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Niterói, Dezembro de 2004.

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Dissertação final de curso apresentada como requisito à obtenção ao título de mestre em Economia da Universidade Federal Fluminense, sob a orientação do Prof. Carlos Pinkusfeld Bastos.

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RESUMO

A forma de mensuração do déficit/superávit do setor público na economia brasileira usualmente utilizada tem sido a chamada Necessidade de Financiamento do Setor Público, que é a metodologia recomendada pelo Fundo Monetário Internacional. O objetivo deste trabalho é o de questionar a utilização deste método como instrumento de auxílio à política fiscal e apresentar e aprofundar a metodologia alternativa de medida chamada déficit de alto emprego ou déficit ciclicamente ajustado. Além disto, será visto de forma breve a teoria das “finanças funcionais” desenvolvida por Abba-Lerner – teoria que difere das “finanças saudáveis” (ou orçamento equilibrado) – e a importância do déficit de alto emprego para esta. O déficit de alto emprego tem a vantagem de eliminar das estimativas das contas do governo os efeitos provocados por variações no produto da economia. A forma de estima-lo nos Estados Unidos e na OECD é apresentada, seguido de uma adaptação e cálculo deste método para a economia brasileira para os anos de 1991 a 2002. Os resultados obtidos mostram que a política fiscal adotada pelo governo brasileiro foi de característica mais expansionista no período de implantação do Plano Real e até o ano de 1998, quando se passou a atuar de forma mais contracionista. Ao analisar separadamente os totais das despesas e das receitas do Governo Central se percebeu um aumento maior das despesas do que das receitas nos anos de 1993 a 1996. Esta política expansionista implicou em queda do superávit fiscal primário efetivo, surgindo um déficit em 1997. Contudo, medido em termos de alto emprego, estes resultados, em todo o período estudo, nunca ficaram deficitários.

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ABSTRACT

The objective of this dissertation is to discuss the use of the Public Sector Borrowing Requirements - PSBR (operational concept) as the basic indicator to analyze the Brazilian fiscal policy from 1991 to 2003. It is argued that the adjusted concept, which corrects revenues and expenditures for the economic cycle, is a better methodology of the fiscal stance. The theoretical argument that support this claim brigs us to the study of the theory of “Functional Finances” developed by Abba-Lerner – which is opposed to the traditional "sound finance”, or balanced budget, approach. After this initial theoretical discussion we calculate the adjusted, or high employment, public deficit to the Brazilian economy using two methodologies: one proposed by the Bureau of Economic Activity (BEA) for the United States, and the other developed by the Organization for Economic Co-Operation and Development (OECD). .The results show that the Brazilian’s fiscal policy was expansionary from 1994 to 1998, which includes the initial phase of the stabilization program, called Real Plan. After this the period the fiscal policy became much more austere. This result is not very far from the analysis based on the current deficit measure, and this similarity can be explained by the relatively stable pattern of the Brazilian economy during this period: low economic growth and small variance around this tendency. When we study separately Central Government's expenditures and revenues it is observed that from 1993 to 1996 there is a large increase of the expenditures that is not accompanied by a proportional increase of tax revenues in the years. This combination explains the fall in both actual and adjusted government's primary budget surplus, which became a deficit a deficit in 1997 in the actual measure. This result changes when the deficit is measured at its high employment level: using this methodology the whole period, from 1991 to 2002 never register a single year of public deficit.

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SUMÁRIO

RESUMO ... 2

LISTA DE QUADROS ... 6

INTRODUÇÃO ... 7

Capítulo 1 - Medidas de Déficit Público e uma Introdução à Metodologia de Cálculo do Déficit de Alto Emprego ... 11

1.1 – Evolução das Finanças Pública: breve histórico e a contribuição de Abba Lerner. ... 11

1.2 – Finanças Funcionais... 14

1.3 – A Importância do Déficit de Alto Emprego ... 21

1.4 – Medidas de Déficit Público ... 27

1.4.1– Déficit Convencional Nominal ... 29

1.4.2 – Déficit Real e Déficit Operacional ... 31

1.4.3 – Déficit de Alto Emprego... 34

Capítulo 2 - Metodologias de Cálculo do Déficit de Alto Emprego ... 40

2.1 – Déficit Orçamentário de Alto Emprego do Bureau of Economic Analysis (BEA) ... 40

2.1.1 – Receitas de Alto Emprego ... 41

2.1.1.1 – Cálculo das Receitas de Alto Emprego ... 43

2.1.1.2 – Cálculo das Elasticidades ... 45

2.1.2 – Despesas de Alto Emprego... 48

2.2 – Déficit Orçamentário de Alto Emprego da Organization for Economic Co-Operation and Development (OECD)... 49

2.2.1 – Receitas de Alto Emprego ... 50

2.2.1.1 – Elasticidade do Imposto (η) ... 50

2.2.2 – Despesas de Alto Emprego... 52

2.2.2.1 – Elasticidade das Despesas Correntes (λ)... 53

Capítulo 3 - Adaptação para o Caso Brasileiro: Receitas e Despesas de Alto Emprego ... 54

3.1 – Hiato entre o Produto Interno Bruto Potencial e o Efetivo para a Economia Brasileira ... 55

3.2 – Receita de Alto Emprego para o Caso Brasileiro... 61

3.2.1 – Elasticidade das Receitas ... 65

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3.3 – Despesas de Alto Emprego para o Caso Brasileiro ... 76

3.3.1 – Elasticidades das Despesas do Governo Central ... 77

Capítulo 4 - Adaptação para o Caso Brasileiro: O Déficit Operacional de Alto Emprego... 81

4.1 – Déficit Primário de Alto Emprego para o Governo Central... 84

4.2 – Comparando o Déficit de Alto Emprego com o Déficit Efetivo ... 88

CONCLUSÃO ... 97

BIBLIOGRAFIA... 101

ANEXO A – PIB de Alto Emprego (BEA e OECD) ... 104

ANEXO B – Elasticidade da Taxa Média do Imposto com Respeito à Renda ... 110

ANEXO C – Dados do PIB Brasileiro ... 112

ANEXO D – Dados do Total das Receita Administradas pela SRF ... 113

ANEXO E – Dados do Total das Contribuições ... 115

ANEXO F – Dados sobre os Impostos sobre Produtos Industrializados ... 117

ANEXO G – Dados sobre o Imposto de Renda ... 119

ANEXO H – Dados sobre o Imposto sobre Comércio Exterior... 120

ANEXO I – Dados sobre as Receitas da STN e do INSS ... 121

ANEXO J – Dados sobre as Despesas da STN ... 122

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Coeficiente do PIB ... 59

Quadro 2 – PIB Hiato ... 61

Quadro 3 – Contribuições ... 67

Quadro 4 – IPI ... 68

Quadro 5 – Imposto de Renda ... 69

Quadro 6 – Demais Receitas da SRF e Receitas da STN... 70

Quadro 7 – Receita do INSS... 71

Quadro 8 – Contribuições de Alto Emprego ... 72

Quadro 9 – IPI de Alto Emprego... 73

Quadro 10 – Imposto de Renda de Alto Emprego ... 74

Quadro 11 – Receita Fiscal de Alto Emprego... 75

Quadro 12 – Receita de Alto Emprego Total do Governo Central ... 76

Quadro 13 – Despesas do Tesouro Nacional... 78

Quadro 14 – Despesas do INSS ... 79

Quadro 15 – Despesa de Alto Emprego Total do Governo Central ... 80

Quadro 16 – Déficit Primário de Alto Emprego ... 87

Quadro 17 – Déficit de Alto Emprego do Setor Público... 88

Quadro 18 – Déficit Efetivo do Setor Público... 89

Quadro 19 – Despesas com Juros Reais X Demais Despesas ... 92

Quadro 20 – Variação Percentual das Receitas e Despesas ... 94

Quadro 21 – Diferença Percentual entre PIB* e PIB ... 95

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INTRODUÇÃO

Estimar o impacto macroeconômico do déficit público é uma das principais tarefas dos economistas. A metodologia de mensuração deste déficit recomendada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) é a Necessidade de Financiamento do Setor Público (NFSP). Esta é estimada pela subtração dos fluxos efetivos de despesa e receita (ou “acima da linha”) que deve ser consistente com a variação do estoque da dívida líquida do governo, aí incluída a base monetária. O valor “acima da linha” determinaria as necessidades de financiamento do setor público que teria, como contrapartida, a variação da dívida líquida.

