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Sumário. Texto Integral. Tribunal da Relação de Guimarães Processo nº 2180/12.3TBVRL-A.G1

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Tribunal da Relação de Guimarães Processo nº 2180/12.3TBVRL-A.G1 Relator: ANTÓNIO SOBRINHO

Sessão: 12 Março 2015 Número: RG

Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: IMPROCEDENTE

NOVAÇÃO ABUSO DE DIREITO

Sumário

I – Existe novação quando as partes contratantes quiseram eliminar a dívida antiga, constituindo uma nova obrigação.

II – Ao invés, havendo uma simples modificação da obrigação, mantêm-se todos os elementos que não foram especificamente alterados, ou seja, não se pressupõe a eliminação das garantias e dos acessórios da dívida alterada.

III - A vontade de substituir a antiga obrigação (“animus novandi”), mediante a contracção de novo vínculo, há-de resultar de declaração expressa.

IV - Não se provando que o exequente induziu maliciosamente os executados à constituição de uma hipoteca com a promessa de celebração de um novo

contrato bancário, em que fossem eximidos aqueles da garantia pessoal – avales pessoais – dada à execução, inexiste abuso de direito, na vertente venire contra factum proprium.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório;

Apelante (s): AA, BB e CC (oponentes/executados);

Apelado (s): DD (exequente/oponido);

*****

Nos autos de oposição à execução que a exequente DD instaurou contra os

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oponentes AA, BB e CC, aqui recorrentes, foi proferida decisão que julgou improcedente a oposição e ordenou o prosseguimento dos autos.

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram os oponentes o presente recurso de apelação, em cuja alegação formulam, em súmula, as seguintes conclusões:

F020

1) Sendo dado à execução a 1ª livrança, destinada a garantir um contrato que veio a ser alterado, o Banco é ilegítimo portador de tal livrança, pois que tendo recebido da devedora (AA) a segunda livrança, passou a partir de então a não ter fundamento para se manter na posse da primeira.

2) A 2ª livrança constituiu, como é razoável extrair de tudo quanto resulta da documentação junta e da alegação do exequente, de uma substituição da 1ª livrança.

3) Em face da prova documental referida, conjugada com a posição assumida pelo Banco exequente e as regras da experiência comum importam a

modificação da matéria de facto assente conforme consta das alíneas B), C) e M) da douta sentença recorrida, pois que:

i. Nem a livrança que vem dada à execução se destinou a garantir o cumprimento do contrato de conta corrente caucionada celebrado com a executada em 06/11/2002, mas sim o contrato de abertura de crédito

celebrado em 26/03/2001 (vide contrato junto com a contestação do exequente às oposições dos executados)

ii. Nem o Banco exequente, para o referido contrato de conta corrente caucionada (2º contrato) exigiu unicamente da executada como garantia a subscrição da dita livrança, uma vez que com a celebração do contrato de alteração em 06/11/2002 exigiu e foi-lhe entregue uma outra livrança;

iii. Nem a entrega da segunda livrança representou um reforço das garantias prestadas (livrança entregue com o primeiro contrato)

4) Ainda a respeito de modificação da matéria de facto a efectuar nos termos consentidos pelo artº 662º/1 do NCPC, importa referir o documento de fls. 39 – ofício datado de 19 de Abril de 2010, tratando-se de ofício elaborado em papel timbrado da executada “AA”, subscrito pela administradora XX e pelo avalista e administrador, BB(também executado), de onde conta o carimbo de recepção aposto pelo balcão de Amarante do Banco exequente, assim

atestando que o mesmo ali foi entregue ou deu entrada.

5) Contudo, na motivação da sentença considerou-se que o documento não fora entregue ao Banco, nem em mão. (vide pág 9 da sentença). E isto apesar de na mesma motivação da sentença – vide pág. 8 o próprio gerente de conta daquele balcão, Luis, ter admitido ter sido recepcionada aquela carta – pelo que, quer em face do carimbo constante daquele documento, como das

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próprias declarações do mesmo, conforme resulta da sentença deveria o facto constante do ponto 2) dos factos não provados ter sido julgado como provado.

6) Pelo que se impõe, nos termos do mencionado artº 662º/1 e 640º/1 e 2 do CPC, que a factualidade de tais alíneas seja dada como não provada,

provando-se a factualidade em conformidade com o vertido na parte final dos pontos I e ii que antecedem.

