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Uso tópico versus oral do ácido tranexâmico em pacientes portadores de coagulopatias hereditárias submetidos à extrações dentárias : um ensaio clínico randomizado controlado fase III

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VINICIUS RABELO TORREGROSSA

USO TÓPICO VERSUS ORAL DO ÁCIDO TRANEXÂMICO

EM PACIENTES PORTADORES DE COAGULOPATIAS

HEREDITÁRIAS SUBMETIDOS À EXTRAÇÕES

DENTÁRIAS:

um ensaio clínico randomizado controlado fase III

Piracicaba 2018

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USO TÓPICO VERSUS ORAL DO ÁCIDO TRANEXÂMICO

EM PACIENTES PORTADORES DE COAGULOPATIAS

HEREDITÁRIAS SUBMETIDOS À EXTRAÇÕES

DENTÁRIAS:

um ensaio clínico randomizado controlado fase III

Tese apresentada à Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutor em Estomatopatologia, área de concentração em Estomatologia.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Elvira Pizzigatti Corrêa.

Este exemplar corresponde à versão final da Tese defendida pelo aluno Vinicius Rabelo Torregrossa e orientada pela Profa. Dra. Maria Elvira Pizzigatti Corrêa.

Piracicaba 2018

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Em primeiro lugar a Deus, por me proporcionar saúde e vivacidade para encarar os desafios que já se passaram e os que ainda estarão por vir.

Ao apoio incondicional de minha família, obrigado por entender a minha ausência nos últimos cinco anos. Hoje podemos ver o quanto valeu à pena compartilhar este sonho comigo.

Ao meu avô Milton Rabelo (In Memoriam), Cirurgião Dentista e professor. Teu sangue corre em minhas veias.

À minha avó Joanina Rabelo (In Memoriam). É festa no céu, e você está sorridente com tudo o que está acontecendo aqui comigo. Sem os teus conselhos e o teu amor nada seria possível.

À minha querida mãe, pró-Zana ou Profª. Zana. É raro ser alfabetizado por uma mãe. Tive esse privilégio e talvez o maior de todos, que é ser o seu filho. É um amor incondicional que nos une, é simples e puro, é amor de mãe e filho.

À minha noiva Samilly. Amor que a pós-graduação me deu de presente. Mesmo que nada disto aqui estivesse acontecendo hoje, já teria valido à pena ter te encontrado.

À Universidade Estadual de Campinas, na pessoa de seu Magnífico Reitor, Professor Doutor Marcelo Knobel.

À Faculdade de Odontologia de Piracicaba, na pessoa de seu Diretor, Professor Doutor Guilherme Elias Pessanha Henriques, e de seu Diretor Associado, Professor Doutor Francisco Haiter Neto.

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fazer parte do time de egressos deste maravilhoso programa de pós-graduação. Sem sombra de dúvidas uma referência internacional e desejo de muitos que buscam cruzar as fronteiras do conhecimento.

À minha orientadora, Professora Doutora Maria Elvira Pizzigatti Corrêa. Como resumir em poucas palavras tudo o que passamos juntos nesses últimos anos? Certamente uma tarefa árdua descrever em poucas palavras meia década de convivência intensa. Convivência essa que se traduziu em experiências marcadas por empenho e determinação, aventuras e frustações, brilho nos olhos e lágrimas...lapidação. O que mais me deixa feliz é que duas coisas jamais deixaram de existir em nossa relação durante todo esse tempo: respeito mútuo e admiração.

Ao Professor Doutor Alan Roger dos Santos-Silva. Excelente professor, ser humano e um líder nato. Incentivador do trabalho em equipe, sabe como poucos extrair o que há de melhor individualmente em cada um de seus alunos. Sou grato por você ter aberto as portas do Orocentro para mim, e me sinto honrado pela sua amizade e apoio concedido durante esses últimos anos.

Ao Professor Doutor Ricardo Della Colleta, que gentilmente cedeu as instalações e equipamentos do Laboratório de Biologia Molecular do Departamento de Diagnóstico Oral da Faculdade de Odontologia de Piracicaba para o processamento das amostras deste estudo.

Aos demais Professores Doutores das áreas de Semiologia e Patologia Oral da Faculdade de Odontologia de Piracicaba: Edgard Graner, Jacks Jorge, Oslei Paes de Almeida e Pablo Agustín Vargas.

À Raíza e ao Marquinhos, sem vocês esse estudo jamais sairia do papel.

