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Entre a imaginação e o processo de aprendizagem da leitura: o desafio de ler 100 livros no 2º ano do ensino fundamental

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Academic year: 2021

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Júlia Mendes Ferreira 2 Clésia Mendes Zapelini3

Resumo: O objeto de investigação tratou sobre a participação, o envolvimento e a interpretação das crianças no projeto de leitura “Livro de Ouro”, desenvolvido, no ano 2018, em uma turma de 2º ano do Ensino Fundamental, de uma escola da rede particular de Tubarão. Temos como hipótese que as crianças participaram e realizaram diferentes interpretações a partir do projeto, incentivando, assim, o gosto pela leitura. O objetivo geral incide em analisar a participação, o envolvimento e a interpretação das crianças, de 8 e 9 anos do 2º ano do Ensino Fundamental, no projeto de leitura “Livro de Ouro”. Os objetivos específicos versaram em analisar a narrativa das crianças a respeito da proposta da professora ao propor a leitura de 100 livros; identificar nos relatos a experiência em participar desse projeto, o que mais gostaram no campeonato da leitura, possíveis dificuldades e se havia lembranças dos textos lidos. Esses objetivos surgiram a partir do problema: Como aconteceu a participação, o envolvimento e a interpretação das crianças no projeto de leitura “Livro de Ouro”, desenvolvido em uma turma do Ensino Fundamental, da rede particular de ensino, da cidade de Tubarão – Santa Catarina? Na perspectiva da metodologia qualitativa, realizamos uma entrevista gravada por áudio celular, realizada em uma manhã, com uma turma de 3º ano de Ensino Fundamental que, em 2018, participou do projeto “Livro de Ouro”. Após as discussões dos dados, concluímos que as crianças se envolveram no projeto. Poucas encontraram dificuldade em realizá-lo, pois as dificuldades estavam associadas ao processo de alfabetização, por não conhecerem alguns fonemas. Embora a professora aceitasse a leitura de outros gêneros textuais, a literatura infantil foi o título mais registrado no livro de ouro.

Palavras-chave: Leitura. Projeto. Interpretação.

1 Introdução

A presente pesquisa aborda como tema o projeto de leitura “Livro de Ouro”, desenvolvido em uma turma de 2º ano, em 2018. A pesquisa tem como objetivo geral analisar a participação, o envolvimento e a interpretação das crianças no projeto de leitura “Livro de Ouro”, desenvolvido em uma turma do Ensino Fundamental, da rede particular de ensino, da

1Artigo apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito para a

conclusão da Unidade de Aprendizagem de Conclusão dos Processos Investigativos.

2Acadêmica do Curso de Pedagogia da Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL. E-mail:

julya_tb@hotmail.com.

3Graduada em Pedagogia - Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Especialista em Fundamentos

Epistemológicos da Educação - Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Mestre em Ciências da Linguagem - Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Doutora em Ciências da Linguagem - Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Coordenadora pedagógica do Colégio Dehon e professora do Curso de Pedagogia - Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL. E-mail: clesia.zapelini@unisul.br.

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cidade de Tubarão – Santa Catarina. Os objetivos específicos versaram em analisar a narrativa das crianças a respeito da proposta da professora ao propor a leitura de 100 livros; identificar nos relatos a experiência em participar desse projeto, o que mais gostaram no campeonato da leitura, possíveis dificuldades e se havia lembranças dos textos lidos. O problema é saber como aconteceu a participação, o envolvimento e a interpretação das crianças no projeto de leitura “Livro de Ouro”, desenvolvido em uma turma do Ensino Fundamental, da rede particular de ensino, da cidade de Tubarão – Santa Catarina?

Justificamos a escrita desta pesquisa a partir das vivências da pesquisadora com essas experiências de leitura. Desde criança, observávamos que a leitura é apresentada pela escola apenas como forma de trabalhar conteúdos e atividades voltadas para o processo de alfabetização. Nos estágios realizados no curso de Pedagogia, ainda, vimos isso acontecer. A leitura se transforma em obrigação e preenchimento de atividades escolares. Também, observávamos os professores oportunizarem a leitura como forma de castigo por não fazerem a tarefa, não copiarem a atividade, etc. Consideramos ser de extrema importância o professor trabalhar a leitura com as crianças desde a educação infantil, seja ela a leitura verbal ou não verbal, porém sem estarem associadas ao castigo ou, apenas, como atividades gramaticais.

Essa temática é muito relevante, uma vez que a leitura forma a criança em um sujeito leitor e crítico, pois é, por meio dela, que a criança ampliará a sua leitura de mundo e terá contato com diferentes gêneros textuais, diversas informações que perpassam o mundo. Desse modo, entendemos que a leitura está presente em nosso dia a dia, mesmo que não percebemos. Está no supermercado, em nossa casa, na escola, no transporte público, em vários outros lugares. Toda a forma de incentivo à leitura é válida, porque a criança, desde os primeiros anos de vida, familiariza-se com essa linguagem, podendo trazer para a sua vida pessoal e escolar, como um hábito prazeroso no qual, a mesma, pode conhecer diversos mundos e realidades diferentes.

Na escola, a prática da leitura torna-se fundamental para que possamos desenvolver, desde pequenos, o hábito da leitura. Assim, as práticas diversificadas podem ampliar o conhecimento das crianças e favorecer, a partir de um ambiente leitor, o gosto pela leitura e não como simples obrigação. Além disso, o ato de ler nos torna pessoas mais críticas para analisar os fatos e nos posicionarmos. Portanto, consideramos importante investigar o projeto de leitura, principalmente ouvir as crianças, para que possamos conhecer o que elas pensam a respeito e como podemos ampliar essa prática no cotidiano escolar.

Para entendermos melhor este artigo, optamos por estruturá-lo em quatro capítulos. No primeiro, faremos uma breve apresentação do trabalho. No segundo, tratamos

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dos aspectos metodológicos: o encontro com as crianças e a aproximação com os dados. No terceiro, apresentamos e analisamos os dados à luz do referencial teórico. E, por último, fazemos a conclusão com os dados da pesquisa.

