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EQUAÇÕES DIFERENCIAIS E

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Academic year: 2022

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EQUAC ¸ ˜ OES DIFERENCIAIS

E

MODELAC ¸ ˜ AO

20 ano da Licenciatura em Matem´atica

Maria de F´atima da Silva Leite Jos´e Carlos Soares Petronilho

Departamento de Matem´atica (FCTUC) Coimbra, Setembro de 2004

i

(2)

Nota pr´evia

O texto que se apresenta serviu de apoio `as aulas da disciplina deEqua¸c˜oes Diferenciais e Modela¸c˜aoleccionada pelos autores nos dois ´ultimos anos. Deve ter-se em mente que o texto n˜ao abarca a totalidade dos t´opicos estudados, assim como inclui outros que n˜ao foram abordados, e que a ordem de apresenta¸c˜ao n˜ao corresponde, em muitas situa¸c˜oes, `aquela em que a mat´eria foi, efectivamente, leccionada. Trata-se, pois, apenas de umas notas ainda em constru¸c˜ao.

(3)

Indice

Cap´ıtulo 1. No¸c˜oes b´asicas 1

1. Primeiras defini¸c˜oes 1

2. Exerc´ıcios 5

Cap´ıtulo 2. Equa¸c˜oes diferenciais de primeira ordem 7

1. Considera¸c˜oes geom´etricas 7

2. Equa¸c˜oes exactas 11

3. Equa¸c˜oes de vari´aveis separ´aveis 15

4. Equa¸c˜oes lineares de primeira ordem 18

5. Algumas EDO’s cl´assicas 20

6. Possibilidade de “invers˜ao” numa EDO de primeira ordem 24

7. Problema de Cauchy: y=f(t, y), y(t0) =y0 26

Cap´ıtulo 3. Aplica¸c˜oes das ED’s de 1a ordem `a Modela¸c˜ao Matem´atica 39

1. O que ´e Modela¸c˜ao Matem´atica ? 39

2. Lei do arrefecimento de Newton 40

3. Verdadeiro ou Falso? 42

4. Um modelo em Medicina 44

5. Modelos de Crescimento Populacional 46

Cap´ıtulo 4. Equa¸c˜oes diferenciais lineares de ordemn 49

1. Preliminares 49

2. Operador diferencial linear de ordemn 50

3. Equa¸c˜oes lineares homog´eneas 51

4. Equa¸c˜oes lineares n˜ao homog´eneas 57

5. M´etodo de D’Alembert ou de abaixamento de ordem 58

6. M´etodo de Lagrange ou da varia¸c˜ao das constantes arbitr´arias 62

7. Equa¸c˜oes lineares de coeficientes constantes 65

8. Exerc´ıcios 76

Cap´ıtulo 5. Transformada de Laplace 79

1. Defini¸c˜ao e primeiros exemplos 79

2. Existˆencia da transformada de Laplace 80

3. Propriedades da transformada de Laplace 82

4. Invers˜ao da transformada de Laplace 87

5. Aplica¸c˜ao `a resolu¸c˜ao de EDO’s 90

6. Teorema de Heaviside 94

7. “Pacotes” computacionais 98

Cap´ıtulo 6. Sistemas de Equa¸c˜oes Diferenciais 101

1. T´opicos da Teoria das Matrizes 101

iii

(4)

2. Exponencial matricial 111 3. Sistemas de equa¸c˜oes diferenciais. No¸c˜oes b´asicas 114

4. Teorema de existˆencia e unicidade 116

5. Sistemas diferenciais lineares 120

6. Sistemas diferenciais lineares homog´eneos 123

7. Sistemas diferenciais lineares homog´eneos de coeficientes constantes 125

8. Sistemas diferenciais lineares n˜ao homog´eneos 130

Bibliografia 133

(5)

No¸ c˜ oes b´ asicas

1. Primeiras defini¸c˜oes

Uma equa¸c˜ao envolvendo derivadas de uma fun¸c˜ao desconhecida dependente de uma ou mais vari´aveis (independentes) diz-se equa¸c˜ao diferencial. Neste curso vamos supor que esta fun¸c˜ao desconhecida depende apenas de uma ´unica vari´avel real, e que na equa¸c˜ao figura apenas um n´umero finito de derivadas. Uma tal equa¸c˜ao diferencial diz-seordin´aria1 (abreviadamente, escreveremos EDO) e pode sempre pˆor-se na forma

(1.1) F³

t, y, y, y′′,· · ·, y(n)´

= 0

onde y = y(t) ´e a fun¸c˜ao inc´ognita, t ´e a vari´avel independente, e F ´e uma fun¸c˜ao de v´arias vari´aveis definida de uma forma adequada. Naturalmente, na equa¸c˜ao (1.1) a plica representa a derivada relativamente `a vari´avel independente t. O n´umero inteiro positivo n, que indica a ordem da derivada de maior ordem de todas as derivadas que figuram na equa¸c˜ao diferencial, ´e designado por ordem da equa¸c˜ao diferencial. No caso mais geral a fun¸c˜ao desconheciday pode ser interpretada como uma matriz de fun¸c˜oes reais,

y=y(t) = [yij(t) ]i=1,...,r

j=1,...,s ,

pelo queFpode ser considerada definida num subconjuntoD⊂IRrs(n+1)+1e a tomar valores em IRrs. Assim, em geral, o zero no segundo membro da equa¸c˜ao (1.1) pode identificar-se com a matriz nula de ordemr×s.

Por exemplo, considerandor=s= 1 (caso escalar), dy

dt =ty+ siny e d2y dt2 −3

µd3y dt3

2

=t2et

s˜ao equa¸c˜oes diferenciais ordin´arias de ordens 1 e 3, respectivamente, tendo-se F(t, y, y) :=y−ty−siny e F(t, y, y, y′′) := (y)2−3(y′′)2−t2et. Pensando num exemplo mais elaborado, parar= 2 es= 3,

d2y dt2

 d2y11

dt2

d2y12

dt2

d2y13

dt2 d2y21

dt2

d2y22

dt2

d2y23

dt2

=

 d5y11

dt5 t4siny13 dy21

dt cos(t2) dy13

dt arccosd2y23

dt2

´e uma equa¸c˜ao diferencial (ordin´aria) de ordem 5, sendo neste caso a fun¸c˜ao desconhecida do tipo

y=y(t) =

"

y11(t) y12(t) y13(t) y21(t) y22(t) y23(t)

# .

1No caso de na equa¸c˜ao diferencial aparecerem mais que uma vari´avel independente, a equa¸c˜ao diz-se de derivadas parciais(e o seu estudo ser´a realizado em disciplinas de anos posteriores).

1

(6)

SejaI um intervalo deReϕ:I→Rr×s uma fun¸c˜ao que admite derivadas at´e `a ordem n(inclusiv´e) para todo ot ∈I. A fun¸c˜aoϕdiz-se umasolu¸c˜ao expl´ıcita em I da equa¸c˜ao diferencial (1.1) se

F(t, ϕ(t), ϕ(t), . . . , ϕ(n)(t))≡0 emI .

Isto significa que ϕ ´e solu¸c˜ao expl´ıcita em I da EDO (1.1) se substituindo nesta y e as suas sucessivas derivadas porϕ(t) e as suas sucessivas derivadas, respectivamente, a EDO ´e transformada numa identidade emI.

Uma rela¸c˜ao

ψ(t, y) = 0

diz-sesolu¸c˜ao impl´ıcita emI da EDO (1.1) se define pelo menos uma fun¸c˜aoϕda vari´avel realt, no intervaloI, tal que esta fun¸c˜ao ´e uma solu¸c˜ao expl´ıcita emI de (1.1).

Solu¸c˜oes expl´ıcitas e solu¸c˜oes impl´ıcitas de uma dada EDO denominam-se, usualmente, solu¸c˜oes. Porresolverouintegraruma EDO entende-se determinar as suas solu¸c˜oes.

Note-se que uma solu¸c˜ao impl´ıcita n˜ao ´e uma fun¸c˜ao (de acordo com a defini¸c˜ao).

Sucede que por vezes n˜ao ´e poss´ıvel determinar uma solu¸c˜ao expl´ıcita de uma EDO, pelo que se considera como “resolu¸c˜ao satisfat´oria” dessa EDO a determina¸c˜ao de uma rela¸c˜ao impl´ıcita (equa¸c˜ao) envolvendo apenas as vari´aveis independente e dependente (j´a “livre”

de derivadas!).

Por exemplo, a fun¸c˜aoϕ:R →R definida por ϕ(t) = et ´e solu¸c˜ao expl´ıcita em R da EDO de ordem 2

y′′=y .