7) Ou seja, dando-se antes como provado que: a) a livrança dada à execução se destinou a garantir o contrato de abertura de crédito celebrado em

26/03/2001, alterado pelo contrato de 06/11/2002 no âmbito do qual foi entregue ao exequente uma outra livrança, igualmente subscrita pela

sociedade AA e avalizada pelos mesmos executados, representantes daquela;

b) para o contrato de contra corrente caucionada, celebrado em 06/11/2002 o banco exequente exigiu da executada uma outra livrança para garantia das obrigações emergentes desse contrato em substituição da anterior.

8) A matéria provada em tais alíneas (A e B) encontra-se em oposição com a factualidade provada constante das alíneas I) e J), o que sempre constituirá fundamento para a anulação da sentença recorrida, nos termos do artº 662º/2, alínea c) do NCPC.

9) Em função do documento junto de fls. 39 e das declarações da testemunha Luis (gerente do balcão do Banco exequente, conforme consta da sentença – pág. 8), deveria ser dado provada a factualidade constante do ponto 2 dos factos não provados, impondo-se agora a sua alteração nos termos do artº 662º/1 do NCPC, ou em alternativa, a anulação da sentença, nos termos do nº 2, alínea c) do mesmo normativo adjectivo.

10) Os recorrentes entendem que foi, ainda, indevidamente julgada uma parte substancial de matéria de facto, mais concretamente a constante dos pontos N) e O) dos factos provados, assim como os pontos nºs 3, 4, 5, 6 e 8 dos factos não provados.

11) Do conjunto da prova mencionada, tal como referido e transcrito: prova por documentos (documentos acima enunciados), testemunhal e por

declarações de parte, conjugada com as regras da experiência, nos termos expendidos no excurso destas alegações:

Quanto à Alínea N) dos factos provados, deverá ser dado como “Provado que, entre os executados e o Banco, através da agência de Amarante e mais

precisamente do seu gerente de conta que serviu de interlocutor com aqueles nas negociações que tiveram lugar no ano de 2010, precedentemente à

escritura realizada em 06/12/2010, foi celebrado um acordo nos termos do qual a sociedade executada constituiria a favor do Banco exequente hipoteca sobre os 4 imóveis (naquela escritura devidamente identificados), destinando- se tal garantia a substituir as garantias pessoais prestadas por meio de

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livrança subscrita pela sociedade “AA” e avalizada pelos executados singulares.

Quanto à Alínea O) dos factos provados, com referência ao nº 8 dos factos não provados, deve dar-se como provado o teor deste ponto.

Os pontos 3), 4), 5) e 6) dos factos dados como não provados deverão ser dados como PROVADOS.

12) Em consequência da modificação da matéria de facto nos moldes acabados de mencionar – e sem prejuízo do sufragado supra acerca da ilegitimidade da detenção de tal título, é patente que o Banco exequente não é legítimo

portador da livrança dada à execução.

13) Na verdade, tendo aceite a substituição dessa livrança pelas garantias reais que recebeu por meio da hipoteca sobre os imóveis da sociedade

executada, o Banco credor eximiu aqueles da respectiva obrigação cambiária, deixando de se justificar a manutenção de tal título cambiário na sua posse.

Em via subsidiária:

14) A menos que o Banco tivesse usado da estratégia e, consequente da má-fé, em abdicar daquele contrato, para depois de uma vez realizada a escritura e de constituída a hipoteca sobre os imóveis, fazer crer quanto à existência de um pseudo acordo prévio estampado na minuta que apenas fez chegar ao conhecimento dos executados em 1 de Março de 2011, para invocar que na escritura nada consta quanto à eximição das garantias pessoais, tal como agora defende.

15) Só que nesta última hipótese é flagrante que o Banco agiu de modo contrário aos mais elementares princípios impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e fim económico do direito, actuando com abuso de direito, nos termos do artº 334º do C Civil.

16) Sendo a livrança assim detida por si um dos títulos que vêm dados à

execução a ilegitimidade quanto à sua titularidade determina a falta de título.

17) O Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento, quer de facto, quer de Direito, tendo violado entre outros, o consignado nos artºs 405º do C. Civil, 334º do C Civil, 703º/1 al. c) do NCPC ou 46º/1 al. c) do CPC pregresso.

Pede que se revogue a sentença recorrida e se julgue extinta a instância

executiva em relação aos executados (recorrentes) singulares e extinta quanto à livrança em relação à recorrente sociedade ou então que se anule a sentença recorrida.