2 Aspectos metodológicos: o encontro com as crianças e a aproximação com os dados

A presente pesquisa trata do Trabalho de Conclusão do Curso de Pedagogia da Unisul. O trabalho integra os estudos científicos realizados durante o curso e, neste momento, fecha mais uma etapa de cunho científico. Esta pesquisa defende a hipótese de que as crianças participaram e realizaram diferentes interpretações a partir do projeto, incentivando, assim, o gosto pela leitura. Neste trabalho, essa hipótese foi testada por meio de entrevista semiestruturada, com 11 crianças que estudam em 2019 no 3º ano do ensino fundamental e que, em 2018, participaram do projeto “Livro de Ouro”, quando estudavam no 2º ano. Das 25 crianças que estudam, atualmente, no 3º ano, 11 trouxeram a ficha que anotavam os textos lidos e manifestaram interesse em participar da pesquisa.

A pesquisa foi realizada através de três perguntas formuladas mediante o projeto “Livro de Ouro”. As perguntas realizadas foram: Quando a sua professora do segundo ano anunciou o projeto “Livro de Ouro” e que teriam que ler 100 livros, o que você achou? Para você, como foi a experiência de ler os 100 livros? O que você mais gostou do campeonato? Encontrou alguma dificuldade? Você gostou de participar do campeonato? Você consegue lembrar de algum livro que leu? Pode citar alguns?

Fomos até a sala do 3º ano do ensino fundamental e conversamos com toda a turma sobre o projeto. Logo após, dirigimo-nos a outra sala para que pudéssemos realizar a entrevista com cada criança em particular.

Foram chamados um por um e a entrevista foi realizada através de uma gravação por áudio de celular. Realizamos a pergunta e cada criança respondia de acordo com a sua experiência sobre o projeto. Ao finalizar a entrevista, a pesquisadora retornou à sala agradecendo a disponibilidade da turma e da professora em oportunizar que a pesquisa fosse desenvolvida.

A pesquisa se caracteriza como qualitativa por tratar-se de dados que necessitam de interpretações e deduções do pesquisador. Rauen (2015, p. 156) destaca que:

Retomando-se o grupo de pesquisas de abordagem qualitativa, cabe destacar que, embora se possa pensar na descrição, associação, interferência e intervenção de variáveis qualitativas, em geral as pesquisas qualitativas não se fundamentam a

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partir da lógica de causa e efeito, e, portanto, repelem a noção de hipótese, preferindo organizar a investigação em torno de questões de pesquisa.

Nesse contexto, Rauen (2015) continua mostrando que esse tipo de pesquisa não se traduz em números estatísticos, mas se considera o envolvimento entre os sujeitos e a realidade e, a partir da interpretação e da atribuição processual e indutivamente descrit iva de significados. Ainda, trazendo os estudos de Rauen (2015), a pesquisa qualitativa usa os contextos de uma situação natural como dados primários, lida com descrições detalhadas dos contextos de uma situação. Lida com amostras pequenas e únicas e considera o contexto dos eventos como parte integrante dos dados primários.

Optamos em entrevistar as 11 crianças do 3º ano, porque em 2018 esse grupo participava do projeto no 2º ano do ensino fundamental. Esse número não foi determinado pela pesquisadora, pois convidamos no grupo de crianças quem desejariam participar da pesquisa. Desse modo, acreditamos que pudéssemos observar melhor as questões norteadoras que sustentaram a pesquisa:

a) Como as crianças compreendem, interpretam e significam quando a professora menciona que eles farão a leitura de 100 livros?

b) Como as crianças relatam a experiência em participar desse projeto?

c) O que as crianças relatam referente ao que mais gostaram no campeonato da leitura?

d) Será que encontraram dificuldades na leitura, nos gêneros? e) Do que eles lembram/narram sobre os textos lidos?

Para responder a essas questões, optamos por realizar uma entrevista individualmente com cada criança, sendo registrada um áudio de celular. A entrevista foi realizada e concluída em uma manhã. Abaixo, apresentaremos um pouco do projeto “Livro de Ouro”.

2.1 Projeto Livro de Ouro

O projeto de leitura intitulado “Livro de Ouro” foi desenvolvido em um colégio da rede particular, na cidade de Tubarão, Santa Catarina. Em conversa com a professora do ano de 2018, que trabalhava com a turma entrevistada, o projeto teve início em 2008 e, desde então, teve algumas modificações, conforme as necessidades, mas o intuito do mesmo sempre foi o incentivo à leitura.

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Figura 1 - Crianças trabalhando sobre o projeto “Livro de Ouro”

Fonte: Acervo do Colégio, 2013.

Neste projeto, as crianças do 2º ano do ensino fundamental, deveriam ler 100 livros, independente do gênero textual. O projeto tinha como objetivo oferecer o contato da criança com o livro, incentivando o gosto pela leitura. O campeonato iniciou-se no segundo semestre do ano letivo e, ao final do ano, em novembro, as turmas comemoraram a medalha de ouro que receberam ao terminar de ler os 100 livros/textos. A comemoração foi realizada em um dia diferente, com um passeio entre as crianças e professores. No final do ano, também, comemoraram com a família em uma noite preparada para esse fim.

Na sala, ficou exposto um quadro na parede, onde havia a foto de cada criança e a cada 20 livros lidos ela ganhava uma medalha com cores diferentes. Ao término, recebia a medalha dourada. Caso alguma criança conseguisse atingir o objetivo de ler os 100 livros antes do término previsto, a mesma auxiliava outro colega que ainda não tinha terminado, chamando-o, assim, de leitor colaborador.

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Figura 2 - Folha de cada criança para colocar as suas medalhas

Fonte: Acervo do Colégio, 2018.

Figura 3 - Crianças lendo livros

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Figura 4 - Crianças anotando no “Livro de Ouro”

Fonte: Acervo do Colégio, 2018.

O Livro de Ouro contém a foto e o nome da criança e algumas instruções, vejamos as imagens abaixo:

Figura 5 - Capa do Livro de Ouro

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Figura 6 - Instruções

Fonte: Acervo do Colégio, 2018.

Figura 7 - Títulos dos livros lidos

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Figura 8 - Crianças no projeto Livro de Ouro

Fonte: Acervo do Colégio, 2018.