A adoção dessa medida no Brasil, a partir do acordo com o FMI em 1982, serve de exemplo muito interessante como a metodologia de medida de um déficit pode ser incompatível com os modelos que pretendem usar tais estimativas.

A assinatura de um acordo de condicionalidade com o Fundo em 1983 exigia do governo o estabelecimento de metas fiscais restritivas para diminuição da absorção interna. Entretanto, o valor do déficit medido em termos nominais revelava-se tão elevado que sua redução para valores compatíveis com uma política fiscal restritiva era impossível. Esse fato acabou resultando na mudança da medida do déficit para o conceito operacional, que uma vez descontada a correção monetária da dívida pública apresentava valores muito mais razoáveis e passíveis de uma programação de redução, ao menos teoricamente, factível.

É interessante notar que o caráter teoricamente equivocado da NFSP tradicional já havia sido apontado por autores como Eisner (ver capítulo 1), mas devido

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ao valor não tão elevado da inflação nos países desenvolvidos, o efeito distorcivo não era tão grande a ponto de sugerir uma revisão profunda da metodologia do FMI.

Esse é um exemplo “radical” de utilização inadequada de um conceito do déficit público, já que o conceito nominal é basicamente incorreto. Entretanto, a questão do indicador fiscal adequado é bem mais complexa já que depende das perguntas que o macroeconomista visa a responder.

Blanchard (1990) alinha uma série de questões relevantes sobre a análise do déficit público: qual a contribuição da política fiscal para demanda, oferta e poupança agregados; se as mudanças nos resultados do déficit decorrem de mudanças do ambiente econômico ou da ação arbitrária do governo; a sustentabilidade ou não de determinada política fiscal no longo prazo, etc... Para ele, não existe um indicador que seja capaz de responder adequadamente a todas essas perguntas, logo, a estratégia adequada seria “...tomar cada conjunto de questões dentro de suas próprias especificações e prover não um, mas um conjunto de indicadores” (p. 5).

Dentro dessa perspectiva, essa dissertação pretende contribuir para o debate sobre o impacto do déficit na economia calculando o déficit de alto emprego para o período de 1991 até 2002, partindo da constatação que o atual conceito oficial, o déficit operacional efetivo é incapaz de fornecer respostas a perguntas pertinentes.

Com o cálculo do déficit de alto emprego é possível, por exemplo, verificar o quanto as ações discricionárias estariam afetando a medida do déficit e o quanto essa variação é resultado de variações na economia. Pode-se também estimar se as políticas expansionistas foram no sentido mais estrito do termo, isto é, até que ponto o déficit é superavitário ou deficitário quando medido no nível de alto emprego. Em princípio, esse número mediria o quanto de fato o governo está, ou não, exercendo uma pressão sobre a demanda acima da capacidade máxima potencial da economia. Logo, o objetivo central desta dissertação é realizar o trabalho empírico de mensuração do déficit neste conceito, adaptando para o caso brasileiro metodologias aplicadas em outros países.

Além desse objetivo central reconhece-se que essa medida é mais consistente e indicada como indicador de política econômica, uma vez que seja adotada uma abordagem macroeconômica Keynesiana, na qual a economia não tende ao pleno emprego e que a atuação do governo através de seus dispêndios e cobranças de tributos

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é fundamental para manutenção de um nível elevado de produto e reduzido de desemprego.

Dentro dessa idéia geral será feita uma breve revisão da teoria das “Finanças Funcionais” desenvolvida por Abba Lerner (1951), pois nesta estaria o princípio básico que deveria orientar o desenho das políticas macroeconômicas e das finanças públicas. Adicionalmente, independente da utilização ou não do indicador, calcularam-se estimativas de elasticidades de arrecadação e gastos que apresentaram resultados econométricos bastante aceitáveis. Foi feito, também, um esforço de compatibilização das rubricas de gasto e receita que podem ser utilizados para outros estudos macroeconômicos em nível mais desagregado.

Esta dissertação está divida em mais cinco partes, além desta introdução. No capítulo seguinte, será exposto, de forma muito sintética, o surgimento da posição Keynesiana, e, conseqüentemente, da relevância do conceito de alto emprego, em contraste com a ortodoxia do orçamento equilibrado que imperava até então. Será destacada a importância do déficit de alto emprego e sua limitação, no que refere a necessidade de se estimar a poupança privada de alto emprego e a dificuldade de se agir com a metodologia do déficit de alto emprego quando um país se defronta com uma economia aberta.

Ainda dentro do primeiro capítulo, serão apresentadas algumas metodologias de mensuração do déficit (Necessidade de Financiamento nos conceitos nominal, operacional e primário), suas características e limitações. Em seguida, será dado enfoque, de forma rápida, ao conceito do déficit de alto emprego e de algumas medidas alternativas que tentam captar este fenômeno, qual seja, o impacto das variações do produto sobre o valor do déficit.

No segundo capítulo serão destacadas, de forma mais detalhada, duas metodologias que tentam estimar o déficit de alto emprego: o cálculo realizado pelo Bureau of Economic Analysis e pela Organization for Economic Co-Operation and Development.

No terceiro capítulo será feita uma adaptação destas metodologias para a economia brasileira, estimando-se as receitas e despesas de alto emprego para o Governo Central. Foram estimadas, neste capítulo, equações com significância

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estatística para os componentes de gasto e receita ainda que nem sempre se tenha alcançado essas estimativas no nível de maior desagregação. Nestes casos, optou-se, então, por uma combinação de estimativas mais e menos desagregadas segundo um critério de consistência interna que será explicitado neste capítulo.

No quarto capítulo, utilizando-se das receitas e despesas de alto emprego obtidas no capítulo anterior, será estimado o déficit primário de alto emprego do Governo Central pelo método “acima da linha”. Entretanto, devido às dificuldades encontradas em se compatibilizar o déficit primário efetivo “acima da linha” ao “abaixo da linha”, foi necessária a inclusão da variável erros e omissões para se obter o déficit primário de alto emprego “abaixo da linha”. Com este déficit estimado, foi somado o montante de juros reais pago para se obter o déficit operacional de alto emprego e em seguida este resultado foi somado aos déficits operacionais dos estados e municípios e das empresas estatais em seus valores efetivos para se chegar ao déficit operacional de alto emprego de todo o Setor Público. Por fim, utilizou-se deste resultado para cotejar com o déficit operacional efetivo do Setor Público, com estas comparações foi possível identificar uma característica muito mais recessiva do governo brasileiro em toda a década passada e começo desta do que usualmente se costuma argumentar, contudo, no período de implantação do plano Real se percebeu uma característica, dentro do déficit medido em ambos os conceitos, mais expansionista do que as ocorridas em outros períodos estudados. Finalizando o trabalho, será apresentada uma conclusão dos resultados obtidos.

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Capítulo 1

Medidas de Déficit Público e uma Introdução à Metodologia de Cálculo do Déficit de Alto Emprego

1.1 – Evolução das Finanças Pública: breve histórico e a contribuição de Abba Lerner.

A doutrina do orçamento equilibrado se constituiu como uma das peças centrais da, pelo menos, auto-proclamada ordem do Padrão Libra-Ouro do século XIX. Para alguns autores monetaristas, inclusive, foi exatamente a impossibilidade sócio-política de manter-se essa cláusula macroeconômica que teria levado a instabilidade econômica que decretou o fim deste padrão. Eichengreen (2000), por exemplo, afirma que “... os governos do pós-guerra estavam mais suscetíveis a pressão em vista da extensão dos direitos de cidadania... e do crescimento dos investimentos sociais” (p. 76). Essa pressão sobre o orçamento (e também sobre a flexibilidade do salário nominal) pelos que “reivindicavam estímulos ao crescimento e emprego” faziam, segundo esse autor, com que os governos, incorrendo em déficits, perdessem sua credibilidade, transformado, assim, “perturbações limitadas numa crise econômica e política” (p. 76).