Por outro lado, a rela¸c˜aot2+y2= 2 ´e solu¸c˜ao impl´ıcita em ]−√ 2,√

2[ da EDO

(1.2) yy =−t ,

j´a que cada uma das fun¸c˜oesy=ϕ+(t) ey=ϕ(t) definidas porϕ±:]−√ 2,√

2[→R(t7→

ϕ±(t) = ±√

2−t2) satisfaz a rela¸c˜ao t2+y2 = 2 para todo o t∈]−√ 2,√

2[, e ´e solu¸c˜ao expl´ıcita em ]−√

2,√

2[ da EDO (1.2). Isto pode confirmar-se facilmente determinando as express˜oes designat´orias que definem as fun¸c˜oes derivadasϕ+e ϕ, obtendo-seϕ±(t) =

∓t/√

2−t2, e verificar (por substitui¸c˜ao directa) que comy=±√

2−t2e y=∓t/√ 2−t2 (respectivamente) a equa¸c˜ao (1.2) se reduz a uma identidade para t ∈]−√

2,√

2[. Note- se tamb´em que por deriva¸c˜ao em ambos os membros da igualdade t2+y2 = 2 obt´em- se 2t+ 2yy = 0, donde yy = −t, pelo que da mera comprova¸c˜ao de que uma fun¸c˜ao y=ϕ(t), diferenci´avel nalgum intervaloI ⊂R, satisfa¸ca `a rela¸c˜aot2+y2= 2 emI, decorre imediatamente que essa fun¸c˜ao ´e solu¸c˜ao da EDO (1.2) emI.

Na pr´atica, o problema que se coloca ´e o de saber se uma dada rela¸c˜ao impl´ıcita define, de facto, alguma fun¸c˜ao solu¸c˜ao de uma dada EDO. Uma condi¸c˜ao suficiente para que uma rela¸c˜ao impl´ıcita defina uma rela¸c˜ao expl´ıcita ´e dada pelo denominado Teorema das Fun¸c˜oes Impl´ıcitas, estabelecido na disciplina de An´alise Infinitesimal. Recordemos aqui uma vers˜ao simples deste importante resultado.

Teorema(existˆencia de fun¸c˜oes impl´ıcitas) SejamD um dom´ınio deR2, (t0, y0) um ponto interior de D eG : D →R ((t, y)7→G(t, y)) uma fun¸c˜ao. Suponha-se que as derivadas parciaisGt eGy existem e s˜ao cont´ınuas emD, e que

G(t0, y0) = 0 , Gy(t0, y0)6= 0.

Ent˜ao existe um intervalo aberto,I, contendot0e uma ´unica fun¸c˜aoϕdefinida e cont´ınua emI tal que

ϕ(t0) =y0 , Gy(t, ϕ(t))6= 0, ∀t∈I , G(t, ϕ(t)) = 0 , ∀t∈I .

(7)

Al´em disso,ϕ´e deriv´avel (diferenci´avel) em I, sendo a derivada dada por

ϕ(t) =−Gt(t, ϕ(t))

Gy(t, ϕ(t)) , ∀t∈I .

Nas condi¸c˜oes do teorema, diz-se que a equa¸c˜aoG(t, y) = 0 defineycomofun¸c˜ao impl´ıcita det numa vizinhan¸ca det0. Recordemos que este ´e um resultado de natureza local, o que significa que se tem a garantia de existˆencia de fun¸c˜ao (expl´ıcita) a partir da rela¸c˜ao impl´ıcita apenas numa vizinhan¸ca de certo ponto (sob as condi¸c˜oes do teorema). Resultados gerais de natureza global (i.e., que garantam a existˆencia da fun¸c˜ao num intervalo fixadoa priori) n˜ao s˜ao conhecidos, embora esta “globalidade” possa ser testada nalguns casos particulares.

Concretizando, no caso do exemplo anterior envolvendo a equa¸c˜ao diferencial (1.2), o teorema precedente apenas garante que existe um intervalo aberto I ⊂ R, vizinhan¸ca do ponto 0 (toma-set0= 0 para fixar ideias), tal que a rela¸c˜aot2+y2= 2 define implicitamente uma

´

unica fun¸c˜ao (solu¸c˜ao da EDO (1.2)) y = ϕ(t) satisfazendoϕ(0) =√

2 para todo o t∈I.

Mas o Teorema nada diz `acerca da maior ou menor “extens˜ao” desse intervaloI, nem d´a um m´etodo para a determina¸c˜ao (expl´ıcita) da fun¸c˜aoϕ. Contudo, no caso em discuss˜ao verifica-se que ϕseria a fun¸c˜aoϕ+ introduzida atr´as (pois ϕ+(0) = √

2) e o “maior” (ou

“mais global”) intervaloI poss´ıvel seria ]−√ 2,√

2 [.

Observamos ainda, como se constata analisando este ´ultimo exemplo, que para assegurar a unicidade da fun¸c˜ao ϕ nas condi¸c˜oes do teorema anterior ´e necess´ario requerer a sua continuidade. De facto, considerando (t0, y0) = (0,√

2) e G(t, y) = t2+y2−2, ´e f´acil de verificar que as fun¸c˜osϕ1:]−√

2,√

2[→Re ϕ2:]−√ 2,√

2[→R definidas por ϕ1(t) =ϕ+(t)≡p

2−t2 e ϕ2(t) =

( ϕ+(t)≡√

2−t2 , t∈]−√ 2,0]

ϕ(t)≡ −√

2−t2, t∈]0,√ 2 [

ambas satisfazem a rela¸c˜aoF(t, y)≡t2+y2−2 = 0 em qualquer vizinhan¸ca de 0 contida em ]−√

2,√

2 [ e ambas cumprem a condi¸c˜aoy(0) =√

2. O que se passa ´e queϕ1´e cont´ınua em qualquer vizinhan¸ca de 0 contida em ]−√

2,√

2 [, masϕ2n˜ao (j´a que ´e descont´ınua no ponto 0).

Naturalmente, nem sempre ´e poss´ıvel determinar uma solu¸c˜ao (expl´ıcita ou impl´ıcita) de uma dada EDO (e pode at´e suceder que uma EDO n˜ao tenha solu¸c˜oes, como, por exemplo,

|y|+y2 = −1), mas em muitos problemas isso n˜ao ´e importante, bastando apenas saber justificar, por algum processo, que a solu¸c˜ao (ou as solu¸c˜oes) existe e que se comporta de determinada maneira (por exemplo, que `a medida que t cresce a solu¸c˜ao se mant´em limitada, ou que certas altera¸c˜oes na equa¸c˜ao—tais como a substitui¸c˜ao, na EDO dada, de certos termos por outros—n˜ao conduzem a altera¸c˜oes significativas no comportamento das suas solu¸c˜oes, etc.). Isto conduz ao estudo da chamada Teoria Qualitativa das EDO’s.

Um outro aspecto que tamb´em importa referir ´e que na maior parte das aplica¸c˜oes n˜ao interessa conhecer todas as solu¸c˜oes de uma dada EDO (mesmo que fosse poss´ıvel determin´a-las), mas sim solu¸c˜oes satisfazendo certas condi¸c˜oes previamente fixadas. Assim, d´a-se o nome deproblema de valores iniciais ouproblema de Cauchya todo o problema que consista em determinar a solu¸c˜ao (ou as solu¸c˜oes) de uma EDO requerendo que essa solu¸c˜ao satisfa¸ca certas condi¸c˜oes dadas num dado ponto (pertencente ao intervalo onde a EDO ´e dada). Estas condi¸c˜oes dadas dizem-se condi¸c˜oes iniciais. Por outro lado, d´a-se o nome de problema de valores na fronteiraa todo o problema que consista em determinar a solu¸c˜ao (ou as solu¸c˜oes) de uma EDO requerendo que essa solu¸c˜ao satisfa¸ca certas condi¸c˜oes dadas em dois ou mais pontos dados.

(8)

Chama-sesolu¸c˜ao geral(ou integral geralou, ainda,integral completo) de uma EDO ao conjunto de todas as suas solu¸c˜oes. Em particular, sen´e a ordem da EDO, uma fam´ılia de fun¸c˜oes

(1.3) Φ(t, y, c1, . . . , cn) = 0

(expl´ıcitas ou impl´ıcitas), dependente denparˆametros reaisc1,c2, ..., cn, define a solu¸c˜ao geral se (i) todo o elemento da fam´ılia for solu¸c˜ao dessa EDO nalgum intervalo; e (ii) toda a solu¸c˜ao da equa¸c˜ao se puder obter dessa fam´ılia por concretiza¸c˜ao dec1,c2, ...,cn.

Note-se que ´e natural (apesar de n˜ao ser evidente!) que se existir uma express˜ao que seja o “mais geral poss´ıvel”, no sentido de englobar o maior n´umero poss´ıvel de solu¸c˜oes da EDO de ordemn(1.1), nessa express˜ao figuremnconstantes arbitr´arias, porque no processo de integra¸c˜ao (resolu¸c˜ao) da EDO, intuitivamente tudo se passa como se efectu´assemos n integra¸c˜oes (primitiva¸c˜oes), uma vez que na resolu¸c˜ao de (1.1) procuramos y e em (1.1) aparece a derivada de ordemndey.

