• Nenhum resultado encontrado

A NOVA ORDEM DE HITLER. Continente sombrio.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A NOVA ORDEM DE HITLER. Continente sombrio."

Copied!
40
0
0

Texto

(1)

A Nova Ordem de Hitler, 1938-45

Tenho a impressão de que a Alemanha possui certos planos [...] referentes a uma nova ordem européia [...] nos moldes da economia planificada que conhece e que certamente encerra vantagens importantes, em comparação com a falta de planejamento que faz parte do egoísmo liberal e vem reinando até o momento. Cabe-nos colaborar, calmamente e de boa vontade, com a adaptação que mencionei.

Thorvald Stauning, primeiro-ministro dinamarquês, 8 de março de 1941'

No verão tornou-se cada vez mais claro para nós que, aqui no Leste, concep-ções espiritualmente insuperáveis estão lutando entre si: o conceito alemão de honra e raça e uma tradição militar de muitos séculos contra um modo asiático de pensar e instintos primitivos alimentados por um punhado de intelectuais, quase todos judeus [...]. Mais que nunca estamos imbuídos da idéia de uma nova era, na qual a força da superioridade racial e das realiza-ções do povo alemão lhe confia a liderança na Europa. Reconhecemos clara-mente nossa missão de salvar a cultura européia da barbárie asiática que avança. Agora sabemos que temos de lutar contra um adversário furioso e

MAZOWER. Mark.

Continente sombrio

:

a Europa no século XX.

São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

(2)

inflexível. Essa luta só pode terminar com a destruição de um ou de outro; qualquer acordo está fora de cogitação.

General Hermann Hoth, 17a Exército,

25 de novembro de 19412

N a primavera de 1942, u m j o v e m d i p l o m a t a italiano c h a m a d o Luciolli voltou para sua pátria depois de servir p o r u m a n o e m e i o e m Berlim. Sua primeira tarefa, e m R o m a , consistiu e m a n o t a r suas idéias sobre a m a n e i r a c o m o a aliada da Itália enfrentava os maiores p r o b l e m a s d e c o r r e n t e s da g u e r r a . Assim, e l a b o r o u u m a crí-tica sagaz das bases da N o v a O r d e m nazista na Europa; q u a n d o t o m o u conheci-m e n t o desse texto, Mussolini declarou q u e "fazia conheci-m u i t o t e conheci-m p o q u e n ã o lia algo t ã o significativo e de t ã o amplas conseqüências". Luciolli escreveu:

Defender até a morte a grande extensão conquistada até agora, explorá-la, organizar a vida econômica e política da Europa de modo que seu poder de resistência aumente e sua capacidade ofensiva se desenvolva—tudo isso constituiria um objetivo claro e pre-ciso, um programa capaz de conquistar adeptos e o consenso, não fosse o fato de que é exatamente nessa missão política que a Alemanha se mostra aquém de sua tarefa. A inequívoca decisão alemã de organizar a Europa hierarquicamente, como uma pirâmide, com a Alemanha no vértice, é do conhecimento geral. Mas isso não basta para captar a atitude do regime alemão diante dos problemas da reconstrução euro-péia. Em nenhum país, mesmo naqueles que ate ontem mantinham uma postura niti-damente antialemã, faltaram personalidades e correntes políticas dispostas a admitir que a ordem internacional que emergiu da Revolução Francesa e culminou em Versalhes fora suplantada de uma vez por todas e que os Estados-nação teriam de dar lugar a entidades políticas muito maiores [...] Assim, o conceito de uma organização hierárquica da Europa não era inaceitável. Contudo, o que choca quem entra em con-tato com os alemães é sua concepção puramente mecânica e materialista da ordem européia. Para eles, organizar a Europa significa decidir a produção desse ou daque-le minério e o número de trabalhadores que cabe utilizar. Não compreendem que nenhuma ordem econômica pode prevalecer se não se basear numa ordem política e que para fazer o operário belga ou boêmio trabalhar não basta prometer-lhe deter-minado salário, mas deve-se incutir-lhe também a consciência de servir a uma comu-nidade da qual é parte íntima, com a qual sente aficomu-nidade e na qual se reconhece.1

(3)

C o m o Luciolli o b s e r v o u , a o e n c e r r a r - s e a d é c a d a de 1930 m u i t o s e u r o p e u s e s t a v a m d i s p o s t o s a a b a n d o n a r a o r d e m liberal, d e m o c r á t i c a , criada a p a r t i r d e 1918 pela I n g l a t e r r a , pela França e p e l o s E s t a d o s Unidos, p a r a a b r a ç a r u m f u t u r o m a i s a u t o r i t á r i o . N ã o c o n t a v a m c o m a realidade b r u t a l d o i m p e r i a l i s m o nazista, a r e i n t r o d u ç ã o da escravidão na E u r o p a e a n e g a ç ã o d e t o d a s as aspirações nacionais, exceto as alemãs.

O g o v e r n o nazista n u n c a foi m a i s c a ó t i c o q u e d u r a n t e a g u e r r a : os s á t r a p a s de H i t l e r d i s p u t a v a m sua a t e n ç ã o e u m a h o s t e de aliados e c o l a b o r a d o r e s s e m e a v a intrigas. N o e n t a n t o , p o r m e i o d e t o d a a c o n f u s ã o , da incerteza, d o s i n u m e r á v e i s p l a n o s p a r a o f u t u r o q u e e m a n a v a m d o s i n s t i t u t o s de pesquisa nazistas, p o d e m o s t r a ç a r as linhas gerais da N o v a O r d e m e n t r e 1938e 1945. N e n h u m a experiência foi m a i s crucial p a r a o d e s e n v o l v i m e n t o da E u r o p a n o século x x J c o m o H i t l e r e Stalin b e m s a b i a m , a S e g u n d a G u e r r a M u n d i a l envolveu algo m u i t o m a i s p r o f u n d o q u e u m a série d e c o n f r o n t o s militares e n e g o c i a ç õ e s d i p l o m á t i c a s ; foi u m a l u t a p e l o f u t u r o social e político d o c o n t i n e n t e / E a s u b m i s s ã o a u m r e g i m e d e u m a violên-cia inédita e i n i n t e r r u p t a c o n s t i t u i u t a m a n h o c h o q u e q u e n o i n t e r v a l o d e oito a n o s as a t i t u d e s políticas e sociais d o s e u r o p e u s p a s s a r a m p o r u m a e x t r a o r d i n á r i a trans-f o r m a ç ã o e eles r e d e s c o b r i r a m as v i r t u d e s da d e m o c r a c i a .

O s aliados n a o c o n q u i s t a r a m os e u r o p e u s : H i t l e r é q u e os p e r d e u . M u i t o s o b s e r v a d o r e s r e p e t i r a m a m e s m a análise d o f r a c a s s o d o s a l e m ã e s feita p o r Luciolli. U m a a r g u t a j o r n a l i s t a a m e r i c a n a i n f o r m o u q u e , q u a n d o c h e g o u à R o m ê n i a , n o v e r ã o d e 1940, s e n t i r a " q u e H i t l e r p o d i a n ã o s ó g a n h a r a g u e r r a , c o m o p o d i a g a n h a r a p a z e, n e s s e caso, o r g a n i z a r a E u r o p a " . A o deixar o país, " n u m a gélida m a n h ã de final d e j a n e i r o d e 1941, estava c o n v e n c i d a d e q u e e m n e n h u m a circuns-tância H i t l e r p o d e r i a g a n h a r a p a z o u o r g a n i z a r a E u r o p a " . C o m e c e m o s n o s s a aná-lise d a N o v a O r d e m c o m o q u e p o d e r í a m o s c h a m a r d e a o p o r t u n i d a d e p e r d i d a d o Führer.4

A OPORTUNIDADE PERDIDA DE HITLER

A o e n c e r r a r - s e a década d e 1930, a o p i n i ã o pública e u r o p é i a n ã o se o p u n h a de m o d o a l g u m à idéia de u m a r e c o n s t r u ç ã o a u t o r i t á r i a d o c o n t i n e n t e s o b a lideran-ça d o s a l e m ã e s . A base p o t e n c i a l d e u m a N o v a O r d e m q u e r e j e i t o u a h e r a n ç a d e Versalhes ia m u i t o a l é m d o s radicais pró-nazistas o u fascistas. A d e s c o n f i a n ç a d o

(4)

p o d e r i o a l e m ã o mesclava-se c o m a a d m i r a ç ã o pela r e c u p e r a ç ã o e c o n ô m i c a da A l e m a n h a ; o a p e g o às n o ç õ e s inglesas de liberdade misturava-se à suspeita dos "plutocratas" londrinos, que, c o m sua defesa d o p a d r ã o - o u r o e d o laissez-faire, con-d e n a r a m b o a p a r t e con-d o c o n t i n e n t e à con-depressão e n ã o c o n s e g u i r a m e n c o n t r a r solu '' ção p a r a a crise/"Esses povos e u r o p e u s t o r n a r a m - s e indiferentes à d e m o c r a c i a , ' q u e e m t e r m o s intelectuais lhes foi apresentada c o m o liberdade de p e n s a m e n t o e liberdade de expressão, m a s q u e e m t e r m o s de sua experiência cotidiana significou ' , s o b r e t u d o liberdade de m o r r e r de f o m e " , o b s e r v o u a condessa Waldeck.

