-tratado") nao corresponde nem a economia tradicional nem ~

eco-nomia de tipo ocidental moderno. As migra9oes, directa ou

indi-rectamente for9adas, nao s6 perturbam a vida e a saude das

po-pula.9oes africanas, aumenta.ndo a mortalidade, mas desorganizam

a disciplina social e econ6mica dos meios originarios, "mesmo

quando as empresas ou patroes procuram combater as causas· de

tais males"

196 •

Augusto Casimiro da urn exemplo elucidative: em

1923

a Companhia do A9ucar de Angola recrutou na regiao norte

(distrito do Congo) 500 trabalhadores. "Os cuidados no

recruta-mento, a forma como fora.rn tratados durante o periodo de trabalho

sob fiscaliza9ao repetida do proprio governador do Congo, o

re-patriamen:to ao fim do contrato, em condi9oes de agrado para os

repatriados - nao evi taram porem a morte de quase 50

%

deles:.

Causas: a transplantagao do planalto para a regiao do Baixo

Cu-nene, a for9ada altera9ao do seu regime alimentar durante as

primeiras semanas (as chuvas intensas tinham destruido tro9os

da linha de Malange, e a alimentagao dos homens que devia ter

por base o luco, :farinha de mandioca, teve de ser alterada. Os

sobreviventes consideraram as mortes como uma fatalidade

inevi-tavel, sem culpa de ninguem. Encontrei-os no caminho de regresso.

Vinham satisfeitos. Capazes de voltar ap6s o merecido repouso e

de animar outros trabalhadores no Dande. Mas 250 mortos em 500

(37)

148

-balha.dores exige que pensemos no caso em termos de evi tar

se-19M melha.ntes" 1•

A "colonizag;;;:o ci.vilizadora'' percorre varias etapas na

tra_"lsculturagao, do conflito 11 batalha (finalmente perdida.) pela

integra9ao/ assimila9ao. Batalha perdida porque uma tal

"integra·-9ao" implicava, para se tornar possivel - independentemente de

ser desejavel ou nao uma proposta de restrutura9ao cultural,

econ6mica e social das popula9oes aut6ctones, o que a classe

do-minante colonial nunca tentou seriarnente. Um des seus principais

par~metros que foi a propria refer~ncia ao trabalho d.o branco, a

comparaoao com 0 branco (factor que nao aparece na nogao de

tra-balho na &nopa), longe de desempenhar um papel positive,

agra-vou ainda mais a "aliena9ao" do trabalhador aut6ctone sempre

con-front ado com um discurso de que ele nao podia "compreender" (no

sentido r,.reberiano) na medida em que o seu _96di82_ era outre.

Dai muitas das dificu1dades de leitura. da ''coloniza.gao

portuguesa", q_11estao onde se articulam, no mini:-no, Economia,

liis--t6ria, Socio1ogia e Etno1ogia,

Por outro 1ado, a necessidade de observar uma rigorosa

distanciayE£ na analise das situayoes, ponderando OS discursos

vind.os de varies lados' invariaveis mono logos que se chocam ou se

(38)

cruzam sem se encontrarem, torna a objectividade ci(mtifica urn

criteria imperative que nos esforgamos par seguir sem nunca ter

a certeza de o ter alcangado, como ~ natural. N~o faltam, ~

cer-to, OS documentOS (pelo menOS do lado COlonial. Ja 0 mesmO naO

acontece do lado africano infelizmente). Eles consti"buem, no

caso portugu~s, uma massa impressionante.

Ha

inumeras obras que

podem ser consideradas de qualidade, ma.s em muitas delas

e

pre-ciso ainda peneirar a fraseologia, descodificar o conteudo ideo-·

16gico, interligar os problemas "colando" bocados disperses. A

tarefa de abrir urn pequeno caminho em tal ema.ranhado nao

e

fa-oil. Mais ainda se, recusando os maniqueismos simplistas, se

pre-tende menos "julgar" as intengoes ou os aetas do que analisar as

problematicas porque se entende que o objective fundamental da

investigagao ~, antes de mais, contribuir com o maier rigor

posu-sivel para a exacta compreensao dos ''processes pelos quais o

fe-n6meno se formou" (ROTITANO 1972) •

Fechado este part;nteses, vel tames .~ questao do trabalho

!!: bern verdade que "Portugal, ao longo de, hist6ria

colo-nial e ate me ados do seculo XX, nunco. aprovei tau as

possibilida-des que a possessao das colonias lhe oferecia para a construgao

de uma din§,mica pr6prie, no campo econ6mico"198• 0 fra,oo

desenvol-

Referências

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