A criança recebeu uma folha com 20 linhas para que a cada livro lido pudesse anotar o título. E, assim, ao atingir os 20 livros, a professora sorteava um número para que a criança contasse aos seus colegas a história, caso não lembrasse, sorteava outro número.

O livro deveria permanecer sempre na mochila, a fim de que a criança anotasse os livros lidos tanto em casa, quanto na escola. Depois, a criança recebia outra folha de uma outra cor para completar mais 20 histórias, até que chegasse ao final do livro, atingindo a meta dos 100 livros e, com isso, ganhasse uma medalha do leitor de ouro.

Em 2018, em torno de 140 crianças participaram do campeonato. Ao término do projeto, a família foi chamada para comemorar com as crianças o desafio de ler 100 livros. Nessa noite, as crianças receberam a medalha de ouro e os aplausos da escola e da família.

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Figura 9 - Noite de comemorações do projeto “Livro de Ouro”

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3 Apresentação e análise dos dados à luz do referencial teórico

O referencial teórico será desenvolvido juntamente com os dados da pesquisa para que, assim, possamos mobilizar os conceitos necessários para tratar os dados.

Podemos pensar a leitura pelas discussões pelo viés da educação e pelos estudos da linguagem. Neste trabalho, vamos usar o referencial da educação com base em Paulo Freire (2008), Kleiman (2000), Cagliari (2004), Teberosky e Tolchinsky (2000), Naspolini (2010), Liberato (2007), Prado (2003), Coelho (2000), Góes (1991), Bakhtin (1992), Zilbermann e Lajolo (2002) e Abramovich (1997).

Nos estudos da linguagem temos: Orlandi (2008), Courtine (2009), Cazarin (2006), Pêcheux (1990) e Indursky (2001).

A prática da leitura, seja verbal ou não verbal, sempre está presente na vida das pessoas. No desejo de interpretar o sentido das coisas que os cercam, de perceber o mundo sob diversas perspectivas, de relacionar a ficção com a realidade em que vivem, no contato com um livro, enfim, em todos esses casos, estamos, de certa forma, lendo, embora, muitas vezes, o indivíduo não se dá conta disso. Freire (2008) menciona que “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente” (FREIRE, 2008, p. 11).

As situações didáticas, referentes aos processos de leitura na escola, devem possibilitar que as crianças desenvolvam o gosto de participar das atividades que envolvem a leitura e a interpretação de diferentes textos. Não podemos transformar o espaço escolar em um lugar que considere a leitura uma forma de decodificar os códigos, leituras consideradas chatas e sem sentido para as crianças. Elas precisam ser motivadas e incentivadas com diferentes metodologias. De acordo com os estudos de Freire (2008, p. 56), “Quando aprendemos a ler e a escrever, o importante é aprender também a pensar certo. [...] Devemos pensar sobre a nossa vida diária. [...] Aprender a ler e escrever não é decorar “bocados” de palavras para depois repeti-los”.

Nesse contexto, a criança que lê, sem o objetivo de decorar palavras ou para realizar atividades mecânicas, está assumindo uma posição de sujeito aprendiz, de leitor além das palavras, mas como atribui Paulo Freire, o leitor do mundo. Portanto, o perfil de leitor que a escola cria depende muito das condições de produção da leitura na escola. No caso do “Livro de Ouro” em que estamos tratando, parece-nos que a escola tenta criar oportunidades

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diferentes para que a criança goste de participar, pois, nessa idade, elas adoram desafios, assim, com a vontade e com ajuda da escola e da família, esse objetivo pode acontecer.

Freire (2008, p. 59) menciona que “um texto para ser lido é um texto para ser estudado. Um texto para ser estudado é um texto para ser interpretado. Não podemos interpretar um texto se o lemos sem atenção, sem curiosidade”. Essa citação pode ser relacionada com os estudos da linguagem, da Análise do Discurso (AD), quando Orlandi (2008) destaca que o sujeito não se apropria da linguagem num movimento individual. A forma dessa apropriação é social. Nela está refletindo o modo como o sujeito fez, ou seja, sua interpelação pela ideologia. O sujeito que produz linguagem, também, está reproduzindo nela, acreditando ser a fonte exclusiva de seu discurso quando, na realidade, retoma sentidos preexistentes. Para compreender melhor esse referencial teórico da AD, é importante pensarmos o que Orlandi (2008, p. 19) menciona:

Visando o conhecimento do processo de produção da linguagem, o quadro epistemológico da análise de discurso se apresenta como a articulação de três regiões do conhecimento científico: [...] O materialismo histórico, como teoria das formações sociais e suas transformações; [...] A linguística, como teoria dos mecanismos sintáticos e dos processos de enunciação; [...] A teoria do discurso, como teoria da determinação histórica dos processos semânticos.

Assim sendo, o discurso é visto como uma prática social, é o conteúdo estruturante que organiza e identifica o conjunto de saberes e conhecimentos desta disciplina, por meio das práticas discursivas da oralidade, leitura e escrita.

Segundo Orlandi (2008, p. 18),

[...] todo falante e todo ouvinte ocupa um lugar na sociedade, e isso faz parte da significação. Os mecanismos de qualquer formação social têm regras de projeção que estabelecem as relações entre as situações concretas e as representações (posições) dessas situações no interior do discurso: são as formações imaginárias. O lugar assim compreendido, enquanto espaço de representações sociais, é constitutivo de significações. Tecnicamente, é o que se chama relação de forças no discurso.

Ainda, conforme Orlandi (2008, p. 37), “a leitura é o momento de constituição do texto, o momento privilegiado do processo de interação verbal, uma vez que é nele que se desencadeia o processo de significação”. Deste modo, relacionando os estudos da educação e da AD, entendemos que não se pode trabalhar a leitura limitando-a a um reducionismo linguístico, apenas em atividades mecânicas e sem sentido e significado para a criança.

Nessa perspectiva teórica que apresentamos, optamos por trazer as narrativas das crianças nomeando cada fala da entrevista de sequência discursiva (SD). A discussão sobre

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SD pode ser referenciada a partir de Courtine (2009), quando destaca que SD é um conjunto de sequências discursivas orais ou escritas de dimensão superior à frase, extraído de um campo discursivo. As sequências discursivas são organizadas de acordo com um plano que lhes confere uma dada forma, uma forma de corpus. Courtine (2009) apresenta diferentes possibilidades de organização: uma sequência discursiva/várias sequências, sequências produzidas a partir de posições ideológicas homogêneas/heterogêneas, sequências produzidas em sincronia/diacronia.

