• Nenhum resultado encontrado

Os limites do princípio do contraditório no inquérito policial e o direito de acesso a dados sigilosos de coinvestigado

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Os limites do princípio do contraditório no inquérito policial e o direito de acesso a dados sigilosos de coinvestigado"

Copied!
60
0
0

Texto

(1)

DEPARTAMENTO DE DIREITO PROCESSUAL

ANA RAISA FARIAS CAMBRAIA

OS LIMITES DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL E O DIREITO DE ACESSO A DADOS SIGILOSOS DE COINVESTIGADO

(2)

OS LIMITES DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL E O DIREITO DE ACESSO A DADOS SIGILOSOS DE COINVESTIGADO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Processual Penal.

Orientador: Prof. Dr. Samuel Miranda Arruda.

(3)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

C177l Cambraia, Ana Raisa Farias.

Os limites do princípio do contraditório no inquérito policial e o direito de acesso a dados sigilosos de coinvestigado / Ana Raisa Farias Cambraia. – 2012.

59 f. : enc. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2012.

Área de Concentração: Direito Processual Penal. Orientação: Prof. Dr. Samuel Miranda Arruda.

1. Inquérito policial - Brasil. 2. Sigilo (Direito) - Brasil. I. Arruda, Samuel Miranda (orient.). II. Universidade Federal do Ceará - Graduação em Direito. III. Título.

(4)

ANA RAISA FARIAS CAMBRAIA

OS LIMITES DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL E O DIREITO DE ACESSO A DADOS SIGILOSOS DE COINVESTIGADO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Processual Penal.

Aprovada em _____/_____/_______.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________ Prof. Dr. Samuel Miranda Arruda (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_____________________________________________ Prof. Ms. William Paiva Marques Júnior

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_____________________________________________ Mestrando Tibério Carlos Soares Roberto Pinto

(5)

A Deus, o provedor de tudo.

(6)

AGRADECIMENTOS

A Deus, pelas graças alcançadas, pelo dom da vida e pela constante comprovação de que a fé nos conduz à realização dos mais elevados sonhos.

Aos meus pais, Antonio Mota e Ana Rosa, por serem a base de tudo o que sou, o incentivo para o que eu pretendo ser e a força para que eu sempre lute pelos meus sonhos.

Ao meu irmão Diego, por ser o meu maior orgulho e o meu maior exemplo de retidão, bem como de dedicação e disciplina.

Ao meu namorado e amigo, Thiago, pelo contínuo encorajamento para que eu acredite na minha capacidade, pelos conselhos e pelo companheirismo.

À minha cunhada Rebeca e aos demais familiares, pela confiança no meu potencial e pelo apoio em todas as etapas vivenciadas.

Ao Ministério Público Federal e aos excelentes profissionais com quem tive o privilégio de conviver no decorrer da vida acadêmica, pela partilha de experiências, pela contribuição ao meu amadurecimento e pelo estímulo para lutar sempre pelo melhor.

Ao Colégio Santa Cecília, pela base da minha formação humana e religiosa e pela transmissão de valores que sempre me acompanharão.

À Faculdade de Direito e aos amigos e colegas de curso, pelo aprendizado adquirido, pela ajuda mútua e pelos momentos maravilhosos, em especial às amigas sempre presentes, Ana Paula, Carla, Clícia, Elane, Fabiana, Gabrielle, Giovanna, Maíra, Priscilla e Ritiane, pelo incontestável vínculo de amizade e por tornarem ainda mais especial a vivência dessa bela fase da graduação.

(7)

“O tempo desenvolve nossas defesas, nos oferece outras possibilidades e a gente avança porque é da natureza humana avançar.”

(8)

RESUMO

O presente trabalho discute a delimitação da incidência do contraditório no inquérito policial e a possibilidade de se autorizar o acesso a informações sigilosas relativas a coinvestigado. Primeiramente, é explanada uma visão constitucional do tema, tendo em vista os dispositivos da Lei Maior que asseguram o direito ao contraditório e o direito ao sigilo, os quais também são apresentados sob o prisma processual penal. Em seguida, procede-se a uma análise pormenorizada do inquérito policial, especificamente no que tange à natureza jurídica e às características que o particularizam, além das circunstâncias que levam ao sigilo das investigações. Por fim, abordam-se os limites que pairam sobre o contraditório em sede policial, ressaltando-se que a solução do impasse é encontrada com base na aplicação do princípio da proporcionalidade, vale dizer, por meio de uma medida de ponderação entre os valores em conflito. Nesse panorama, sobressai a eficácia da investigação preliminar e a privacidade do coinvestigado titular dos dados sigilosos carreados aos autos.

(9)

ABSTRACT

The present work argues the delimitation of the incidence of the contradictory in the police inquest and the possibility to authorize the access to confidential information concerning the co-investigated. First, the subject receives a constitutional approach, taking into consideration the devices of the Law Biggest that assure the right to the contradictory and the right to the confidentiality, which are also presented under the criminal procedural prism. After that, this work proceeds to a detailed analysis from the police inquest, specifically in what it refers to the legal nature and the characteristics that distinguish it, beyond the circumstances that lead to the confidentiality of the investigated. Finally, there is an analysis of the limits of the contradictory in police inquests, standing out itself that the solution of this subject is found on the basis of the application of the principle of the proportionality, by means of a measure of balance enter the values in conflict. In this context, predominate the effectiveness of the preliminary inquiry and the privacy of the co-investigated whose data were brought into the files of legal documents.

(10)

SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO ... 10

2O CONTRADITÓRIO E A INVIOLABILIDADE DO SIGILO: DIREITOS CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADOS ... 12

1.1 Princípio do Contraditório: Corolário do Devido Processo Legal ... 12

1.2 Noções Básicas do Princípio do Contraditório ... 13

1.3 O Contraditório no Processo Penal ... 17

1.4 O Direito à Privacidade e a Inviolabilidade do Sigilo ... 20

3O INQUÉRITO POLICIAL ... 24

3.1 Natureza Jurídica ... 25

3.2 Características ... 26

3.3 O Investigado: Variações Técnicas de Denominação ... 28

3.4 O Sigilo do Inquérito Policial e o Trâmite sob Segredo de Justiça ... 30

4 DELIMITAÇÃO DO CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL ... 33

4.1Valor Probatório do Inquérito Policial em Sentença Condenatória: Condição de Submissão ao Contraditório em Juízo ... 38

4.2Restrições à Aplicação da Súmula Vinculante nº 14 em face do Acesso a Dados Sigilosos de Coinvestigado ... 41

4.3Aplicação do Princípio da Proporcionalidade: Ponderação de Direitos ... 44

4.3.1 A Eficácia da Investigação e o Princípio da Justiça Penal Eficaz ... 46

4.3.2 O Direito à Privacidade do Coinvestigado ... 49

4.3.3 Ausência de Violação às Garantias do Indivíduo: Direitos de Defesa no Inquérito Policial e Contraditório Diferido ... 51

5 CONCLUSÃO ... 53

(11)

1 INTRODUÇÃO

O cotidiano da investigação criminal levada a efeito pela polícia judiciária aponta determinados conflitos que suscitam uma análise jurídica mais detida. Nesse panorama, tem-se a questão do cabimento do exercício do contraditório em tem-sede de inquérito policial, a possibilitar o acesso a dados sigilosos de coinvestigado.