A todos os meus colegas durante o tempo de pós-graduação aqui em São Paulo, Campinas e Piracicaba. Seria injusto enumerar aqui apenas alguns nomes. Todos vocês foram, e continuarão a ser, especiais para mim.

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Professora Doutora Sara Teresinha Olalla Saad, e aos diretores das Divisões de Hematologia e Hemoterapia, os Professores Doutores Erich Vinicius de Paula e Fabrício Bíscaro Pereira, pela concessão ao uso das dependências desta instituição para a realização da coleta de dados deste estudo.

À toda a equipe do Ambulatório Multiprofissional de Hematologia – Unidade

de Hemofilia Cláudio Luiz Pizzigatti Correa, do Hemocentro de Campinas. Em especial

ao corpo clínico de enfermagem, nas pessoas da Andréia Sambo, Valdirene Ferreira e Mariana Midori, e ao corpo clínico de médicos, nas pessoas da Dra. Margareth, Dr. Samuel e Dra. Carol.

À Eliana Miranda, pelo profissionalismo e paciência dispensados durante as análises estatísticas do nosso estudo. Muito obrigado pelas suas valiosas contribuições, conselhos e amizade.

À Nicete Romano, pela paciência e apoio durante os últimos cinco anos no Hemocentro de Campinas.

Ao Serviço de Estomatologia e Odontologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, na pessoa de seu Coordenador, o Professor Doutor Leandro Dorigan de Macedo, e da Dra. Tatiane Cristina Ferrari.

À Evandra Strazza Rodrigues da Fundação Hemocentro de Ribeirão Preto pela valiosa ajuda no processamento laboratorial das amostras.

Ao Coordenador do Laboratório de Ressonância Magnética Nuclear do LNBio/CNPEM, Professor Doutor Maurício Luís Sforça, sempre solícito e paciente durante a fase de leitura das amostras. Foi uma das mais fantásticas experiências poder trabalhar neste precioso lugar com uma equipe tão maravilhosa e acolhedora.

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nestes últimos cinco anos atuando honrosamente no Serviço de Urgência Bucal municipal! Vocês sempre me motivaram a buscar meus sonhos. Sei que fiz amigos de verdade, para a eternidade.

Ao Bayer Hemophilia Awards Program pelo apoio financeiro concedido para a realização deste estudo.

Em especial aos pacientes, queridos e maravilhosos. Aprendi a ressignificar a palavra “problema” com vocês. Cresci com a força da sua resiliência e com a simplicidade com que tratam as coisas da vida. Gratidão pelos momentos em que pudemos conviver juntos.

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INTRODUÇÃO: A terapia antifibrinolítica, por via tópica ou sistêmica, é rotineiramente empregada como método hemostático adjuvante para o preparo de extrações dentárias (exodontias) em pacientes portadores de coagulopatias hereditárias (PCH). OBJETIVOS: Avaliar a eficácia e segurança do uso tópico versus sistêmico do Ácido Tranexâmico (ATX) como método hemostático adjuvante para exodontias em pacientes PCH. O objetivo secundário foi identificar e quantificar a presença do ATX em plasma e saliva após seu uso tópico versus sistêmico. MÉTODOS: Este foi um ensaio clínico de tratamento fase III, prospectivo, paralelo, com dois braços, randomizado controlado, aberto e multicêntrico que recrutou pacientes PCH que necessitavam de exodontias. Cada procedimento de exodontia foi randomizado em dois grupos: Grupo controle – foi prescrito o uso por via oral do ATX (15 mg/Kg), três vezes ao dia, durante sete dias, com início da terapia 24 horas antes da exodontia.

Grupo experimental – após a exodontia, foi aplicado por vis tópica o ATX em gel bucal

bioadesivo a 8% (Kin Exogel, Laboratórios Kin S.A., Barcelona, Espanha) sobre a ferida cirúrgica. Os participantes receberam a orientação de reaplicar o gel de ATX três vezes ao dia, durante sete dias. Ambos os grupos receberam a terapia de reposição de fatores de coagulação (TRFC) uma hora antes de cada procedimento de exodontia, de acordo com a doença de base. Dados clínicos relacionados aos procedimentos cirúrgicos foram coletados imediatamente após as exodontias (dia D0). No dia D+7, dados clínicos relativos aos episódios de sangramento secundários às exodontias e ao processo de cicatrização da ferida cirúrgica foram coletados. Para o estudo metabolômico do ATX, amostras de sangue periférico e saliva não estimulada foram coletadas pré e pós-exodontia (dia D0). Todas as amostras de plasma e saliva foram posteriormente analisadas por espectroscopia de ressonância magnética nuclear (RMN) com o intuito de detectar e quantificar o ATX. RESULTADOS: Vinte e seis participantes com necessidade de exodontias foram recrutados, com uma média de idade de 30 (18-68) anos, sendo quinze (57,7%) participantes do sexo masculino. Trinta e cinco procedimentos de exodontias foram randomizados, 17 (48,6%) no grupo controle e 18 (51,4%) no grupo experimental. Um total de 38 dentes foram extraídos, 19 para cada grupo. Terceiros molares corresponderam a 7/19 (37%) dos dentes extraídos no grupo controle e a 11/19 (58%) no grupo experimental. Apenas 2/35