Houve contra-alegações pugnando pela confirmação do julgado.

II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciarem;

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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos do artigo 639º, do Código de Processo Civil, na redacção introduzida pela Lei nº 41/2013, de 26.06 (doravante CPC).

As questões suscitadas pelos recorrentes podem sintetizar-se nos seguintes itens:

a) Erro na apreciação da matéria de facto;

b) Inexigibilidade da obrigação exequenda por inexistência e invalidade do título executivo (letra de câmbio);

c) Abuso de direito;

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

III – Fundamentos;

1. De facto;

A factualidade considerada assente na sentença é a seguinte:

1.Matéria de facto provada:

A) Vêm dados à execução, reclamando o exequente dos executados o

pagamento da quantia de 556.226,90 € dos quais 546.204,28 € referentes a capital, o seguinte: (i) uma livrança subscrita pela sociedade executada e avalizada pelo aqui oponente e um terceiro, também ele administrador daquela executada, e bem assim, (ii) a escritura de mútuo com hipoteca dos imóveis ali melhor identificados.

B) Tal livrança, quando lhe foi entregue (na data do contrato), destinou-se a garantir o cumprimento do contrato de conta-corrente caucionada que celebrou com a executada, em 06/11/2002.

C) Para o referido contrato de conta-corrente, que veio substituir o contrato de abertura de crédito que a mesma executada havia celebrado com o antigo Banco DD, em 26/03/2001, o Banco exequente unicamente exigiu da

executada como garantia a subscrição da dita livrança, avalizada por cada um dos dois administradores da sociedade creditada, um dos quais o aqui

oponente.

D) A executada não tinha disponibilidade financeira para proceder à amortização do valor acusado no conta-corrente, e o outro administrador encontrava-se (e se previa que se manteria) impossibilitado de prestar o seu aval em nova livrança para segurança do cumprimento das obrigações

emergentes de novo contrato a celebrar, por razões que eram do

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conhecimento do Banco exequente, e que foram objecto de noticiários e da intervenção do Governo e do Chefe de Estado Português junto do Governo de Angola e do seu Presidente.

E) Era vontade dos administradores que prestaram o aval à livrança, ficarem libertos dessa garantia.

F) Exequente e executada vieram a celebrar, em 06/12/2010, a escritura de constituição de hipoteca.

G) O Banco exequente, depois de celebrada a escritura, não entregou à executada, a dita livrança.

H) O oponente CC encontrava-se em Angola, onde reside desde 2009, estando impedido de se deslocar ao nosso país.

I) Para garantia das responsabilidades da mutuária “AA.” emergentes do

aludido contrato foram entregues duas livranças subscritas por esta sociedade e avalizadas pelo oponente BB e por CC.

J) A primeira foi entregue aquando sua celebração do referido contrato ou seja, em 26/03/2001 e a segunda com as suas alterações, que ocorreram 06/11/2002.

K) Posteriormente, por escritura pública outorgada em 6 de Dezembro de 2010, a sociedade oponente/executada “AA.” constituiu a favor do Banco opoído/exequente hipoteca sobre as fracções autónomas nela identificadas.

L) A referida hipoteca foi constituída para garantia de todas as

responsabilidades assumidas ou a assumir pela sociedade oponente/executada perante o Banco opoído/exequente provenientes dos financiamentos que

tivessem sido, ou viessem a ser, concedidos.

M) A constituição da hipoteca voluntária em 06/12/2010, tal como a entrega de uma segunda livrança a título de caução em 06/11/2002, representa somente um reforço das garantias prestadas.

N) Nunca foi emitido qualquer documento ou celebrado qualquer contrato onde ficasse estabelecido que a constituição da hipoteca substituiria qualquer outra garantia, nomeadamente as garantias pessoais prestadas através dos avales apostos nas livranças subscritas pela sociedade AA pelo oponente BB e CC.

O) Os executados nunca reagiram ao preenchimento da livrança que foi dada à execução, que foi devidamente comunicado pelo Banco opoído/exequente aos executados por cartas registadas com aviso de recepção datadas de 2 de Julho de 2012.