A incerteza em volta do tema tem sua raiz no entrechoque de preceitos constitucionais, quais sejam, o art. 5º, LV, em face do art. 5º, X e XII, e do art. 144, § 1º, IV e § 4 º, da CF/88, além das normas infraconstitucionais do art. 20 do CPP e do art. 7º, XIV, da lei nº 8.906/94.

Ao passo em que se tem a polícia judiciária atuando com os meios que se fazem necessários à realização do seu objetivo de preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, tem-se o princípio do contraditório, o qual confere a condução dialética do processo, constituindo-se na ciência bilateral dos atos processuais e na possibilidade de contrariá-los. Emerge, então, o conflito entre a atuação sigilosa e inquisitva da polícia judiciária em prol dos seus objetivos previstos na Carta Magna e a incidência do referido princípio constitucional.

É mister que sejam salientadas, portanto, as particularidades do inquérito policial, precipuamente no que tange à sua característica do sigilo e da inquisitorialidade, ou seja, ao fato de que a regra é a não publicidade das investigações e a concentração da presidência do inquérito exclusivamente na pessoa da autoridade policial, sob o fundamento de se realizar com eficácia o dever estatal da segurança pública e da aplicação da lei penal.

Aliando-se à consecução da justiça penal eficaz por meio da atividade policial como fator restrititvo em face do contraditório, tem-se a proteção ao sigilo de determinados dados que tenham sido revelados no transcurso das investigações.

A Constituição Federal de 1988 assegura, como decorrência do direito à privacidade, o direito ao sigilo bancário, fiscal, epistolar, das comunicaões telegráficas, telefônicas e de dados. No entanto, tendo em vista que nenhum direito é absoluto, a inviolabilidade do sigilo não é ilimitada, podendo ser necessária a revelação de informações privadas com o fim de se apurar a verdade de fatos que estejam sob investigação.

(12)

devendo-se preservar a privacidade do suspeito em face dos demais coinvestigados, os quais poderão sofrer restrições no direito de acesso aos autos.

Partindo-se desta análise, torna-se necessária a delimitação do conceito do contraditório e da sua aplicação na fase policial, em contrapartida à eficácia das investigações e, também, à inviolabilidade do sigilo das informações colhidas a respeito do coinvestigado. É inegável a aplicabilidade do contraditório nos processos judiciais, no entanto não se pode olvidar que, como se dá com todo e qualquer direito fundamental, o contraditório não é absoluto, isto é, não se aplica ampla e irrestritamente. Nesse diapasão se insere o inquérito policial, que é procedimento de natureza administrativa, tratando-se de peça informativa, hábil a oferecer o embasamento probatório à atuação do titular da ação penal.

O tema em apreço é detentor de grande relevância dentro do contexto jurídico-social brasileiro, tendo em vista que acarreta conseqüências ao investigado, assim como àqueles que presidem o curso das investigações e aos demais envolvidos, implicando no sopesamento de direitos fundamentais frente a outros preceitos constitucionais.

(13)

2 O CONTRADITÓRIO E A INVIOLABILIDADE DO SIGILO: DIREITOS CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADOS

Antes de adentrar ao tema do contraditório em sede de uma investigação policial e da consequente possibilidade do direito de acesso a dados sigilosos do coinvestigado, é imperioso destacar o fundamento constitucional do mencionado princípio, junto às noções básicas que o definem e à sua incidência no processo penal. Com o fito de lançar o alicerce da presente monografia, também é mister que se analise a base constitucional do direito fundamental ao sigilo, que será o ponto de partida para a delimitação do contraditório no inquérito policial.

2.1Princípio do Contraditório: Corolário do Devido Processo Legal

O devido processo legal é considerado pela doutrina constitucionalista como um sobreprincípio, uma vez que representa o fundamento dos princípios constitucionais que limitam a ação do Poder Público, constituindo um postulado sobre o qual repousam os demais direitos fundamentais.

A Carta Magna de 1988, diferentemente das anteriores, instituiu expressamente o devido processo legal, conforme se constata do seu art. 5º, inciso LIV, in verbis:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

Com origem na Magna Charta Libertatum de 1215, essencial para o direito anglo-saxão, tal princípio foi também disciplinado no art. XI, nº 1, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que garante que:

Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.

(14)

razoabilidade e da proporcionalidade, os quais configuram o seu elemento material. Nesta vertente é que o Poder Judiciário pode invalidar atos legislativos ou administrativos, diante da verificação do cumprimento dos seguintes requisitos: adequabilidade dos meios aos fins, proporcionalidade em sentido estrito, necessidade da medida e, ainda, proibição de excessos.

Na seara processual penal, o devido processo legal determina que a pretensão punitiva deve ser levada a efeito por meio de um procedimento regular, perante uma autoridade competente, em atendimento ao contraditório e à ampla defesa e com respaldo em provas validamente colhidas.

Verifica-se, portanto, que do devido processo legal advém uma proteção dúplice ao indivíduo, qual seja, uma na seara material de proteção ao direito de liberdade e outra formal no sentido de conferir ao jurisdicionado paridade de condições frente ao Estado-persecutor e plenitude de defesa.

Adentrando ao campo criminal, o princípio em tela guarda conexão, materialmente, com o direito penal, determinando que ninguém deve ser processado senão por crime previamente previsto e definido em lei, além do atendimento às demais garantias penais do indivíduo. Já processualmente, liga-se ao transcorrer do procedimento e à oportunidade de o réu atuar em sua defesa e tentar demonstrar ao órgão julgador a sua inocência, bem como refere-se à possibilidade de o órgão acusador, em representação da sociedade, influir no convencimento do juiz acerca da plausividade de sua pretensão punitiva.

É na proteção formal proveniente do devido processo legal que se destaca o contraditório, ao lado de diversos outros princípios derivados dessa vasta garantia, como o da isonomia, da inafastabilidade da jurisdição, do duplo grau de jurisdição, do juiz e promotor natural, da proibição da prova ilícita, da motivação das decisões, da publicidade, da razoável duração do processo e da presunção de inocência, os quais estão explícitos na Constituição Federal de 1988 ou dela decorrem implicitamente.

2.2Noções Básicas do Princípio do Contraditório

O princípio do contraditório, expresso no brocardo romano audiatur et altera

pars, compõe o que José Afonso da Silva (2008, p. 432) denomina de ciclo das garantias

processuais, ao lado do devido processo legal, da ampla defesa e do direito de acesso à

justiça.

(15)

Art. 5º [...]

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

No âmbito do Estado Democrático de Direito, o contraditório emerge como uma verdadeira garantia à pretensão à tutela jurídica, assegurando que a função jurisdicional será exercida em consonância com o devido processo constitucional. Assim, o Estado somente pode atuar nas hipóteses em que for chamado a fazê-lo e deve seguir, de forma estrita, a metodologia normativamente determinada, garantindo a apropriada participação dos destinatários na formação do ato imperativo estatal e afastando qualquer arbitrariedade incompatível com os postulados do Estado Democrático de Direito.

O princípio do contraditório, consolidado nos dois elementos básicos da bilateralidade e da possibilidade de reação, passou a ser considerado como uma constante participação dos interessados no transcorrer processual, sendo-lhes conferidas as ferramentas procedimentais hábeis à efetiva realização do diálogo entre os sujeitos do processo. Nesse diapasão, o constituinte de 1988 buscou garantir aos litigantes o direito de ação e o direito de defesa, resguardando-se a isonomia entre as partes.