"Cons-tatei q u e n ã o mais de 10% dos e u r o p e u s p r e z a v a m a liberdade individual o u esta-v a m dispostos a lutar para preseresta-vá-la."5 //

^ N a Bélgica, n o verão de 1940, a opinião pública recebeu c o m " p a t e n t e alívio" a notícia da vitória alemã, e d u r a n t e a l g u m t e m p o u m a autêntica "fúria antiparla-m e n t a r " t o antiparla-m o u c o n t a de Bruxelas. Os belgas antiparla-m o s t r a r a antiparla-m - s e favoráveis aos ale-mães, felizes c o m o f i m da g u e r r a e e s p e r a n ç o s o s de q u e seu país recuperasse a prosperidade n u m c o n t i n e n t e u n i f i c a d o sob u m sistema político local r e f o r m a d o e m e n o s d i v i s ó r i o / H e n d r i k de M a n , p r e s i d e n t e do P a r t i d o dos T r a b a l h a d o r e s e conselheiro do rei Leopoldo, declarou o f a m o s o m a n i f e s t o de 28 de j u n h o q u e a era d e m o c r á t i c a t e r m i n a r a . "Esse colapso de u m m u n d o decrépito, longe de ser u m desastre, é u m a libertação", a f i r m o u . Sua visão de u m g o v e r n o autoritário chefia-d o pelo rei parecia — n o verão chefia-de 1940 — u m resultachefia-do mais "realista" chefia-d o conflito q u e q u a l q u e r revivescência previsível da democracia. Para políticos e diplomatas q u e f a z e m do realismo u m fetiche, o verão de 1940 constituiu u m a advertência.

/ N a H o l a n d a t a m b é m a repulsa a o p a r t i d a r i s m o está p o r trás d o a t a q u e de V H e n d r i k C o l i j n aos "males da democracia"; ex-primeiro-ministro e líder do

conser-v a d o r P a r t i d o Anti-Reconser-volucionário, Colijn i m a g i n o u — c o m o D e M a n — u m regi-m e autoritário leal à regi-m o n a r q u i a e disposto a colaborar c o regi-m os aleregi-mães,/Ó social-y"~y d e m o c r a t a T h o r v a l d S t a u n i n g , p r i m e i r o - m i n i s t r o d i n a m a r q u ê s d e s d e 1924,

aconselhou a colaboração n o interesse do f u t u r o bem-estar e c o n ô m i c o da E u r o p a , e e m C o p e n h a g u e u m g o v e r n o de coalizão n a c i o n a l c o o p e r o u t r a n q ü i l a m e n t e c o m Berlim.6/

E m Estranha derrota, o historiador Marc Bloch p r o c u r a as causas da humilha-ção da França — além dos erros c o m e t i d o s pelo alto c o m a n d o do exército — nas falhas de u m sistema p a r l a m e n t a r g o v e r n a d o p o r velhos, c o r r o í d o p o r u m funcio-nalismo cínico, d e s t r u í d o pela polarização q u e se seguiu à Frente Popular. Nessa época p o u c o s c o n s e g u i r a m , c o m o Bloch, deixar o abismo d o "desespero burguês", buscar u m a f o r m a de d e m o c r a c i a renovada, adaptar-se "às exigências de u m a nova

(5)

era"!Muitos acreditavam que a solução para a "decadência" da França estava n u m a reconciliação c o m a Alemanha nazista. Aceitar o inevitável é sábio, escreveu André Gide. "Estamos presenciando o nascimento, mais q u e a m o r t e , de u m m u n d o " , a f i r m o u Teilhard de Chardin. As matrículas n o curso de alemão da Berlitz e m Paris saltaram de 939 e m 1939 para 7920 dois anos depois; n o curso de inglês os n ú m e -ros despencaram.7^

A queda da França repercutiu e m t o d o o continente. "Mais u m a notícia r u i m hoje à tarde", u m médico polonês registrou e m 1 4 d e j u n h o de 1940. "Paris caiu e m p o d e r dos alemães." Dois dias depois ele anotou: 'As notícias da França são terrí-veis. As pessoas estão e m o c i o n a l m e n t e arrasadas. Algumas p e r d e r a m p o r comple-t o a esperança. O q u e vai a c o n comple-t e c e r agora?". E m Bucarescomple-te, Waldeck percebeu u m a reação mais positiva, c o n q u a n t o cautelosa. " C o m a queda da França atingem o auge vinte anos de promessas vãs da democracia: acabar c o m o desemprego, c o m a inflação, a deflação, a agitação dos trabalhadores, o partidarismo, e sei lá mais o quê", escreveu ela. Cansada de si m e s m a , duvidando dos princípios que a nortea-ram, a Europa sentiu-se quase q u e aliviada c o m a solução de t u d o [...] Hitler era u m sujeito esperto — desagradável, mas esperto. Ele conseguiu fortalecer seu país. Por q u e não experimentar seus métodos? Era assim que os europeus se sentiam naque-le verão de 1940.""

^ -Ç^, / Essas atitudes relativamente favoráveis aos alemães logo desapareceriam. Na y França e na Bélgica, p o r exemplo, os ânimos m u d a r a m t o t a l m e n t e n o espaço de <-- * ; J dois o u três meses, deixando os colaboracionistas cada vez mais isolados,fem 1941

tT

p , J> o s alemães dissolveram o Sindicato Holandês, declarando-o "indigno de

confiança" . Tal m u d a n ç a deveuse, e m parte, à indignação provocada pelo c o m p o r t a m e n -t o dos soldados nazis-tas e das forças de ocupação, e, e m par-te, às al-terações n o p a n o r a m a internacional. Após a batalha da Inglaterra ficou mais claro que a guer-ra duguer-raria mais do que se pensaguer-ra. E, c o m o veremos, as dúvidas relativas a possí-veis m o d i f i c a ç õ e s de f r o n t e i r a s e anexações t a m b é m d e s t r u í r a m a fé na N o v a O r d e m de Hitler.

VIVENDO NUMA ÉPOCA HISTÓRICA

Na Alemanha o clima era de euforia. A Nova O r d e m prevalecera contra os "protetores de u m a era agonizante". Mais que nunca, os alemães sentiam-se viven-do n u m a época "histórica". Depois da m a r c h a para Praga, Hitler a f i r m o u que "ao

(6)

l o n g o de seus mil anos, o Reich d e m o n s t r o u [...] q u e lhe cabe restabelecer a o r d e m na E u r o p a central". Às vésperas da c a m p a n h a ocidental a n u n c i o u q u e "a luta q u e ora se inicia decidirá o destino da nação alemã nos p r ó x i m o s mil anos". Goebbels s a u d o u u m a "época s e m precedentes", na qual o "gênio histórico" d o F ü h r e r esta-va a j u d a n d o a c o n s t r u i r u m a "noesta-va E u r o p a " . E n q u a n t o a W e h r m a c h t aesta-vançaesta-va para o leste, r u m o a Moscou, Hitler sonhava c o m "as belezas da Criméia, q u e tor-n a r e m o s acessível p o r m e i o de u m a auto-estrada — para tor-nós, alemães, será tor-nossa Riviera. Creta é q u e n t e demais e seca. Chipre seria ótimo, m a s p o d e m o s viajar p o r t e r r a até a Criméia — passando p o r Kiev! E existe a Croácia, t a m b é m , u m paraíso turístico para nós. Espero q u e depois da g u e r r a haja m u i t a celebração [...] Q u e pro-gresso na direção da Nova Europa!".9

C o n v e r s a n d o c o m Ciano e m o u t u b r o de 1941 — talvez o m o m e n t o de m a i o r e m p o l g a ç ã o —, Ribbentrop, o ministro das Relações Exteriores alemão, predisse q u e a Nova O r d e m de Hitler na E u r o p a "garantirá a paz p o r mil anos". O cínico ita-liano n ã o se conteve: " C o m e n t e i q u e mil anos é m u i t o t e m p o " , registrou e m seu diário. " N ã o é fácil f u n d a m e n t a r a l g u m a s gerações nos feitos de u m só h o m e m , ainda q u e de u m gênio. R i b b e n t r o p acabou f a z e n d o u m a concessão: ' Q u e seja u m século', falou."10 C o n t u d o , se o ex-negociante de c h a m p a n h e n ã o conseguia

resis-tir a u m a b a r g a n h a , o F ü h r e r n ã o tinha esse tipo de dúvida. " Q u a n d o o nacional-socialismo tiver r e i n a d o p o r b a s t a n t e t e m p o " , declarou certa vez, após o jantar, " n ã o será mais concebível u m a f o r m a de vida diferente da nossa."11

V i / N i n g u é m e m Berlim duvidava q u e u m a o p o r t u n i d a d e histórica se apresenta-ra ao Terceiro Reich. Restava descobrir a m e l h o r m a n e i r a de aproveitá-la. O q u e os soldados c o n q u i s t a r a m , os políticos deviam agora governar. E n t r e t a n t o , a extensão dos territórios controlados pelos alemães n o final de 1941 era a s s o m b r o s a m e n -te vasta — ia do o c e a n o Ártico à orla do d e s e r t o do Saara, do Atlântico e dos Pire-n e u s à UcrâPire-nia. C o m u m a rápida sucessão de ofePire-nsivas, a Blitzkrieg p r o p o r c i o Pire-n a r a a Hitler u m i m p é r i o m u i t o m a i o r do q u e ele pretendia conquistar.