2. Matéria de facto não provada:

1) Em data incerta do primeiro trimestre de 2010, o Banco exequente propôs à sociedade executada a amortização da conta-corrente e a celebração de um novo contrato, com alterações, para mais, das taxas de juro e com outras

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condições naturalmente mais vantajosas para o Banco ou, em alternativa, e em substituição das garantias pessoais prestadas (avales dados na livrança que vem dada à execução) que constituísse hipoteca sobre imóveis de valor

suficiente que assegurasse o pagamento do montante do crédito que lhe tinha disponibilizado.

2) Na sequência do referido em D), a executada predispôs-se, disso tendo informado o Banco exequente, e anuindo à proposta deste, substituir as garantias pessoais prestadas através dos avales apostos na livrança que vem dada à execução, por uma garantia real, que prestaria mediante constituição de hipoteca sobre o imóvel de sua propriedade, situado na freguesia da

Terrugem, concelho de Sintra, avaliado em 750.000 €.

3) O próprio oponente e a irmã do outro administrador, também dador do aval, agindo em nome deste, transmitiram ao Banco esse seu desejo e

negociaram com o banco a substituição da garantia pessoal pela constituição de garantias reais, através de hipotecas de imóveis.

4) O Banco exequente concordou com esta última solução, de substituir a livrança por troca da garantia real, apenas recusando ficar com hipoteca unicamente daquele imóvel.

5) Exigiu, então, que a executada, em substituição da dita livrança, lhe desse de hipoteca mais três imóveis, correspondentes a 3 fracções destinados a comércio integradas em prédio sito em Vila Real.

6) O que acabou por ser aceite pela executada.

7) Com o acordo acima referido, o Banco exequente renunciou à garantia pessoal através da livrança subscrita e avalizada que recebera em 2002 e aos direitos de a accionar, liberando os seus avalistas da obrigação de garantir o seu pagamento.

8) A executada “AA” escreveu ao Banco em ofício datado de 13/07/2012,

solicitando-lhe a devolução da livrança, invocando para tal, e era verdade, que a mesma tinha sido substituída pela constituição das hipotecas e que a

mantinha em seu poder indevidamente.

9) Seguidamente foi contactado pessoalmente o gerente do balcão, tendo este se comprometido a resolver o assunto da devolução, o que não mais

aconteceu.

*****

2. De direito;

a) Erro na apreciação da matéria de facto;

(8)

Começam os recorrentes por impugnar a matéria de facto, no sentido de que dever-se-ia ter respondido negativamente à factualidade constante das alíneas B),C) e M) e positivamente à que consta dos pontos 2, 3, 4, 5, 6 e 8 dos factos não provados.

Mais contrapõem que a matéria fáctica vertida nas alíneas N) e O) dos factos supra deveria ter merecido outra resposta, a saber:

Relativamente à alínea N) dos factos provados, deverá ser dado como provado que “Entre os executados e o Banco, através da agência de Amarante e mais precisamente do seu gerente de conta que serviu de interlocutor com aqueles nas negociações que tiveram lugar no ano de 2010, precedentemente à

escritura realizada em 06/12/2010, foi celebrado um acordo nos termos do qual a sociedade executada constituiria a favor do Banco exequente hipoteca sobre os 4 imóveis (naquela escritura devidamente identificados), destinando- se tal garantia a substituir as garantias pessoais prestadas por meio de

livrança subscrita pela sociedade “AA” e avalizada pelos executados singulares”.

No tocante à alínea O) dos factos provados, com referência ao nº 8 dos factos não provados, deve dar-se como provado o teor desse ponto nº8.

Invocam ainda que há contradição entre o factualismo constante das alíneas A) e B) e o consignado nas alíneas I) e J) dos factos provados, sendo

fundamento para a anulação da sentença recorrida.

Não lhes assiste razão.

Em matéria de valoração das provas, nomeadamente dos depoimentos e dos documentos juntos aos autos, designadamente da livrança dada à execução, dos contratos de 26.03.2001 e de 06.11.202, juntos respectivamente com a contestação e com o requerimento executivo, do documento de fls. 39, o tribunal a quo aprecia-os livremente, por força do disposto no artº 607º, nº5, do CPC, salvo o estatuído na parte final do mesmo preceito.