Também se pode vislumbrar o princípio do contraditório sob o viés da obrigatória imparcialidade do órgão jurisdicional e da necessidade de o provimento judicial corresponder ao máximo ao que foi apresentado em juízo. Consoante expõem Cintra, Grinover e Dinamarco (2003, p. 55), o magistrado, em decorrência do seu dever de se manter imparcial, “coloca-se entre as partes, mas eqüidistante delas: ouvindo uma, não pode deixar de ouvir a outra; somente assim se dará a ambas a possibilidade de expor suas razões, de apresentar suas provas, de influir sobre o convencimento do juiz”. Desta feita, as partes detêm o direito de, além de produzir provas e sustentar suas razões, tê-las devidamente apreciadas e ponderadas pelo magistrado.

Mendes, Coelho e Branco (2009, p. 592), ao tratarem do direito de defesa sob o enfoque do direito constitucional comparado, bem explicitam que, no direito alemão, a garantia em apreço envolve, além do direito de manifestação e do direito de informação sobre o objeto do processo, o direito de o jurisdicionado ver os seus argumentos contemplados pelo órgão julgador. Assim sendo, tais doutrinadores apresentam a seguinte enumeração dos direitos inseridos no campo do contraditório e da ampla defesa:

(16)

- direito de manifestação (Recht auf Äusserung), que assegura ao defendente a possibilidade de manifestar-se oralmente ou por escrito sobre os elementos fáticos e jurídicos constantes do processo;

- direito de ver seus argumentos considerados (Recht auf Berücksichtigung), que exige do julgador capacidade de apreensão e isenção de ânimo (Aufnahmefähigkeit und Aufnahmebereitschaft) para contemplar as razões apresentadas.

Ao passo em que a ampla defesa consiste na garantia do indivíduo de ter-lhe fornecido todo o amparo necessário para que apresente os argumentos para esclarecer a verdade ou mesmo para calar-se ou omitir-se, tem-se que o contraditório é a própria exteriorização da plenitude de defesa, composto pelas garantias da informação e da reação. Este constitui-se da ciência bilateral dos atos processuais e da possibilidade de contrariá-los.

O primado do contraditório impõe que aos litigantes e aos acusados deve ser conferida a condução dialética do processo, à medida em que, na lição de Moraes (2005, p. 93), “a todo ato produzido pela acusação caberá igual direito da defesa de opor-se-lhe ou dar-lhe a versão que melhor lhe apresente, ou, ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor”. O processo desenvolve-se, então, na lógica incessante entre ação e reação, acusação e defesa, afirmação e negação.

Ademais, Nery Júnior (1995, p. 122) elucida que:

O princípio do contraditório, além de fundamentalmente constituir-se em manifestação do princípio do Estado de Direito, tem íntima ligação com o da igualdade das partes e o do direito de ação, pois o texto constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla defesa, quer significar que tanto o direito de ação, quanto o direito de defesa são manifestação do princípio do contraditório.

Por conseguinte, depreende-se do contraditório a finalidade principiológica de informar ao interessado acerca da existência do processo e também de ensejar-lhe a possibilidade de se defender daquilo que lhe for desfavorável. Ressalte-se que tal premissa, em decorrência do texto constitucional, aplica-se indistintamente a autores, réus, litisdenunciados, oponentes, chamados ao processo, assistentes litisconsorciais ou simples e Ministério Público, englobando o processo penal, o civil e o administrativo. Nos dizeres de Fazzalari (2006, p. 122):

A própria essência do contraditório exige que dele participem ao menos dois sujeitos, um ‘interessado’ e um ‘contra-interessado’, sobre um dos quais o ato final é destinado a desenvolver efeitos favoráveis, e, sobre outro, efeitos prejudiciais.

(17)

No que tange ao direito à informação, tem-se que este é atendido por meio da citação, da intimação e da notificação. Capez (2004, p. 19) assim conceitua tais institutos:

Citação é a cientificação a alguém da instauração de um processo, com a consequente chamada para integrar a relação processual. Intimação é a comunicação a alguém dos atos do processo, podendo conter um comando para fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Embora nosso Código não faça distinção, doutrinariamente a intimação refere-se a atos ou despachos já proferidos no processo, enquanto a notificação consiste em uma comunicação à parte para que faça ou deixe de fazer alguma coisa. Assim, intima-se “de” e notifica-se “para” algum ato processual.

O direito à participação, por sua vez, é exercido, por exemplo, através da produção de provas e da atividade de argumentação, manifestando-se em variadas oportunidades no decorrer do processo.

Diante do vasto rol de possibilidades de exercício do contraditório, a Constituição Federal de 1988 não apresenta o momento específico de sua incidência, motivo pelo qual o contraditório pode surgir como prévio, real ou simultâneo, e, ainda, como diferido ou prorrogado.

O Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, expôs linhas elucidativas acerca do contraditório prévio no processo penal, ao deferir medida liminar no

habeas corpus nº 107.795 MC/SP, no dia 28 de outubro de 2011. Em sua decisão, o Ministro

Relator explicita a faculdade conferida ao réu, pela lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008, no sentido de argumentar acerca de tudo o que interesse à sua defesa, bem como produzir provas e realizar demais medidas consideradas imprescindíveis.

Nessa ordem, abalizado por outros julgados da Suprema Corte, o Ministro assim desenvolveu o tema:

Sabemos que a reforma processual penal estabelecida por legislação editada em 2008 revelou-se mais consentânea com as novas exigências estabelecidas pelo moderno processo penal de perfil democrático, cuja natureza põe em perspectiva a essencialidade do direito à plenitude de defesa e ao efetivo respeito, pelo Estado, da prerrogativa ineliminável do contraditório.

Bem por isso, a Lei nº 11.719/2008, ao reformular a ordem ritual nos procedimentos penais, instituiu fase preliminar caracterizada pela instauração de contraditório prévio, apto a ensejar, ao acusado, a possibilidade de argüir questões formais, de discutir o próprio fundo da acusação penal e de alegar tudo o que possa interessar à sua defesa, além de oferecer justificações, de produzir documentos, de especificar as provas pretendidas e de arrolar testemunhas, sem prejuízo de outras medidas ou providências que repute imprescindíveis.

Com tais inovações, o Estado observou tendência já consagrada em legislação anterior, como a Lei nº 10.409/2002 (art. 38) e a Lei nº 11.343/2006 (art. 55), cujas prescrições viabilizaram a prática de verdadeiro contraditório prévio no qual o acusado poderia invocar todas as razões de defesa – tanto as de natureza formal quanto as de caráter material.

(18)

absoluta (HC 87.346/MS, Rel. p/ o acórdão Min. CÁRMEN LÚCIA - HC 90.226/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 98.382/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RHC 86.680/SP, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, v.g.) [...]

O contraditório é real ou simultâneo quando a sua observância é de maneira direta, em momento imediato à realização dos atos processuais. Exemplifica-se com a prova que é produzida sob o manto da participação das partes, como a oitiva de testemunhas.

Por fim, o contraditório diferido ou prorrogado, o qual não se efetiva concomitantemente ao ato processual, tem o seu fundamento na finalidade de preservação da eficácia de determinado ato ou no momento em que se encontra a persecução criminal. Nesse contexto é que se insere, por exemplo, a decretação de prisão cautelar e a realização de perícia durante o inquérito policial.

2.3O Contraditório no Processo Penal

A concepção do contraditório como princípio essencial ao processo penal remonta, conforme explanado por Gonçalves (1992, p. 119), às lições de Jhering, o qual já fazia alusão à “justiça no processo” como um requisito da relação processual, tendo como embasamento teórico a exigência de se assegurar a igualdade jurídica entre as partes.