A partir de Mein Kampf estava claro que o f u t u r o i m p é r i o a l e m ã o devia locali-zar-se n o leste, c o b r i n d o a p r o x i m a d a m e n t e o território q u e a A l e m a n h a controla-ra e m 1918, depois d o T r a t a d o de Brest-Litovsk. " E s t a m o s a c a b a n d o c o m a perpé-t u a m a r c h a dos a l e m ã e s r u m o ao sul e ao oesperpé-te da E u r o p a " , Hiperpé-tler escreveu e m

Mein Kampf, "e v o l t a n d o os olhos para as terras d o leste." C o m a colonização

(7)

u m f o l h e t o da ss, tratava-se de u m país "mal explorado, c o m solo fértil de t e r r a n e g r a , q u e poderia ser u m paraíso, u m a Califórnia européia".12^

A Polônia constituiria u m a ligação c o m o leste e u m a fonte de mão-de-obra — u m Arbeitsreich para o Herrenvolk, c o m o disse Hitler p o u c o depois da invasão.13

O d e s m e m b r a m e n t o do país e o t r a t a m e n t o b r u t a l dispensado a sua p o p u l a ç ã o ^ ^ depois d e s e t e m b r o de 1939 m o s t r a r a m o tipo de m é t o d o q u e seria u s a d o para alcançar tal o b j e t i v o / E q u a n t o à Escandinávia, aos Países Baixos, aos Bálcãs, até c / m e s m o à França? Esses lugares n ã o se destacavam t a n t o nos planos de Hitler. T u d o ^ i n d i c a v a q u e n o final de 1939 ele relutava e m assumir mais c o m p r o m i s s o s milita-yv' res. Por q u e se dar ao t r a b a l h o de invadir países q u e podia intimidar para o b t e r sua ' >y i' aliança e sua aquiescência? As pressões diplomáticas p r o p o r c i o n a r a m à A l e m a n h a

o controle de recursos vitais na Romênia, na H u n g r i a e na Suécia. Ao iniciar-se o

a n o de 1940, Hitler resistiu à idéia de invadir a N o r u e g a até o m o m e n t o e m que se convenceu de que os planos dos ingleses representavam u m a a m e a ç a para os car-r e g a m e n t o s de minécar-rio da Escandinávia pacar-ra a Alemanha.'4 A França tinha de ser

y, excluída da guerra, n a t u r a l m e n t e , m a s seu papel na Nova O r d e m n ã o estava claro. ^ y A Grécia provavelmente ficaria n e u t r a , n ã o fosse a desastrada invasão italiana, q u e levou os ingleses para lá e obrigou os alemães a reagir. A invasão da Iugoslávia teve de ser planejada às pressas, q u a n d o Berlim recebeu a notícia de q u e u m golpe mili-tar d e r r u b a r a o governo pró-Eixo. '

A política alemã e m relação a m u i t o s dos países d e r r o t a d o s foi, a princípio, d e l i b e r a d a m e n t e provisória: só q u a n d o a g u e r r a terminasse se definiria seu desti-no. E m m a i o de 1940, às vésperas d o ataque contra a França, Goebbels decidiu q u e a i m p r e n s a n ã o publicaria u m a palavra sobre os objetivos bélicos, que, n o decorrer do conflito, seriam f o r m u l a d o s s i m p l e s m e n t e c o m o " u m a paz justa e d u r a d o u r a e u m Lebensraum para o p o v o a l e m ã o " . Tal política refletia os desejos dos líderes nazistas. H i t l e r d e c l a r o u q u e n ã o havia p o r q u e explicitar os objetivos bélicos: " D e n t r o de nossas possibilidades nos é d a d o fazer o q u e q u e r e m o s e de q u a l q u e r m o d o n ã o p o d e m o s fazer o q u e ultrapassa nossas forças".15

N o verão de 1940 a W e h r m a c h t e o Ministério das Relações Exteriores viam c o m b o n s olhos o desejo francês de concluir u m t r a t a d o de paz c o m o Terceiro Reich, p o r é m a desaprovação de Hitler i m p e d i u as negociações. Os generais ale-m ã e s baseados na Holanda pensavaale-m q u e o país d e r r o t a d o ale-manteria sua indepen-dência e se s u r p r e e n d e r a m q u a n d o Hitler resolveu atribuir-lhe u m g o v e r n o civil. Entretanto, a afinidade racial dos holandeses e os s o n h o s de anexação n o sentido

(8)

de reconstituir o Sacro Império R o m a n o seduziam o partido e a ss e c e r t a m e n t e n ã o contrariavam Hitler.16

Alarmados c o m a anexação de partes da Polônia e da Tchecoslováquia pelos alemães, os estadistas da Europa ocidental p r o c u r a r a m assegurar o respeito à inte-gridade de seus países e a restauração de sua soberania. E óbvio que não acredita-v a m nas numerosas declarações da Alemanha nesse sentido, já que não haacredita-via trata-dos de paz confiáveis c o m Berlim. O iludido rei L e o p o l d o da Bélgica teve u m encontro decepcionante com Hitler. Vidkun Quisling levantou a questão ao m e n o s três vezes, sem n e n h u m resultado; na última vez Hitler disse-lhe que n ã o queria mais falar sobre o assunto. Funcionários do Ministério das Relações Exteriores e ofi-ciais da W e h r m a c h t , que t e n t a r a m pleitear concessões de autonomia — à França, por exemplo, e, depois de 1941, à Estônia — não tiveram maior sucesso.'7

C o m a questão dos acordos de paz relegada a u m f u t u r o indefinido, o Terceiro Reich implantou na Europa u m a série de regimes de ocupação mais ou m e n o s pro-visórios. N u m extremo d e s m e m b r o u alguns países e suprimiu p o r completo sua identidade nacional. Foi o q u e aconteceu c o m a Polônia, a Iugoslávia e a Tche-coslováquia, cujos n o m e s seriam riscados do mapa. N o f u t u r o não nos referire-m o s referire-mais ao ' G o v e r n o Geral dos T e r r i t ó r i o s Poloneses O c u p a d o s ' , e sireferire-m ao 'Governo Geral', sem dar maior atenção a isso", Goebbels proclamou n o verão de 1940; "assim, da m e s m a f o r m a q u e está p o u c o a p o u c o a c o n t e c e n d o n o P r o t e t o r a d o [da Boêmia-Morávia], q u e hoje se chama apenas Protetorado, a situa-ção se esclarecerá a u t o m a t i c a m e n t e . Cabe à populasitua-ção desses territórios facilitar nosso trabalho." L u x e m b u r g o t a m b é m foi praticamente anexado ao Reich e elimi-nou-se toda referência ao "Grão-ducado" ou ao país" de Luxemburgo. O status jurídico desses países era vago, p o r é m n ã o seu futuro.1 8

J o p r o c e d i m e n t o usual dos alemães consistia e m designar comandantes mili-tares ou civis, que governavam p o r i n t e r m é d i o do funcionalismo local. Nessa guer-ra d e n t r o de u m a guerguer-ra, que foi o caos burocrático do Terceiro Reich, os territó-rios o c u p a d o s t r a n s f o r m a r a m - s e e m feudos, sujeitos a diversos ministéterritó-rios e administrados c o m diferentes graus de sucesso/O governo dinamarquês foi o que m e l h o r conseguiu preservar a o r d e m pública, talvez p o r ser o m e n o s afetado pela ocupação. O rei e o Parlamento c o n t i n u a r a m atuando e a princípio d e s f r u t a r a m — ao m e n o s t e o r i c a m e n t e — considerável soberania: p o r conseguinte, m e n o s de cem alemães controlavam o país inteiro; na França, na Grécia, n o P r o t e t o r a d o da Boêmia-Morávia, na Sérvia e na N o r u e g a governantes fantoches i n t e r p u n h a m u m

(9)

V

véu de respeitabilidade entre os conquistadores e o serviço público. Na Holanda u m comissário do Reich, civil, governava por intermédio dos secretários-gerais da admi-nistração pública, enquanto na Bélgica os secretários-gerais se reportavam às autori-dades militares. N o m i n a l m e n t e independentes, os governos da Croácia e da Eslováquia e r a m , de fato, subordinados aos alemães; parceiros do Eixo, c o m o a Finlândia, a Romênia, a Bulgária e a Hungria, tinham u m p o u c o mais de autonomia. O exemplo dos ingleses na índia seduzia a imaginação de Hitler. Seu m o d e l o de governo imperial, tal c o m o o concebia, parecia-lhe admirável. Após a invasão da União Soviética, intrigava-o o fato de os ingleses governarem o subcontinente c o m u m p u n h a d o de homens; para ele a Ucrânia era o "novo Império Indiano"; o front oriental se converteria na fronteira noroeste da Alemanha, onde gerações de ofi-„-' ciais se distinguiriam e preservariam as virtudes marciais da raça a r i a n a / M a s o

Führer n ã o compreendia b e m as técnicas imperiais de g o v e r n o utilizadas pelos o ' ingleses; condenava a frouxidão de suas atitudes raciais e sua disposição de

permi-tir alguma autonomia política local.'j''

O paralelo com a índia veio à tona n u m a das raras ocasiões e m que se men-cionaram os objetivos bélicos dos nazistas. Isso aconteceu n u m discurso que, pro-vavelmente seguindo instruções de Hitler, o comentarista de rádio Hans Fritzsche p r o n u n c i o u e m o u t u b r o de 1941, q u a n d o parecia certa a derrota da Rússia. Depois de dizer à imprensa estrangeira que a g u e r r a estava decidida, Fritzsche revelou os planos políticos de seu pais: a Europa se tornaria e c o n o m i c a m e n t e auto-suficien-te sob a liderança da Alemanha. Os alemães auto-suficien-teriam de enauto-suficien-tender a "idéia imperial e u r o p é i a " e preparar-se p a r a realizar n o leste o p e r a ç õ e s militares, c o n t í n u a s e p e q u e n a s , análogas às dos ingleses q u a n d o e n f r e n t a v a m p r o b l e m a s na índia. " Q u a n t o às nações d o m i n a d a s p o r nós", explicou, " u s a r e m o s c o m elas u m a lin-g u a lin-g e m m u i t o mais f r a n c a e fria. N a t u r a l m e n t e n ã o p e r m i t i r e m o s q u e ne-n h u m Estadozine-nho v a g a b u ne-n d o

p e r t u r b e a paz européia c o m pedidos ou exigên-cias especiais — nesse caso lhe l e m b r a r e m o s c o m energia o q u e lhe c o m p e t e f a z e r na Europa."2 0

/ ' U m a visão tão dura refletia as críticas dos nazistas ao direito internacional / V' liberal. Carl Schmitt, por exemplo, a f i r m o u que agora os territórios conquistados

c . f o r m a v a m o Grossraum da Alemanha. Assim c o m o a doutrina Monroe devia

justi-;J-xr ficar a não-intervenção de o u t r a s potências n o hemisfério ocidental, escreveu,

V ' ^ t a m b é m a Alemanha conquistara o direito de governar a Europa. S o b r e t u d o o V ^ / d i r e i t o de governar segundo novas n o r m a s : o velho sistema de direito