Não surpreende que na tentativa de restabelecimento do padrão ouro nos anos de 1920, que se inicia justamente com os países que sofreram as mais dramáticas crises inflacionárias, uma das questões centrais tenha sido sempre a necessidade do equilíbrio fiscal corrente. Mesmo quando eclode a crise de 1929, ou seja, num momento

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em que a política fiscal expansionista teria uma importância contra-cíclica crucial, a doutrina do orçamento equilibrado continua a exercer forte influência sobre a política econômica então implementadas.

No caso da Inglaterra, por exemplo, o Ministro das Finanças (Chancelor do Exchequer) em 1931 fazia a seguinte declaração (apud Eatwell 1984, p. 28):

“I say with all the seriousness I can command that the national position is so grave that drastic and disagreeable measures will have to be taken if Budget equilibrium is to be maintained and if industrial progress is to be made. An expenditure which may be easy and tolerable in prosperous times becomes intolerable in a time of grave industrial depression . . . I believe . .. that an increase of taxation in present conditions which fell on industry would be the last straw. Schemes involving heavy expenditure, however desirable they may be, will have to wait until prosperity returns. This is necessary ... to uphold present standard of living, and no class will ultimately benefit more by present economy that the wage-earners.”

Já nos Estados Unidos, o Presidente Hoover, ao fim de 1931 eleva a carga tributária com o objetivo explícito de equilibrar o orçamento. Essa política fiscal contracionista em meio a pior crise econômica vivida pelos Estados Unidos, é uma evidência convincente da força teórico-ideológica da doutrina do orçamento equilibrado1. Essa idéia é reforçada pelo apoio dos democratas a tal compromisso com as “finanças saudáveis” ainda que a forma de imposição do ajuste fiscal fosse criticada como “a rich man’s tax bill”.

Mesmo o presidente F.D. Roosvelt que passou a história, em conseqüência da sua política do New Deal, como um “pioneiro” na aplicação de políticas fiscais expansionistas, ou Keynesianas, foi, pelo menos durante o seu primeiro mandato e em parte do segundo, um defensor da idéia do orçamento equilibrado. É verdade, entretanto, que em face dos graves problemas que enfrentava suas propostas orçamentárias efetivas foram, pelo menos nos valores correntes, expansionistas, e que sua retórica incorporava conceitos “elásticos” para a idéia do orçamento equilibrado.

1 Nesta doutrina, busca-se manter as contas do governo em equilíbrio de forma que as despesas não sejam

maiores que as receitas.

Segundo Stein (1996), a tentativa de equilibrar o orçamento em meio a uma profunda recessão estaria associada a tentativa de manutenção do padrão-ouro pelos EUA, após a saída da libra desse sistema de câmbio em setembro de 1931. Haveria a necessidade de demonstração que o orçamento estaria “sob controle” para evitar ataques especulativos sobre o dólar.

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Em resumo, apenas no final da década de 30 é que o presidente, e parte de sua acessoria mais próxima, começa a se convencer da necessidade de geração de déficits públicos para garantir níveis de emprego alto.

Ainda tendo como exemplo histórico os EUA, pode-se observar que essa mudança de perspectiva teórica da atuação do governo levou algum tempo para se consolidar dentro das metas concretas de política fiscal. Segundo Blinder e Solow (1974), mais especificamente, o conceito de déficit público de alto emprego (ou “full employment surplus”) tem as suas origens no “trabalho de Beardsley Ruml e o Comitê para Desenvolvimento Econômico em torno da Segunda Grande Guerra” (Blinder e Solow – p. 15). Esse conceito foi articulado politicamente por Charles Schultz e Herbert Stein num testemunho perante o congresso em 1961 e consagrado em 1962 como peça central da “New Economics” dos Presidentes Kennedy e Johnson. A crise inflacionária que se acirra a partir do final dos anos 60 termina por derrubar essa doutrina macroeconômica dos presidentes democratas dos anos 60 e com ela o papel central do déficit (ou superávit) de alto emprego.

Pode-se perceber então que a utilização do déficit de alto emprego reflete a “ortodoxia” do consenso Keynesiano dos anos 50 e 60, enquanto contrasta com a “ortodoxia” do padrão-ouro e seu renascimento a partir da década de 70 com os teóricos novoclássicos, do orçamento equilibrado.

Dentro dessa perspectiva de política econômica, onde se reconhece a importância do ciclo econômico sobre as contas do governo, por um lado, e a importância da atuação deste para levar a economia para níveis mais elevados de produto e emprego, por outro, surge uma leitura mais radical quanto à importância das finanças públicas na determinação do nível de emprego, tanto no curto como no longo prazo: a chamada teoria das Finanças Funcionais de Abba Lerner . A exposição abaixo dessa teoria segue Lerner (1951) e Wray (2003), tendo como princípio o chamado “pessimismo das elasticidades”, ou seja, o investimento privado é incapaz de reagir à redução das taxas de juros sendo, por essa razão, incapaz de levar a economia ao pleno emprego, mesmo que todos os pressupostos da teoria marginalista sejam respeitados. Desta forma, o foco da política econômica deve ser a forma como o governo deve elaborar suas finanças com o objetivo de manter a economia o mais próximo possível do

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seu nível potencial, tentando evitar desemprego involuntário e o processo inflacionário (provocado pela demanda).

As finanças do governo têm que ter uma funcionalidade macroeconômica e não devem ser consideradas apenas como a contabilização de entrada e saída de recursos cujo resultado final deve apresentar um equilíbrio financeiro.

1.2 – Finanças Funcionais

Não existe razão para acreditar que a economia esteja produzindo ao seu nível potencial, nem que ela tenderá no longo prazo para este nível determinado pela oferta (como postulado pela teoria neoclássica). A aplicação do princípio da demanda efetiva no longo prazo demonstra que a produção se adapta a demanda e, dentro dessa abordagem o gasto autônomo do governo influencia diretamente a demanda agregada no longo-prazo e, consequentemente, a evolução da própria capacidade produtiva2.

Com base nesta teoria heterodoxa – de que a economia não tende ao pleno emprego e de que a demanda determina a oferta – Abba Lerner desenvolveu a idéia das Finanças Funcionais. As “Finanças Funcionais são meramente a adaptação consciente pelo governo da responsabilidade da prevenção da inflação e da deflação”3. Existem duas formas pela qual a ação do governo pode afetar a demanda agregada, ou variando diretamente seus gastos ou variando os recursos a qual ele deixa disponível para consumo (tributação e/ou transferências). Então, se o governo resolver aumentar seus gastos em bens de consumo e/ou bens de capital ou diminuir a tributação e/ou aumentar os gastos com transferências (seguro desemprego, por exemplo) ele estará aumentando a demanda agregada, por outro lado, se diminui os seus gastos ou aumenta a tributação e/ou diminui as transferências ele estará diminuindo o total das demandas realizadas. É bom notar que nas primeiras ações (aumentar/diminuir os gastos) o governo afetará a demanda de forma direta, enquanto que as últimas afetam primeiro a renda das famílias para depois afetar a demanda, através de variação no consumo, isto é, afetam a demanda de forma indireta4.

2 Para um modelo de multiplicador e acelerador onde o princípio da demanda efetiva vale no longo prazo

ver Serrano (1995)

3 Lerner (1951) pág. 136. Tradução do autor.

4 Lerner ainda inclui a possibilidade do governo afetar a demanda agregada de forma indireta através do

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Destarte, se a economia estiver com desemprego involuntário é recomendável que o governo aumente seus gastos e/ou diminua a tributação e/ou aumente as transferências para as famílias com o objetivo de aumentar a demanda agregada até que o desemprego diminua e, caso contrário, se a economia estiver com excesso de demanda é recomendável que o governo diminua seus gastos e/ou aumente a tributação e/ou diminua as transferências para evitar um processo inflacionário originário da demanda. Ou seja, o governo, através da política fiscal, tem de agir de forma a tentar manter a economia o mais perto do pleno emprego.