Para muitas equa¸c˜oes diferenciais, de ordemn, a solu¸c˜ao geral reduz-se a uma fam´ılia dependente denparˆametros, do tipo (1.3). No entanto, existem casos em que isto n˜ao sucede.

Qualquer solu¸c˜ao que se obtenha desta fam´ılia (1.3) por concretiza¸c˜ao dasnconstantesc1, c2, ...,cn diz-se uma solu¸c˜ao particularda EDO relativamente `a fam´ılia em quest˜ao. Dada uma fam´ılia de solu¸c˜oes comnparˆametros de uma EDO, chama-sesolu¸c˜ao singularda EDO relativamente a esta fam´ılia a qualquer solu¸c˜ao da EDO que n˜ao perten¸ca a essa fam´ılia.

Por exemplo,

y= 1/(c+t)2 define uma fam´ılia de solu¸c˜oes com um parˆametro da EDO

(1.4) y=−2y3/2,

no sentido de que para cada escolha decexiste um intervaloIondey= 1/(c+t)2define uma solu¸c˜ao (emI) desta EDO. No entanto, a solu¸c˜aoy(t)≡0 n˜ao est´a inclu´ıda nessa fam´ılia e, por isso, ´e uma solu¸c˜ao singular da EDO em quest˜ao (relativamente `a fam´ılia definida por y= 1/(c+t)2). Para ilustrar a dependˆencia dos conceitos de solu¸c˜ao particular e de solu¸c˜ao singular relativamente a uma fam´ılia de solu¸c˜oes, considere-se a EDO de ordem 1

(1.5) y= 12(y2−1).

Constata-se facilmente que a rela¸c˜ao

(1.6) y−1 =cet(y+ 1)

define uma fam´ılia de solu¸c˜oes com um parˆametro de (1.5) (j´a que, fazendoc percorrerR, define implicitamente as fun¸c˜oesϕc(t) := (1 +cet)/(1−cet), e comprova-se por substitui¸c˜ao directa que todas estas fun¸c˜oes s˜ao solu¸c˜oes da EDO em discuss˜ao, nalgum intervalo real).

Al´em disso,ϕ≡ −1 ´e solu¸c˜ao da EDO, mas n˜ao se pode obter da fam´ılia (1.6) por nenhuma escolha da constante c, pelo que constitui uma solu¸c˜ao singular da EDO relativamente `a fam´ılia (1.6). Por outro lado, tamb´em a rela¸c˜ao

c(y−1) = et(y+ 1)

define uma fam´ılia de solu¸c˜oes com um parˆametro de (1.5). Por´em, relativamente a esta fam´ılia,ϕ≡ −1 ´e solu¸c˜ao particular (escolhendoc= 0) eϕ≡1 ´e solu¸c˜ao singular.

Por vezes a equa¸c˜ao (1.1) pode ser resolvida explicitamente em termos dey(n), obtendo- se

(1.7) y(n)=f(t, y, y, y′′, . . . , y(n−1)),

(9)

ondef ´e uma fun¸c˜ao conhecida. Nesse caso, (1.7) diz-seforma normalda equa¸c˜ao diferencial.

Observe-se que (1.1) pode corresponder a mais do que uma equa¸c˜ao na forma normal. De facto, por exemplo, (y)2−4y= 0 representa as duas equa¸c˜oes diferenciaisy=±2√y.

No caso mais simples,n= 1, a equa¸c˜ao (1.7) reduz-se a y=f(t, y).

O cap´ıtulo 2 tem por objectivo, justamente, o estudo deste tipo de equa¸c˜oes (ou das que se podem reduzir a este tipo) na situa¸c˜ao particular em que y ´e fun¸c˜ao escalar, o que corresponde a tomar em (1.1)r=s= 1 (e, claro,n= 1).

2. Exerc´ıcios (1) Considere a igualdade coshα= 12sinβ .

(a) Justifique que n˜ao existem n´umeros reaisαeβque verifiquem a igualdade anterior.

(b) Ser´a a rela¸c˜ao coshy′′= 12sin(πy) uma equa¸c˜ao diferencial? Em caso afirmativo, o que poder´a dizer relativamente ao conjunto das suas solu¸c˜oes?

(2) Diga quais das rela¸c˜oes indicadas a seguir s˜ao equa¸c˜oes diferenciais a)y= cos(π/y) b) dd2t2y= ddy(√t+y) c)√y′′′=−1 d)y= 0ye−t2dt e)y′′= ddt

t

0log(sy) ds f) ∂x∂z+∂z∂y= ∂x∂y.

(3) Para cada uma das al´ıneas seguintes, verifique que as express˜oes indicadas `a direita definem solu¸c˜oes das equa¸c˜oes diferenciais indicadas `a esquerda (nalgum intervalo de n´umeros reais).

a)y′′′= 8y; ϕ(t) :=e2t−1

b)t2y′′+ty+y= 0 ; ϕ(t) := cos(logx) c) (1 +tety)y+yety+ 1 = 0 ; t+y+ety= 0. (4) Considere a rela¸c˜ao impl´ıcita

(ty)2+ log(t2+y2+ǫ) = 0, ondeǫ´e um parˆametro positivo (fixo).

(a) Justifique que paraǫ≥1 a rela¸c˜ao anterior n˜ao pode definirycomo fun¸c˜ao detem nenhum intervalo (n˜ao degenerado) de n´umeros reais.

(b) Se 0< ǫ <1, use o Teorema da existˆencia de fun¸c˜oes impl´ıcitas para mostrar que aquela rela¸c˜ao define implicitamente uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao diferencial

y=−t y

1 +ty(t2+y2+ǫ) 1 +t2(t2+y2+ǫ)

nalgum intervalo de n´umeros reais que contenha a origem.

(Sugest˜ao: Procure uma solu¸c˜ao tal quey(0) =√ 1−ǫ)

(10)
(11)

Equa¸ c˜ oes diferenciais de primeira ordem

Neste cap´ıtulo vamos estudar equa¸c˜oes diferencias ordin´arias de primeira ordem cuja fun¸c˜ao desconhecida ´e escalar. De acordo com o exposto anteriormente, uma tal equa¸c˜ao pode-se traduzir por uma rela¸c˜ao do tipo

F(t, y, y) = 0,

ondeF ´e uma fun¸c˜ao definida de modo adequado. Esta rela¸c˜ao pode assumir uma forma extremamente simples, como

y= 0, ou uma forma bastante complicada, tal como

log|ty|+ sin[(t2y−ey+ 1)y+p

t4+ 3 ] = 0. 1. Considera¸c˜oes geom´etricas

Vamos supor que a equa¸c˜ao geral de primeira ordem acima pode ser escrita na forma normal,

(1.1) y=f(t, y),

ondef ´e uma fun¸c˜ao real conhecida definida num certo conjunto Ω⊂R2.

1.1. Campo de Direc¸c˜oes. Recordemos que se uma fun¸c˜ao real de vari´avel real ´e deriv´avel num certo intervalo ent˜ao o valor da derivada da fun¸c˜ao num ponto t0 desse intervalo ´e o declive da recta tangente ao gr´afico da fun¸c˜ao no ponto do gr´afico cuja abcissa

´et0. Por outro lado, fixada a fun¸c˜aof, a cada ponto (t0, y0) de Ω pode associar-se a recta r≡rt0,y0 que passa por (t0, y0) e tem declivef(t0, y0), definida por

y−y0=f(t0, y0)(t−t0).

Por conseguinte, construindo um “pequeno” segmento de recta,ϕt0,y0, passando por (t0, y0) e paralelo art0,y0, e fazendo o mesmo para cada ponto (t, y) do dom´ınio Ω de f, obt´em- se o chamado campo de direc¸c˜oes definido pela equa¸c˜ao (1.1). O gr´afico de cada solu¸c˜ao y=ϕ(t) de (1.1) ´e, pois, tangente ao segmentoϕt,ϕ(t)em cada ponto (t, ϕ(t)) de Ω; e, como

“perto” dos pontos de tangˆencia o gr´afico da fun¸c˜ao tende a confundir-se com o conjunto dos correspondentes segmentos do campo de direc¸c˜oes, conclui-se que o campo de direc¸c˜oes permite ter uma ideia aproximada do comportamento geom´etrico das solu¸c˜oes da EDO (1.1).

O campo de direc¸c˜oes da equa¸c˜ao diferencial y=t

´e dado pelas figuras seguintes (na figura 1 tra¸cam-se apenas alguns segmentos do campo de direc¸c˜oes, enquanto que na figura 2 j´a se indica uma curva representando um esbo¸co do gr´afico de alguma solu¸c˜ao).

7

(12)

-2 -1 1 2

-2 -1 1 2

-2 -1 1 2

-2 -1 1 2

Figura 1 Figura 2

Como segundo exemplo, damos o campo de direc¸c˜oes da equa¸c˜ao diferencial y=y .