Em um julgado clássico, o Supremo Tribunal Federal apresentou elucidativa manifestação sobre o assunto:

(19)

conseqüêncial, a nulidade do procedimento persecutório. (STF, HC 69001/RJ, Órgão Julgador: Primeira Turma, Relator: Min. Celso de Mello, Julgamento em: 18/02/1992, DJ: 26/06/1992)

(grifo nosso)

No ensinamento de Mirabete (2006, p. 24), o contraditório é:

[...] corolário do princípio da igualdade perante a lei, a isonomia processual obriga que a parte contrária seja também ouvida, em igualdade de condições (audiatur et altera pars). A ciência bilateral dos atos e termos do processo e a possibilidade de contrariá-los são os limites impostos pelo contraditório a fim de que se conceda às partes ocasião e possibilidade de intervirem no processo, apresentando provas, oferecendo alegações, recorrendo das decisões etc.

Originalmente, o princípio do contraditório perfazia-se com a simples participação das partes no processo. No entanto, com o desenvolvimento do seu conceito, esse direito adquiriu uma vertente mais ampla, passando a englobar uma dimensão dupla: informação e reação. O primeiro elemento diz respeito ao direito de ser informado acerca da acusação penal movida contra si, enquanto o segundo refere-se ao direito de se manifestar e de ter os seus argumentos levados em consideração pelo órgão jurisdicional.

O contraditório determina que devem ser submetidos à parte todos os argumentos fáticos e todas as apresentações de prova realizadas no bojo do processo, sejam decorrentes da parte contrária, sejam oriundos de determinação do juiz, fazendo-se cumprir a finalidade precípua da aplicação do contraditório: a possibilidade conferida às partes de realizarem a devida manifestação em face das alegações e das provas que lhes forem contrárias, contribuindo para a formação do convencimento do órgão julgador.

Portanto, no processo penal, o réu tem o direito de tomar conhecimento sobre a acusação que lhe é imputada e de contrariá-la, impedindo-se que haja uma condenação sem que o acusado tenha sido ouvido em juízo. Todo ato processual há de ser cientificado ao réu, o qual será acompanhado de seu defensor. Segundo Tourinho Filho (2009, p. 22), o contraditório origina para a defesa o direito de:

[...] contestar a acusação, seja após a denúncia, seja em alegações finais; direito de o acusado formular reperguntas a todas as pessoas que intervierem no processo para esclarecimento dos fatos (ofendido, testemunhas, peritos, p. Ex.); de contra-arrazoar os recursos interpostos pela parte exadversa;direito de se manifestar sobre todos os atos praticados pela acusação.

De outra vertente, não se pode olvidar que idênticas possibilidades de participação devem ser conferidas ao acusador, englobando Ministério Público ou querelante, a depender da espécie de ação penal no caso concreto.

(20)

em intensidade quanto em extensão, proporcionando-lhes os instrumentos adequados para que possuam efetivas condições de contrariar as alegações adversas. Assim, caso o órgão acusador realize a juntada de um documento, a parte oposta tem o direito de se expressar a respeito, bem como ocorre no sentido inverso, conferindo-se a oportunidade de manifestação ao acusador. Ademais, se a defesa pode produzir provas, a acusação também detém tal faculdade. A Carta Magna de 1988 deixou patente que a defesa não pode tolerar limitações que não sejam impostas também à acusação.

Destarte, a doutrina aponta uma ligação entre o contraditório e o princípio da paridade de armas, sendo necessário que as partes estejam munidas de forças iguais para que se confira completa eficácia ao princípio do contraditório, resguardando-se um justo equilíbrio entre a pretensão punitiva estatal e o direito à liberdade e à manutenção do estado de inocência do acusado.

Em uma explanação acerca da importância do contraditório para o processo penal, Oliveira (2009, p. 34) preleciona que este princípio, junto ao da ampla defesa, constitui a pedra fundamental de todo o processo, especificamente do criminal, e arremata afirmando que:

[...] como cláusula de garantia instituída para a proteção do cidadão diante do aparato persecutório penal, encontra-se solidamente encastelado no interesse público da realização de um processo justo e equitativo, único caminho para a imposição da sanção de natureza penal.

Foi justamente devido ao princípio do contraditório, aliado ao da ampla defesa, que a Suprema Corte firmou o entendimento no sentido de que se deve cientificar da sentença condenatória, além do defensor do réu, o próprio condenado. Soma-se a isto a configuração de nulidade quando ausente a intimação do acusado para apresentar contrarrazões ao recurso interposto contra a rejeição da denúncia, nos termos da Súmula nº 707 do STF1.

Dentre as alterações trazidas pela lei nº 11.719/2008, a qual possui o intuito primordial de garantir uma vasta área de atuação da defesa, salienta-se o interrogatório como elemento de defesa do réu. Nessa toada, o art. 400 do Código de Processo Penal2 determina que o interrogatório judicial deve ser a última prova a ser colhida no processo criminal,

1 Súmula nº 707 - STF: Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contra-razões ao

recurso interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo.

2 Art. 400. Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias,

(21)

conferindo ao réu o direito de falar em juízo somente após ter conhecimento de todas as alegações e provas existentes nos autos que lhe forem desfavoráveis.

Ademais, em cumprimento ao disposto no art. 396 do CPP3, tem-se como indispensável a citação do denunciado para oferecer resposta à acusação no prazo de 10 (dez) dias.

Outro aspecto imprescindível à efetividade do contraditório no processo penal é a intimação das partes para que apresentem alegações finais, as quais constituem obrigação processual ao acusador e ao acusado. Pellegrini (2001, p. 202-203) ressalta a violação às garantias do devido processo legal caso não seja cumprida tal premissa. Senão, veja-se:

[...] uma fase decisiva para a aferição da efetividade do contraditório, pois para essa oportunidade derradeira convergem todas as atividades desenvolvidas pela acusação e pela defesa durante o iter procedimental, com vistas à prolação de uma decisão que leve em conta as respectivas razões.

[...]

O melhor entendimento do texto legal, em consonância com os princípios constitucionais, leva à conclusão segura de que a falta de alegações finais traduz ofensa irreparável às garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, importando, por isso, nulidade absoluta do processo, a partir da oportunidade em que deveriam ter sido apresentadas.

Apesar de a doutrina divergir acerca da existência ou não de nulidade processual caso o advogado intimado para oferecer as alegações finais permaneça silente, é ponto pacífico a imprescindibilidade da intimação das partes para tanto.

Como se pode observar, a efetividade do princípio do contraditório no processo penal confere legitimidade ao provimento final prolatado pelo Estado-juiz, constituindo um meio de se garantir a liberdade jurídica do réu.

2.4O Direito à Privacidade e a Inviolabilidade do Sigilo

A Constituição Federal de 1988 consagrou o direito à privacidade ao determinar, em seu art. 5º, X4, que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, do que se depreende que a Lei Maior atribuiu a condição de direito individual a todas as manifestações, íntimas e privadas, da personalidade humana.

Consoante as lições de Silva (2008, p. 206), o magistrado americano Cooly, em uma decisão de 1873 sempre lembrada pela doutrina constitucionalista, conceituou a

3 Art. 396. Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar

(22)

privacidade como o direito de ser deixado tranquilo, em paz, de estar só, consistente no denominado “right to be alone”. O mencionado doutrinador cita, ainda, que a Corte Suprema dos Estados Unidos já emitiu decisão no sentido de que o direito à privacidade compreende o direito de toda pessoa tomar sozinha as decisões na esfera da sua vida privada.