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estatisticamente significantes em relação à cicatrização da ferida cirúrgica e à incidência de eventos adversos entre os grupos (p> 0,05). Os níveis plasmáticos do ATX se encontraram abaixo do limite de detecção (< 0,2 mg/L) no grupo experimental em ambos os períodos do estudo. No grupo controle, a concentração plasmática média do ATX foi de 2,3 mg/L (0 – 12,1 mg/L) e 1,59 mg/L (0 – 10,9 mg/L), pré e pós-exodontia, respectivamente. Nas amostras de saliva, em ambos os grupos, não foram encontrados níveis detectáveis do ATX no período pré-exodontia. No período pós-exodontia, somente o grupo experimental apresentou níveis detectáveis do ATX, com concentração média de 43,24 mg/L (0 – 268,5 mg/L). CONCLUSÃO: O uso tópico do gel bucal bioadesivo de ATX a 8% apresentou segurança e eficácia comparáveis à terapia sistêmica com o ATX quando utilizado como método hemostático adjuvante para exodontias em pacientes PCH. Mesmo após 24h de uso contínuo por via oral do ATX, nenhuma concentração do medicamento pôde ser detectada na saliva dos participantes do grupo controle. A aplicação tópica do ATX em gel bucal bioadesivo a 8% sobre o local da exodontia foi capaz de dispensar altas concentrações do medicamento na saliva, sem induzir a uma absorção sistêmica a níveis detectáveis pela técnica de espectroscopia de RMN.

Palavras-chave: Ácido tranexâmico. Extração dentária. Transtornos da coagulação

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INTRODUCTION: Antifibrinolytic therapy, either topically or systemically, is often used as an adjuvant hemostatic method for dental extractions (DE) in patients with inherited bleeding disorders (IBD). OBJECTIVES: To evaluate the safety and efficacy of the topical versus systemic use of tranexamic acid (TXA) as an adjuvant hemostatic method for DE in patients with IBD. The secondary aim was to detect and quantify TXA in plasma and saliva related to its topical versus systemic use. METHODS: This was a prospective phase III clinical trial, parallel, with two arms, randomized-controlled, open-label, multicenter study, which enrolled patients with IBD who needed DE. Each DE procedure was randomized into two groups: Control group – TXA was prescribed orally (15 mg/Kg), starting 24 hours before DE and continued three times daily (TID) for seven days. Experimental group – after DE, an 8% bioadhesive gel of TXA (Kin Exogel Kin Lab, S.A., Spain) was applied topically on the extraction site. Patients were advised to reapply the TXA gel, TID for seven days. Both groups received replacement factor therapy (RFT) one hour before DE, according to the underlying disease. Clinical data regarding the surgical procedures were collected immediately after DE (day D0). On day D+7, clinical data regarding bleeding episodes related to DE and to the wound healing process were collected. For the metabolomic study of TXA, peripheral blood and non-stimulated saliva samples were collected pre and post-extraction (day D0). All salivary and plasma samples were then analyzed by nuclear magnetic resonance (NMR) spectroscopy in order to detect and quantify TXA. RESULTS: Twenty-six patients who needed DE were enrolled, with a mean age of 30 (18-68) years, and fifteen (57.7%) patients were male. Thirty-five DE procedures were randomized, 17 (48.6%) into the control group and 18 (51.4%) into the experimental group. A total of 38 teeth were extracted, 19 for each group. Third molars corresponded to 7/19 (37%) of extracted teeth in the control group, and to 10/19 (53%) in the experimental group. Only 2/35 (5.7%) bleeding episodes secondary to DE were found, both in the experimental group (p= 0.25). No statistically significant differences were observed regarding the wound healing process and to adverse events between the two groups (p> 0.05). Plasma levels of TXA were found below the limit of detection (< 0.2 mg/L) in the experimental group in both studied periods. In the control group, the mean plasma level concentration of TXA was 2.3 mg/L (0 – 12.1 mg/L), and 1.59 mg/L

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extraction period, only the experimental group presented TXA in detectable levels, with a mean concentration of 43.24 mg/L (0 – 268.5 mg/L). CONCLUSION: Topical use of the 8% bioadhesive gel of TXA showed to be equally effective and safe when compared to systemic TXA therapy as an adjuvant hemostatic method for DE in patients with IBD. Even after 24 hours of continuous oral use of TXA, no drug concentration was detected in salivary samples from the control group. Topical use of an 8% bioadhesive gel of TXA was able to deliver higher drug concentrations in saliva, despite no systemic absorption using a NMR-spectroscopy approach.