-2 -1 1 2

-2 -1 1 2

Figura 3

Analisando este campo de direc¸c˜oes, podemos inferir algumas conclus˜oes `acerca das solu¸c˜oes da equa¸c˜ao diferencialy=y:

• A solu¸c˜ao cresce com o tempo se a condi¸c˜ao inicial for positiva; e decresce se a condi¸c˜ao inicial for negativa.

• As solu¸c˜oes n˜ao podem mudar de sinal com o crescimento do tempo.

• As solu¸c˜oes n˜ao constantes s˜ao ilimitadas.

• Se a condi¸c˜ao inicial for nula, a solu¸c˜ao ´e a fun¸c˜ao identicamente nula.

• N˜ao h´a solu¸c˜oes constantes para al´em da solu¸c˜ao nula.

(13)

Estas conclus˜oes resultam da mera observa¸c˜ao da figura 3. Por´em, neste caso, podemos mesmo confirmar a sua veracidade, j´a que as solu¸c˜oes da EDO y = y s˜ao as fun¸c˜oes da formaϕ(t) =cet, ondec´e uma constante real qualquer.

A importˆancia do conhecimento dos campos de direc¸c˜oes est´a ligada, por exemplo, ao estudo de certas EDO’s cujas solu¸c˜oes n˜ao podem ser determinadas explicitamente, tais como

y= cost2, y= e−t2, y=p

1−ksin2t(0< k <1), y=t2+y2, etc.

De facto, para cada uma das trˆes primeiras destas equa¸c˜oes, a resolu¸c˜ao da EDO consiste, simplesmente, em determinar as primitivas (relativamente `a vari´avel t) das fun¸c˜oes que figuram nos segundos membros das igualdades, e ´e bem conhecido da An´alise Infinitesimal que cada uma das fun¸c˜oes envolvidas nos segundos membros dessas equa¸c˜oes n˜ao admite primitivas que se possam escrever como soma finita de fun¸c˜oes elementares, i.e., fun¸c˜oes polinomiais, racionais, exponenciais, logar´ıtmicas, circulares e hiperb´olicas (e suas inversas).

Referimos, a t´ıtulo de curiosidade, que as fun¸c˜oes que figuram nos segundos membros destas EDO’s tˆem interesse efectivo em problemas concretos: cost2´e uma fun¸c˜ao ´util emOptica;´ e−t2 ´e fundamental naTeoria das Probabilidades; e p

1−ksin2t est´a ligada aos chamados integrais el´ıpticos, ´uteis no c´alculo do comprimento de uma el´ıpse, por exemplo. Por outro lado, o campo de direc¸c˜oes ´e constru´ıdo directamente a partir da equa¸c˜ao diferencial em an´alise, procedimento que n˜ao envolve o conhecimento expl´ıcito das solu¸c˜oes da equa¸c˜ao, e em muitos casos permite tra¸car satisfatoriamente os gr´aficos dessas solu¸c˜oes.

1.2. Isocl´ınicas. Para determinar o campo de direc¸c˜oes correspondente a uma dada EDO, ´e ´util, por vezes, determinar primeiramente as chamadas curvas isocl´ınicas (o que significa curvas de “igual inclina¸c˜ao”). Fixada uma constantec ∈R, designa-se por curva isocl´ınica(ou, simplesmente,isocl´ınicaou, ainda,is´oclina) da EDO (1.1) correspondente ac ao conjunto dos pontos (t, y)∈Ω tais que

f(t, y) =c .

Assim, cada isocl´ınica ´e uma curva (contida em Ω) ao longo da qual todas as tangentes definidas pelo campo de direc¸c˜oes tˆem o mesmo declive.

No caso da EDOy=t, cujo campo de direc¸c˜oes ´e o indicado na figura 1, as isocl´ınicas s˜ao todas as rectas verticais (o que ´e bem vis´ıvel a partir da referida figura), enquanto que para a EDOy=y as isocl´ınicas s˜ao todas as rectas horizontais (cf. figura 3).

Como terceiro exemplo, considere-se a EDO y=t/y .

As isocl´ınicas s˜ao as rectas definidas port=cycomc∈R\{0}(i.e., s˜ao todas as rectas que passam pela origem, com excep¸c˜ao do eixo dostt). Observe-se que da pr´opria EDOy=t/y se pode extra´ır a seguinte informa¸c˜ao:

• Se uma curva integral (solu¸c˜ao) intersecta o eixo dostt (respectivamente: o eixo dosyy) ent˜ao ela ´e tangente a uma recta vertical (respectivamente: horizontal) em todos os pontos, excepto, possivelmente, o ponto (0,0).

• Os campos de direc¸c˜ao cujas tangentes s˜ao definidas pelas isocl´ınicas correspon- dentes a c =±1 s˜ao as rectas y = ±t (respectivamente); e pode verificar-se que estas duas isocl´ınicas definem duas solu¸c˜oes da EDO considerada (o que, geral- mente, n˜ao ´e uma propriedade das isocl´ınicas).

Na figura 4 podem ver-se os tra¸cados de algumas isocl´ınicas e dos correspondentes campos de direc¸c˜ao para a EDOy=t/y.

(14)

-2 -1 1 2

-2 -1.5 -1 -0.5 0.5 1 1.5 2

Figura 4 Como ´ultimo exemplo, considere-se a EDO

y=t2+y2.

Neste caso, as isocl´ınicas ou s˜ao conjuntos vazios (correspondentes a constantes c <0) ou s˜ao circunferˆencias centradas na origem, de equa¸c˜oes t2+y2=c, comc≥0 (figura 5).

-2 -1 1 2

-2 -1 1 2

Figura 5

Do exposto, a resolu¸c˜ao da EDO (1.1) tem uma interpreta¸c˜ao geom´etrica natural:fixada a fun¸c˜aof e o dom´ınioΩ, trata-se de determinar (se existirem) todas as curvas contidas em Ωcujas rectas tangentes em cada ponto(t, y)da curva coincidam com as dadas pelo campo de direc¸c˜oes neste ponto.

(15)

2. Equa¸c˜oes exactas

2.1. Defini¸c˜ao. SejamM(t, y) eN(t, y) duas fun¸c˜oes definidas num determinado aberto Ω⊂R2, e considere-se a EDO

(2.1) M(t, y) +N(t, y)y= 0.

SeN(t, y)6= 0 para todos os pontos (t, y)∈Ω, (2.1) pode reduzir-se `a forma normal (1.1) com

f(t, y) =−M(t, y) N(t, y).

A EDO (2.1) diz-sediferencial total exacta(ou, simplesmente, exacta) em Ω se existir uma fun¸c˜aou(t, y) definida em Ω tal que

(2.2) ∂u

∂t(t, y) =M(t, y), ∂u

∂y(t, y) =N(t, y), ∀(t, y)∈Ω.

A designa¸c˜ao resulta do facto de, nas condi¸c˜oes indicadas (e atendendo ao teorema da deriva¸c˜ao da fun¸c˜ao composta), ser

M(t, y) +N(t, y)y= ∂u

∂t(t, y) +∂u

∂y(t, y)dy dt(t) = d

dtu(t, y(t))

(i.e., M+N y ´e exactamente a derivada total (ordin´aria), du/dt, da fun¸c˜ao definida pela correspondˆenciat7→u(t, y(t))).

Observe-se que a rela¸c˜aoM+N y= du/dtpermite determinar as solu¸c˜oes de (2.1), as quais s˜ao, portanto, definidas implicitamente pela f´ormula

u(t, y) =C , ondeC ´e uma constante real arbitr´aria.

2.2. Teorema de caracteriza¸c˜ao.

Teorema2.1.SejamM(t, y)eN(t, y)duas fun¸c˜oes definidas num rectˆanguloΩ, definido pelas condi¸c˜oes

|t−t0|< a , |y−y0|< b (0< a, b <+∞),

e suponha-se queM eN s˜ao cont´ınuas e tˆem derivadas parciais cont´ınuas emΩ.

Ent˜ao, a EDO(2.1)´e exacta emse e s´o se

(2.3) ∂M

∂y = ∂N

∂t em Ω.

Nestas condi¸c˜oes, as solu¸c˜oes de(2.1)s˜ao dadas implicitamente pela rela¸c˜ao (2.4)

Z y y0

N(t, s)ds+ Z t

t0

M(s, y0)ds=C , ondeC ´e uma constante real arbitr´aria.

Prova. (⇒) Suponha-se que (2.1) ´e exacta. Ent˜ao, por (2.2), tem-se uty = My e uyt=Nt. Mas, por hip´otese,My eNt s˜ao cont´ınuas em Ω, logo, pelo Teorema de Schwarz, deve ter-seuty=uytem Ω. Em consequˆencia,M eN satisfazem necessariamente (2.3).