A privacidade engloba os fatos e as relações de trato pessoal, comercial e profissional que compõem a particularidade da existência humana e que não devem ser expostos publicamente. É o direito de se manter afastado da observação de terceiros. Tal reclusão pessoal, em certa medida, fornece um campo de liberdade individual imprescindível ao desenvolvimento da personalidade.

Mencionando os dizeres de um antigo presidente da Corte Europeia de Direitos Humanos, Mendes, Coelho e Branco (2009, p. 422) salientam o trecho que insere no âmbito de proteção do direito à privacidade a liberdade intelectual e moral do indivíduo contra o uso inadequado do nome e da imagem e contra atividades de espionagem ou de controle ou de perturbação da tranquilidade da pessoa e contra a divulgação de informações cobertas pelo segredo profissional.

No cerne do direito à privacidade destaca-se o controle de informações sobre o indivíduo, o direito de resguardar assuntos pessoais fora do conhecimento público, evitando a exposição pública de características e fatos particulares.

Nesse panorama se inserem os sigilos bancário e fiscal, decorrentes da proteção do art. 5º, X, da CF/88. Assim se consolidou o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, não obstante a existência de posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais no sentido de que tais sigilos encontram respaldo na inviolabilidade da comunicação de dados prevista no inciso XII do art. 5º da CF/885 ou, ainda, possuem proteção apenas legal, e não constitucional.

A inviolabilidade do direito ao sigilo encontra-se expressamente assegurada no art. 5º, XII, da Carta Magna de 1988, do qual se extrai que são invioláveis os sigilos da correspondência, das comunicações telegráficas, telefônicas, telemáticas e de dados. Bulos (2009, p. 476) assevera que tal dispositivo constitucional, mutatis mutandis, assemelha-se ao art. 15 da Carta italiana de 1948, o qual prevê que “a liberdade e o sigilo de correspondência, bem como o de qualquer outra forma de comunicação, são invioláveis. Só se podem impor

4 Art. 5º [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o

direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

5 Art. 5º. [...] XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das

(23)

limitações através de ato motivado da autoridade judiciária e com as garantias estabelecidas pela lei”. Referido constitucionalista ressalta, ainda, outros exemplos de previsão constitucional do direito em apreço, dentre os quais se tem a Constituição portuguesa de 1976, em seu art. 34, 4, a Constituição espanhola de 1978, no art. 18, e a Constituição da Finlândia de 1984, no respectivo art. 12.

Independente de se enquadrar na previsão constitucional do inciso X ou do inciso XII do art. 5º, toda proteção ao sigilo representa um resguardo à privacidade da pessoa, ressalvando as informações relativas à intimidade, as quais devem permanecer afeitas tão somente ao âmbito pessoal de seu titular, a quem, via de regra, cabe a decisão de expô-las ou não a público.

O sigilo bancário impõe que as instituições financeiras mantenham em segredo as operações bancárias e os dados sobre movimentações, abertura e fechamento de contas correntes, e o sigilo fiscal determina que os órgãos da Fazenda Pública não divulguem as informações acerca da situação econômica e financeira dos contribuintes.

O direito ao sigilo das correspondências, por sua vez, resguarda o segredo das mensagens verbais emitidas por meios de comunicação escritos, enquanto o sigilo das comunicações telegráficas refere-se ao resguardo das transmissões escritas por telégrafos. A inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas e das telemáticas protege as transmissões de sinais e caracteres pela via do telefone e da informática, respectivamente.

O sigilo da comunicação de dados, a seu turno, não abrange os dados em si mesmos, mas, sim, a privacidade da troca de informações. Consiste, portanto, no direito de o indivíduo manter uma trasmissão privativa de elementos informativos, sejam eles quais forem. Nesse sentido, segue julgado que ilustra a consolidação desse posicionamento na Suprema Corte:

(24)

votação unânime, à luz do art. 5º, XI, da Lei Fundamental. 2. Na espécie, ao contrário, não se questiona que a apreensão dos computadores da empresa do recorrente se fez regularmente, na conformidade e em cumprimento de mandado judicial. 3. Não há violação do art. 5º. XII, da Constituição que, conforme se acentuou na sentença, não se aplica ao caso, pois não houve "quebra de sigilo das comunicações de dados (interceptação das comunicações), mas sim apreensão de base física na qual se encontravam os dados, mediante prévia e fundamentada decisão judicial". 4. A proteção a que se refere o art.5º, XII, da Constituição, é da comunicação 'de dados' e não dos 'dados em si mesmos', ainda quando armazenados em computador. (cf. voto no MS 21.729, Pleno, 5.10.95, red. Néri da Silveira - RTJ 179/225, 270). V - Prescrição pela pena concretizada: declaração, de ofício, da prescrição da pretensão punitiva do fato quanto ao delito de frustração de direito assegurado por lei trabalhista (C. Penal, arts. 203; 107, IV; 109, VI; 110, § 2º e 114, II; e Súmula 497 do Supremo Tribunal).

(STF, RE 418416/SC, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, Julgado em 10/05/2006, DJ em 19-12-2006) (grifo nosso)

Não se pode olvidar que, haja vista nenhum direito ser absoluto ou ilimitado, os sigilos em apreço podem sofrer ponderação diante de outros valores constitucionais no interesse da coletividade, sendo necessário o conhecimento de informações privadas para a descoberta da verdade nos casos concretos. Dá-se, então, a quebra do sigilo, a qual somente se permite caso caracterizada a adequação e a real necessidade da medida.

A quebra de todas as formas de sigilo efetiva-se em caráter excepcional e por meio de ordem judicial devidamente fundamentada, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, nos termos da parte final do art. 5º, XII, da Constituição Federal. Ademais, Comissões Parlamentares de Inquérito – CPI, mediante requisição, podem romper os sigilos bancário, fiscal e de registros telefônicos.

Cumpre ressaltar que os dados sigilosos somente podem ser utilizados para os fins da investigação que originou a quebra do sigilo e com vistas a individualizar o investigado com a demonstração da autoria e da materialidade delitiva. Ademais, deve ser mantido o segredo em relação a terceiros estranhos ao feito, preservando-se ao máximo a privacidade do investigado.

O art. 2º da lei nº. 9.296/966, que regula a interceptação das comunicações telefônicas e também incide sobre as comunicações telemáticas, prevê como requisitos à autorização dessa medida interventiva: indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal, impossibilidade de obtenção da prova por outros meios disponíveis e classificação do fato investigado como crime que seja punível com pena de reclusão.

6

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:

I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;

(25)

Insta salientar que, uma vez determinada a quebra do sigilo ou outras medidas interventivas da privacidade, é mister que seja decretado o segredo de justiça em face da tramitação dos autos em que constam as informações privadas.

3 O INQUÉRITO POLICIAL

A atividade investigativa da polícia judiciária possui fundamento no Estado Democrático de Direito, o qual é almejado em prol da dignidade da pessoa humana, núcleo axiológico da Constituição. Nesse panorama, o inquérito policial confere a garantia de uma persecução criminal lastreada com um mínimo razoável de provas, assegurando que a ação penal seja instaurada com a conviccção da existência de infração penal e com indícios suficientes a indicar o autor do fato infracional.