É certo que, no que respeita à questão da alteração da matéria de facto, face ao invocado erro na avaliação da prova testemunhal e documental, cabe a esta Relação, ao abrigo dos poderes conferidos pelo citado artº. 662º, do CPC, e, enquanto tribunal de 2ª instância, reapreciar, não apenas se a convicção expressa pelo tribunal a quo tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e os restantes elementos constantes dos autos revelam Nesta

concepção, a divergência quanto ao decidido pelo tribunal a quo na fixação da matéria de facto só assumirá relevância no Tribunal da Relação se for

demonstrada, pelos meios de prova indicados pelo recorrente, a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório., mormente elementos

documentais, mas, também, avaliar e valorar (de acordo com o aludido

princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de

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formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objecto de impugnação, modificando a decisão de facto se,

relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto A jurisprudência tem vindo a

evoluir no sentido de se firmar um entendimento mais abrangente no que se refere aos poderes de alteração da matéria de facto pela Relação,

considerando-os com a mesma amplitude que a dos tribunais de 1ª instância.

Nessa medida, e no que se refere à questão da convicção, já não estará em causa cingir apenas a sua actividade de apreciação ao apuramento da razoabilidade da convicção do julgador da 1ª instância, mas antes formar a sua própria convicção nos elementos probatórios disponíveis nos autos (cfr., entre outros, o Acórdão do STJ de 16.12.2010, proc. 2401/06.1TBLLE.E1.S1, in www.dgsi.pt)..

Começam os apelantes por pôr em causa a factualidade provada constante das alíneas B), C) e M), a qual tem a seguinte redacção:

«B) Tal livrança, quando lhe foi entregue (na data do contrato), destinou-se a garantir o cumprimento do contrato de conta-corrente caucionada que

celebrou com a executada, em 06/11/2002.

C) Para o referido contrato de conta-corrente, que veio substituir o contrato de abertura de crédito que a mesma executada havia celebrado com o antigo Banco DD, em 26/03/2001, o Banco exequente unicamente exigiu da

executada como garantia a subscrição da dita livrança, avalizada por cada um dos dois administradores da sociedade creditada, um dos quais o aqui

oponente.

M) A constituição da hipoteca voluntária em 06/12/2010, tal como a entrega de uma segunda livrança a título de caução em 06/11/2002, representa somente um reforço das garantias prestadas».

Todavia, não se entende como os recorrentes se prestam agora a impugnar, desde logo, essa matéria provada e constante das ditas alíneas B) e C), quando são os mesmos quem admite expressamente o seu conteúdo na oposição por si deduzida – cfr artºs 2 e 3 da oposição, apenso A) e artºs 2 e 3 do Apenso A).

Já no concerne ao teor da alínea M), também não se justifica a sua alteração nos termos pretendidos.

A oposição dos recorrentes alicerçou-se, por um lado, na argumentação de que a posse da livrança dada à execução pelo banco é ilegítima, por ter sido

emitida outra livrança, e, por outro, que as garantias pessoais (avales apostos nas livranças) ficaram extintas com a constituição da aludida garantia real – hipoteca de 06.12.2010.

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A referida alínea M), de conteúdo algo conclusivo, é certo, afasta esse entendimento, na medida em que nela se consigna que, quer a segunda livrança, quer a hipoteca se destinaram a reforçar as garantias prestadas.

A sua modificabilidade nos termos reclamados pelos recorrentes não ocorre.

De facto, nenhuma prova documental ou testemunhal sustenta tal desiderato.

Da análise do contrato de 06.11.2002 não resulta que o mesmo substituía ou fazia extinguir o anterior contrato de 26.03.2001; antes, nele se consigna expressamente que tinha em vista ‘alterar’ o anterior contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente, sendo que os sujeitos contratantes são os mesmos.

Também o conteúdo do documento de fls. 39 não tem a virtualidade de refutar a prova da assinalada alínea M) e de alicerçar a prova do ponto 2 da matéria não provada.

Quando muito, o que dele emerge é que tal escrito foi entregue ao exequente.

Mas não que o banco exequente aceitou o seu conteúdo.

Ora, o factualismo exarado no dito ponto 2 refere-se, além do mais, à anuência do banco a uma substituição de garantias pessoais prestadas através dos

avales apostos nas livranças por garantia real de hipoteca.

E essa substituição, com o consentimento do banco, colide com o conteúdo da prova testemunhal carreada para os autos, designadamente com o teor do depoimento dos funcionários bancários que acompanharam os procedimentos atinentes ao aludido empréstimo bancário, Luís e Rui.

Estes foram unânimes em afirmar que o banco exequente tomou a iniciativa de consolidar o reforço das garantias relativas à aludida conta corrente

caucionada, em face do seu montante já utilizado (cerca de 500.000,00€), da forma como vinha sendo utilizada (a conta corrente estava “cristalizada”, ou seja, o seu limite máximo verificava-se há mais de um ano, sem movimento nenhum) e do risco inerente ao sector de actividade da empresa (construção e obras públicas).