(10)

nal, c o m suas pretensões universais e sua f u n d a m e n t a ç ã o nas relações de Estados soberanos, cederia lugar a u m a jurisprudência autenticamente nacional-socialista de "lei do povo". N e m todos os povos conseguiam suportar o peso de u m Estado constitucional m o d e r n o . A b a n d o n a n d o a noção liberal — c o m o estava sacramen-tada na Liga das Nações — de q u e todos os Estados e r a m soberanos e juridicamen-te iguais, Schmitt declarou que o m u n d o m o d e r n o requeria u m "alto g r a u de orga-» nização" e "disciplina v o l u n t á r i a " . Os d o m i n a d o r e s nazistas da H o l a n d a e o

„ G o v e r n o Geral indicaram p u b l i c a m e n t e que a era da "independência absoluta" chegara ao fim.2 1/

y &

A neutralidade não era mais aceitável/Como explicou u m comentarista:

Existe algum Estado pequeno suficientemente independente para ser neutro em relação às grandes potências? A crise da neutralidade é, de fato, a crise da estrutura de nosso continente, do colapso das antigas ordens e dos velhos impérios e do nas-cimento de novas dinastias. Os pequenos Estados tornaram-se presa de um curso inexorável da história, e a única questão é se vão ceder sem esperança ou cheios de esperança.22

Luciolli estava certo, portanto, ao observar q u e o regime tinha u m a concep-ção de política basicamente hierárquica. A Europa devia dominar o m u n d o , mas apenas sob a condição de ser d o m i n a d a pelo Reich. Hitler considerava inadmissí-vel transmitir p o d e r aos racialmente inferiores; isso denotaria fraqueza, n ã o força. C u m p r i a salvaguardar z e l o s a m e n t e a superioridade alemã, e m todas as esferas, c o m resultados às vezes absurdos. Depois que a equipe tcheca de hóquei n o gelo d e r r o t o u os alemães p o r cinco a u m , e m Praga, Goebbels aludiu à "prática equivo-cada de bater-se c o m povos coloniais n u m c a m p o e m que somos inferiores. H e r r Gutterer deve cuidar [...] para que a repetição de tais incidentes se t o r n e impossí-vel" . Até os italianos, s u p o s t a m e n t e sócios dos alemães na criação da Nova O r d e m , r e c e b e r a m o m e s m o t r a t a m e n t o ; n o r m a s relativas ao t r a t o c o m trabalhadores estrangeiros alertavam: "Relações c o m italianos não são bem-vistas".23

N o nível político tais atitudes se repetiam, e m detrimento dos eventuais cola-boradores da Alemanha. C o m o Luciolli observou, dado o descontentamento dos europeus c o m a o r d e m de Versalhes, e m 1939, havia poucos motivos para supor que a colaboração c o m o projeto político não teria êxito. H o j e é difícil lembrar que o pró-prio conceito tinha algo de positivo para os que o criaram na França. Lavai e Pétain

(11)

v i a m a colaboração c o m o u m a parceria de duas potências imperiais e, p o r t a n t o , c o m o u m m e i o de salvar a soberania francesa. Hitler contrapunha-se a tais idéias.

Ele desconfiava s o b r e t u d o dos soi-disants nacional-socialistas. Impopulares, t e n d i a m a ser a d m i n i s t r a d o r e s ineficazes; populares, c o n s t i t u í a m u m a a m e a ç a . Quisling c h e g o u ao p o d e r d u r a n t e a invasão da N o r u e g a , m a s caiu u m a s e m a n a depois. Degrelle na Bélgica e M u s s e r t na H o l a n d a f o r a m p o s t o s de m o l h o . Até p o d i a m r e c r u t a r jovens crédulos o u desesperados para lutar n o f r o n t oriental, m a s o p o d e r estava nas m ã o s dos f u n c i o n á r i o s públicos profissionais. Robert Brasillach, o j o v e m e desiludido colaboracionista francês, c o n c l u i u m e l a n c o l i c a m e n t e e m agosto de 1943: "Não existe mais u m a E u r o p a fascista".24

O q u e fazia dos Degrelle e Mussert parceiros i n a d e q u a d o s era e x a t a m e n t e seu nacionalismo. "Para tornar-se g e r m a n ó f i l a , a N o r u e g a precisa tornar-se nacional", declarou Quisling. Mussert c o n c e b e u u m a Liga dos Povos G e r m â n i c o s , q u e seria e n c a b e ç a d a p o r Hitler, m a s c u j o s m e m b r o s (a A l e m a n h a , a E s c a n d i n á v i a , a H o l a n d a ) t e r i a m g o v e r n o s nacional-socialistas i n d e p e n d e n t e s e forças militares próprias. Dificilmente haveria algo m e n o s a t r a e n t e para Hitler. E m 30 de j u n h o de 1941, jovens nacionalistas u c r a n i a n o s d e s a f i a r a m Berlim c o m sua " P r o c l a m a ç ã o d o Estado Ucraniano" e m Lvov; duas s e m a n a s depois a maioria estava presa e o m o v i m e n t o sufocado. O imperialismo de Hitler era, pois, m u i t o diferente d o de G u i l h e r m e II, que apoiou Paul Skoropadsky d u r a n t e a o c u p a ç ã o alemã da Ucrânia e m 1918: a m b o s favoreciam regimes autoritários, m a s o kaiser estava disposto a p e r m i t i r q u e u m representante local governasse e m seu n o m e . Hitler recusou até m e s m o isso, explicando: N ã o posso estabelecer objetivo a l g u m q u e u m dia pro-duza [...] Estados independentes, autônomos".2 5

[/k "Nova O r d e m européia" era essencialmente u m a O r d e m alemã. E m b o r a n u m e r o s o s visionários nazistas brincassem c o m a ideologia do e u r o p e í s m o , para ; ^ Hitler só i m p o r t a v a a Alemanha, ou, mais precisamente, o Deutschtum. Após a

inva-são da U n i ã o Soviética a p r o p a g a n d a de Berlim a l a r d e o u q u e se tratava de u m a "cruzada pela Europa"; a rádio transmitiu u m a " C a n ç ã o pela Europa"; lançaram-se lançaram-selos c o m o l e m a "Frente Única E u r o p é i a contra o Bolchevismo"; e a imprensa até p r o c l a m o u , e m fins de n o v e m b r o de 1941, que, "nascidos da discórdia, da luta e da miséria, os Estados Unidos da E u r o p a f i n a l m e n t e se concretizaram". Tais slo-gans, p o r é m , n ã o c o r r e s p o n d i a m à realidade da o c u p a ç ã o vivenciada p o r g e n t e c o m u m , e nada indicava q u e fora da A l e m a n h a a l g u é m levasse esse e u r o p e í s m o mais a sério q u e o F ü h r e r . " Depois de Stalingrado, q u a n d o os alemães c o m e ç a r a m

(12)

a b u s c a r a m i g o s e aliados c o m m a i o r e m p e n h o , e r a t a r d e d e m a i s . A reviravolta n a j u r i s p r u d ê n c i a nazista, q u e i n s p i r o u d e c l a r a ç õ e s de " a n t i i m p e r i a l i s m o " , n ã o con-v e n c e u n i n g u é m , até p o r q u e n ã o tecon-ve n e n h u m efeito con-visícon-vel s o b r e a política. N a E u r o p a oriental, o n d e o a v a n ç o d o E x é r c i t o V e r m e l h o fazia d o c o m u n i s m o u m a f o r m a d e g u e r r a política p o t e n c i a l m e n t e f r u t í f e r a , o r a c i s m o nazista i m u n i z a r a a p o p u l a ç ã o c o n t r a a p r o p a g a n d a d e G o e b b e l s . N a E u r o p a ocidental, f o r a d e qual-q u e r esfera plausível d e influência soviética, o a n t i c o m u n i s m o p o u c o t i n h a a ofe-recer. Só n a Grécia e, e m m e n o r g r a u , n a Sérvia e n o n o r t e da Itália, foi possível con-t u r b a r os â n i m o s a p o n con-t o d e d e s e n c a d e a r u m a g u e r r a civil. A m e d i d a q u e se r e t i r a v a m , as forças a l e m ã s d e i x a v a m u m l e g a d o s a n g r e n t o d e m a s s a c r e s fratrici-das. E m 1944 a s o m b r a da G u e r r a Fria j á se p r o j e t a v a s o b r e a E u r o p a , m a s n ã o t i n h a p o d e r b a s t a n t e p a r a salvar o i m p é r i o d e Hitler.

A ORGANIZAÇÃO DA EUROPA

/ j Se havia u m e u r o p e í s m o nazista, este inseria-se n o p l a n o e c o n ô m i c o , e n ã o n o r r p o l í t i c o . À i d é i a d e u m a d o u t r i n a M o n r o e a l e m ã associava-se a n o ç ã o d e u m a Grossraumwirtschaji—uma e c o n o m i a r e g i o n a l c e n t r a l i z a d a n a A l e m a n h a —, q u e , s o b c e r t o s aspectos, g u a r d a v a a l g u m a s e m e l h a n ç a c o m o M e r c a d o C o m u m d o pós-g u e r r a . A N o v a O r d e m , a m a d a p e l o s j o v e n s t e c n o c r a t a s d o M i n i s t é r i o d a Eco-n o m i a a l e m ã o , eEco-nvolvia a i Eco-n t e g r a ç ã o e c o Eco-n ô m i c a da E u r o p a o c i d e Eco-n t a l e a criação d e u m a z o n a f r a n c a : o m i n i s t r o W a l t h e r F u n k c h e g o u a p r o p o r isso n o v e r ã o d e 1940. G o e r i n g , q u e t i n h a m u i t o m a i s p r e s t í g i o n a c ú p u l a nazista, t a m b é m a p o n t o u a n e c e s s i d a d e d e i n v e s t i m e n t o s m u l t i n a c i o n a i s n a E u r o p a s o b os a u s p í c i o s d a A l e m a n h a . O u t r o s se v o l t a r a m p a r a os Bálcãs, o n d e a p e n e t r a ç ã o e c o n ô m i c a d o s a l e m ã e s se i n t e n s i f i c a r a n o s a n o s 1930. A c o r d o s c o m e r c i a i s f i r m a d o s c o m a Ro-m ê n i a e a H u n g r i a e Ro-m 1939 e 1940 c o l o c a r a Ro-m s o b o c o n t r o l e d o T e r c e i r o Reich m a t é r i a s - p r i m a s f u n d a m e n t a i s . N o final d e 1940, H e r m a n n N e u b a c h e r — q u e m a i s t a r d e g o v e r n a r i a os Bálcãs — r e v e l o u a u m j o r n a l i s t a a m e r i c a n o o b r i l h a n t e f u t u r o q u e a g u a r d a v a a E u r o p a d e p o i s da g u e r r a : "A o r g a n i z a ç ã o e c o n ô m i c a d o s Bálcãs c o n s t i t u i a p r i m e i r a e t a p a d e u m p l a n o p a r a c o n v e r t e r t o d o o c o n t i n e n t e e u r o p e u n u m só Grossraum, q u e , s e m países individuais, f o r m a r á a u n i d a d e e c o n ô m i c a d o f u t u r o . U m p l a n o c o m u m r e g u l a m e n t a r á a p r o d u ç ã o n o Grossraum e u r o p e u " .2 7 O s E s t a d o s U n i d o s e a