Passamos, agora, a conhecer os dados coletados.

3.1 A percepção da criança frente ao projeto

Esta pesquisa foi realizada com o intuito de ouvirmos a criança referente à participação dela no projeto. Geralmente, em pesquisas ou conversas informais na escola, ouvimos os adultos, avaliamos, mas nem sempre a criança é ouvida. É necessário, assim, ouvi-la, observar o seu olhar e a sua percepção sobre o que fazemos na escola. Neste sentido, apresentamos, agora, o olhar das crianças.

No momento em que estávamos na escola conversando com as crianças, uma professora, que trabalhou com o Livro de Ouro no ano passado, destacou que, na sua percepção, o objetivo do projeto de leitura “Livro de Ouro” é trabalhar a leitura e incentivar no aluno o hábito de ler, para que se torne um sujeito leitor. No entanto, criar imaginariamente um sujeito que irá gostar de ler 100 livros, não há como garantir, pois a interpretação e o interesse será de acordo com a participação de cada um. Entendemos que uma criança que não é estimulada a ler diariamente, que não ouve histórias com frequência, poderá achar a leitura até um sacrifício. Orlandi (2008) menciona que a leitura vista em sua acepção mais ampla, pode ser entendida como “atribuição de sentidos”. Daí ser utilizada indiferentemente tanto para a escrita como para a oralidade. Diante de um exemplar de linguagem, de qualquer natureza, tem-se a possibilidade da leitura. Pode-se falar, então, em leitura tanto da fala cotidiana da balconista como do texto de Aristóteles.

Nesse contexto, vamos conhecer o que as crianças narraram sobre o desafio de ler 100 livros. Perguntamos o que elas acharam/pensaram quando a professora falou pela primeira vez do projeto e que teriam que ler 100 livros.

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Figura 10 – Resposta das crianças referente a primeira pergunta

Fonte: Acervo das autoras, 2019.

De acordo com a pesquisa, podemos observar que as crianças gostam de ler, pois quando a professora mencionou que iriam ler cem livros, acharam muito legal. Esse contexto aparece na SD2, SD4, SD9 e SD10. Assim, relatam:

SD2: Legal porque eu gosto de ler.

SD4: Achei muito legal, quando eu ia pra casa as vezes eu ligava a televisão e depois eu desligava e lia uns quatro livros.

SD9: Muito legal. SD10: Achei legal.

Podemos, então, destacar que as crianças gostam de ler, apenas precisam ser incentivadas. Essas SDs nos mostram que a leitura é de fundamental importância no processo de escolarização das crianças, no entanto a escola precisa oportunizar que esse contato seja prazeroso e incentive a criança. Nem sempre a escola consegue oferecer o acesso da criança à leitura por falta de livros na escola.

Na escola em que desenvolvemos a pesquisa, observamos que a leitura é incentivada. As crianças do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental vão semanalmente à biblioteca para leitura e alocar livros para ler na escola e em suas casas. Na educação infantil, também, as crianças têm o contato com o livro diariamente. As professoras contam histórias, leem gibis e outros gêneros literários de acordo com o planejamento pedagógico. Portanto, quando a criança chega no 2º ano, a leitura já faz parte do seu repertório de conhecimento. Segundo Kleiman (2000, p. 15):

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[...]a leitura se baseia no desejo e no prazer, não em uma atividade desagradável visando à decifração de palavras, que leva o aluno a caracterizar o ato de ler como difícil demais, inacessível, não fazendo sentido para o mesmo. Afinal, o sujeito conceber a leitura como um objeto de aprendizagem, que faça sentido a ele.

Além de a criança gostar de ler na relação com o prazer. Observamos a sua percepção da ampliação do conhecimento através da leitura. As sequências SD1, SD3, SD5 e SD8 evidenciam isso:

SD1: Achei muito legal, por que, “tipo” ler livro a gente fica imaginando se a gente pode entrar no livro ou não e quando eu comecei a ler eu senti eu dentro do livro. SD3: Achei massa, eu não sabia ler direito, “dai” eu aprendi lendo os livros do campeonato.

SD5: Ah, eu fiquei muito feliz porque ler livros eu fico imaginando as coisas, eu gosto muito de ler!

SD8: Eu achei legal porque “ta” incentivando a gente a ler cada vez mais.

As SDs indicam que as crianças gostaram de participar do projeto e que aprenderam com ele: “eu não sabia ler direito”, nesse caso, o projeto possibilitou a ampliação do desenvolvimento da leitura. Cada uma vivenciou de uma forma os livros que leram: uns destacam o poder que o livro fornece no sentido de poder imaginar, sentir-se dentro do livro, vivendo aquela história. Além de a criança considerar, na SD8, que achou legal, igualmente, menciona que dizer que eles leram 100 livros é incentivo para a criança ler cada vez mais.

A leitura tem o poder de fazer com que as crianças possam interagir com outras realidades, imaginar mundos diferentes e ampliarem seus conhecimentos. Através da leitura as crianças conhecem universos diferentes. A leitura é transformadora, por meio dela o leitor pode criar um vínculo afetivo com os personagens do livro.

A leitura não deve ser simplesmente algo mecânico onde a criança sinta-se obrigada a ler para que possa ir bem na escola ou para, simplesmente, aprender a ler. O gosto pela leitura deve ser um ponto de partida da criança e o professor tem o papel de tornar esse hábito leve, gostoso e convidativo. Cagliari (2004) destaca que ler é uma atividade muito complicada e que a leitura traz a finalidade da escrita. Cagliari, outrossim, destaca que mesmo sendo complexa, ainda, tem grande importância na vida da criança, porque as maiores dificuldades encontradas pelos jovens e até adultos na escola, estão relacionados à falta de leitura.

Ao olharmos os títulos anotados na ficha do Livro de Ouro, observamos que a maioria são livros de literatura infantil, portanto, quando a criança trata de imaginação, pode estar relacionando com as histórias que leu. Vejamos:

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SD5: Ah, eu fiquei muito feliz porque ler livros eu fico imaginando as coisas, eu gosto muito de ler!