Foram ainda peremptórios em afirmar que jamais o banco quis substituir as garantias (ou seja a hipoteca pelos avales), mas sim reforçá-las, ainda que os representantes da sociedade executada pudessem pretender libertar-se dessas garantias pessoais.

No caso concreto, este factualismo relatado e considerado provado

compagina-se com as regras de experiência comum, se tivermos em conta que o montante em dívida era elevado (cerca de 500.000,00€), perdurava assim há um ano e a sociedade executada informa que não pode amortizá-la.

Não se vislumbra também que um gerente bancário médio, naquela situação, pudesse dispor daquela libertação de garantias pessoais face ao passivo existente da conta bancária e riscos inerentes de incumprimento.

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Tanto mais que, segundo da avaliação do dito imóvel situado em Terrugem e constante do auto de penhora, o seu valor se cifra em 105.430,00€, ou seja, muito inferior aos mencionados 750.000,00€ referidos no redito documento de fls. 39.

Aliás, o teor da carta-proposta de fls. 60, datada de 14.09.2010, emitida pelo banco, com vista à renegociação da dívida e encerramento da conta corrente em causa, não deixa de contemplar os dois tipos de garantia: livrança com aval pessoal dos representantes da sociedade executada e hipoteca sobre os aludidos imóveis, objecto da escritura pública.

Esgrimem ainda os recorrentes que há contradição entre a matéria provada nas alíneas A) e B) e a factualidade apurada nas alíneas I) e J).

Também aqui não se descortina a propalada contradição, em termos de materialidade fáctica.

Podemos sintetizar esta do seguinte modo:

O banco recorrido deu à execução uma livrança, subscrita pela sociedade “AA”

e avalizada por BB e CC, livrança essa emitida em 26/03/2001, preenchida pelo valor de € 546.204,28 e com vencimento em 12/07/2012.

A execução foi instaurada contra a subscritora e respectivos avalistas, sendo que o banco aqui recorrido, para além de dispor do aval acima referido, dispõe ainda de hipoteca sobre 4 (quatro) imóveis da sociedade subscritora.

A referida livrança – título executivo dos autos principais - titula um contrato de abertura de crédito, sob a forma de conta corrente, que o banco recorrido concedeu à sociedade subscritora em 26 de Março de 2001, contrato que as partes aceitaram alterar em 06 de Novembro de 2002.

Mais uma vez os apelantes pretendem pôr em causa e impugnar matéria de facto que aceitaram e confessaram na oposição que deduziram, como acima ficou dito.

A circunstância de se considerar provado que foram entregues duas livranças, uma aquando do contrato de 26.03.2001 e outra aquando da sua alteração verificada em 06.11.2002 não é em si contraditório, ainda que tenha dado como provado que a livrança dada à execução tenha sido a primeiramente emitida.

Coisa diversa é a repercussão jurídica desse circunstancialismo fáctico, em termos de exequibilidade/legitimidade desse título e de novação ou não da obrigação exequenda, que infra abordaremos.

Suscitam ainda os recorrentes a alteração da matéria fáctica constante dos pontos N) e O) nos termos exarados na conclusão 10ª supra e que se responda positivamente aos pontos nºs 3, 4, 5, 6, e 8 dos factos não provados.

Não lhes assiste razão pelos motivos já acima aduzidos.

Quanta à alínea N), o seu teor é confirmado pelos referidos funcionários

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bancários, sendo que os elementos documentais juntos aos autos não contrariam o seu conteúdo.

Mutatis mutandis, no que tange à alínea O) e ao ponto 8 dos factos provados.

Enquanto que a matéria consignada na alínea O) encontra suporte probatório no conteúdo das cartas registadas com aviso de recepção enviadas aos

executados e juntas a fls. 29 a 31, o factualismo vertido no ponto 8) diz

respeito a uma carta simples cujo envio não é comprovado de modo fiável nem tão pouco a sua recepção pelo exequente, sendo tal ónus dos executados

remetentes.

Já a pretendida modificação dos pontos nºs 3, 4, 5 e 6 dos factos não provados mais não é, em abono da verdade, do que o reverso da materialidade acima impugnada e desatendida.