(13)

Grã-Bretanha ficariam fora desse bloco continental; a Europa se tornaria auto-suficien-te. O padrão-ouro e o laissez-faire da o r d e m pós-Versalhes cederiam lugar à troca de m e r c a d o r i a s e ao p l a n e j a m e n t o da p r o d u ç ã o e m escala c o n t i n e n t a l , n u m a extensão da política comercial alemã da década de 1930.

Antes e depois de 1939 se discutiu a "organização" da Europa n u m a vasta eco-n o m i a m u i t o mais a b e r t a m e eco-n t e que o f u t u r o político do coeco-ntieco-neeco-nte. Todavia, par-ticularmente d u r a n t e os três primeiros anos da g u e r r a , projetos tão grandiosos ^ x- tiveram na prática p o u c o impacto sobre a política A estratégia da Blitzkrieg

reque-; ? cxia m é t o d o s diferentes de explorar os recursos econômicos dos territórios

conquis-c ^ y1 tados; só c o m a "guerra total' a idéia de alguma f o r m a de integração econômica

pareceu atraente n o contexto do próprio esforço de guerra^/

• As reflexões nazistas sobre e c o n o m i a i n t e r n a c i o n a l n ã o t i n h a m , p o r é m ,

y < n e n h u m a analogia com a doutrina liberal dos benefícios m ú t u o s oferecidos pelo

v»- . r

mercado. O regime garantia, as vezes, q u e os parceiros da Alemanha lucrariam c o m tal associação: afinal, foi o que aconteceu, e m certa medida, na década de 1930 e n ã o era t o t a l m e n t e implausível, s o b r e t u d o depois das agruras relacionadas ao capitalismo internacional nos anos 1920. Entretanto, estava cada vez mais claro q u e a primeira função econômica da Europa era sustentar a Alemanha. Só se cum-prisse essa f u n ç ã o da m e l h o r forma, assegurando a prosperidade do resto do con-tinente, poderia haver u m a partilha mais ampla dos benefícios econômicos. Países c o m o a Grécia e a Romênia logo d e s c o n f i a r a m q u e t i n h a m trocado a tirania de Londres pelo torniquete de Berlim.

Essa visão estreita da e c o n o m i a européia foi p a r t i c u l a r m e n t e pronunciada d u r a n t e a guerra. Para o desespero de h o m e n s c o m o Goering e, depois, Speer, aos y ^oq u a i s cabia a u m e n t a r a p r o d u ç ã o de a r m a m e n t o s , Hitler relutava e m aceitar a

^ y queda do p a d r ã o de vida no Reich. Queria a t o d o custo evitar que se repetisse o y, >' desastre de 1918, quando, acreditava, o colapso do setor civil acarretara a derrota

VT • militar. O regime manteve o c o n s u m o de alimentos o mais próximo possível do V q u e fora antes da guerra e se mostrava b e m p o u c o disposto a incentivar a presença

de mulheres nas fábricas. Hitler sabia q u e u m conflito extenso n ã o suscitava gran-de entusiasmo entre a população e era sensível à insatisfação noticiada pelo parti-do. Relutava e m testar sua popularidade c o m cortes drásticos na produção de bens de c o n s u m o . Os recursos econômicos da Europa lhe permitiriam evitar isso.ZÍJ

í/Á medida que a Wehrmacht invadia u m país depois do outro, uma variedade

(14)

•o

/

/ y

r

y:

controle de f i r m a s j á existentes, expropriavam empresas p e r t e n c e n t e s a j u d e u s e u* /

t r a t a v a m de estabelecer c o n t a t o c o m e m i n e n t e s industriais locais. A W e h r m a c h t e o u t r a s autoridades c o b r a v a m os "custos da ocupação" e requisitavam estoques de p r o d u t o s estratégicos, q u e i a m de j u t a a bicicleta. A m a i o r p a r t e desses artigos era c o n s u m i d a p o r unidades d o exército o u despachada para o Reich nas remessas dos soldados. N a Primeira G u e r r a M u n d i a l as tropas alemãs estacionadas nos Bálcãs recebiam alimentos p r o c e d e n t e s da A l e m a n h a ; agora os enviavam para sua pátria//

O efeito global dessa política diferia r a d i c a l m e n t e de u m a região p a r a o u t r a . Nas e c o n o m i a s industriais d o P r o t e t o r a d o e do n o r o e s t e e u r o p e u a expropriação física logo c e d e u lugar a o u t r a tática: p e r m i t i r q u e as instalações existentes conti-n u a s s e m p r o d u z i conti-n d o e coconti-nfiscar os p r o d u t o s acabados. A ariaconti-nização de empresas p e r t e n c e n t e s a j u d e u s p r o p o r c i o n o u o c o n t r o l e direto, p a r t i c u l a r m e n t e de g r u -p o s t c h e c o s e a u s t r í a c o s . C o n t u d o , f i r m a s de n ã o - j u d e u s o u -p e r t e n c e n t e s a o Estado t a m b é m a c a b a r a m s e n d o c o n t r o l a d a s pelos alemães. Assim, b o a p a r t e da indústria pesada e da p r o d u ç ã o de m i n é r i o s na E u r o p a central foi i n c o r p o r a d a à Reichswerke AG " H e r m a n n G o e r i n g " m e d i a n t e u m processo q u e recebeu o n o m e de " r o u b o legalizado". Os a l e m ã e s a p o s s a r a m - s e de três q u a r t o s d o m i n é r i o de f e r r o francês e da m e t a d e da p r o d u ç ã o belga. A p r o d u ç ã o de a r m a m e n t o s tcheca foi crucial p a r a o esforço de g u e r r a . O lucro líquido da A l e m a n h a c o m esses países é evidente.29

I r o n i c a m e n t e , a política e c o n ô m i c a dos nazistas f u n c i o n o u m u i t o m e l h o r ali q u e n o s territórios d o Leste, cuja i m p o r t â n c i a e c o n ô m i c a parecia t ã o g r a n d e na i m a g i n a ç ã o nacional-socialista. G o e r i n g , o s u s e r a n o da e c o n o m i a d o Reich até 1942, aceitou a necessidade de explorar recursos in situ na E u r o p a ocidental, m a s n o Leste i m p l a n t o u a "pilhagem" p u r a e simples, até d e p a r a r c o m a resistência d o p a r t i d o local e dos g o v e r n a n t e s militares da Polônia e da Ucrânia, q u e tiveram de arcar c o m as conseqüências.3 0/j

/ N a s e c o n o m i a s b a s i c a m e n t e agrícolas da Rússia e dos Bálcãs, a política de \ expropriação dos alemães n ã o t a r d o u a criar u m a situação das mais terríveis. Os c a m p o n e s e s p a r a r a m de abastecer o m e r c a d o , o excedente desapareceu e as p o p u -lações u r b a n a s d e f r o n t a r a m c o m a m o r t e pela f o m e . Apenas u m m ê s depois da invasão da Grécia pelos alemães, e m abril de 1941, observadores locais p r e v i r a m a falta de alimentos. A c e r t a r a m : cerca de 100 mil gregos p o d e m ter m o r r i d o de f o m e n o i n v e r n o d a q u e l e ano. N o Leste o r e g i m e nazista estava p r e p a r a d o p a r a algo ainda pior. "Muitas d e z e n a s de m i l h õ e s de pessoas serão supérfluas nesta área e

(15)

m o r r e r ã o ou terão de emigrar para a Sibéria", concluiu u m relatório u m mês antes da invasão. "Toda tentativa de salvar a p o p u l a ç ã o da f o m e c o m excedentes da região de terra negra haverá de sacrificar o abastecimento da Europa." C o m os pri-meiros atos da resistência guerrilheira ao d o m í n i o alemão e a brutal reação dos nazistas, a vida n o campo tornou-se precária e todas as possibilidades de explorar eficientemente a "terra negra" da Ucrânia esvaíram-se durante a guerra.3^

/ E n q u a n t o Goering e o Partido Nazista preferiam a exploração direta da

popu-l a?ã o l o c a l> Alfred Rosenberg, que era n o m i n a l m e n t e o encarregado da política no

Leste, preferia encorajar g r u p o s nacionalistas pró-alemães e anti-russos. C o m o g u e r r a política, poderia ter funcionado, n ã o fosse a oposição dos próprios colabo-r a d o colabo-r e s de Rosenbecolabo-rg. O R e i c h s k o m m i s s a colabo-r Kube p colabo-r o m e t e u aos bielo-colabo-russos " n e n h u m absurdo parlamentar e n e n h u m a hipocrisia democrática". Na Ucrânia encontrava-se Erich Koch, devotado seguidor de Hitler. "Tirarei t u d o desta terra", dissera. "Vim aqui não para distribuir felicidade, e sim para ajudar o Führer." Os ucranianos e r a m "negros", e suas tentativas de afirmação política esbarraram n o desprezo de K o c h /