Com isto, surgem os questionamentos de que o governo não terá recursos para financiar os aumentos, nem através da tributação nem através de empréstimos (via venda de títulos), pois estará aumentando a dívida pública (interna) fazendo com que, com receio do futuro, os agentes desconfiem da solvência do governo5, devido aos déficits constantes. Mas é justamente neste ponto que as Finanças Funcionais se diferenciam de forma mais clara das finanças saudáveis (ou orçamento equilibrado). O único modo de o governo realizar seus gastos é através do papel moeda. Seria totalmente ilógico acreditar que o governo, que detém o monopólio da emissão de papel moeda, tenha que captar esta mesma moeda para poder realizar seus gastos e mais ilógico ainda é acreditar que os outros agentes (que não o governo) tenham papel moeda sem o governo tê-la emitido. Então, com base na idéia de que o governo não precisa se “financiar” com tributos nem com emissão de dívidas, Lerner afirma que “a responsabilidade financeira do governo (...) é manter a taxa total de dispêndio no país em bens e serviços nem maior nem menor que a taxa que, a preços correntes, compraria todos os bens que são possíveis produzir” e continua6 (apud Wray 2003, p. 95):

“a tributação nunca deve ser estabelecida apenas porque o governo precisa fazer pagamentos (...) Tributação deveria, pois, ser imposta somente quando é desejável que os contribuintes tenham menos moeda para gastar”.

E seguindo a mesma idéia para os empréstimos diz: “o governo só deveria tomar empréstimo em moeda se fosse desejável que o público devesse ter menos moeda

agregada, porém, não há necessariamente uma relação de causalidade entre a taxa de juros e o investimento agregado. Por isso, serão consideradas apenas estas duas possibilidades.

5 É neste medo de solvência do governo que se fundamentam os dogmas de que a dívida pública não pode

ultrapassar determinado patamar do produto interno bruto. Adiante será visto que não existe razão para se acreditar nisto.

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e mais títulos governamentais7”. Isto é, governo, que só realiza seus gastos através de papel moeda, utilizará o seu poder de cobrador de impostos e operações no mercado aberto para recolher a quantidade de moeda que estiver em “excesso”, ajustando o port-folio da riqueza privada. Então, para entender a função do governo na economia é preciso entender que a única forma que ele tem de realizar suas despesas é através do papel moeda, a qual ele é o único produtor, e que só depois da emissão desta moeda é que poderá tributar ou vender títulos.

A percepção deste fato requer uma compreensão do conceito da moeda emitida por quase todos os Estados Modernos8. A moeda emitida pelo Estado é uma dívida que o governo possui com os receptores desta moeda, entretanto, diferentemente de outros tipos de obrigação, como os títulos públicos que tem conversão na moeda estatal, ela não tem nenhum parâmetro de conversibilidade, ou seja, não tem nada que balize o seu valor de face, nem mesmo o custo de sua produção. Contudo, ela é aceita por todos os agentes para qualquer tipo de transação9. Wray argumenta que esta aceitação vem da obrigação que o Estado impõe aos cidadãos de que o tributo cobrado por ele terá que ser pago com a moeda emitida pelo governo, caso este pagamento não seja feito os agentes sofrerão penalizações legais. Então, com medo destas penalidades, os agentes se esforçam para pagar a obrigação imposta pelo governo e, desta forma, demandam moeda estatal ofertando em troca bens e serviços. Wray afirma que “o governo cria demanda por dinheiro impondo obrigações tributárias” e “como em todas as economias modernas, o governo (...) detém (...) o monopólio da oferta de moeda, a qual é fornecida quando ele compra bens, serviços e ativos públicos”. Pode-se dizer que, para Wray, não é o governo que precisa de moedas para pagar suas despesas, mas sim o público que necessita desta moeda para realizar suas obrigações com o governo10.

Outros fatos a serem destacados são que: a única forma de se pagar os tributos e outros tipos de obrigações ao governo é com papel moeda; legalmente, todas

7 Idem.

8 Seguiremos aqui a mesma argumentação desenvolvida por Wray (2003) capítulo 4. 9 Quando a economia está em processo normal de funcionamento.

10 Para entender melhor a idéia sobre a aceitação da moeda desenvolvida por Wray, ver Wray (2003)

capítulos 2 e 3. Existem outras teorias da aceitabilidade dos agentes da moeda emitida pelo governo, como a de que os agentes a aceitam devido à credibilidade que estes têm para com aquele (quando esta credibilidade é desfeita os agentes tentarão reter o mínimo de moeda possível) e ainda que a moeda é aceita devido a obrigação legal imposta por lei (como o governo tem o poder de polícia, os agentes

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as moedas bancárias são convertidas de imediato em moeda estatal e que a compensação entre os bancos e entre os bancos e o Banco Central só pode ser realizada com esta moeda; e que, também legalmente, toda a produção interna é aceita em troca da moeda produzida pelo governo. Sendo assim, se o governo resolve realizar um gasto, ele emitirá uma ordem de pagamento em favor do fornecedor do bem ou serviço que ele está demandando – ele pode emitir esta ordem de pagamento também para diminuir alguma obrigação que ele tenha, como, por exemplo, pagamento de aposentadoria –, gerando um aumento em seu passivo, devido à obrigação da ordem de pagamento, e um aumento, no mesmo valor, em seu ativo, referente aos bens e serviços adquiridos – ou uma redução de seu ativo quando for o caso de pagamento de alguma obrigação.

O fornecedor terá duas possibilidades de resgatar a ordem de pagamento, ou ele dirige-se à boca do caixa, na qual o governo mantém a conta, e retira a quantia em moeda estatal ou a deposita em uma conta bancária. Caso ele opte pela primeira, o banco fornecerá a quantidade de moeda estatal devida, trocando uma obrigação (a ordem de pagamento que é conversível em papel moeda) por outra obrigação (moeda, que não é conversível em nada). O banco, por sua vez, diminui a quantidade de reservas que ele possui aumentando a quantidade de papel moeda em circulação em poder do público, isto ocorre independente do governo ter arrecadado ou não alguma quantidade de papel moeda. Por outra via, se o fornecedor decidir depositar a ordem de pagamento em sua conta corrente haverá um aumento da quantidade de moeda bancária (depósito, que tem conversibilidade imediata em moeda estatal) e não moeda emitida pelo governo, todavia, haverá, em contrapartida, um aumento nas obrigações do banco. O banco, por sua vez, envia a ordem de pagamento para a compensação (caso não seja o mesmo banco de origem da ordem de pagamento) que realizará um processo de transferência de moedas estatais (lembrando que a compensação entre os bancos e entre os bancos e o Banco Central, por lei, só pode ser realizada através da moeda emitida pelo governo), debitando das reservas do banco de origem e creditando as reservas do banco que recebeu o depósito. Sendo assim, percebe-se também neste processo que a realização das despesas do governo foram feitas com papel moeda, que foi compensado, neste caso, pelo aumento das reservas do banco que recebeu o depósito. Entretanto, cabe

aceitariam a moeda com medo de serem punidos). O objetivo aqui não é discutir a aceitabilidade da moeda, mas sim que os agentes demandam esta moeda.

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destacar que a qualquer momento o fornecedor poderá trocar a moeda bancária pela moeda estatal.

O pagamento de tributos não configura o financiamento das despesas do governo. Quando se cumpre a obrigação tributária exigida pelo governo, se está na verdade aumentando as reservas em papel moeda, mesmo que o pagamento seja feito através de cheque bancário, visto que, ocorrerá um débito na conta do contribuinte diminuindo o seu ativo e um crédito no ativo da conta do governo. Como o governo só recebe tributos na forma de papel moeda, o banco detentor da conta corrente do contribuinte terá que diminuir suas reservas para repassar moeda estatal ao governo. Mesmo no caso, como ocorre na maioria dos países, em que haja uma conta bancária do Tesouro, haverá, após o recebimento do tributo, um aumento nas reservas do governo, reduzindo o papel moeda em poder do público.