(⇐) Suponha-se agora que se verifica (2.3) e prove-se que (2.1) ´e exacta. Para isso, vamos mostrar que existe uma fun¸c˜aou=u(t, y) satisfazendo (2.2). Ora, se uma tal fun¸c˜ao

(16)

existir, deve verificarut=M. Integrando ambos os membros desta igualdade a respeito de t, entret0e t, obt´em-se

(2.5) u(t, y) =

Z t t0

M(s, y)ds+g(y)

ondeg(y) ´e, em princ´ıpio, uma fun¸c˜ao arbitr´aria de y (que desempenha o papel das con- stantes de integra¸c˜ao nos processos de primitiva¸c˜ao usuais). Para determinarg, vamos usar a segunda condi¸c˜ao,uy=N, a queu(existindo) tamb´em deve satisfazer. Assim, derivando ambos os membros de (2.5) relativamente ay, obt´em-se

(2.6) g(y) =N(t, y)− ∂

∂y Z t

t0

M(s, y)ds , e como

∂t µ

N− ∂

∂y Z t

t0

M(s, y)ds

=Nt−My= 0

(atenda-se ao Teorema de Schwarz para fun¸c˜oes reais de duas vari´aveis reais e ao Teorema Fundamental do C´alculo Integral para fun¸c˜oes reais de uma vari´avel real), conclui-se que o segundo membro de (2.6) depende, de facto, apenas de y. Consequentemente, g pode obter-se de (2.6) e decorre que a fun¸c˜aouprocurada ´e dada por (2.5). Portanto, mostr´amos que a condi¸c˜ao (2.3) ´e suficiente para que a EDO (2.1) seja exacta.

Para concluir a demonstra¸c˜ao resta mostrar que a f´ormula (2.4) define uma solu¸c˜ao impl´ıcita de (2.1), para cada constante realC. Para isso, come¸camos por calcular g(y) a partir de (2.6), obtendo-se (integrando ambos os membros de (2.6) entrey0ey)

g(y) =g(y0) + Z y

y0

N(t, s)ds− Z t

t0

M(s, y)ds+ Z t

t0

M(s, y0)ds , donde, atendendo a (2.5),

u(t, y) = Z y

y0

N(t, s)ds+ Z t

t0

M(s, y0)ds+g(y0), o que mostra que (2.4) ´e uma solu¸c˜ao impl´ıcita de (2.1) para cadaC ∈R.

Observac¸˜ao2.1. Como decorre da demonstra¸c˜ao, no enunciado do teorema precedente pode substituir-se a condi¸c˜ao de Ω ser um rectˆangulo pela condi¸c˜ao de ser um conjunto aberto e convexo deR2(e, nesse caso, supor que (t0, y0)∈Ω).

Observac¸˜ao 2.2. Em (2.5), a escolha det0 ey0´e arbitr´aria, impondo-se apenas que sejam escolhidos por forma a que os integrais envolvidos se mantenham pr´oprios.

2.3. Factores integrantes. Por vezes, ´e poss´ıvel transformar uma EDO n˜ao exacta numa exacta, multiplicando ambos os membros da EDO (n˜ao exacta) por um certo factor µ≡µ(t, y), chamadofactor integrante, tal que

(2.7) µ(t, y)M(t, y) +µ(t, y)N(t, y)y= 0

seja uma EDO exacta. Observe-se, no entanto, que as EDO’s (2.1) e (2.7) podem n˜ao ser equivalentes, pois podemos “perder” ou “ganhar” solu¸c˜oes com a introdu¸c˜ao do factor integrante. Por exemplo, a EDO

(2.8) y+ 3ty = 0

(17)

n˜ao ´e exacta, j´a que ∂M∂y ≡ 1 6= 3 ≡ ∂N∂t. Por´em, multiplicando ambos os membros desta EDO pory2, obt´em-se

(2.9) y3+ 3ty2y= 0,

que j´a ´e uma equa¸c˜ao exacta, pois ∂y(y3) = 3y2= ∂t(3y2t). Neste caso, o factor integrante

´e, pois,µ(t, y) =y2. ´E claro que (2.8) e (2.9) s˜ao EDO’s equivalentes (no sentido de terem as mesmas solu¸c˜oes), considerando Ω um rectˆangulo qualquer deR2. Por outro lado, observe-se que multiplicando ambos os membros de (2.8) porµ(t, y) =t−2/3obt´em-se

(2.10) t−2/3y+ 3t1/3y= 0,

que ´e tamb´em uma equa¸c˜ao exacta, pois ∂y (t−2/3y) =t−2/3= ∂t(3t1/3) parat6= 0. Por´em, (2.10) n˜ao ´e exacta em qualquer rectˆangulo deR2, mas apenas em qualquer rectˆangulo Ω que n˜ao intersecte o eixo das abcissas, pelo que apenas podemos afirmar que (2.8) e (2.10) s˜ao equivalentes desde que Ω seja um rectˆangulo nestas condi¸c˜oes.

De acordo com o exposto, a quest˜ao que se coloca ´e, pois, a da determina¸c˜ao de um factor integrante para uma equa¸c˜ao do tipo (2.1) que n˜ao seja exacta. Nestas condi¸c˜oes, de acordo com o Teorema 2.1, (2.7) ser´a uma EDO exacta se e s´o se

∂y(µM) = ∂

∂t(µN) em Ω, i.e.,µ(t, y) deve satisfazer `a condi¸c˜ao

(2.11) µ

µ∂M

∂y −∂N

∂t

=N∂µ

∂t −M∂µ

∂y , (t, y)∈Ω.

Esta rela¸c˜ao permite determinar o factor integranteµ(t, y), o qual pode n˜ao ser ´unico, como decorre do exposto atr´as. Note-se, ali´as, que (2.11) ´e uma equa¸c˜ao diferencial de derivadas parciais de primeira ordem (com vari´aveis independentest e y e vari´avel dependenteµ) e pode mostrar-se que tem sempre solu¸c˜ao. Isto significa que (2.1) admite sempre (!) factor integrante, que ´e solu¸c˜ao de (2.11). Acontece que, na pr´atica, esta solu¸c˜ao n˜ao pode, em geral, determinar-se analiticamente e, portanto, na maioria dos casos n˜ao tem qualquer utilidade – para a resolu¸c˜ao de (2.1), que ´e o nosso objectivo! – saber que existe factor integrante de (2.1). Contudo, nalguns casos simples ´e poss´ıvel determinar analiticamente um factor integrante. Isto sucede,e.g., se alguma das fun¸c˜oes T ouY definidas por

(2.12) T = 1

N µ∂M

∂y −∂N

∂t

e Y =− 1 M

µ∂M

∂y −∂N

∂t

¶ , for fun¸c˜ao apenas detouy (respectivamente), i.e.,

(2.13) T ≡T(t) e Y ≡Y(y).

Nesse caso, um factor integrante ser´a dado por

µ(t) = e T(t)dt ou µ(y) = e Y(y)dy

(respectivamente), como se comprova por substitui¸c˜ao directa em (2.11).

Assim, por exemplo, considerando novamente a EDO (2.8), tem-se 1

N µ∂M

∂y − ∂N

∂t

=−2

3t ≡T(t), logo

µ(t) = e 32tdt=t−2/3

(18)

´e factor integrante de (2.8), como anteriormente se tinha visto. Por outro lado, tem-se tamb´em

− 1 M

µ∂M

∂y −∂N

∂t

= 2

y ≡Y(y), pelo que

µ(y) = e y2dy=y2

´e tamb´em factor integrante de (2.8).

Agora, considerando a EDO exacta que resulta de (2.8) pela multiplica¸c˜ao do factor integrantey2, i.e., a EDO (2.9), usando a f´ormula (2.3) do Teorema 2.1 conclui-se que as solu¸c˜oes de (2.8) s˜ao dadas por

Z y y0

3ts2ds+ Z t

t0

y30ds=C , i.e. , ty3=C , C∈R.

Podemos tamb´em pensar em determinar factores integrantes (para a EDO (2.1)) da forma

µ=µ(ξ),

ondeξ ´e uma fun¸c˜ao conhecida, det e y. Se existir factor integrante desta forma, dever´a satisfazer a rela¸c˜ao (2.11), logo deve verificar-se

µ µ∂M

∂y −∂N

∂t

=N∂µ

∂t −M∂µ

∂y = µ

N∂ξ

∂t−M∂ξ

∂y

¶dµ dξ , donde

(2.14) 1

µ dµ

dξ = My−Nt

N ξt−M ξy.

Consequentemente, se o segundo membro desta igualdade se puder escrever como fun¸c˜ao apenas deξ, digamos

My−Nt

N ξt−M ξy

=φ(ξ), ent˜ao um factor integrante da EDO (2.1) ´e dado por

µ(ξ) = e φ(ξ)dξ

(isto pode comprovar-se verificando directamente queµ(ξ) assim definido ´e solu¸c˜ao de (2.11) ou de (2.14)).