Os resultados e r a m óbvios para muitos de seus subordinados. "Se m a t a r m o s os judeus, liquidarmos os prisioneiros de guerra, deixarmos m o r r e r de f o m e u m a considerável parcela da população e ainda p e r d e r m o s parte dos agricultores", pro-testou u m administrador, " q u e m haverá de ser e c o n o m i c a m e n t e produtivo p o r aqui?" N o c o m e ç o da ocupação, os camponeses da Ucrânia receberam os alemães c o m o libertadores. Se Hitler tivesse concordado e m privatizar as fazendas coleti-vas, c o m o Rosenberg e seus conselheiros r e c o m e n d a r a m , a p r o d u ç ã o agrícola poderia ter a u m e n t a d o ao invés de diminuir. Mas ele n ã o o fez, e o g r a n d e celeiro da Europa nunca cumpriu sua promessa. N o inverno de 1941, a f o m e espalhou-se pela Ucrânia e pela Galícia oriental. O c o r r e u n o leste u m a r e t o m a d a da atividade industrial depois que Goering m u d o u de opinião, p o r é m era tarde demais para reconquistar a simpatia de u m a população já t o t a l m e n t e desiludida. E m 1943 mui-tos camponeses voltaram n o v a m e n t e seus p e n s a m e n t o s para Moscou, alegando q u e " u m a m ã e r u i m ainda é m e l h o r q u e u m a m a d r a s t a q u e p r o m e t e demais". Rosenberg acreditava que seu lacaio Koch " a r r u i n o u u m a g r a n d e o p o r t u n i d a d e política". Só a estratégia mais m o d e r a d a que a W e h r m a c h t adotou c o m os monta-nheses m u ç u l m a n o s do Cáucaso indicou u m a das grandes possibilidades perdidas da guerra.3 2

(16)

GUERRA TOTAL

'A Blitzkrieg t e r m i n o u " , escreveu u m e c o n o m i s t a militar e m j a n e i r o d e 1942. ^ , " Q u a n t o à e c o n o m i a , é p r i o r i d a d e a b s o l u t a r e c o n s t r u í l a c l a r a m e n t e e m c o n s e -\ q ü ê n c i a de u m a l o n g a g u e r r a . " N o i n v e r n o d e 1941, os líderes a l e m ã e s t i v e r a m d e

o r i e n t a r a e c o n o m i a p a r a u m a g u e r r a t o t a l . Isso significava, c o n f o r m e o b s e r v a Milward, q u e o p r o j e t o o r i g i n a l d e criação d e u m a N o v a E u r o p a f a l h a r a e c o m ele V os e s f o r ç o s d e G o e r i n g p a r a c o o r d e n a r a p r o d u ç ã o d e a r m a s p o r m e i o d o P l a n o

t f Quadrienal; a salvação da revolução nacional-socialista demandava u m a p r o f u n d a

t r a n s f o r m a ç ã o das r e l a ç õ e s e c o n ô m i c a s e u m a r a c i o n a l i z a ç ã o d o g i g a n t e s c o m a s r u i n o s o p r o g r a m a d e r e a r m a m e n t o iniciado e m 1936.3/

A g o r a era p r e c i s o e x p l o r a r m a i s q u e n u n c a os paísessatélites. O j o v e m t e c n o -c r a t a A l b e r t Speer, u m d o s f a v o r i t o s d e Hitler, -c o m e ç o u a -c o o r d e n a r a p r o d u ç ã o bélica. Fritz Sauckel, i n s t r u m e n t o d o p a r t i d o , r e c e b e u o r d e n s d e a r r e b a n h a r m a i s a l g u n s m i l h õ e s d e t r a b a l h a d o r e s e s t r a n g e i r o s p a r a s e r v i r e m a o Reich. T e n d o exter-m i n a d o n a q u e l e i n v e r n o q u a s e 3 exter-m i l h õ e s d e prisioneiros d e g u e r r a russos, o regi-m e p e r c e b i a a g o r a s u a d e s e s p e r a d o r a n e c e s s i d a d e d e regi-m ã o - d e - o b r a . C o n f o r regi-m e escreveu u m f u n c i o n á r i o e m fevereiro d e 1942: 'A atual d i f i c u l d a d e n a distribuição d e t r a b a l h a d o r e s n ã o existiria se n o m o m e n t o a d e q u a d o se tivesse d e c i d i d o distri-b u i r e m m a i o r escala os p r i s i o n e i r o s d e g u e r r a russos. D o s 3,9 m i l h õ e s d e r u s s o s disponíveis, r e s t o u a p e n a s 1,1 m i l h ã o

/ / O Reich j á d e p e n d i a da m ã o - d e - o b r a e s t r a n g e i r a : cerca d e 700 mil p o l o n e s e s ' f o r a m e m p r e g a d o s n o v e r ã o d e 1940 e u m a n o d e p o i s havia 2,1 m i l h õ e s d e t r a b a

-v, J~ V

N „ l h a d o r e s civis e 1,2 m i l h ã o d e p r i s i o n e i r o s d e g u e r r a . A p a r t i r d e 1942, os e s f o r ç o s

d e Sauckel p e l o c o n t i n e n t e a f o r a r e s u l t a r a m n o r e c r u t a m e n t o f o r ç a d o d e m i l h õ e s d e t r a b a l h a d o r e s . O s m é t o d o s v i o l e n t o s utilizados p o r seus s u b o r d i n a d o s p r o v o c a -r a m e n o -r m e p -r o t e s t o e a j u d a -r a m a intensifica-r a -resistência a o d o m í n i o nazista. U m r e l a t ó r i o d e n o v e m b r o d e 1942 a p r e s e n t a u m a vivida d e s c r i ç ã o da m a n e i r a c o m o se a r r e g i m e n t a v a m t r a b a l h a d o r e s :

Homens e mulheres, inclusive adolescentes a partir de quinze anos, são agarrados na rua, nas feiras livres e nas festas de sua comunidade e conduzidos para longe. Por esse motivo os moradores estão com medo, escondem-se e evitam sair de casa [...] Além de se aplicarem chibatadas como castigo, desde o começo de outubro incendeiam-se

(17)

sítios ou aldeias inteiras em represália à desobediência da municipalidade local às ordens de providenciar a mão-de-obra disponível.35/'

E m abril de 1943 o chefe da agência de Sauckel e m Varsóvia foi m o r t o e m seu escritório; n o m ê s seguinte o p r o t e s t o generalizado resultou n u m a diminuição do r e c r u t a m e n t o forçado na E u r o p a ocidental.

M e s m o assim, a mão-de-obra estrangeira era essencial p a r a o esforço de guer-ra a l e m ã o . Já e m 1942 e n t r e 80% e 90% dos 600 mil o p e r á r i o s da g i g a n t e s c a Reichswerke de G o e r i n g e r a m estrangeiros civis e prisioneiros de g u e r r a ; o restan-te da e c o n o m i a seguia o exemplo. E m 1944 havia 8 milhões de trabalhadores n o Reich, na maioria civis, e 2 m i l h õ e s d i r e t a m e n t e s u b o r d i n a d o s aos a l e m ã e s e m o u t r o s países. Eles a t u a v a m n a a g r i c u l t u r a e c o n s t i t u í a m u m a f o n t e b a r a t a de e m p r e g a d o s domésticos. C o r r e s p o n d i a m a u m terço da mão-de-obra utilizada na p r o d u ç ã o de a r m a m e n t o s , e m n o v e m b r o de 1944, e a mais de u m q u a r t o dos ope-rários dedicados à c o n s t r u ç ã o de m á q u i n a s e à indústria química. Sua presença res-g u a r d o u a p o p u l a ç ã o a l e m ã e p o u p o u o r e res-g i m e de e s t a b e l e c e r u m a e s t r a t é res-g i a i n t e r n a q u e teria obrigado donas-de-casa a trabalhar fora. C o n f o r m e escreveu u m e s t u d i o s o nazista: " P r e f e r i m o s s u p o r t a r u m a u m e n t o t e m p o r á r i o n o e l e m e n t o e s t r a n g e i r o e m certas ocupações a colocar e m perigo o vigor biológico d o p o v o ale-m ã o c o ale-m a ale-m a i o r participação das ale-m u l h e r e s na força de trabalho".3 6

A caçada h u m a n a de Sauckel p e l o c o n t i n e n t e p o d e ter a j u d a d o o esforço de g u e r r a na A l e m a n h a , m a s e m o u t r o s lugares c a u s o u t r a n s t o r n o s t r e m e n d o s . Ante a a m e a ç a de s e r e m c a p t u r a d o s e d e s p a c h a d o s p a r a o Reich, t r a b a l h a d o r e s da E u r o p a o c u p a d a c o m freqüência a b a n d o n a v a m o e m p r e g o e t r a t a v a m de se escon-der. Os administradores locais p r o c u r a v a m f o r m a s de protegê-los da d e p o r t a ç ã o e os policiais faziam vista grossa. O crescimento d o Maquis na França e da resistên-cia na Gréresistên-cia teve r e l a ç ã o direta c o m a i n t e n s i d a d e c r e s c e n t e das investidas de Sauckel. Políticos e f u n c i o n á r i o s públicos t e n t a r a m convencer os alemães a m u d a r sua estratégia. E n c o n t r a r a m seu m a i o r aliado na pessoa de Albert Speer, o minis-t r o da P r o d u ç ã o Bélica.