Desta forma, se o governo, ao realizar um gasto, solicita uma transferência dos tributos para “cobrir” estes gastos, na verdade ele estará apenas reajustando as reservas bancárias. No caso do Brasil, onde o governo mantém uma conta no Banco do Brasil, no momento que a ordem de pagamento for debitada haverá uma redução nas reservas do banco, logo, aumento do papel moeda em poder do público (considerando um saque direto na boca do caixa), isto é, a obrigação da ordem de pagamento, que o governo emitiu para realizar algum dispêndio, foi trocada por outra obrigação do governo, o papel moeda.

Percebe-se, com isso, que a realização de um dispêndio do governo implicará necessariamente em aumento do papel moeda em poder do público (mesmo que depois haja um remanejamento de reservas fazendo com que o papel moeda em poder do público retorne ao tamanho original). Destarte, sabendo-se que o pagamento das obrigações do público com governo só pode ser feito através do papel moeda e que este papel moeda é emitido exclusivamente pelo Estado, podemos concluir que os tributos (e qualquer outra obrigação dos agentes com o Estado) só podem ser pagos após a emissão da moeda fabricada pelo governo. Levando-se em conta, agora, que, como sugeriu Keynes, o público retém papel moeda pelo motivo especulação e/ou precaução, o governo pode gastar mais do que arrecada em tributos, deixando um saldo líquido com o setor privado para tais fins. Essa prática seria, por assim dizer, complementar,

(19)

pelo lado monetário, ao objetivo de manter a economia o mais perto possível do pleno emprego, como sugerido por Lerner. A existência do multiplicador bancário e o relaxamento da hipótese de manutenção de uma velocidade de circulação constante, podem implicar numa situação de satisfação da demanda privada por moeda sem que haja necessidade de aumento da emissão de moeda estatal.

Apesar da sua contribuição fundamental no campo do entendimento do impacto das finanças públicas sobre o nível de produto de longo prazo Lerner, e por extensão em boa medida Wray, não abandonam a hipótese de moeda exógena, argumentando que governo determinaria uma quantidade de reservas capaz de satisfazer uma taxa de juros desejável para sociedade. Então, se, por exemplo, após realizar seus gastos (seja compra de bens ou serviços, seja através de transferências aos outros setores) e os tributos forem pagos, o governo perceber que as reservas estão no nível que mantenha a taxa de juros desejada por ele, não haverá necessidade de emitir títulos nem resgatá-los, entretanto, se as reservas estiverem acima das reservas desejada pelo governo, haverá necessidade da venda de títulos públicos buscando reduzir a quantidade de moeda estatal disponível, por outro lado, se as reservas forem menores que as reservas desejadas para manter a taxa de juros, o governo compraria os títulos públicos emitidos anteriormente injetando moeda estatal na economia11. Na abordagem da moeda endógena as reservas são uma variável resíduo que resulta da fixação exógena de uma taxa de juros pela autoridade monetária.

Para finalizar este tópico, é preciso dar destaque ao fato de que, com a teoria das Finanças Funcionais, o “mito” de que o governo não poderá incorrer em dívidas maiores do que uma dada relação dívida/produto cai por terra12. Como dito, a única forma do governo se financiar é através do papel moeda, que, por sua vez, é uma obrigação (dívida) do governo, que não tem conversibilidade. Ao vender títulos

11 A operação de enxugar e injetar moeda na economia pode ser feita também através da compra e venda

de outros ativos, como, por exemplo, uma moeda estrangeira ou algum metal precioso.

12 Considerando a dívida denominada e conversível em moeda emitida pelo governo. Se esta dívida

estiver denominada em moeda estrangeira o governo terá que realizar esforços para obter esta moeda e fazer o pagamento. Normalmente um governo se endivida em moeda estrangeira se esta dívida for para comprar algum bem ou serviço (ou alguma obrigação anteriormente adquirida em moeda estrangeira) que não seja pago com a moeda que ele emite, ou seja, bens e serviços importados. Existem casos onde a política de endividamento externo público seguia outra lógica como o Brasil no final dos anos 70 início dos 80 quando o governo se endividava em dólar para fechar o balanço de pagamentos. A Argentina durante a vigência de seu currency board se endividava para fins de ajuste monetário interno (ajuste na base monetária).

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públicos no mercado o Estado estará recolhendo moeda anteriormente emitida, cuja finalidade já havia sido efetivada. Como o título é uma obrigação do governo com conversibilidade no papel moeda, ao realizar a operação da venda de títulos estará ocorrendo apenas uma troca de obrigação que não rende nada, moeda, por outra que rende juros, o título. Sabendo que os agentes que demandam os títulos têm moeda em excesso, pois consumiram menos que sua renda, o governo estará oferecendo a estes agentes as opções de poupar moeda – que não rende juros – e/ou títulos – que rendem juros. Sendo assim, os agentes privados estarão trocando um ativo que não rende juros por um ativo que rende juros, por outro lado, o governo estará trocando uma obrigação que não lhe tinha custos por uma obrigação que lhe impõe custos (os juros).

Considerando que a moeda trocada por títulos fique como reservas do Tesouro no Banco Central, então, quando os agentes privados vierem, no futuro, resgatar estes títulos estarão fazendo o processo inverso, isto é, substituindo obrigações governamentais que rendem juros (títulos) por obrigações governamentais que não rendem juros (moeda). Com esta lógica, torna-se sem sentido a argumentação de que a dívida não pode atingir determinados patamares do produto, pois ocorreria problema de solvência por parte do governo, visto que, a aceitação da dívida foi efetivada no momento que o governo realizou seus gastos. Estando numa economia funcionando normalmente, o retorno do papel moeda aos agentes privados poderá ser utilizado para consumir qualquer tipo de bem ou serviço produzido dentro do país, independente da relação dívida/produto13.

Relembrando ainda que, como o produto e a renda estarão crescendo (caso a economia venha de uma recessão), a necessidade de dispêndio governamental estará diminuindo e a quantidade de tributos arrecadados aumentando, pois ambos são função da renda. Logo, um indicador de medida da política fiscal estimado ao nível efetivo será pouco eficiente, pois o déficit público é endógeno14. Desta forma, medir esta solvência através de uma medida ao nível efetivo prejudica ainda mais esta argumentação.

13 O pagamento do montante de juros da dívida será considerado como um gasto qualquer realizado pelo

governo, logo é financiado com papel moeda emitido pelo próprio governo.

14 O déficit utilizado pela teoria que propõe as finanças saudáveis, pelo menos o recomendado pelo Fundo

Monetário Internacional, é um déficit calculado ao nível efetivo, o que prejudica uma análise da política fiscal. Este tipo de mensuração das contas do governo será visto com mais detalhes no capítulo seguinte.

(21)

Um indicador mais adequado para o governo balizar e realizar suas ações será o que lhe indique as arrecadações e despesas caso economia estivesse ao nível potencial, o chamado déficit de alto emprego. Contudo, o déficit de alto emprego tem que ser compatível com as contas externas, pois quando um país realiza transações com outros países ele dependerá de uma moeda (dólar) que não é fabricada por ele fazendo com que este país incorra em esforços para obtê-las. Com isso, o déficit de alto emprego “deve ser suficientemente grande para compensar a soma do déficit externo em conta corrente, percebido como sustentável ou desejável, com o superávit do setor privado ... quando a economia opera à plena capacidade15”. O próximo tópico será justamente demonstrar a importância do déficit de alto emprego para a política fiscal do governo e algumas de suas limitações.

1.3 – A Importância do Déficit de Alto Emprego

Apresentaremos agora o comportamento dos agregados macroeconômicos que justificam e esclarecem a adoção das Finanças Funcionais, princípio pelo qual o governo não deveria ter nenhum compromisso com o equilíbrio fiscal corrente. Ao contrário, este deve ajustar seus gastos e tributos para manter a economia em um nível alto de emprego.