O inquérito policial trata-se de procedimento investigativo preliminar, presidido pelo delegado de polícia, que atua em cumprimento à finalidade precípua da polícia judiciária, qual seja, manter a paz pública e a segurança individual. Carnelluti (1950 apud MARQUES, 1997) preleciona que a função da polícia é a de promover as condições materiais favoráveis à ordem social.

A fase investigatória e a fase processual, posterior àquela, constituem as duas circunstâncias que compõem a persecução criminal, consistente na atuação do Estado voltada à apuração de um crime e à prolação de sentença penal, efetivando o direito de punir quando constatado o ilícito penal. Marques (1997, p. 138) assim conceitua:

A persecutio criminis apresenta dois momentos distintos: o da investigação e o da ação penal. Esta consiste no pedido de julgamento da pretensão punitiva, enquanto a primeira é atividade preparatória da ação penal, de caráter preliminar e informativo:

inquisitivo nihil est quam informatio delicti.

(26)

circunstâncias e a autoria delitiva, bem como a específica, que se consubstancia no fornecimento do lastro probatório suficiente ao oferecimento da denúncia ou da queixa-crime.

Impende salientar, por oportuno, que, caso o titular da ação penal já disponha dos elementos suficientes à instauração do processo, o inquérito policial é dispensável, tendo em vista que existem outros instrumentos investigatórios legalmente previstos, como as sindicâncias e os processos administrativos instaurados por agentes da Administração Pública, o inquérito civil promovido pelo Ministério Público, os levantamentos fiscais, as investigações realizadas pelas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) e aquelas realizadas pelas autoridades florestais.

Nesse ponto, ressalte-se que o art. 4º, parágrafo único, do CPP7 preleciona que a competência da polícia judiciária não exclui a competência de autoridades administrativas que, por lei, também detenham a função de apuração de infrações penais no que concerne às suas atividades institucionais. Assim sendo, a lei pode prever o exercício da função investigatória por parte dos órgãos e das entidades da Administração Pública Direta e Indireta. Ademais, conforme bem elucida Capez (2004, p. 66), o inquérito policial também se destina, porém de forma indireta, ao juiz, o qual irá valer-se dos elementos de informação colhidos pela autoridade policial para decidir acerca do recebimento da peça acusatória, bem como para inferir sobre a decretação de medidas cautelares, tal qual a prisão preventiva.

3.1 Natureza Jurídica

A natureza jurídica da investigação policial é de procedimento administrativo pré-processual, não se confundindo com o processo judicial, do qual aquele é preparatório. Trata-se, em verdade, do exercício do poder de polícia por parte do Estado, atividade administrativa por natureza. A autoridade que preside o inquérito é alheia aos quadros do Poder Judiciário e não detém poder jurisdicional, fazendo-se necessária a atuação do juiz quando tiverem de ser adotados atos jurisdicionais, como, por exemplo, a decretação de prisão preventiva.

No inquérito estão ausentes os requisitos definidores do processo, como as partes e as garantias a elas inerentes, a pretensão a uma tutela jurisdicional, a sentença e a coisa julgada. Outrossim, os atos realizados no bojo da investigação policial não se sujeitam às

7

Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

(27)

regras de nulidades processuais, nem devem seguir regras procedimentais. Mirabete (2006, p. 60) assim esclarece o tema:

Não é o inquérito “processo”, mas procedimento administrativo informativo, destinado a fornecer ao órgão da acusação o mínimo de elementos necessários à propositura da ação penal. A investigação procedida pela autoridade policial não se confunde com a instrução criminal, distinguindo o Código de Processo Penal o “inquérito policial” [...] da “instrução criminal”.

O inquérito policial não pode ser entendido sequer como processo administrativo, pois, conforme explana Santin (2001, p. 139): “não se trata de processo administrativo, porque ainda não há acusado, litigante ou conflito de interesses nem há imposição de sanção ou decisão sobre um direito do investigado”. Tal distinção mostra-se essencial à análise acerca da limitação do contraditório no inquérito policial, uma vez que o constituinte determinou o exercício desse princípio apenas nos processos, podendo-se entender por afastada sua aplicação nos procedimentos, conforme será explorado adiante.

3.2 Características

Dentre os elementos caracterizadores do inquérito policial, nitidamente distintos do processo penal, primeiramente destaca-se a discricionariedade, o que significa que na investigação policial não há um rigor procedimental, cabendo ao delegado de polícia presidir o inquérito pautado em um juízo de conveniência e oportunidade. Não obstante o desapego à rigidez, a atividade policial não pode ser arbitrária, deve respeitar a esfera da legalidade, subordinando-se à ordem jurídica. Uma vez instaurado o inquérito, a autoridade policial não pode simplesmente desfazer-se dele, eis que indisponível, sendo expressamente vedado pelo art. 17 do CPP8 que o delegado determine o arquivamento.

Diante da sua finalidade de colheita de elementos de informação a serem fornecidos ao titular da ação penal, o inquérito policial deve ser escrito, conforme preleciona o art. 9º do Código de Processo Penal9, devendo ser reduzidos a termo os atos produzidos oralmente. Admite-se, no entanto, que sejam realizados registros através de outros meios ou recursos, como gravações magnéticas, digitais ou audiovisuais, segundo atual previsão do art. 405, § 1º, do CPP10.

8 Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito.

9 Art. 9o. Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e,

neste caso, rubricadas pela autoridade.

10 Art. 405. [...] § 1o Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e

(28)

O inquérito policial é regido pela oficialidade e pela autoritariedade, pois o delegado de polícia que o preside é um órgão oficial do Estado e autoridade pública, não podendo ficar a cargo do particular. Impera, também, a oficiosidade, tendo em vista que, nos casos de notícia de crime de ação penal pública incondiconada, a autoridade policial deve dar início às investigações de ofício, sem qualquer provocação ou autorização para tanto.

Tem-se que o inquérito policial é, por sua própria natureza, inquisitivo, isto é, cuida-se de procedimento em que há uma centralização de funções, as atividades persecutórias concentram-se nas mãos de uma única autoridade, que atua de ofício e discricionariamente, não sendo concedida ao investigado ampla oportunidade de defesa, como produção e indicação de provas, interposição de recursos e apresentação de alegações.

Por fim, o procedimento investigatório também se caracteriza como sigiloso, não sendo conferida a publicidade a qualquer do povo, a qual é típica da fase processual. O Código de Processo Penal, em seu art. 20, assim regula o assunto: “A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade”.

Nos dizeres de Capez (2004, p. 71), configura-se, assim, uma limitação ao direito de obter informações dos órgãos públicos (art. 5º, XXXIII, CF/8811), em decorrência dos imperativos da segurança da sociedade e do Estado, interesse público que deve prevalecer sobre o individual. Apesar da restrição ao conhecimento do povo, resta intacta a fiscalização do inquérito policial, tarefa afeita aos órgãos estatais, como o Ministério Público na sua atividade de controle externo da atividade policial.

O procedimento mediante o segredo consiste em uma garantia ao bom êxito no desdobramento das investigações e à consequente efetividade da jurisdição penal, além de ser uma proteção à imagem e à intimidade do investigado. Tourinho Filho (2010, p. 114-115) sintetiza a relevância do sigilo para as apurações policiais nos seguintes termos: “Não se concebe investigação sem sigilação”. O segredo da atuação policial resguarda, também, a paz social, o sossego da comunidade.

Távora e Alencar (2010, p. 91) apresentam a distinção entre o sigilo externo e o interno. Aquele se refere à preservação das informações essenciais do caderno inquisitorial, evitando a divulgação ao público em geral e a exposição ao sistema midiático. Já o sigilo interno restringe o acesso aos dados da investigação por parte do indiciado e do seu advogado.