D i f e r e n t e m e n t e de Sauckel, Speer acreditava q u e a c o o p e r a ç ã o e c o n ô m i c a c o m as e c o n o m i a s industrializadas da França, da Bélgica e da H o l a n d a era essen-cial para o esforço de g u e r r a do Reich. O r e c r u t a m e n t o f o r ç a d o de t r a b a l h a d o r e s n ã o fazia sentido se malquistava g o v e r n o s e empresários estrangeiros, d e s m a n t e -lava a p r o d u ç ã o e intensificava a resistência a o d o m í n i o alemão. Na França a tática

(18)

de Sauckel levara Lavai ao desespero: "Esta política j á n ã o é de colaboração, e sim de sacrifício, d o lado francês, e de compulsão, do lado alemão". Speer propôs, na verdade, ressuscitar a colaboração — u m a q u e s t ã o de racionalidade mais q u e de o r g u l h o político.37

/. A r a c i o n a l i z a ç ã o da p r o d u ç ã o c o n c e b i d a p o r S p e e r c o n s i d e r a v a t o d o o n o r o e s t e e u r o p e u c o m o u m a só u n i d a d e e c o n ô m i c a . Era algo m u i t o diferente da expropriação q u e caracterizara as primeiras f o r m a s da política e c o n ô m i c a alemã e que, e m c e r t o sentido, atingiu o auge na exploração da mão-de-obra européia p o r p a r t e de Sauckel. Speer tinha u m a visão mais fria e m e n o s nacionalista; preferia o p l a n e j a m e n t o à p i l h a g e m e o m u n d o dos negócios à ideologia nacional-socialista. Para ele, a criação de u m a indústria bélica de p r o p o r ç õ e s européias — essencial para a A l e m a n h a ter u m a possibilidade de g a n h a r a g u e r r a — requeria a p r o t e ç ã o de e c o n o m i a s industriais e x t e r n a s ao Reich e, p o r extensão, a p r o t e ç ã o de u m a força de t r a b a l h o a d e q u a d a m e n t e capacitada e motivada.'

Os esforços de Speer p a r a i m p l a n t a r a p r o d u ç ã o de a r m a s na Polônia e n a Ucrânia e s b a r r a r a m na devastação e c o n ô m i c a provocada p o r políticas anteriores. N a França, p o r é m , o n d e os interesses ideológicos e r a m p e q u e n o s , sua estratégia causou impacto. Ele conseguiu sustar o r e c r u t a m e n t o forçado de Sauckel e chegar a u m e n t e n d i m e n t o c o m tecnocratas locais ( c o m o Jean Bichelonne, o ministro da P r o d u ç ã o Industrial de Vichy), o q u e possibilitou planejar a p r o d u ç ã o industrial e m c o n j u n t o e m vez de s i m p l e s m e n t e destiná-la à expropriação. "E u m a imbecili-dade convocar 1 m i l h ã o de franceses", a r g u m e n t o u , criticando Sauckel, "para ficar c o m 2 milhões de t r a b a l h a d o r e s a m e n o s na França e entre 50 mil e 100 mil a mais na A l e m a n h a . " N ã o só material bélico, c o m o bens de c o n s u m o iam para o Reich. N o o u t o n o de 1943 os alemães utilizaram cerca de 40% a 50% da p r o d u ç ã o indus-trial francesa. Nessa época Speer pensava e m criar gigantescos cartéis industriais de carvão, carros, a l u m í n i o e o u t r o s p r o d u t o s , q u e p o d i a m ser incluídos n u m a z o n a franca européia.3 8

Por causa disso, ele é c o n s i d e r a d o u m pioneiro dos acordos industriais q u e l e v a r i a m à C o m u n i d a d e E u r o p é i a d o C a r v ã o e do Aço e, p o r f i m , a o M e r c a d o C o m u m . H á a l g u m a verdade e m tal interpretação, q u e d e c e r t o é n o m í n i m o t ã o plausível q u a n t o a q u e faz essas instituições do pós-guerra r e m o n t a r ao federalis-m o da resistência antinazista. C o n t u d o , p e r federalis-m a n e c e inalterado o fato de q u e a Nova O r d e m foi m u i t o mais, e m u i t o m e n o s , q u e u m p r o t o - M e r c a d o C o m u m . Por u m lado Speer era realista, pois reconhecia a impossibilidade de g a n h a r u m a g u e r r a

(19)

m o d e r n a , a l t a m e n t e i n d u s t r i a l i z a d a , c o m a p r i m i t i v a e c o n o m i a d e c o n q u i s t a d e Hitler; p o r o u t r o , p o r é m , estava e n g a n a d o , pois s e m a política de H i t l e r o T e r c e i r o Reich n ã o era n a d a . E m o u t r a s palavras, sua visão d e u m m u n d o o n d e os n e g ó c i o s s u p l a n t a v a m o c o n f l i t o p o l í t i c o — u m m u n d o s u r p r e e n d e n t e m e n t e s e m e l h a n t e a o q u e a c a b o u d e s p o n t a n d o depois d e 1945 — n ã o p o d i a concretizar-se n a E u r o p a d e Hitler. O p r ó p r i o H i t l e r l i m i t o u o p l a n e j a m e n t o d e Speer e n u n c a r e t i r o u inteira-m e n t e seu a p o i o a Sauckel: a vitória d a r a c i o n a l i d a d e s o b r e a i d e o l o g i a foi a p e n a s t e m p o r á r i a .

Se a E u r o p a n ã o p ô d e ser " o r g a n i z a d a " , b o a p a r t e da culpa c o u b e aos "orga-n i z a d o r e s " e a seu c o "orga-n c e i t o d e " o r g a "orga-n i z a ç ã o " . C o m a lucidez q u e o caracteriza, o f i l ó l o g o Victor K l e m p e r e r a p o n t o u as c o n o t a ç õ e s nazistas desse c o n c e i t o — disci-plina i m p o s t a , h i e r a r q u i a , o r d e m — , devidas a seu r a c i s m o s u b j a c e n t e . Seu rever-so foi a " o r g a n i z a ç ã o " (isto é, o r o u b o , o f u r t o , o s a q u e ) e f e t u a d a p e l o s í n f i m o s n o s c a m p o s d e c o n c e n t r a ç ã o . Mais q u e u m princípio de eficiência a d m i n i s t r a t i v a isen-ta d e j u í z o d e valor, a o r g a n i z a ç ã o n o estilo nazisisen-ta significou a s u b o r d i n a ç ã o econ ô m i c a das raças ieconferiores da E u r o p a a o Volk econ ó r d i c o g e r m â econ i c o . Assim, a e c o econ o -m i a era inseparável da ideologia; a raça seria o a u t ê n t i c o princípio " o r g a n i z a d o r " d o continente.3 9

A EUROPA COMO ENTIDADE RACIAL

/ E m a g o s t o d e 1941 H i t l e r p r o c l a m o u : 'A E u r o p a n ã o é u m a e n t i d a d e g e o g r á , fica. É u m a e n t i d a d e racial . A Liga das N a ç õ e s havia t e n t a d o c o n s e r v a r as m i n o -j S rias o n d e elas e s t a v a m e a s s e g u r a r a estabilidade p o r m e i o d o d i r e i t o i n t e r n a c i o n a l ;

Hitler, a o c o n t r á r i o , n ã o acreditava e m d i r e i t o e p r e t e n d i a a s s e g u r a r a estabilidade d e s l o c a n d o p o p u l a ç õ e s . E m n o m e d e o b j e t i v o s raciais r e m a n e j a r a m - s e n a ç õ e s , e m i l h õ e s d e p e s s o a s f o r a m a r r a n c a d a s d e s u a p á t r i a , reinstaladas n u m l u g a r estra-n h o , a c e estra-n t e estra-n a s de q u i l ô m e t r o s de distâestra-ncia, a b a estra-n d o estra-n a d a s , e estra-n c e r r a d a s e m c a m p o s d e t r a b a l h o o u d e l i b e r a d a m e n t e e l i m i n a d a s . É s o b r e t u d o n e s s e a s p e c t o q u e a S e g u n d a G u e r r a M u n d i a l difere d e c o n f l i t o s a n t e r i o r e s . Existe u m a b i s m o e n o r m e e n t r e as aspirações d o kaiser G u i l h e r m e e m 1918 — c o m seu a n t i q u a d o p r o g r a m a d e assimilação pela g e r m a n i z a ç ã o c u l t u r a l — e o r a c i s m o b i o l ó g i c o d e 1939.40/'

^ y ^ i / E s s e m u n d o n o v o d e e x t e r m í n i o e m m a s s a e a n i q u i l a ç ã o c u l t u r a l p a t r o c i n a -y i1" d o s p e l o E s t a d o d e u o r i g e m a u m n o v o t e r m o — g e n o c í d i o —, q u e s u r g i u e m 1944,

a 4

(20)

n o e s t u d o Axisrulein occupiedEurope, d o advogado j u d e u p o l o n ê s Raphael L e m k i n . Depois d o conflito, os j u l g a m e n t o s de N u r e m b e r g , a C o n v e n ç ã o do Genocídio das Nações Unidas, o j u l g a m e n t o de E i c h m a n n e o interesse da mídia pelo q u e se tor-n o u c o tor-n h e c i d o c o m o H o l o c a u s t o d i f u tor-n d i r a m a idéia de q u e a S e g u tor-n d a G u e r r a Mundial foi, e m certa m e d i d a , u m a g u e r r a racial — vista, c o m freqüência, exclusi-v a m e n t e e m t e r m o s de "a g u e r r a c o n t r a os j u d e u s " (para citar o título de u m estu-do f a m o s o ) , ' t ) e fato, a solução final da q u e s t ã o judaica surgiu de u m entrelaçamen-t o mais a m p l o de q u e s entrelaçamen-t õ e s raciais q u e o r e g i m e nazisentrelaçamen-ta p r o c u r o u "resolver" p o r m e i o da g u e r r a .

U m a c o n s e q ü ê n c i a da conquista da E u r o p a pelos nazistas foi a extensão da dialética d o Estado d o b e m - e s t a r racial a u m a escala continental — u m Estado, e m o u t r a s palavras, o n d e as m e d i d a s policiais de repressão aos "racialmente indesejá-veis" e r a m o anverso da estratégia de salvaguardar o vigor da Volksgemeinschaft. A N o v a O r d e m na E u r o p a envolvia, p o r u m lado, medidas para eliminar a " a m e a ç a " q u e j u d e u s , ciganos, poloneses, u c r a n i a n o s e o u t r o s Untermenschen r e p r e s e n t a v a m para o Reich e, p o r o u t r o , planos g r a n d i o s o s e m prol d o Deutschtum — e m particu-lar, p r o v e r o b e m - e s t a r e o r e a s s e n t a m e n t o d o s c h a m a d o s Volksdeutsche, os 10 m i l h õ e s d e g e r m a n ó f o n o s q u e v i v i a m f o r a d o Reich. E x p u l s ã o e c o l o n i z a ç ã o , e x t e r m í n i o e assistência social e r a m os dois lados da m e s m a m o e d a imperial.