Na contabilidade anual do produto a oferta agregada se iguala a demanda agrega mais variação dos estoques. A oferta agregada é realizada pelos produtores de bens e serviços domiciliados no país e produtores de bens e serviços domiciliados fora do país, como neste primeiro momento estamos considerando a economia fechada, só nos interessa a oferta de produtores domiciliados no país. Sendo assim, tem-se:

OA = Y e DA = C + I + Gc + GI onde, OA = oferta agregada,

DA = demanda agregada, Y = produto interno, C = consumo, I = investimento,

Gc = gasto do governo em bens de consumo e

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Gt = gasto do governo em investimento. Em equilíbrio,

Y = C + I + Gc + GI (1) Sabe-se, também da contabilidade social, que a renda gerada na produção será: ou consumida (C), ou poupada (S), ou utilizada para pagar tributos – ou uma combinação dos três – e Ainda é necessário considerar as transferências feitas pelo governo, inclusive pagamento de juros, que fazem com que a renda aumente. Os tributos menos essas transferências estão representados pela letra T. Então, pelo lado da renda agregada tem-se que:

Y = C + S + T

Igualando as duas identidades e arrumando os termos.

S – I = Gc + GI – T (2) O lado esquerdo da equação representa o superávit do setor privado e o lado direito representa o déficit do setor público. Levando em conta que tanto a poupança privada como os tributos arrecadados pelo governo e as transferências realizadas por ele são funções da renda gerada no país, pode-se considerar as variáveis S e T da equação acima como sendo dependentes de Y.

S = sY e T = tY

onde, s é a propensão marginal a poupar do setor privado e t é a taxa marginal a tributar. Desta forma, a equação (2) fica:

(sY – I) = (Gc + GI – tY) (3) Percebe-se através da equação (3) que se a parte da renda que não foi consumida e nem utilizada para pagar tributos, sY, for maior que o investimento privado, isto significará que os gastos do governo são maiores que total tributado. Por outro lado, se poupança privada, sY, for menor que o investimento privado isto significará que o governo arrecadou mais do que gastou. A renda gerada neste processo não será, necessariamente, a renda de plena capacidade e sim uma renda nominal qualquer que poderá estar tanto acima quanto abaixo do nível de alto emprego. Para saber como estas variáveis deveriam se comportar para que a economia estivesse funcionando a este nível é preciso considerar a renda na equação como sendo a renda de

(23)

alto emprego. Desta forma, considerando Y* como sendo a renda ao nível de alto emprego, pode-se apresentar a equação (3) da seguinte forma:

(sY* – I) = (Gc + GI – tY*) (4) O lado direito desta equação é o déficit do setor público registrado ao nível de alto emprego, o qual o governo terá que incorrer para balizar as ações propostas pelas Finanças Funcionais. Já o lado esquerdo da equação é o superávit do setor privado ao nível de alto emprego. Desta forma, pensando sempre com a proposta de manter a economia o mais perto possível do alto emprego, se a renda efetiva for igual à renda de alto emprego (Y = Y*) o déficit de alto emprego do setor público terá que ser igual a zero, pois neste caso o superávit do setor privado também será zero e caso o governo estiver, a este nível, gastando mais do que arrecada, a demanda agregada estará pressionando o aumento na produção de bens, mas, como a economia já se encontra à plena capacidade, a resposta a esta pressão da demanda será dada com aumento no nível de preços. Numa situação geral, para Lerner o gasto deficitário governamental é uma necessidade permanente no processo de determinação do produto uma vez que, dada o seu pessimismo quanto ao comportamento do investimento, este normalmente registra um valor abaixo do necessário para manter a economia perto do alto emprego. Logo, se o governo estiver gastando menos que o total de tributos e transferências ao nível de alto emprego, o governo estará pressionando a demanda para baixo e assim pelo princípio do acelerador diminuindo a capacidade produtiva, ou crescimento do produto potencial, no longo.

Se, por exemplo, a renda efetiva estiver abaixo da renda de plena capacidade (Y* > Y), isto implicará em poupança efetiva menor que poupança de alto emprego, isto é, sY < sY*16. Com isso, se o déficit de alto emprego do governo for igual a zero a economia estará incorrendo em problema de ociosidade. Então, quando a renda efetiva estiver menor que a renda de plena capacidade o déficit de alto emprego terá que ser tal que consiga absorver o excesso de poupança privada de alto emprego sobre o investimento privado, logo, déficit de alto emprego será maior que zero. Por outro lado, se a renda efetiva for maior que a renda de plena capacidade (Y > Y*), isto implicará em poupança privada efetiva maior que a poupança privada de alto emprego

(24)

[sY>sY*]17. Sendo assim, se o déficit público de alto emprego for igual a zero ele estará pressionando a demanda e, por conseqüência, o nível de preços (pois, os produtores estarão utilizando toda a capacidade instalada). Assim, quando a renda efetiva for maior que a renda de plena capacidade em função de um aumento do investimento privado, o governo terá que realizar ações de forma que o déficit de alto emprego seja capaz de garantir que a poupança privada mais poupança do governo iguale o investimento privado sem pressionar a demanda acima da oferta potencial e, em conseqüência, o nível de preços. Nesse caso o déficit de alto emprego terá que ser menor do que zero.

Considerando agora o setor externo, a oferta agregada será realizada pelos produtores de bens e serviços domiciliados no país e produtores de bens e serviços domiciliados fora do país, enquanto que a demanda agregada vista na equação terá mais um componente, as exportações (X). Então, considerando M como a quantidade de bens e serviços importados do resto do mundo, tem-se que:

OA = Y + M e DA = C + I + Gc + GI + X Em equilíbrio

Y + M = C + I + Gc + GI + X ou Y = C + I + Gc + GI + (X – M) (5)

A renda gerada pela produção demonstrada na equação acima é uma renda gerada dentro dos limites territoriais do país e podem ser utilizadas ou para ser consumida (C), ou para ser poupada (S), ou para pagar tributos, ou pode ser enviada para o exterior, porém está renda pode ainda ser acrescida das transferências realizadas pelo governo e da renda recebida do exterior (renda que não foi gerada na produção interna). Considerando, da mesma forma quando economia estava fechada, a soma dos tributos menos as transferências do governo como sendo simbolizada pela letra T e considerando ainda que a diferença entre a renda enviada ao exterior e a renda recebida do exterior é a renda líquida enviada ao exterior (RLEE), pode-se expressar pelo lado da renda a seguinte equação:

Y = C + S + T + RLEE (6) Igualando as duas equações (5 e 6) e arrumando os termos, tem-se que:

16 Como a poupança é determinada pelo investimento, isto significará que o investimento que gerou esta

(25)

(S – I) + (M + RLEE – X) = (Gc + GI – T) (7) Lembrando que a poupança e os tributos e transferências do governo são funções da renda interna e assumindo que a quantidade de bens importados também é, temos que:

S = sY . T = tY e M = mY

onde m é a propensão marginal a importar. Substituindo na equação (7), esta fica: (sY – I) + (mY + RLEE – X) = (Gc + GI – tY) (8)

O primeiro componente entre parênteses do lado esquerdo da equação (8) é o superávit (ou déficit) privado e o segundo componente é o déficit externo em conta corrente, já no lado direito da equação está o déficit público.