Como exemplo ilustrativo desta situa¸c˜ao, considere-se a EDO (2.15) (3ty+y2) + (3ty+t2)y= 0,

e mostremos que admite um factor integrante do tipoµ=µ(ξ), comξ=t+y. Ora, tem-se My−Nt=t−y ,

e conclui-se que n˜ao existe factor integrante dependente apenas detou dependente apenas dey(j´a que, neste caso, as fun¸c˜oesT eY definidas por (2.12) n˜ao satisfazem (2.13)). Por´em, tem-se

My−Nt

N ξt−M ξy = t−y

t(3y+t)ξt−y(3t+y)ξy; logo, escolhendoξ≡ξ(t, y) =t+y, esta rela¸c˜ao reduz-se a

My−Nt

N ξt−M ξy

= 1

t+y = 1

ξ ≡φ(ξ),

(19)

e decorre que podemos calcular

µ(ξ) = e φ(ξ)dξ = e 1ξ =|ξ|. Isto permite concluir que um factor integrante da EDO (2.15) ´e

µ(t, y) =t+y , pelo que a EDO

(2.16) (3ty+y2)(t+y) + (3ty+t2)(t+y)y= 0

´e exacta e equivalente a (2.15)1. Finalmente, usando o Teorema 2.1 conclui-se que as solu¸c˜oes de (2.15) s˜ao dadas por

t3y+ 2t2y2+ty3=C , C∈R. 3. Equa¸c˜oes de vari´aveis separ´aveis As EDO’s mais simples que se podem considerar s˜ao as do tipo

(3.1) y=g(t),

ondeg ´e uma fun¸c˜ao (conhecida) apenas det. Claramente, resolver esta EDO reduz-se a determinar uma primitiva deg. Assim, supondo que esta fun¸c˜ao ´e primitiv´avel num certo intervaloI, as solu¸c˜oes de (3.1) neste intervalo s˜ao as fun¸c˜oesϕ:I →Rdadas por

ϕ(t) = Z

g(t) dt+C (C∈R), ondeR

g(t) dtrepresenta uma primitiva qualquer (concreta) deg.

A EDO (3.1) ´e caso particular da equa¸c˜ao mais geral do tipo

(3.2) h(y)y=g(t),

ondegehs˜ao fun¸c˜oes (conhecidas) detey, respectivamente. A EDO (3.2) diz-se uma EDO devari´aveis separadas(por nela as express˜oes envolvendoteyfigurarem separadamente nos membros da equa¸c˜ao). Uma EDO que se possa escrever na forma (3.2) diz-se uma EDO de vari´aveis separ´aveis. Por exemplo,

yy=t2

´e uma EDO de vari´aveis separadas, enquanto que

(1 +y2)t−(1 +t2)yy= 0

´e uma EDO de vari´aveis separ´aveis, j´a que se pode reescrever na forma equivalente y

1 +y2y= t 1 +t2.

Para resolver (3.2) suponha-se queg e h s˜ao primitiv´aveis (em intervalos adequados), relativamente `as vari´aveistey, respectivamente, e designemG(t) eH(y) primitivas (quais- quer) degeh (nos intervalos considerados), respectivamente. Ent˜ao, considerandoycomo fun¸c˜ao det,y=y(t), de acordo com o teorema da deriva¸c˜ao da fun¸c˜ao composta, tem-se

d

dtH(y) = d

dt(H◦y)(t) =h(y(t)).y(t) =h(y)y,

1Observe-se que, aparentemente, introduzimos uma solu¸c˜ao suplementar `a equa¸c˜ao (2.15), nomeada- mente,ϕ(t) :=−t, a qual resulta da possibilidade de sery+t= 0—sendo, portanto, solu¸c˜ao de (2.16)—;

mas comprova-se por verifica¸c˜ao directa queϕassim definida ´e tamb´em solu¸c˜ao de (2.15), pelo que (2.15) e (2.16) s˜ao, efectivamente, equa¸c˜oes equivalentes.

(20)

i.e.,H(y) ´e uma primitiva, relativamente `a vari´avelt, deh(y)y. Assim, de acordo com o que se expˆos para a resolu¸c˜ao de (3.1), ´e agora claro como resolver (3.2): primitivam-se ambos os membros de (3.2) relativamente at, obtendo-se

H(y) =G(t) +C (C∈R), ou, usando uma nota¸c˜ao mais sugestiva,

(3.3)

Z

h(y) dy= Z

g(t) dt+C (C ∈R).

Observe-se que nesta express˜ao est˜ao abarcadas todas as solu¸c˜oes de (3.2), por constru¸c˜ao, pelo que (3.3) constitui a solu¸c˜ao geral de (3.2).

Como primeiro exemplo, considere-se a EDO

(3.4) y= e−2ycost .

Multiplicando ambos os membros da equa¸c˜ao por e2y, obt´em-se e2yy= cost, pelo que (3.4)

´e uma EDO de vari´aveis separ´aveis, cuja solu¸c˜ao geral ´e determinada por Z

e2ydy= Z

costdt+C , i.e. , e2y= 2 sint+C (C∈R),

rela¸c˜ao que define implicitamente as solu¸c˜oes de (3.4). Neste caso ´e claro que, considerando intervalos adequados para a varia¸c˜ao det, as solu¸c˜oes podem mesmo explicitar-se, de modo que (em intervalos adequados) as solu¸c˜oes de (3.4) s˜ao definidas por

ϕ(t) = log√

2 sint+C (C∈R).

Como se constata imediatamente, e (3.4) sugere, uma EDO de vari´aveis separ´aveis

´e, essencialmente, uma EDO de primeira ordem que se pode escrever na forma normal y=f(t, y) onde a fun¸c˜aof(t, y) ´e factoriz´avel como produto de duas fun¸c˜oes, uma apenas dete outra apenas de y, digamos,f(t, y) =g(t)h1(y), ou seja, ´e essencialmente uma EDO da forma

(3.5) y=g(t)h1(y).

Note-se que seh1(y)6= 0 nalgum intervalo ent˜ao, nesse intervalo, (3.5) ´e equivalente a (3.2), pondoh(y) = 1/h1(y) e, de acordo com (3.3), a solu¸c˜ao geral de (3.5) ´e dada por

(3.6)

Z 1 h1(y)dy=

Z

g(t) dt+C (C ∈R).

Por´em, seh1(y0) = 0 para algumy0, ent˜ao ´e ´obvio que a fun¸c˜ao constante definida por ϕ(t)≡y0

´e solu¸c˜ao de (3.5) em qualquer intervalo ondegesteja bem definida (e, claro, seja a´ı primi- tiv´avel).

Como segundo exemplo, considere-se a EDO

(3.7) y= (3−y)y .

Referimos que EDO’s deste tipo dizem-selog´ısticase aparecem frequentemente em problemas de varia¸c˜ao populacional. ´E ´obvio, por um lado, que

ϕ1(t)≡0 e ϕ2(t)≡3

(21)

s˜ao solu¸c˜oes de (3.7) em qualquer intervalo de R. Por outro lado, considerando Ω um dom´ınio deR2 que n˜ao intersecte as rectas y= 0 e y= 3, separando as vari´aveis na EDO (3.7), tem-se

1

(3−y)yy= 1. Agora, de acordo com (3.6), deduz-se

Z 1

(3−y)ydy=t+C , i.e. , 13 Z µ

1 y+ 1

3−y

dy=t+C , ou seja,

log

¯

¯

¯

¯ y 3−y

¯

¯

¯

¯= 3t+C (C ∈R).

Esta rela¸c˜ao define implicitamente uma fam´ılia de solu¸c˜oes da EDO (3.7) nalgum intervalo I. Observe-se que esta ´ultima pode reescrever-se na forma equivalente

(3.8)

¯

¯

¯

¯ y 3−y

¯

¯

¯

¯

=Ce3t (C >0).

Daqui, paraC >0 (fixo) resulta que y/(3−y) =±Ce3t para todo o t∈I. Por´em, como procuramosy=y(t) como solu¸c˜ao de uma EDO no intervaloI, logo, em particular,ydever´a ser uma fun¸c˜ao cont´ınua detemI, ter´a for¸cosamente de ser ouy/(3−y) =Ce3tpara todo o t∈I, ouy/(3−y) =−Ce3tpara todo ot∈I. Estas duas situa¸c˜oes podem ser descritas por uma mesma express˜ao, atribuindo maior liberdade `a constanteC, e deduz-se que a rela¸c˜ao

(3.9) y

3−y =Ce3t (C ∈R)

define implicitamente uma fam´ılia de solu¸c˜oes da EDO (3.7) nalgum intervaloI. Note-se que a solu¸c˜aoϕ1≡0 se obt´em desta fam´ılia de solu¸c˜oes como solu¸c˜ao particular, escolhendo C = 0. Foi por isso que se pˆosC ∈R e n˜aoC∈R\{0}, em (3.9). Observe-se tamb´em que a solu¸c˜aoϕ2≡3 n˜ao se pode obter de (3.9) por concretiza¸c˜ao deC, pelo que constitui uma solu¸c˜ao singular da EDO (3.7) relativamente a esta fam´ılia de solu¸c˜oes (3.9). Al´em disso, resolvendo (3.9) [ou (3.8)] relativamente a y, conclui-se que as solu¸c˜oes de (3.7) s˜ao dadas explicitamente por

(3.10) ϕ(t) =

















3Ce3t/(Ce3t−1) , y <0

0 , y= 0

3Ce3t/(Ce3t+ 1) , 0< y <3

3 , y= 3

3Ce3t/(Ce3t−1) , y >3 , ondeC ´e uma constante arbitr´aria e positiva (C >0).