A g u e r r a n ã o só expandiu o alcance g e o g r á f i c o da política racial nazista c o m o a radicalizou e complicou. Foi o g r a n d e catalisador. Para Hitler, n o final dos anos 1930, o p r i m e i r o r e a s s e n t a m e n t o de alemães d o Tirol meridional constituiu inicial-m e n t e u inicial-m a q u e s t ã o de necessidade diploinicial-mática: nas inicial-m ã o s de H i inicial-m inicial-m l e r , depois de o u t u b r o de 1939, converteu-se n o prelúdio de u m a visão m u i t o mais ambiciosa, envolvendo o c o m p l e t o r e m a n e j a m e n t o étnico da E u r o p a oriental. Os objetivos d o r e a s s e n t a m e n t o p a s s a r a m p o r várias m u d a n ç a s à m e d i d a q u e a u m e n t a v a a extensão territorial dos alemães e as perspectivas se modificavam. Pode-se dizer o m e s m o sobre a estratégia relativa aos "racialmente indesej áveis". A p r o g r e s s ã o da g u e r r a levou a política p a r a águas desconhecidas.

N o t o c a n t e à " q u e s t ã o j u d a i c a " , abriram-se novas perspectivas, e s u r g i r a m novas dificuldades, q u a n d o a Polônia, depois a Europa ocidental e p o r f i m g r a n d e s p o r ç õ e s da U n i ã o Soviética caíram e m p o d e r dos nazistas. A "estrada t o r t u o s a para A u s c h w i t z " c o m p r e e n d e u a t a l h o s e q u i v o c a d o s , c o m o o P l a n o M a d a g á s c a r de 1940 (o envio dos j u d e u s e u r o p e u s p a r a essa ilha), e i m p r o v i s a ç õ e s m o r t í f e r a s , c o m o as u n i d a d e s de gás usadas na Sérvia, na Ucrânia e e m C h e l m n o , a n t e s de

(21)

(

o c o r r e r à cúpula nazista a idéia da aniquilação maciça, industrializada, nos c a m p o s de extermínio.

/ Paralelamente à expansão e à radicalização da agenda racial h o u v e u m rápido - c r e s c i m e n t o da ss. Ao a g r u p a r os serviços de segurança na RSHA, sob a direção de ^ \ Heydrich, H i m m l e r passou a exercer ampla influência n o p o l i c i a m e n t o e n o

servi-ço de i n f o r m a ç õ e s e m b o a p a r t e dos territórios ocupados. Criado e m 1934, o impé-j rio do c a m p o de c o n c e n t r a ç ã o (excluindo-se os c a m p o s de extermínio) expandiu

sua p o p u l a ç ã o de 25 mil e m 1939 para 714 mil e m 1945 e foi administrado p o r o u t r o s e t o r da ss, a WVHA. OS c a m p o s de e x t e r m í n i o n ã o existiam e m 1939; e m 1942, ' m a t a r a m mais de 1 m i l h ã o de pessoas!/a criação de u m a nova classe de colonos

ale-m ã e s a partir dos infelizes Volksdeutsche t o r n o u - s e responsabilidade da RKFDV, que, * V ° instituída e m o u t u b r o de 1939, retirou de suas casas mais de 1 milhão de alemães

étnicos, administrou centenas de c a m p o s de r e a s s e n t a m e n t o e instalou n o m í n i m o 400 mil na E u r o p a oriental. Foi, p o r t a n t o , a g u e r r a q u e p e r m i t i u à ss rivalizar c o m o p o d e r d o a p a r a t o estatal estabelecido na U n i ã o Soviética para controlar a vida e o destino de milhões de pessoas.4'

/ A c e n t r a l i d a d e d o p e n s a m e n t o racial — b e m c o m o a idéia d o assassinato N ^ r maciço industrializado — constituiu a diferença básica entre o i m p é r i o de Hitler e o de Stalin. C o m o p o d e r de r e f o r m u l a r a c o m p o s i ç ã o h u m a n a de u m c o n t i n e n t e inteiro, H i m m l e r e a ss d e p a r a r a m c o m as ambigüidades, os dilemas e as limitações de u m a política imperial c o n f i g u r a d a pelas premissas do racismo biológico. Para

C começar, qual devia ser o papel dos alemães? D e v i a m concentrar-se n o Reich,

con-NTV forme a opinião que prevaleceu até 1941, ou formar u m a classe fronteiriça para p o v o a r as marcas orientais, tal qual f i z e r a m seus antepassados medievais? C o m o raça superior, deviam e n c h e r suas p r o p r i e d a d e s c o m milhares de servos eslavos, o u cultivar a t e r r a de acordo c o m a n o ç ã o nazista de q u e Blut und Boden constituía a garantia m á x i m a da vitalidade ariana? C o m o r e c o n h e c e r u m a l e m ã o étnico: pelo idioma, pelas características físicas o u pela genealogia? D u r a n t e toda a g u e r r a , os b u r o c r a t a s nazistas d i s c u t i r a m a c a l o r a d a m e n t e essas q u e s t õ e s . Q u a n t o aos

Untermenschen, e r a m u m a força de t r a b a l h o necessária o u u m a a m e a ç a biológica

q u e c u m p r i a eliminar? Tais e r a m os dilemas d o apartheid p r a t i c a d o na vasta e cri-m i n o s a escala da Nova O r d e cri-m de H i t l e r /

(22)

A GUERRA RACIAL (1): POLÔNIA, I939-4I

As disposições de Versalhes referentes aos problemas das minorias na Europa oriental expiraram e m Munique, q u a n d o Ribbentrop, o ministro do Exterior ale-mão, secretamente p r o m e t e u aos italianos reassentar n o Reich os alemães étnicos do Tirol meridional. J u n t o c o m a anexação dos Sudetos, essa promessa encerrou a era dos Tratados das Minorias e i n a u g u r o u u m a abordagem mais brutal das ten-sões étnicas na Europa. As garantias legais c e d e r a m lugar a traslados compulsórios de populações nos moldes da troca greco-turca efetuada quinze anos antes.

A princípio, isso resultou n u m g r a n d e influxo de alemães étnicos n o Reich. Assim c o m o a necessidade de contar c o m o apoio da Itália levou Hitler a revogar u m a política anterior e sancionar o r e a s s e n t a m e n t o de 80 mil alemães d o Tirol meridional, sua necessidade de contar c o m o apoio da Rússia e m 1939-40 levou-o a u m sacrifício semelhante das comunidades alemãs do Báltico e da Bessarábia. E m o u t u b r o de 1939, a ss recebeu a incumbência de repatriar cerca de 75 mil alemães da Letônia e da Estônia; n o m ê s seguinte u m novo acordo entre Berlim e Moscou abrangeu os 128 mil Volksdeutsche da Polônia ocupada pelos soviéticos. D e n t r o de semanas essa gente c o m e ç o u a chegar ao Reich e à Polônia ocupada, e n ã o se sabia ainda o n d e e c o m o instalá-la.

Hitler concebeu o r e a s s e n t a m e n t o c o m o u m a tarefa do Partido Nazista, m a s H i m m l e r logo o c o n v e n c e u a confiá-lo à ss. N o c o m e ç o de 1940 ele criou a Comissão do Reich para a Consolidação da Nacionalidade Alemã (RKFVD), encar-regada de organizar evacuações, a triagem racial de evacuados e campos de

recep-ÜD

ção. Cabia à RKFVD n ã o só zelar pelos imóveis q u e os alemães bálticos haviam dei-xado para trás c o m o e n c o n t r a r novas propriedades onde reassentá-los. Esta última tarefa envolvia a expulsão dç poloneses e j u d e u s de seus imóveis nos territórios conquistados.;

Entre 1939 e 1941, as atividades da RKFVD concentraram-se na Polônia, agora dividida nos territórios ocidentais de W a r t h e g a u e Dantzig, q u e f o r a m incorpora-dos ao Reich, e n o G o v e r n o Geral, a d m i n i s t r a d o c o m o u m a colônia p o r H a n s Frank. H i m m l e r pensou e m criar u m a linha de demarcação clara entre os alemães e a população "racialmente inferior". Os alemães étnicos seriam conduzidos para os territórios ocidentais incorporados, e n q u a n t o os poloneses e os j u d e u s

Referências

Documentos relacionados

Para o menino Momik, a constituição de sua própria memória, no que diz respeito ao trauma não vivido do holocausto e a constituição de si mesmo como judeu, se dará necessariamente

Benetton (1999) apresenta o caráter de funcionalidade na Terapia Ocupacional como tendo sido assumido por muitos autores, pelos precurssores da profissão (Meyer, Simon e Schneider)

Portanto, todos os negócios devem ser informados de suas falhas, pois são manchas para a religião, pois não devemos ser assim neste ou naquele

Processo de se examinar, em conjunto, os recursos disponíveis para verificar quais são as forças e as fraquezas da organização.

Seus filhos não apenas deveriam ouvir, mas contar e recontar o que Deus tinha feito por eles, de modo que não se esquecessem.. Haveria melhor maneira de preservar o conhecimento do

Disse que os danos materiais requeridos pelo autor, qual seja, a restituição da integralidade do valor pago pela passagem não merece prosperar pois o trecho não cumprido foi

1 — Os apoios são concedidos pela Câmara Municipal da Guarda às IPSS legalmente cons- tituídas de acordo com o estipulado no n.º 3, do artigo 2.º do presente Regulamento... 2 —

Há amplo espaço para preocupação quanto às dificuldades para aprovação de reformas necessárias à contenção do déficit público, peça crucial para o sucesso