11 Art. 5º [...] XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular,

(29)

O primeiro liga-se à ausência de publicidade genérica dos atos investigatórios, enquanto o segundo consiste na falta de conhecimento dos interessados (vítima, suspeito, indiciado, testemunha) acerca de diligências levadas a efeito pela autoridade policial.

É certo que o Ministério Público e o juiz não sofrem as restrições de nenhum dos tipos de sigilo indicados acima, eis que destinatários imediato e mediato das investigações, respectivamente. Ademais, o Parquet atua como titular da ação penal ou fiscal da lei, e o magistrado cuida da legalidade da atuação da polícia judiciária e do respeito às liberdades públicas. De outra vertente, quando necessário à investigação ou devido ao interesse da sociedade, faz-se plenamente possível a limitação do acesso aos autos por parte do investigado e seu defensor, sendo o inquérito conduzido de forma sigilosa.

A condução das investigações sob sigilo é imprescindível para que as diligências sejam efetivadas com vistas à elucidação do fato criminoso sem que haja obstáculos exteriores que podem ser implementados pelo investigado, como a destruição de provas, a ocultação de produtos ou instrumentos do crime, a influência sobre o depoimento de testemunhas, dentre outros. Medidas como a interceptação telefônica e o acompanhamento da rotina de um suspeito são exemplos demonstrativos da necessidade do sigilo para o fiel implemento de providências elucidativas do fato criminoso, sob pena de se tornar inócua a investigação.

Há, ainda, diligências que têm o sigilo já determinado por lei, como a infiltração de agentes da polícia em organizações criminosas, a interceptação telefônica e a ambiental.

No entanto, caso não haja previsão legal e o delegado de polícia não detecte a necessidade de sigilo, poderão ser realizados, inclusive, atos destinados a conferir publicidade às investigações, buscando-se o auxílio da população, conforme se verifica nas situações em que é divulgado um retrato falado do suspeito e revelado o fato, a fim de facilitar a apuração. Nessa hipótese, a publicidade vai auxiliar o trabalho investigatório, tendo em vista que, ao haver a divulgação na imprensa, a comunidade poderá ajudar a esclarecer o caso concreto.

3.3 O Investigado: Variações Técnicas de Denominação

(30)

nomenclaturas para que, adiante, seja corretamente interpretado o âmbito de incidência do preceito constitucional do art. 5º, LV12, que trata do princípio do contraditório.

O primeiro status jurídico no qual se insere o sujeito passivo da persecutio

criminis corresponde à figura do suspeito, ou investigado. Não há nenhum dispositivo legal

que indique o marco inicial dessa situação jurídica, tampouco o tratamento jurídico que lhe deve ser conferido. Desta feita, observa-se que, na realidade, a pessoa do investigado não é diferenciada do informante, o qual acaba por ser ouvido na investigação policial como principal suspeito, sem ter conhecimento disso.

Em um segundo momento, o indivíduo adquire a posição de indiciado, passando de mero suspeito a efetivo alvo das investigações, o que se formaliza com o indiciamento, que é a atribuição da autoria ou da participação na infração penal a uma pessoa determinada. Deixa-se a seara da possibilidade do cometimento do ato infracional e adentra-se ao juízo de probabilidade, diante da existência de elementos informativos, ainda que mínimos, porém suficientes a vincular o investigado à prática delitiva.

Machado (2010, p. 65) ressalta que essa mudança provoca reflexos na situação e no sistema de liberdades do indiciado, que poderá, por exemplo:

[...] ser constrangido a comparecer aos atos do inquérito; ter a sua prisão provisória decretada; ter a sua vida pregressa investigada; ter os seus atos vigiados ou investigados pela autoridade policial e seus agentes; passará a ter registros criminais, enfim, estará sujeito a inúmeros constrangimentos a que normalmente os indivíduos não estão submetidos nos Estados democráticos. Em outras palavras, o indiciamento ameaça as liberdades fundamentais do indiciado, como o direito à imagem, à honra, à liberdade e, portanto, é ato que deve estar condicionado a algumas exigências legais.

Sobre o indiciado recai um maior nível de convicção de autoria, comparado ao suspeito. Por outro lado, havendo apenas escassos indícios a permitir a imputação penal, o investigado permanece na sua situação inicial, sendo vedado o indiciamento discricionário.

Embora se caracterize mais como o objeto da investigação do que como sujeito de direitos, o indiciado tem o direito de ser claramente informado acerca da sua condição e cientificado do fato de ser ele o principal foco da atividade policial. Ao explicitar que se trata de uma terminologia típica da fase pré-processual, Lopes Júnior (2010, p. 311) conceitua a pessoa do indiciado como aquela formalmente submetida ao inquérito policial e que ainda não foi objeto de denúncia ou queixa.

12 Art. 5º [...] LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são

(31)

Ato contínuo, havendo o arquivamento do inquérito policial ou o oferecimento da peça acusatória, cessa a condição de indiciado. Caso oferecida e recebida a denúncia ou a queixa-crime, instaura-se a ação penal e, por conseguinte, surge o acusado, imputado ou perseguido, contra quem recai a prestação jurisdicional. A depender da espécie da petição delatória, também se pode denominar o sujeito passivo de denunciado, quando das ações penais públicas, instauradas por iniciativa do Ministério Público, ou de querelado, em sede de ação penal privada, impulsionada pelo particular ofendido.

O ocupante do polo passivo é a parte de destaque na relação processual, haja vista ser a razão da persecução penal, bem como o destinatário da decisão final. Exige-se, para tanto, a legitimação passiva ad causam e ad processum, bem como a capacidade penal para figurar como sujeito passivo, razão pela qual excluem-se as coisas, os animais, os mortos, os menores de 18 anos e os que gozam de imunidade parlamentar ou diplomática.

Diversamente do que ocorre nas situações anteriores, a condição de acusado, parte integrante do processo, confere ao indivíduo a garantia da ampla defesa e do contraditório, aliados aos demais direitos constitucionalmente assegurados. O imputado atua em igualdade de armas com a acusação, e a gama de direitos subjetivos titularizados por ele têm eficácia frente a todos os sujeitos que interferem no processo, como o magistrado e o acusador.

Por fim, a condição de acusado encerra-se com o trânsito em julgado da sentença penal. Caso a decisão judicial definitva seja condenatória, inicia-se a execução penal e o imputado adquire a qualidade de condenado, sentenciado, apenado ou, ainda, executado.

Insta explicitar que, por preciosismo técnico, não se pode denominar o indivíduo de réu durante o processo, tendo em vista que sobre ele ainda paira a presunção de inocência. Nos termos do art. 5º, LVII13, da CF/88, que dispõe sobre o princípio da presunção de inocência, ou de não-culpabilidade, a qualidade de inocente perdura até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

3.4 O Sigilo do Inquérito Policial e o Trâmite sob Segredo de Justiça

Conforme já mencionado quando da análise das características do inquérito policial, o sigilo é um atributo intrínseco à investigação preliminar, apresentando-se nas espécies de sigilo interno e externo.

Ambos fundamentam-se na necessidade de preservar a intimidade dos envolvidos e o regular transcurso das investigações. No entanto, cumpre ratificar que o sigilo externo é

(32)

imposto em face dos terceiros estranhos ao feito, enquanto o interno destina-se primordialmente aos interessados, podendo alcançar o investigado, seu defensor, a vítima e as testemunhas.