SD1: Achei muito legal, por que, “tipo” ler livro a gente fica imaginando se a gente pode entrar no livro ou não e quando eu comecei a ler eu senti eu dentro do livro.

Essas experiências da literatura, também, podem estar relacionadas com as histórias que as crianças já vivenciaram na educação infantil, no 1º ano e/ou as oferecidas pelas famílias. Então, não é algo novo, há algum tempo, já faz parte do repertório desse grupo. Mesmo diante desse mundo imaginário das literaturas, não podemos dizer que ler é um processo fácil. A leitura, não é tão simples para a criança que está em processo de alfabetização. Alguns relatos das crianças nas SD6, SD7 e SD11 evidenciam essa realidade:

SD6: Eu achei um desafio muito legal, no começo eu achei que não ia conseguir mais depois eu fui lendo e consegui.

SD7: Eu achei que eu ia demorar um pouco, e eu demorei um pouco, mais consegui. SD11: Eu achei bem difícil, mais depois eu fui me acostumando.

Para o adulto, ler pode ser algo simples, mas para aquele que está começando, muitas vezes, torna-se uma tarefa difícil. Assim sendo, a escola deve fazer com que essa tarefa seja agradável, motivadora, que a criança tenha vontade de aprender e não a veja como uma barreira. Segundo o Teberosky e Tolchinsky (2000, p. 150),

[...] ler é uma atividade cognitiva complexa, é um processo constante de geração e verificação de hipóteses a partir de diversos indicadores. Quando lemos, fazemos suposições prévias sobre o que será dito no texto. Estabelece-se uma relação entre o que já sabemos e a informação que o texto nos traz.

A leitura está muito associada ao processo de alfabetização e, nesse caso, pode adquirir o caráter da aprendizagem formal. Então, a criança, ao pensar nos 100 livros como um número grandioso, como algo difícil, poderá considerar que não irá conseguir concluir. Desde que se assuma uma perspectiva discursiva na reflexão sobre leitura, alguns fatos se impõem em sua importância, para Orlandi (2008), o de se pensar a produção da leitura e, logo, a possibilidade de encará-la como possível de ser trabalhada (se não ensinada); o de que a leitura, tanto quanto a escrita, faz parte do processo de instauração do(s) sentido(s); o de que o sujeito-leitor tem suas especificidades e sua história; o de que tanto o sujeito quanto os sentidos são determinados histórica e ideologicamente; e) o fato de que há múltiplos e variados modos de leitura; finalmente, e de forma particular, a noção de que a nossa vida intelectual está intimamente relacionada aos modos e efeitos de leitura de cada época e segmento social.

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3.2 Experiência da criança com o projeto

A leitura está presente no cotidiano da criança de diversas formas. Nesse entendimento, a escola, juntamente com a família, precisa trabalhar para que esse hábito se torne frequente em seu cotidiano.

Todas as formas de experiência trazidas pela criança para a escola devem ser respeitadas e acolhidas, assim, vão se sentir seguras para partilhar o que já vivenciaram. É a partir dessas trocas que as crianças aprendem umas com as outras e ampliam seus conhecimentos. Naspolini (2010) destaca que a leitura é condição básica do ser humano no sentido de compreensão do mundo. A leitura não se limita apenas à decodificação de símbolos, mas envolve uma gama de possibilidades que permitem o sujeito compreender o que lê. De acordo com os Parâmetro Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (2001, p. 54):

Um leitor competente é alguém que, por iniciativa própria, é capaz de selecionar, dentre os trechos que circulam socialmente, aqueles que podem atender a uma necessidade sua. Que consegue utilizar estratégias de leitura adequada para abordá-los de forma a atender a essa necessidade.

Nesse contexto, não podemos esquecer que a criança, antes de ler 100 livros, já realizou outras leituras que estão no contexto social. Já traz em sua memória discursiva, experiências com a leitura desde o seu nascimento. Portanto, o aluno traz para o processo de compreensão de um texto, toda a sua experiência discursiva, incluindo sua relação com diversas formas de linguagem. Vejamos o que as crianças responderam quando conversamos a respeito da experiência ao ler 100 livros.

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Figura 11 – Respostas das crianças referente a segunda pergunta

Fonte: Acervo das autoras, 2019.

De acordo com as respostas, observamos que todas as crianças consideraram a experiência positiva. A maioria destaca positivamente, narrando que foi legal, apenas uma criança achou difícil (SD13). Possivelmente, essa criança encontrou dificuldades devido ao processo de alfabetização, pois como estão ainda se alfabetizando, pode acontecer de não ter uma leitura contínua e isso dificulta a compreensão quando o texto traz a linguagem escrita. Segundo Liberato (2007, p. 14), “é possível que o leitor consiga ler um texto que, embora escrito numa língua que ele domina, trate de um assunto sobre o qual ele não tem informações”. Portanto, quando o leitor não consegue captar o sentido do texto lido, a leitura passa a não ser tão prazerosa.

Constatamos, também, que, na SD16, a ideia da leitura já está associada a fazer resumo. Essa é uma prática comum nas escolas, não que seja positivo ou negativo, mas a leitura não poderá ficar apenas associada aos afazeres escolares tradicionais. Assim, a criança menciona: “SD16: Foi muito legal, eu aprendi muita coisa, quando eu leio livro eu faço resumo, então, eu aprendo muita coisa.”

O espaço de leitura escolar não pode excluir o fato de que a criança convive no seu contexto social com diferentes formas de linguagem, pois, segundo Orlandi (2008, p. 38), “a relação do aluno com o universo simbólico não se dá apenas por uma via – a verbal -, ele opera com todas as formas de linguagem na sua relação com o mundo”. Para a autora, a escola precisa considerar a linguagem não apenas como transmissão de informação, mas como mediadora (transformadora) entre o homem e sua realidade natural e social, desse

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modo, a leitura deve ser considerada no seu aspecto mais abrangente, que não é o de mera decodificação, mas o da compreensão.