Ou seja, toda essa desejada alteração assenta na argumentação de que houve uma substituição das garantias pessoais – livranças com avales pessoais – por garantia real – hipoteca, quando é certo que, como afirmado ficou, os meios probatórios produzidos – os documentos (a saber a livrança dada à execução, contratos de empréstimo, correspondência bancária, carta-proposta de fls. 60, minuta de contrato de fls. 61, escritura de constituição de hipoteca de

06.12.2010) e os testemunhos, sobretudo dos citados funcionários bancários, Luís e Rui, apontam no sentido de se tratar antes de um reforço de garantias.

Porquanto se deixa expendido, inexiste fundamento para a modificação da matéria de facto nos termos impugnados, mantendo-se esta – artº 663º, nº6, do CPC.

b) Inexigibilidade da obrigação exequenda por falta de título e por posse ilegítima do título executivo (livrança);

Os recorrentes aludem a erro de julgamento, quanto à questão de direito, porque a livrança dada à execução constitui um título executivo inexistente e a sua posse pelo exequente é ilegítima.

Segundo eles, o banco exequente é portador ilegítimo da livrança que serve de título executivo porque, por um lado, recebeu da devedora (a sociedade

executada) a segunda livrança, deixando de haver fundamento para se manter na posse da primeira e, por outro, tendo aceite a substituição dessa livrança pelas garantia real – hipoteca – sobre imóveis da sociedade executada, o exequente eximiu os executados da respectiva obrigação cambiária.

Diga-se que este último fundamento é de algum modo contraditório ou

preclusivo do primeiro, já que parte da premissa de que afinal não há falta de título, o que se verifica é a sua substituição.

Ainda assim, carecem de razão os apelantes.

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Na verdade, o invocado erro de direito pressupunha a alteração da decisão de facto, o que foi desatendido.

Atenta a factualidade provada, nomeadamente o teor das alíneas A), B), C), I), J), K), L) e M), não pode considerar-se nem que a 2ª livrança entregue fez cessar a legitimidade da detenção da 1ª livrança, nem que estas se

extinguiram com a constituição da garantia real, a hipoteca. Como ficou demonstrado, tais garantias não se excluíam entre si.

Bem pelo contrário, como se apurou, tratou-se de um reforço de garantias.

Para que tal exclusão operasse, haveria que concluir, desde logo, que,

relativamente ao contrato de 06.11.2002, se tratava de uma novação, isto é, de que as partes contratantes quiseram eliminar a dívida antiga, constituindo uma nova obrigação.

Mas, ao invés, perante o que se provou, pode-se concluir que se verificou não a substituição da obrigação originária, mas sim a sua modificação. E na

simples modificação da obrigação mantêm-se todos os elementos que não foram especificamente alterados, ou seja, não pressupõe a eliminação das garantias e dos acessórios da dívida alterada Neste sentido, vide Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol II, 3ª Ed., pág. 197. - artº 861º do Código Civil (CC).

Note-se que a vontade de substituir a antiga obrigação, mediante a contracção de novo vínculo, há-de resultar de declaração expressa –artº 859º, do CC.

De facto, a falta de um “ animus novandi” emerge do próprio conteúdo desse contrato de 06.11.2002, tendo-se exarado expressamente neste que alterava o anterior contrato de 26.03.2001 e não que o extinguia.

Nestes termos, não ficou demonstrado que o exequente é portador ilegítimo da livrança nem que existe falta de título executivo.

c) Abuso de direito

Tão pouco se descortina a uma actuação juridicamente abusiva por parte do banco exequente.

Com efeito, invocam subsidiariamente os recorrentes que, pelo menos, o exequente terá agido com abuso de direito, ao usar, com má fé, da estratégia de abdicar daquele contrato para, depois de uma vez realizada a escritura e de constituída a hipoteca sobre os imóveis, fazer crer quanto à existência de um pseudo acordo prévio estampado na minuta que apenas fez chegar ao

conhecimento dos executados em 01.03.2011, invocando depois que na escritura nada consta quanto à desobrigação das garantias pessoais.

Segundo o disposto no artº 334º CC, é ilegítimo o exercício de um direito quando o seu titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé,

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abrangendo-se neste preceito não só “a vasta área dos direitos de crédito, mas todo e qualquer direito integrado noutros domínios do direito civil,

nomeadamente dos direitos reais” (Antunes Varela; RLJ 127º; nº3845; p.235 Antunes Varela; RLJ 127;nº3845; p.235).