O sigilo externo, portanto, corresponde a uma ausência de publicidade, vale dizer, a população em geral não tem acesso aos atos referentes ao inquérito policial. Essa restrição tem respaldo na premissa de se evitar a divulgação pormenorizada por parte da mídia acerca do desenvolvimento da investigação policial, o que pode levar ao fracasso da apuração do crime. Preserva-se, também, a imagem e a presunção de inocência do investigado, evitando-se a execração pública, eis que a sociedade tende a formar um prévio juízo de valor em face do suspeito, sobre o qual recai uma incriminação antecipada.

Já o sigilo interno autoriza que determinadas medidas sejam realizadas em segredo, sem que seja dado conhecimento até mesmo aos envolvidos, aos quais se impede o acesso a informações e o acompanhamento de atos da investigação. As diligências sigilosas impõem que os interessados não saibam que elas estão em vias de serem efetivadas e não acompanhem a realização de tais atos investigatórios, sob pena de se tornarem inócuos, bem como estabelecem uma restrição ao acesso aos seus resultados e às informações obtidas, tendo em vista a preservação da intimidade daqueles aos quais se dirigiu a providência policial, tal qual ocorre quando se tem a quebra do sigilo bancário de algum investigado.

Destarte, via de regra, a ausência genérica de publicidade comum a todo inquérito policial não pode ser oposta ao investigado e ao seu defensor, ao passo em que o sigilo interno, devidamente fundamentado no art. 20 do CPP ou nas demais hipóteses legais, permite a condução do feito sob estrito segredo de justiça, que pode afetar o acesso de suspeitos que sejam estranhos às informações coletadas, conforme as particularidades explanadas a seguir.

Acerca do segredo de justiça, não há um diploma legal que apresente toda a regulamentação correspondente, com as exatas hipóteses de cabimento, a delimitação do alcance e a forma de implemento. Entretanto, existem dispositivos processuais penais que prelecionam acerca do tema. Consoante salientado acima, o art. 20 do CPP dispõe que, no inquérito, a autoridade policial irá assegurar o sigilo imprescindível à elucidação do fato ou exigido pelo interesse social.

Outrossim, o art 1º da lei nº. 9.296/9614 determina que a interceptação de comunicações telefônicas condiciona-se a ordem judicial sob segredo de justiça, o que

14 Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação

(33)

também se impõe nos demais casos em que se rompe um direito ao sigilo, conforme explanado acima. O art. 7º, VIII15, e o art. 9º, § 4º16, ambos da lei nº 9.807/99, estabelecem a necessidade de sigilo durante as investigações policiais em proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas.

A lei do crime organizado (lei nº. 9.034/95), ao disciplinar sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas, aponta diligências resguardadas pelo segredo de justiça, nos seguintes termos:

Art. 2º. Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas: I - (Vetado);

II - a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação praticada por organizações criminosas ou a ela vinculado, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de informações;

III - o acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais;

IV - a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial; V - infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação, constituída pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada autorização judicial.

Parágrafo único. A autorização judicial será estritamente sigilosa e permanecerá nesta condição enquanto perdurar a infiltração.

(grifo nosso)

O Capítulo II da lei supracitada, intitulado “Da Preservação do Sigilo Constitucional”, prevê, no art. 3º17, que, tratando-se do acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais, e havendo possibilidade de violação de sigilo, o magistrado realizará pessoalmente a diligência, “adotado o mais rigoroso segredo de justiça”.

Constata-se, portanto, que há normas infraconstitucionais que prevêem determinadas hipóteses de implemento do segredo de justiça, por meio de autorização judicial, com vistas a resguardar o êxito da atividade policial e, ainda, o interesse da sociedade consubstanciado na paz e na ordem social.

15 Art. 7o Os programas compreendem, dentre outras, as seguintes medidas, aplicáveis isolada ou

cumulativamente em benefício da pessoa protegida, segundo a gravidade e as circunstâncias de cada caso: [...] VIII - sigilo em relação aos atos praticados em virtude da proteção concedida.

16 Art. 9º [...] § 4o O conselho deliberativo, resguardado o sigilo das informações, manterá controle sobre a

localização do protegido cujo nome tenha sido alterado.

17 Art. 3º. Nas hipóteses do inciso III do art. 2º desta lei, ocorrendo possibilidade de violação de sigilo preservado

(34)

A Carta Magna de 1988, por sua vez, contém a determinação do já analisado inciso LX18 do art. 5º, bem como do art. 93, IX19, o qual excepciona a regra geral da publicidade nos processos judiciais para os casos em que o interesse público assim exigir.

Acerca do tema, Albuquerque (2007, p. 49) ressalta que:

É certo, entretanto, que se tornou consensual no meio jurídico que nos procedimentos criminais, administrativos disciplinares ou fiscais, sempre que envolverem dados protegidos pela Constituição, ou sempre que houver interesse da nvestigação, é perfeitamente possível a decretação do segredo de justiça, ainda que não esteja, na hipótese investigada, previsto em lei.

Constata-se, portanto, que o sigilo no inquérito policial pode advir de despacho da autoridade policial fundamentado no art. 20 do CPP, de expressa previsão legal ou de ordem judicial, seja esta a requerimento do interessado, seja de ofício.

4 DELIMITAÇÃO DO CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL

Conforme já indicado no presente trabalho, o princípio do contraditório tem previsão constitucional no inciso LV do art. 5º, in verbis: “Art. 5º [...] LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (grifo nosso). Para que bem se esclareça a aplicabilidade do contraditório na fase policial, cumpre destacar e interpretar determinados trechos do preceito ora transcrito.

Primeiramente, tem-se que a Carta Magna destina o princípio em comento aos litigantes, em processo judicial ou administrativo. Ao se confrontar esta hipótese com as características do inquérito policial, verifica-se uma nítida divergência de situações, do que resulta que a investigação policial não se subsome ao preceito constitucional. A fase preliminar não consiste em ferramenta jurisdicional, uma vez que configura, em verdade, mera peça de informação, concretizada em um procedimento inquisitivo.

O inquérito policial dirige-se precipuamente à colheita de provas que servirão de base à denominada opinio delicti, vale dizer, ao convencimento do órgão responsável pela

18 Art. 5º [...] LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou

o interesse social o exigirem.

19 Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da

Magistratura, observados os seguintes princípios:

Referências

Documentos relacionados

Quanto às suas desvantagens, com este modelo, não é possível o aluno rever perguntas ou imagens sendo o tempo de visualização e de resposta fixo e limitado;

Os principais objectivos definidos foram a observação e realização dos procedimentos nas diferentes vertentes de atividade do cirurgião, aplicação correta da terminologia cirúrgica,

The challenges of aging societies and the need to create strong and effective bonds of solidarity between generations lead us to develop an intergenerational

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das

psicológicos, sociais e ambientais. Assim podemos observar que é de extrema importância a QV e a PS andarem juntas, pois não adianta ter uma meta de promoção de saúde se

Os principais resultados obtidos pelo modelo numérico foram que a implementação da metodologia baseada no risco (Cenário C) resultou numa descida média por disjuntor, de 38% no

Este trabalho consistiu na colheita de amostras de água superficial do rio Douro, com o objetivo de identificar a presença de espécies do género Staphylococcus, com perfis

Como mencionado anteriormente, em Cuba a densidade de médicos por número de habitantes é de 6,72 para cada 1 mil habitantes, média considerada altíssima, tendo