Nessa perspectiva, consideramos que a aprendizagem se efetiva também fora da escola, ou seja, a criança aprende, mesmo fora da escola, em qualquer hora, sem que a mensagem do adulto/professor se preocupe em ensinar conteúdos e no final estar preocupado, apenas com a provação e reprovação. Dessa forma, sabemos que pelo fato de a criança já ter construída sua bagagem, em muitas leituras, a mesma pode não compreender o texto, porque é algo que está fora de seu cotidiano. Para uma criança que está acostumada a ler literatura infantil, não conseguirá compreender um texto de Orlandi, por exemplo.

A criança, quando é estimulada, procura por algo que a faça sentir prazer, vontade de ler e de estar naquele universo no qual o livro aborda. No entanto, é importante avaliarmos como a escola trata esse leitor. Ler 100 livros por ler? Como a escola considera essa leitura? No projeto “O livro de Ouro”, as professoras aceitam a leitura de outros textos, tais como, gibis, receitas, bulas, entre outros. Mas, pelas respostas das crianças, ainda a leitura está muito presa à linguagem escrita. Parece-nos que o não verbal, também, não recebeu a mesma valorização por parte da educação, permanece, infelizmente, excluído. Desse modo, seria possível, nesse projeto, aceitar leituras não verbais?

Ao realizar a proposta do projeto “Livro de Ouro”, apresentado pela escola, entendemos que as professoras envolvidas no projeto criam, antecipadamente, uma imagem de leitor, ou seja, acreditam que as crianças terão a capacidade de ler o número de 100 livros. Além da capacidade, o professor considera que fará sentido e terá um significado cada leitura realizada e anotada na ficha. No entanto, observamos que surge a dúvida para as crianças se irão conseguir ler os 100 livros, como podemos perceber nas sequências discursivas abaixo:

SD21: No começo eu achei que não ia conseguir mais depois eu consegui ler os livros, teve uma pessoa que me ajudou no último livro.

SD12: Muito legal também, por que a professora deixou a gente ler bastante livro e até hoje eu leio bastante livro.

SD13: Foi difícil mais foi legal. Por que eu gosto de ler. Eu já lia no 1º ano. Me lembro que li livro de histórias e gibis.

SD14: Foi muito “massa” e eu gostei da experiência. Por que eu não sabia ler direito, dai eu aprendi. Lembro que eu li o livro “A Bela e a Fera”.

Nesse contexto, podemos observar as contribuições de Orlandi (2008) ao questionar a imagem de leitor que a escola produz e a forma de como as representações são constitutivas da ação pedagógica. Assim, é preciso saber como é representado esse aluno-leitor.

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O projeto já vem ocorrendo desde o ano de 2008, portanto, a imagem desse aluno que vai conseguir ler, vem marcado pelo tempo de experiência em que o professor avaliou e percebeu que é uma atividade bem importante para esse momento escolar. Esse projeto que vem sendo desenvolvido por dez anos, pode nos mostrar a própria noção de língua apresentada pela escola. A língua, nesse projeto, é tratada além da compreensão do texto, mas implica em uma metodologia que valoriza a interpretação no fazer pedagógico e isso mostra o tratamento que é dado a leitura pela escola. De acordo com Cazarin (2006), pautar a prática da leitura e da interpretação a partir dessa concepção nos leva a conceber essa prática como um processo de produção de sentidos, isto é, como um gesto de interpretação do sujeito que lê/interpreta. Nesse entendimento, trazemos, outrossim, a contribuição de Pêcheux (1990, p. 317-18): “1º) se a análise do discurso se quer uma (nova) maneira de ‘ler’ as materialidades escritas e orais, que relação nova ela deve construir entre a leitura, a interlocução, a memória e o pensamento?; 2º) o que é interpretação nesse processo?”.

Então, a interpretação apresentada pela criança segue um certo trajeto de interpretação que é construído entre suas experiências com as brincadeiras e as demais linguagens que perpassam o espaço escolar, logo, é um processo de construção e reconstrução de interpretações e significados para a criança dizer se gostou ou não, se fez sentido ou não, tais como citada nas sequências a seguir:

SD17: Eu amei muito legal.

SD12: Muito legal também, por que a professora deixou a gente ler bastante livro e até hoje eu leio bastante livro.

SD22: Foi bem bom, eu gostei.

De acordo com Cazarin (2006), ler constitui-se, assim, em uma prática social que mobiliza o interdiscurso, conduzindo o leitor, enquanto sujeito histórico, a inscrever-se em uma disputa de interpretações. Este desestabiliza sentidos já dados, daí o efeito de inconsistência de todo e qualquer texto, que se caracteriza como uma heterogeneidade provisoriamente estruturada. Já Indursky (2001) destaca que ler é mergulhar em uma teia discursiva invisível, construída de já-ditos para desestruturar o texto e (re) construí-lo, segundo os saberes da posição-sujeito em que se inscreve o sujeito-leitor.

Na prática da leitura, o sujeito-leitor vai ocupar uma posição-sujeito em relação àquela ocupada pelo sujeito-autor, identificando-se ou não com ele. É nessa identificação que a criança pode dizer se gostou ou não de realizar a leitura daquela obra literária, tais como a

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SD18: “Foi uma experiência boa, foi legal, ler mais de 90 livros em 1 ano. Por que ler eu aprendo coisas novas. O que aconteceu no mundo e até coisas de histórias”.

As narrativas das crianças indicam que há um movimento de produção de sentido nesse projeto. A cada obra lida, sentidos são movimentados num diálogo com a escrita, imagens e experiências das crianças com esse tipo de atividade. De acordo com Rodriguez (1998), a noção de interpretação mobiliza diretamente uma definição do papel do sujeito na constituição dos sentidos.

3.3 Narrativas que seguem...

Ao analisarmos as respostas das crianças, identificamos que os títulos das leituras realizadas se tratavam do campo literário, os demais gêneros textuais foram pouquíssimos citados, tais como gibis, receita, poema, etc. Em nossa interpretação, acreditamos que só foi citado a literatura por se tratar de um gênero conhecido pelas crianças. O contato, desde a educação infantil, é mais com a literatura infantil. As respostas que seguem, foram respondidas a partir dos seguintes questionamentos: O que você mais gostou do campeonato? Encontrou alguma dificuldade? Você gostou de participar do campeonato? Você consegue se lembrar de livros que leu? Pode citar alguns?