Observe-se que cada solu¸c˜ao definida por (3.10) fica perfeitamente especificada se fixar- mos uma condi¸c˜ao inicial. Isto ´e, por cada ponto (t0, y0)∈R2 fixado a priori passa uma e uma s´o solu¸c˜ao, que ´e explicitamente definida por algum dos ramos que comp˜oem a express˜ao (3.10). Note-se tamb´em que para cada escolha deC >0 existem trˆes possibilidades para a solu¸c˜ao, e que o intervalo de defini¸c˜ao da solu¸c˜ao depende da escolha deC, podendo existir ass´ımptotas horizontais (para as solu¸c˜oes que se situam na faixa definida por 0< y < 3) ou simultaneamente ass´ımptotas verticais e horizontais (para as solu¸c˜oes que se situam nos semi-planos definidos pory <0 ouy >3). Estas ass´ımptotas verticais dependem da escolha da constanteC >0, sendo definidas port=−13logC.

(22)

Observac¸˜ao 3.1. Sendo dtum acr´escimo n˜ao nulo da vari´avel independente, a EDO (3.2) pode reescrever-se como

h(y)ydt=g(t) dt .

Considerandoycomo fun¸c˜ao det, digamos, y=y(t), o diferencial da vari´avel dependente ´e dado por dy=ydt, o que permite reescrever novamente a EDO (3.2) na forma

(3.11) h(y) dy=g(t) dt .

Esta ´e uma forma usual de escrever uma EDO de vari´aveis separ´aveis, a qual tem algumas vantagens pr´aticas. Com efeito, comparando esta rela¸c˜ao com a f´ormula (3.3), anteriormente estabelecida para as solu¸c˜oes de (3.2),

Z

h(y) dy= Z

g(t) dt+C (C ∈R),

somos conduzidos `a seguinte regra pr´atica para a determina¸c˜ao das solu¸c˜oes da EDO de vari´aveis separadas na forma (3.2): basta “aplicar integrais” a ambos os membros da igual- dade (3.11).

Assim, por exemplo, para resolver a EDOyy=t2, reescrevemo-la na formaydy=t2dt e, “aplicando integrais”, segue-se que as suas solu¸c˜oes s˜ao dadas porR

ydy= R

t2dt+C, ou seja, s˜ao definidas implicitamente pela rela¸c˜ao

y2 2 = t3

3 +C (C∈R).

Observac¸˜ao 3.2. Do mesmo modo, em vez da EDO do tipo (2.1), anteriormente con- siderada, tamb´em ´e corrente (e rigoroso) escrever

(3.12) M(t, y) dt+N(t, y) dy= 0.

Contudo, neste caso as vantagens n˜ao s˜ao t˜ao evidentes como no caso acima, pois as vari´aveis te y figuram nas fun¸c˜oes que aparecem como factores de ambos os acr´escimos dt e dy na equa¸c˜ao, pelo que n˜ao faz sentido “aplicar integrais” a (3.12).

4. Equa¸c˜oes lineares de primeira ordem

Sejama0,a1eb fun¸c˜oes definidas num intervaloI⊂R. A equa¸c˜ao diferencial a0(t)y+a1(t)y=b(t)

diz-se umaequa¸c˜ao diferencial linear de primeira ordem, designa¸c˜ao justificada pelo facto de tal equa¸c˜ao poder ser encarada como uma combina¸c˜ao linear das vari´aveisy ey (sendo os coeficientes da combina¸c˜ao linear as fun¸c˜oesa0ea1, independentes dey ey).

Se o segundo membro da equa¸c˜ao,b, for a fun¸c˜ao identicamente nula emI, a equa¸c˜ao diz-sehomog´enea; caso contr´ario, diz-sen˜ao homog´eneaoucompleta.

Neste par´agrafo vamos admitir que a fun¸c˜aoa0 nunca se anula no intervalosI e, al´em disso, quea0,a1ebs˜ao fun¸c˜oes cont´ınuas emI, hip´oteses que simplificam consideravelmente o estudo destas equa¸c˜oes diferenciais. Deste modo (dividindo ambos os membros pora0(t)) a equa¸c˜ao diferencial pode reescrever-se na forma equivalente

(4.1) y+P(t)y=Q(t),

ondeP eQs˜ao fun¸c˜oes cont´ınuas no intervaloI. Para a resolu¸c˜ao de (4.1) podem adoptar- se v´arios m´etodos, nomeadamente om´etodo do factor integrantee om´etodo da varia¸c˜ao das constantes arbitr´arias, que a seguir se exp˜oem. Como, sob as hip´oteses consideradas, qualquer destes m´etodos de resolu¸c˜ao ´e sempre aplic´avel, em particular conclui-se que a EDO (4.1) admite sempre solu¸c˜ao emI.

(23)

4.1. M´etodo do factor integrante. Multiplicando ambos os membros de (4.1) por µ(t) := e P(t)dt

(dito factor integrante), onde R

P(t)dt ´e qualquer primitiva deP emI, obt´em-se e P(t)dty+P(t) e P(t)dt=Q(t) e P(t)dt,

express˜ao que se pode reescrever na forma d

dt

³

e P(t)dt

=Q(t) e P(t)dt. Integrando ambos os membros relativamente at, vem

e P(t)dty= Z ³

Q(t) e P(t)dt´

dt+C ,

ondeC ´e uma constante real arbitr´aria, logo o integral geral da EDO (4.1) ´e

(4.2) y=

µZ ³

Q(t) e P(t)dt´ dt+C

e P(t)dt, C∈R.

Observac¸˜ao 4.1. A introdu¸c˜ao do factor integranteµ, tal como definido acima, pode justificar-se no contexto da teoria devenvolvida para as equa¸c˜oes diferenciais totais exactas.

Com efeito, (4.1) ´e do tipo (2.1), com M(t, y) := P(t)y −Q(t) e N(t, y) ≡ 1 . Como

∂M/∂y=P(t) e ∂N/∂t= 0 , a equa¸c˜ao n˜ao ´e total exacta. Por´em, N1 ³

∂M

∂y∂N∂t

´

=P(t) , que s´o depende de t, pelo que existe factor integrante como fun¸c˜ao apenas de t, que ´e justamente o factorµintroduzido acima.

4.2. M´etodo da varia¸c˜ao das constantes arbitr´arias. Este m´etodo consiste em re- solver a EDO (4.1) em duas etapas, determinando primeiramente a solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ao homog´enea associada,

(4.3) y+P(t)y= 0,

que ´e uma equa¸c˜ao de vari´aveis separ´aveis (e, portanto, sabemos j´a como resolver), e em seguida fazendo variar a constante arbitr´aria, C, que figura na solu¸c˜ao geral que j´a se determinou (da equa¸c˜ao homog´enea), considerando momentaneamente que essa constante ´e fun¸c˜ao det, digamos,C =C(t), e determinando em seguidaC(t) de modo que a express˜ao da solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ao homog´enea, comC(t) em vez deC, seja uma solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao completa (4.1). ´E ´obvio que y(t)≡ 0 ´e uma solu¸c˜ao de (4.3). Supondo ent˜ao y6= 0 nalgum intervalo, nesse intervalo deduz-se sucessivamente

1

ydy=−P(t) dt ⇒ Z 1

ydy=− Z

P(t) dt+c

⇒ log|y|=− Z

P(t) dt+c

⇒ |y|= ece P(t)dt,

ondec´e uma constante real arbitr´aria. Pela continuidade da solu¸c˜ao de uma EDO, decorre que a solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ao homog´enea (4.3) ´e dada por

y=Ce P(t)dt, C∈R.

(24)

Supondo agora queC´e fun¸c˜ao det, determine-seC(t) de modo que y(t) =C(t) e P(t)dt seja solu¸c˜ao de (4.1). Como y(t) = [C(t)−P(t)C(t)] e P(t)dt, substituindo estas ex- press˜oes dey(t) ey(t) em (4.1), obt´em-se

C(t) =Q(t) e P(t)dt ⇒ C(t) = Z ³

Q(t) e P(t)dt´

dt+C , C ∈R;

logo, substituindo esta express˜ao para C(t) em y(t) = C(t) e P(t)dt, somos novamente conduzidos `a express˜ao (4.2) para a solu¸c˜ao geral de (4.1).