Para uma economia fechada é fácil perceber a importância de balizar as ações do governo sobre o déficit de alto emprego. Porém, com a inclusão do setor externo esta análise se torna um pouco mais complexa, pois quando se leva em conta uma economia aberta é preciso, com o déficit de alto emprego, levar em conta para executar políticas de “pleno emprego”, além do superávit privado, o déficit externo em conta corrente. Não nos ateremos em analisar caso por caso, mas o importante é destacar que o governo estará agindo de forma a garantir que a soma entre o superávit privado e o déficit externo esteja em conformidade com um déficit de alto emprego do setor público que garanta uma economia funcionando o mais perto possível da plena capacidade18. Todavia, o governo, ao incluir o setor externo, terá que dar atenção não somente a necessidade de se manter a economia o mais perto da plena capacidade e/ou evitar um processo inflacionário como é proposto nas finanças funcionais. Caso um determinado país esteja crescendo incorrendo em déficit externo o seu governo terá que se preocupar com a viabilidade deste crescimento associado ao déficit em conta corrente. Desta forma, ele não estará agindo apenas com o intuito de manter a economia perto da plena capacidade. Agora sua ação terá que levar em consideração a restrição externa, ou seja, o montante de déficit em transações correntes passível de

17 Conforme nota anterior, investimento maior que investimento de pleno emprego.

18 Medida esta levando em consideração uma dada capacidade ociosa planejada. Se o objetivo de política

econômica é um baixo desemprego, ou uma política de “pleno emprego”, é preciso garantir que essa plena ocupação da capacidade produtiva se faça em torno de um produto potencial que cresce a taxas capazes de gerar uma demanda por trabalho elevada.

(26)

financiamento externo, ou em termos dinâmicos, a trajetória de crescimento da economia com déficit em conta corrente sustentável.

Esta sustentabilidade é dada, segundo Medeiros e Serrano (2001), pela proporção do déficit em conta corrente que é financiada por exportação e a proporção deste déficit que é financiada por passivos externos. O problema de sustentabilidade não depende da forma pela qual o passivo externo entra no país (investimento direto, capitais de curto prazo e capitais de longo prazo)19 e sim de sua proporção no financiamento do déficit. “À medida que aumenta a massa de capital externo, crescem também seus serviços financeiros, que vão demandando proporção crescente de recursos provenientes das exportações, e quanto mais cresce a proporção destes serviços, tanto menos haverá margem para a importação de bens de capital com estes recursos20”. Então se o déficit em conta corrente está sendo financiado por exportação isto não nos trará problemas futuros de diminuição da capacidade de importar, em contra partida, se o déficit está sendo financiado por passivos externo isto fará aumentar os serviços da dívida implicando em queda na capacidade de importar fazendo com que, caso se mantenha esta atitude, interrompa-se o processo de crescimento e a busca do pleno emprego proposta pelas finanças funcionais. Um indicador para se verificar se o crescimento com déficit em conta corrente é sustentável proposto por Medeiros e Serrano é a evolução da razão déficit em conta corrente/exportação21.

O problema da sustentabilidade de se crescer incorrendo em déficit em conta corrente não desqualifica o conceito de déficit de alto emprego como a medida mais recomendada para se analisar uma política fiscal, apenas, nesse caso há que se levar em consideração a restrição externa. Ou seja, como dito acima e com o intuito de reforçar esse ponto, o déficit público tem que ser “...suficientemente grande para compensar a soma do déficit externo em conta corrente, percebido como sustentável ou desejável, com o superávit do setor privado quando a economia opera à plena capacidade”. No tópico seguinte, será feita uma breve apresentação das principais

19 A grandeza do passivo externo nos dá condições para analisar problemas de solvência externa e de crise

cambial, mas não o problema de sustentabilidade de crescimento incorrendo em déficits externos. Para ver esta diferença e um indicador de fragilidade financeira externa de um país ver Medeiros e Serrano (2001).

20 Prebich, citado em Medeiros e Serrano (2001)

21 Para mais informações a respeito da sustentabilidade do crescimento com déficit externo ver Medeiros

(27)

medidas de déficit público estimadas para o Brasil e também uma introdução ao déficit de alto emprego.

1.4 – Medidas de Déficit Público

A mensuração do déficit público parte da idéia de que o Estado possui uma restrição orçamentária, isto é, as despesas e receitas públicas agregadas, caso estejam em déficit, têm como contrapartida uma elevação da riqueza líquida privada (no país e/ou no exterior no caso de uma economia aberta), ocorrendo o inverso para o caso de superávit. Partindo dessa identidade deriva-se o conceito das NFSP. Entretanto, alguns autores como Tanzi (1999) e Ize (1999), numa coletânea de textos editada pelo próprio FMI levantam algumas críticas a este conceito. Tanzi22 destaca três limitações: uma seria a não identificação de diferentes impactos provocados por diferentes categorias de despesas e receitas sobre a demanda agregada; a outra seria a característica endógena de algumas receitas e despesas e a última seria o impacto das diferentes fontes de financiamento do déficit.

Na primeira limitação levantada por Tanzi, as variações nas receitas teriam impactos sobre a demanda agregada diferentes dos impactos provocados por variações nas despesas (em sentido contrário) na mesma proporção, isto porque, enquanto as despesas afetam diretamente a demanda agregada, mudanças nas receitas afetarão primeiro a renda do contribuinte para depois afetar a demanda, logo, este processo dependerá da propensão marginal a poupar destes contribuintes23. A segunda limitação está fundamentada na dupla causalidade entre mudanças em variáveis macroeconômicas e variação nas contas do governo. Da mesma forma, que ações discricionárias do governo afetam a demanda agregada e, por conseqüência, a renda, mudanças na renda também provocam variações em algumas receitas e em algumas despesas. Um exemplo desta dupla causalidade pelo lado da receita é o imposto de renda – se a renda está aumentando (diminuindo) o total arrecadado com tributo estará aumentando (diminuindo) – e pelo lado das despesas é o seguro desemprego – se a renda está caindo

22 Tanzi (1999, p. 16 e 17).

23 Algumas tentativas de mensurar tais impactos foram realizadas, contudo, segundo Tanzi, estes

resultados não conseguiram “chegar a um consenso sobre a atribuição de pesos específicos e objetivos” dos impactos dos vários tipos de receitas e despesas na demanda agregada. Para verificar referências a respeito do assunto ver Tanzi (1999, p. 16).

(28)

(subindo) a quantidade de desempregados na economia estará subindo (caindo) e, por conseguinte, as despesas com seguro desemprego estarão subindo (caindo). Para este tipo de limitação, várias metodologias foram criadas com o intuito de resolve-la, neste capítulo e no seguinte será dada uma atenção especial a algumas destas metodologias. A terceira limitação é, para Tanzi, o fato de que as fontes de “financiamentos” terão impactos diferentes sobre a demanda agregada, porém, como visto no tópico anterior e seguindo a teoria desenvolvida nas finanças funcionais, a única forma de o governo financiar seus gastos é através da emissão de moeda, depois, conciliando políticas monetária e fiscal, é que se buscará, conforme a necessidade da economia, reduzir ou aumentar a quantidade destas moedas em circulação, pouco influenciando o comportamento de quem for trocar moeda por título24.

Alain Ize (1999) coloca praticamente as mesmas limitações para o déficit convencional, apenas acrescentando que este indicador não informa a possibilidade de inadimplência da dívida pública interna, e aqui, esta dificuldade também pode ser deixada de lado se for seguida a idéia das finanças funcionais, visto que a preocupação principal da teoria está no fluxo das contas do governo e não no estoque (que se representa em dívida) – destacando que esta despreocupação com estoque da dívida se dá apenas para a dívida interna.

Esse tipo de argumentação segue a mesma linha das críticas levantadas por Blanchard (1990) citadas na introdução, na qual não se deve exigir de apenas um indicador do déficit que “responda” ao grande número de perguntas que o impacto do déficit na economia suscita.

A seguir será apresentada de forma breve a metodologia de medida fiscal do governo partindo da restrição orçamentária do governo, começando com a NFSP nominal, que é depois corrigida para resultar nos déficits real e operacional. Por fim, será destacada a existência de metodologias que tentam eliminar o caráter endógeno das contas do governo, o chamado déficit de alto emprego ou o déficit ciclicamente ajustado.

24 O comportamento destes agentes ao demandar títulos e/ou moedas dependerá da taxa de juros – como

dito no tópico anterior, é dada exogenamente. Esta é utilizada justamente para compartilhar a necessidade de se manter uma determinada quantidade de moeda em circulação e o objetivo da economia ficar o mais perto possível do alto emprego.