Vejamos as respostas:

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Fonte: Acervo das autoras, 2019.

Figura 13 - Livros que foram lidos e anotados

Fonte: Acervo das autoras, 2019.

Algumas crianças mencionaram que não encontraram dificuldades para ler os livros e completar o desafio:

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SD23: Eu gostei do livro. Não encontrei dificuldade, por que a “tia” incentiva a gente ler e a gente vai aprendendo cada vez melhor. Me lembro da boneca do laço de fita, e a Rapunzel.

SD24: De ter lido todos os livros. O que eu mais gostei foi no final que ganhamos um passeio, não encontrei dificuldade de ler os 100 livros e gostei de participar do campeonato. Não me lembro de nenhum livro que li.

SD27: Eu gostei que todo mundo leu o livro e isso pra mim é muito legal, não encontrei dificuldades. Gostei de participar do campeonato, li Bela e a Fera, Chapeuzinho Vermelho, Os brilhos dos Poemas, e... O vestido de Carolina.

SD29: Gostei de ler todos esses livros. Não encontrei dificuldade, gostei de participar, eu só lembro do primeiro que foi o Gatinho e o último foi A festa encrencada e também gostei do Ali Babá e os 11 ladrões.

SD30: Eu gostei de ler os livros que a “tia” foi dando pra gente ler. Não encontrei dificuldade. Sim foi bem legal. Eu lembro que li da Branca de Neve da Bela e a Fera e não me lembro mais de nenhum.

SD31: Gostei das medalhas. Não encontrei dificuldade, gostei de participar. Lembro dos Três Lobinhos e o Porco Mal, mais gostei foi esse.

As crianças que relataram que não tiveram problemas para cumprirem com o desafio, citaram a “Tia”, professora, que auxiliou, por isso não foi difícil. Com essas respostas, acreditamos que o professor exerce um papel fundamental na ação pedagógica com a criança, pois uma coisa é propor a leitura de 100 livros, mas acompanhar e estimular a fim de que a criança signifique esse processo de forma prazerosa, é fundamental.

O professor é o profissional responsável por formar grandes leitores. Assim, ele cria, incentiva e propõe diferentes metodologias para auxiliar a criança a desenvolver-se. Portanto, precisa ser comprometido no seu planejamento em pensar estratégias para orientar as crianças, sendo assim, um mediador do processo. Segundo Freire (1999, p. 29), “[...] percebe-se, assim, a importância do papel do educador, o mérito da paz com que viva a certeza de que faz de sua tarefa docente, não apenas ensinar conteúdos, mas também ensinar a pensar certo”.

Os livros precisam fazer parte da vida das pessoas, assim, os projetos de leitura abrem novos caminhos de aprendizagem para a vida. Prado (2003, p.55) destaca que a leitura é “um espaço de formação e de educação para a informação”. O incentivo da leitura é o caminho que possibilita melhorar em todos os sentidos, aprende diferentes culturas, saberes, oportuniza a reflexão sobre o mundo e a dá dignidade humana.

Mesmo o professor criando projetos de leitura, não significa que todas as crianças gostarão de participar, ou encontrarão facilidade. Algumas crianças, na entrevista, responderam que encontraram dificuldades, porque não conseguiam ler muito rápido. A narrativa apresentada na SD33 destaca a dificuldade por estar no processo de alfabetização e,

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ainda, não saber os sons que compõe as palavras. Portanto, as dificuldades apontadas retratavam a relação grafemas e fonemas, vejamos:

SD25: Ler vários livros e conseguir chegar na última medalha. Sim, não conseguia ler muito rápido. Gostei de participar. Me lembro da Rapunzel, só.

SD28: Das medalhas eu gostei mais. Mais ou menos no começo tinha dificuldades pra ler os livros. Gostei de participar, não me lembro dos livros.

SD33: Eu achava muito difícil ler, no começo encontrei várias dificuldades, porque eu não sabia o som das letras, daí eu fiquei o recreio todo tentando descobrir os sons mais eu não sabia muito, eu ia perguntando pra professora, fui aprendendo pelas silabas, agora eu nem sei muito como é, vogal com vogal, hoje eu leio bem melhor. Gostei bastante do campeonato. Eu me lembro... aí não me lembro eu acho (risos).

Mesmo encontrando dificuldades ou não, as crianças, de forma geral, citaram diferentes literaturas que lembravam que haviam lido. Disseram:

SD26: Gostei de tudo, de ler 100 livros e também ajudar na leitura dos meus colegas. Consegui ler melhor depois do campeonato. Ás vezes eu tinha dificuldade, mais dai eu voltava e lia tudo certinho. Sim eu gostei por que eu “tava” com meus amigos. Eu li Rapunzel, Valente, vamos ver.. Ai é porque foram tantos, esses que eu falei foram os primeiros, mais os últimos eu não me lembro.

SD32: Gostei de tudo (risos) tipo eu encontrei que eu não conseguia achar o último livro, porque eu já tinha lido todos, dai uma amiga me ajudou a encontrar o Sapo Pulando a Vaca. Eu gostei de participar. Lembro de uns, acho que era a Capivara Voante, Eu Quero Brincar com o Sapo.

Nessa etapa da infância, a literatura infantil é fundamental na vida da criança, pois permite que ela desenvolva a imaginação, a fantasia de forma que possa brincar com esse mundo fantástico. Coelho (2000, p. 15) destaca que “a literatura e, em especial a infantil, tem uma tarefa fundamental a cumprir nesta sociedade em formação: a de servir como agente de formação, seja no espontâneo convívio leitor/ livro, seja no diálogo leitor/ texto estimulado pela escola”. É ao livro, à palavra escrita, que atribuímos a maior responsabilidade na formação da consciência de mundo das crianças e dos jovens.

A literatura infantil, além de ser o primeiro contato da criança com o mundo da literatura, faz com que a mesma exercite suas imaginações, fantasias, criatividades, pois a literatura em si não significa o livro propriamente dito, mas sim os diferentes gêneros literários. Góes (1991, p. 22) menciona que a função primeira do livro infantil é a estético-formativa, a educação da sensibilidade, pois reúne a beleza da palavra e a beleza das imagens. O essencial é a qualidade da emoção e sua ligação verdadeira com a criança. Há emoções poéticas que, presentes ou não no livro infantil, são diretamente acessíveis a todas as crianças.