5. Algumas EDO’s cl´assicas

Nesta sec¸c˜ao apresentaremos algumas EDO’s que estiveram na origem da Teoria das Equa¸c˜oes Diferenciais. Muitas destas EDO’s podem ser resolvidas utilizando uma mudan¸ca de vari´avel adequada, a qual permite, em cada caso, reduzir a EDO em an´alise a um dos tipos j´a estudado.

5.1. Equa¸c˜ao homog´enea. Sendok um n´umero real, uma fun¸c˜aoh : Ω⊂ R2 →R diz-sehomog´enea de graukno dom´ınio Ω se

(5.1) h(λt, λy) =λkh(t, y)

para todos os pares (t, y)∈Ω e para todos os n´umeros reaisλ tais que (λt, λy)∈Ω.

As fun¸c˜oes abaixo fornecem alguns exemplos de fun¸c˜oes homog´eneas (kindica o grau de homogeneidade, em cada caso):

• h(t, y) := 3t2−ty−y2 ,k= 2 ;

• h(t, y) := sin(t2/(t2−y2)) ,k= 0 ;

• h(t, y) := 6ey/t/(t2/3y1/3) ,k=−1 ;

• h(t, y) := (t4+ 7y4)1/5 ,k= 4/5 .

Chama-seequa¸c˜ao diferencial homog´eneaa toda a EDO do tipo

(5.2) y =f(t, y)

ondef ´e uma fun¸c˜ao homog´enea de grau zero nalgum dom´ınio Ω⊂R2. Observe-se que, fazendo em (5.1)λ= 1/tvem

tkf³ 1,y

t

´

=f(t, y),

o que implica que uma fun¸c˜ao homog´enea de grauk= 0 pode ser vista como uma fun¸c˜ao de uma s´o vari´avel, nomeadamentev=y/t. Assim, a EDO homog´enea (5.2) ´e essencialmente uma EDO da forma

(5.3) y=g³y

t

´ ,

ondeg´e uma fun¸c˜ao real de vari´avel real. Para resolver esta equa¸c˜ao, efectue-se a mudan¸ca de vari´avel dependente (y→v) definida por

y=tv , i.e., v=y/t . Ent˜ao, ´e y=v+tv, logo por substitui¸c˜ao em (5.3) obt´em-se

(5.4) tv=g(v)−v ,

que ´e uma EDO de vari´aveis separ´aveis, pelo que pode aplicar-se a teoria desenvolvida para a resolu¸c˜ao deste tipo de equa¸c˜oes. Assim, por um lado, se para algumv0∈Rforg(v0) =v0, decorre quev(t)≡v0´e uma solu¸c˜ao de (5.4), logo

y(t) :=v0t

(25)

´e uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao homog´enea (5.3). Por outro lado, seg(v)6=vnalgum intervaloJ, admitindo queg´e cont´ınua emJ, de (5.4) deduz-se que R dv

g(v)−v =R dt

t +C= log|t|+C, ondeC ´e uma constante real arbitr´aria, pelo que, pondo

G(x) :=

Z dx

g(x)−x (escolhe-se uma qualquer primitiva emJ),

uma fam´ılia de solu¸c˜oes (nalgum intervalo adequado que n˜ao contenha a origem) da EDO (5.3) ´e dada por

(5.5) G³y

t

´

= log|t|+C , C ∈R. Observac¸˜ao 5.1. E f´acil constatar que uma EDO do tipo´

M(t, y)dt +N(t, y)dy= 0,

ondeM eN s˜ao fun¸c˜oes homog´eneas do mesmo grau nalgum dom´ınio Ω ondeN nunca se anule, ´e uma EDO homog´enea.

Como exemplo, considere-se a EDO

(t2−ty+y2)dt+t2dy= 0.

Tem-se M(t, y) := t2−ty +y2 e N(t, y) := t2, logo M e N s˜ao fun¸c˜oes homog´eneas do mesmo grau k = 2. Por conseguinte, a EDO em quest˜ao ´e homog´enea em intervalos adequados, que n˜ao contenham a origem. Considerando dom´ınios Ω que n˜ao contenham pontos do eixo dosyy, esta EDO pode reescrever-se na forma equivalente

y=−1 +y t −³y

t

´2

≡g³y t

´ ,

ondeg(v) :=−1 +v−v2. Observe-se que n˜ao existem pontosv0tais queg(v0) =v0. Assim, efectuando a mudan¸ca de vari´avel (y →v) definida pory = tv, e atendendo a que, neste caso, ´e

G(x) :=− Z dx

1 +x2 = arctanx ,

deduz-se de (5.5) que, em intervalos adequados, uma fam´ılia de solu¸c˜oes da EDO em an´alise

´e

y=ttan (C−log|t|), C∈R.

5.2. Equa¸c˜ao homogr´afica. Chama-se equa¸c˜aohomogr´aficaa uma EDO do tipo

(5.6) y=g

µa1t+b1y+c1

a2t+b2y+c2

¶ ,

ondeg´e uma fun¸c˜ao cont´ınua nalgum intervalo eai, bi, ci (i= 1,2) s˜ao n´umeros reais fixos tais que|a2|+|b2|+|c2|>0.

Note-se que sea1=a2= 0 oub1=b2= 0 a equa¸c˜ao reduz-se a uma EDO de vari´aveis separ´aveis, e se c1 = c2 = 0 ela ´e redut´ıvel a uma EDO homog´enea. Em qualquer destes casos sabemos j´a como resolver a equa¸c˜ao, pelo que no que vai seguir-se podemos supor que em (5.6) nenhum dos pares (a1, a2), (b1, b2) e (c1, c2) coincide com o par (0,0).

A determina¸c˜ao das solu¸c˜oes da EDO (5.6) ser´a feita analisando separadamente dois casos, de acordo com a posi¸c˜ao relativa das rectas definidas pelas equa¸c˜oes a1t+b1y+c1= 0 e a2t+b2y+c2= 0 .

(26)

Caso 1: As rectas s˜ao concorrentes. Designando por (t0, y0) o ponto de intersec¸c˜ao destas rectas, (5.6) resolve-se efectuando a substitui¸c˜ao definida por

½ t=u+t0

y=v+y0.

Daqui vem y =v e, comoa1t0+b1y0+c1= 0 =a2t0+b2y0+c2= 0 , tamb´em a1t+b1y+c1

a2t+b2y+c2 = a1u+b1v

a2u+b2v = a1+b1v/u a2+b2v/u, pelo que (5.6) se converte na EDO homog´enea

v=h³v u

´, onde h(x) :=g

µa1+b1x a2+b2x

¶ .

Caso 2: As rectas s˜ao paralelas (eventualmente coincidentes). Ent˜ao, ou a1 e a2 s˜ao simultaneamente nulos, ou s˜ao ambos n˜ao nulos, e analogamente parab1eb2, pelo que pode- mos supor que nenhum dos n´umeros a1, a2, b1, b2 ´e zero. Agora, a condi¸c˜ao de paralelismo implica

a1

a2

= b1

b2 ≡λ , logo

a1t+b1y+c1

a2t+b2y+c2

= λ(a2t+b2y) +c1

a2t+b2y+c2

, pelo que a substitui¸c˜ao

a2t+b2y=u permite reduzir (5.6) `a forma

u−a2

b2

=g

µλu+c1

u+c2

¶ ,

que ´e uma EDO de vari´aveis separ´aveis (na vari´avel dependenteu).

5.3. EDO’s redut´ıveis a lineares de primeira ordem. Certas EDO’s n˜ao lineares podem, por vezes, converter-se em EDO’s lineares, atrav´es de uma mudan¸ca de vari´avel (dependente) adequada. Nesta sec¸c˜ao vamos estudar algumas EDO’s em que isso sucede.

5.3.1. Equa¸c˜ao de Bernoulli. Chama-seequa¸c˜ao de Bernoullia uma EDO do tipo (5.1) a0(t)y+a1(t)y=b(t)yn,

onde se sup˜oe quea0, a1, bs˜ao fun¸c˜oes cont´ınuas nalgum intervaloI en´e um n´umero real (que pode ou n˜ao ser inteiro).

Claramente, sen= 0 a equa¸c˜ao anterior ´e linear; e, sen= 1 trata-se de uma equa¸c˜ao de vari´aveis separ´aveis.

Sen6= 0 en6= 1, multiplicando ambos os membros de (5.1) pory−n, obt´em-se (5.2) a0(t)y−ny+a1(t)y1−n=b(t).

Isto sugere que se efectue a mudan¸ca de vari´avel (y→v) definida por v=y1−n.

Ter-se-´a ent˜ao, derivando,y−ny=v/(1−n); logo, substituindo em (5.2), conclui-se que a equa¸c˜ao (5.1) ´e transformada na equa¸c˜ao

a0(t)

1−nv+a1(t)v=b(t),

Referências

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