(29)

1.4.1– Déficit Convencional Nominal

A restrição orçamentária do governo é o ponto de partida para se obter a metodologia de cálculo das medidas fiscais recomendadas pelo FMI. Para facilitar o desenvolvimento será assumido, como pressupõe a teoria, que a ação do governo está limitada à restrição orçamentária (lembrando que a restrição orçamentária do governo é uma identidade) e que existem três formas do governo estar cobrindo seus gastos: tributando os outros agentes, endividando-se25 e emitindo moeda. A forma “direta” do governo se financiar é através do tributo, caso este não seja suficiente para cobrir todos os gastos, o governo se endividará e/ou a emitirá moeda. Dessa maneira, partindo da suposição de uma economia fechada e que o governo possui dívida de períodos anteriores ao atual, a restrição orçamentária do governo no período atual é dada como segue:

(

1

) (

1

)

1 − − − = − + − + − t t t t t t t R iDI M M DI DI G (9)

onde, Gt = Total de gastos realizados pelo governo no período t, tanto em bens de consumo como em investimentos e também transferências (exceto pagamento de juros).

Rt = Total de receitas obtida pelo governo no período t através da tributação. i = Taxa de juro nominal interna.

DI = Dívida interna.

iDIt – 1 = Montante de juros pagos referente à dívida interna no período t – 1. M = Moeda emitida.

(Mt – Mt – 1) = Variação da base monetária entre os períodos t e t – 1. (DIt – DIt – 1) = Variação da dívida interna entre os períodos t e t – 1.

O lado esquerdo da equação (9) é a medida fiscal do governo freqüentemente chamada “acima da linha”. Nesta, as contas do governo são estimadas através de todos os itens desagregados, isto é, todas as receitas e despesas, item por item. Já o resultado das contas do governo obtido pelo lado direito da equação é chamado “abaixo da linha” e é estimado através da variação da dívida do governo,

25 Como é só uma exposição teórica só levaremos em conta a possibilidade de dívida interna, esta

(30)

incluindo variações na base monetária26. Esses resultados são obtidos com seus valores nominais e efetivos e por isso são chamados de déficit nominal corrente. No Brasil, a apuração dos dados do déficit nominal é feita pelo Banco Central que os divulga, com o nome de Necessidade de Financiamento do Setor Público (NFSP)27, para todo o setor público não-financeiro e estimado pelo conceito “abaixo da linha”. O resultado “acima da linha” só é divulgado em nível de governo federal e das empresas estatais, não apresentando resultados para os estados e municípios.

O déficit nominal tem por objetivo demonstrar o comportamento da dívida do setor público com os outros agentes privados e da base monetária. Na teoria das finanças saudáveis esta medida é imprescindível, uma vez que para esta teoria, a principal causa da inflação é a emissão de moeda e este instrumento fornece tal informação. Além do mais, com o déficit nominal, consegue-se acompanhar o comportamento da dívida pública, verificando se o governo estaria aumentando ou diminuindo sua “dependência” com outros setores e se esta “dependência” é “sustentável” em determinado prazo de tempo. Entretanto, esta forma de medida sofre, como visto, dois problemas de causalidade. Um é o problema da renda, o déficit público afeta, necessariamente, o comportamento da renda, mas variações na renda também afetam o comportamento do déficit – a tentativa de resolver este problema será visto mais adiante. O outro, é o fato de que, apesar da teoria marginalista alegar que o déficit geraria inflação, variações nos preços também fazem com que haja mudanças no déficit nominal28. Será vista, a seguir, a saída utilizada para se tentar eliminar do déficit nominal o efeito da inflação, para isto serão apresentados os chamados déficits real e operacional.

26 Será visto no capítulo 4 a dificuldade de se compatibilizar essas duas formas de medir o déficit público. 27Tradução para o Português de public sector borrowing requirement.

28 Todavia, é bom ressaltar que qualquer variação no preço afeta a mensuração do déficit independente do

(31)

1.4.2 – Déficit Real e Déficit Operacional

A variação nos preços afeta as contas do governo, os déficits operacional e real têm como objetivo justamente excluir este efeito do cálculo das contas públicas. O operacional tenta “retirar da despesa o componente inflacionário dos juros nominais da dívida pública29”, pois o montante de juros pagos por dívidas acumuladas em períodos anteriores é uma das variáveis que capta o efeito de variações no nível de preços. Já o déficit real tenta estimar a variação da dívida do governo em termos reais para todos os componentes desta dívida, ele é mais eficiente – em termos de eliminar o efeito da inflação – do que o déficit operacional. Para se chegar a ambos os déficits, seguem-se os mesmos caminhos, por isso, serão apresentados os passos seguidos para se obter déficit real e no decorrer deste processo será apresentado o déficit operacional. O déficit real ou, como chamou Ramalho(1997), déficit ajustado da inflação será obtido calculando-se o aumento real da dívida do governo, isto é, o aumento em termos reais da dívida que o governo possui de um período para outro. Então, levando em conta o lado direito da equação (9) o déficit real (DR) será:

⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − + ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − = − − − − 1 1 1 1 t t t t t t t t P DI P DI P M P M Dr (10)

Entretanto, como colocou Bastos e Serrano (1989), para se calcular a variação em termos reais de componentes da dívida do governo – que é um estoque – com os outros agentes da economia é necessário que se inclua a variação total destes estoques ao nível do preço atual mais a perda de valor que o estoque inicial desta dívida sofreu devido a mudanças no preço. Vejamos como isto fica para cada um dos componentes em parênteses, primeiro a variação da base monetária. A expressão exposta na equação inclui toda a mudança provocada pela inflação – variação da quantidade de moedas ao nível do preço atual mais a perda de valor do estoque –, se for somado e diminuído do primeiro termo entre parênteses da equação (10) a razão entre a quantidade de moedas do período anterior (Mt–1) e o nível de preços do período atual (Pt), a variação total do estoque de moeda em termos reais não mudará, logo:

(32)

⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − + ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − = ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − − − − − − − 1 1 1 1 1 1 t t t t t t t t t t t t P M P M P M P M P M P M

Agora, multiplicando e dividindo o primeiro membro do segundo colchete do lado direito da equação acima por Pt – 1 e organizando os termos chega-se a expressão a seguir: ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − + ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − = ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − − − − − − − 1 1 1 1 1 1 1 t t t t t t t t t t t t P P P M P M P M P M P M

Como a inflação

( )

π é por definição

(

)

1 1 − − − t t t P P P , tem-se que

(

)

⎥⎦⎤ ⎢⎣ ⎡ + = ⎥⎦ ⎤ ⎢⎣ ⎡ − π 1 1 1 1 P

Pt , com isso chega-se finalmente a equação desejada

(

)

⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ + − ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − = ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − − − − − − 1 1 1 1 1 1 π π t t t t t t t t t t P M P M P M P M P M

(11) Onde o primeiro termo entre colchetes do lado direito da equação acima é a variação do estoque de moeda a preço do período atual e o segundo termo é a variação do estoque inicial provocada pela mudança no nível de preços, isto é, a perda de valor do estoque da quantidade de moeda. O mesmo processo pode ser feito para a variação da dívida interna, que ficará da seguinte forma:

(

)

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Todavia, a perda do valor real da dívida interna do governo em mãos de outros agentes é compensada com o pagamento de juros aos detentores destas obrigações, estes juros são dados pela taxa nominal que pode ser maior ou menor que a inflação do período, caso seja maior, os possuidores de títulos públicos estarão recebendo uma remuneração real positiva referente ao montante emprestado ao governo, por outro lado, se a taxa de juros nominal for menor que a inflação estes agentes não estarão obtendo tal remuneração. Na parte da dívida expressa em moeda o governo não estará remunerando este ativo com juros, por isso, toda a perda de valor referente ao efeito da inflação no estoque inicial de moeda deve ser considerada um pagamento de juros real negativo aos seus detentores, logo, um recebimento para o governo. Esta remuneração é conhecida como imposto inflacionário.

Referências

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