Ainda falando sobre diversos benefícios que traz a literatura infantil nos primeiros anos de vida, sabemos que ela implicará, também, no futuro da criança. Assim como afirma

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Bakhtin (1992), a literatura infantil, por ser um instrumento motivador e desafiador, é capaz de transformar o indivíduo em um sujeito ativo, responsável pela sua aprendizagem, que sabe compreender o contexto em que vive e modificá-lo de acordo com a sua necessidade.

A escola deve ser a maior incentivadora para a criança tomar gosto pela leitura, pois é onde deveria encontrar diversos gêneros literários, já que em casa nem sempre é possível ter, ou seus familiares terem tempo de sentarem junto para ler, brincar. De acordo com Zilbermann e Lajolo (2002, p. 25), "a escola passa a habilitar as crianças para o consumo das obras impressas, servindo como intermediária entre a criança e a sociedade de consumo".

Outro aspecto relevante que a literatura tem o poder de trabalhar são os sentimentos, visto que as crianças admiram muito os personagens, assim, ouvirem uma história onde um personagem também sente medo, machuca-se, ou uma princesa que não tem cabelos lisos, é algo que faz com que a criança sinta um conforto e que ela possa começar a enxergar que todos passam por alguns problemas na vida, até em histórias. Segundo Abramovich (1997), quando as crianças ouvem histórias, passam a visualizar, de forma mais clara, sentimentos que têm em relação ao mundo. As histórias trabalham problemas existenciais típicos da infância, como medos, sentimentos de inveja e de carinho, curiosidade, dor, perda, além de ensinarem infinitos assuntos.

A escola é um dos espaços privilegiados para o começo da leitura e para a formação do ser humano. O ato de ler deve ser prazeroso e lúdico desde a educação infantil, visto como uma estratégia de gerar conhecimento. De acordo com os Referenciais Curriculares Nacionais (1998), ter acesso à boa literatura é dispor de uma informação cultural que alimenta a imaginação e desperta o prazer pela leitura. A intenção de fazer com que as crianças, desde cedo, apreciem o momento de sentar para ouvir histórias exige que o professor, como leitor, preocupe-se em lê-la com interesse, criando um ambiente agradável e convidativo à escuta atenta, mobilizando a expectativa das crianças, permitindo que elas olhem o texto e as ilustrações enquanto a história é lida.

A prática da leitura tem um papel fundamental para avançar no processo de construção de significados, enriquecendo, cada vez mais, sua capacidade expressiva, formando crianças que gostem de ler. É por meio dela que a criança entra em contato com toda a riqueza dos contos, da fantasia e da imaginação. Essa prática pode ser facilmente incorporada à rotina diária do professor, independentemente da idade e da condição social das crianças. É mediante projetos de leitura que auxiliamos, desde cedo, a criança a ter contato com o livro.

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4 Considerações finais

No presente artigo, investigamos qual foi a participação, o envolvimento e a interpretação das crianças no projeto de leitura “Livro de Ouro”. Sabemos que para a escola, o intuito do projeto é incentivar a leitura, mas para a criança nem sempre é algo tão prazeroso, já que cada criança é diferente e tem mais facilidade ou não na leitura.

Com base nos estudos feitos durante o curso, vimos que a leitura é de extrema importância na vida da criança para que ela possa se tornar um sujeito leitor e crítico. É a partir das diversas formas de leitura, verbal ou não verbal, que ampliamos os conhecimentos das crianças. E, para isso, a leitura deve estar presente desde a educação infantil, um trabalho que deve caminhar junto com a família e a escola.

A partir das entrevistas realizadas, conseguimos analisar como foi a experiência desse projeto para cada uma das crianças e percebemos, também, que elas reagem de forma distintas. Para uns, o projeto, quando anunciado, foi um susto, pois acharam que não dariam conta, para outros foi legal, e alguns acharam o mais legal ganhar a medalha e ter um dia diferente no fim do ano.

As onze crianças que aceitaram participar da pesquisa, cada uma contribuiu ao seu modo com a sua interpretação e experiência de vida. De modo geral, as crianças entrevistadas manifestaram palavras positivas sobre o projeto de leitura. Elas estão na idade de desafios e aventuras e ler 100 livros foi um grande desafio.

Nos relatos das crianças, notamos que, ao finalizarem os 100 livros, o sentimento foi de alegria, pois no começo muitos não imaginavam que iriam conseguir. Houve quem não sabia ler no início e que desenvolveram essa habilidade com a prática da leitura dos livros do projeto. Nas anotações feitas pelas crianças, percebemos que a maioria das histórias lidas era de clássicos da literatura infantil, como Branca de Neve, Rapunzel, entre outros.

Podemos considerar que, em nossa percepção, esse projeto é de extrema importância para o desenvolvimento das crianças, principalmente porque são pequenos e já são incentivados à prática da leitura.

Agradecimentos

Agradeço, primeiramente, a Deus, pelo dom da vida e por me proporcionar a imensa alegria de compartilhar deste trabalho com todos aqueles que me incentivaram e me deram forças até aqui para que eu não desistisse.

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Em especial, aos meus pais, Volnei e Dilcéia, que sempre foram meu alicerce e me motivaram desde sempre aos estudos e a me tornar a pessoa que sou hoje. A minha irmã, Morgana, que sonhou comigo esta conquista e não mediu esforços para me auxiliar e me incentivar a nunca desistir. E, também, quem me deu o melhor presente da vida, minha afilhada, Helena, onde encontro forças todos os dias para ser alguém melhor. Ao meu esposo, Bismarck, que esteve comigo durante estes 4 anos e 6 meses de graduação, apoiando-me, incentivando-me e dando-me forças para que eu pudesse concluir este projeto, no qual foi um sonho para nós.

A minha orientadora, Clésia Mendes Zapelini, um anjo que Deus colocou na minha vida, que me ajudou nos momentos que eu precisei, com uma inteligência única e onde encontro inspiração de força, dedicação e humildade.

Enfim, minha gratidão à vida e a todas as belas oportunidades que me proporciona.

Referências

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