Cada direito só é tutelado pela ordem jurídica para certo interesse relevante, devendo “obedecer, no seu exercício, a uma norma implícita ou explícita de correcção, de lealdade, de moralidade, a uma lei acima da lei” (Orlando de Carvalho; “Teoria Geral do Direito Civil”; Centelha; Coimbra 1991; p.47) pois a validade jurídica desse direito só subsiste enquanto “cumpre concretamente o fundamento axiológico-normativo” que o constitui (Castanheira Neves;

“Questão de Facto - Questão de Direito”; vol. I; p.523).

O princípio da boa-fé pressupõe, necessariamente, uma “específica relação inter-pessoal (embora não necessariamente negocial, ou sequer, pré ou circum-negocial), fonte de uma específica relação de confiança - ou, pelo menos, expectação de conduta- cuja frustração ou violação seja

particularmente clamorosa” (Orlando de Carvalho; “Teoria Geral do Direito Civil”; Centelha; Coimbra 1991; p.56).

O abuso de direito pode também manifestar-se num venire contra factum proprium, isto é, numa conduta anterior do seu titular que, objectivamente, interpretada face à lei, legitima a convicção de que tal direito não será exercido (cfr. Ac. RC 1.7.77; CJ IV; p.800).

A ideia imanente da proibição do venire contra factum proprium é a do dolus praesens: a conduta sobre que incide a valoração negativa é a conduta

presente sendo a conduta anterior apenas ponto de referência para, tendo em conta a situação então criada, se ajuizar da legitimidade da conduta actual (cfr. Baptista Machado, “Tutela de Confiança e Venire Contra Factum Próprio”, Obra Dispersa, vol.I,p.385).

Há abuso do direito quando se exerce de modo anormal um direito próprio, respeitando a sua estrutura formal, mas violando a sua afectação substancial, funcional e teleológica, isto é, contrariando o interesse que o poder nele consubstanciado se encontra adstrito.

Pretende-se impedir que “o titular do direito abusivamente exercido obtenha ou conserve as vantagens que obteve com a prática do acto abusivo”,

paralisando o direito exercido. (Fernando Cunha de Sá, “Abuso do Direito”;

p.646).

Do factualismo concreto apurado não advém qualquer circunstância que permita ajuizar que o exequente, fez supor aos executados que abdicava do contrato de empréstimo anterior (e correspectivas garantias pessoais), com o fito de vir a celebrar novo, com vista a conduzi-los à constituição da hipoteca e, uma vez conseguida esta, não só não pretenderiam celebrar novo contrato,

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como o fizeram com o intuito de vir a invocar que no acto de constituição da hipoteca, através da respectiva escritura pública, nada se exarou acerca da desobrigação das garantias pessoais prestadas pelos executados.

Na verdade, o que de relevante se provou sobre esta matéria foi o que decorre das alíneas D), E), F), H) e N) sobre a actuação do exequente, sendo que

mereceram resposta negativa os pontos 3, 4, 5, 6 e 7, quanto à propalada substituição de garantias: da hipoteca pelos avales pessoais.

Não se vislumbra, assim, que o exequente tenha induzido maliciosamente os executados à constituição da dita hipoteca com a promessa de celebração de novo contrato (que não se concretizou), em que fossem eximidos aqueles da garantia pessoal – avales pessoais – assumida e que serviu de título executivo.

Não se verifica, portanto, o invocado abuso de direito.

Destarte, não procede a apelação.

Sintetizando:

I – Existe novação quando as partes contratantes quiseram eliminar a dívida antiga, constituindo uma nova obrigação.

II – Ao invés, havendo uma simples modificação da obrigação, mantêm-se todos os elementos que não foram especificamente alterados, ou seja, não se pressupõe a eliminação das garantias e dos acessórios da dívida alterada.

III - A vontade de substituir a antiga obrigação (“animus novandi”), mediante a contracção de novo vínculo, há-de resultar de declaração expressa.

IV - Não se provando que o exequente induziu maliciosamente os executados à constituição de uma hipoteca com a promessa de celebração de um novo

contrato bancário, em que fossem eximidos aqueles da garantia pessoal – avales pessoais – dada à execução, inexiste abuso de direito, na vertente venire contra factum proprium.

DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acorda-se nesta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelos oponentes, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pelos recorrentes.

Guimarães, 12.03.2015 António Sobrinho

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Isabel Rocha Jorge Teixeira

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