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Figura 1 – Esquema ilustrativo do mecanismo de competição farmacológica utilizado pelo ATX

para inibir a dissolução da fibrina. 31

Figura 2 – Diferentes formas farmacêuticas do ATX. 36

Figura 3 – Exemplo de uso tópico do ATX após exodontia. 37

Figura 4 – Sutura obliterativa do alvéolo dental no

pós-cirúrgico imediato. 50

Figura 5 – Aplicação tópica do gel bucal bioadesivo de ATX

a 8% sobre a ferida cirúrgica pós-exodontia. 51

Figura 6 – Identificação do ATX em espectros de RMN de

1H.

58

Figura 7 – Espectros de RMN de 1H de amostras de plasma

e saliva contendo o Ácido Tranexâmico (ATX). 59

Figura 8 – Diagrama de fluxo do ensaio clínico. 64

Figura 9 – Episódio de sangramento observado durante o

(14)

Tabela 1 – Classificação do Índice de Placa (IP). 44

Tabela 2 – Classificação do Índice Gengival (IG). 45

Tabela 3 – Classificação da complexidade dos

procedimentos cirúrgicos de exodontia. 52

Tabela 4 – Índice de Sangramento alveolar versus

necessidade de reintervenção local e/ou

transfusional. 54

Tabela 5 – Procedimentos realizados em cada visita. 56

Tabela 6 – Características dos participantes. 62

Tabela 7 – Total de dentes extraídos e razões para as

exodontias por grupo. 66

Tabela 8 – Complexidade dos procedimentos cirúrgicos de exodontia e episódios de sangramento nos dois

grupos. 68

Tabela 9 – Características clínicas dos episódios de sangramento tardio observados no grupo

experimental. 70

Tabela 10 – Parâmetros clínicos de avaliação da cicatrização

da ferida cirúrgica distribuídos por grupo. 72

Tabela 11 – Características clínicas dos procedimentos diagnosticados com retardo no processo de

cicatrização da ferida cirúrgica. 73

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AHA - American Heart Association/Sociedade Americana de

Cardiologia

AINES - antiinflamatórios não-esteróides

ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária

ATX - ácido tranexâmico

C - Celsius

CCP - concentrado de complexo protrombínico

CCPA concentrado de complexo protrombínico parcialmente

ativado

CEP - Comitê de Ética em Pesquisa

CHR - coagulopatias hereditárias raras

CNPEM - Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais

CPO-D - Índice de dentes Cariados, Perdidos e Obturados

DDAVP - acetato de desmopressina

D2O - água deuterada

DvW - Doença de von Willebrand

EACA - ácido épsilon-aminocapróico

EVA - escala visual analógica

FCM - Faculdade de Ciências Médicas

FOP - Faculdade de Odontologia de Piracicaba

FvW - fator von Willebrand

FVIII - fator VIII

FIX - fator IX

HC - Hospital de Clínicas

HCFMRB - Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto

ICTRP - International Clinical Trials Registry Platform/Plataforma

Internacional de Registro de Ensaios Clínicos IG - índice gengival

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KDa - kilodáltons

LNBio - Laboratório Nacional de Biociências

M - molaridade (mol)

mM - milimol

µL - microlitros

mL - mililitros

mm - milímetros

NMR - nuclear magnetic resonance

PCH - portadores de coagulopatias hereditárias

pH - potencial hidrogeniônico

ppm - partes por milhão

Rco - cofator ristocetina

RFT - replacement fator therapy

rFVIIa - fator VIIa recombinante

rFVIII - fator VIII recombinante

RMN - ressonância magnética nuclear

rpm - rotações por minuto

TCF - Tatiane Cristina Ferrari

TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TID - three times daily/três vezes ao dia

t-PA - ativador de plasminogênio tecidual

TRFC - terapia de reposição de fatores da coagulação

UB - unidades Bethesda

UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas

USP - Universidade de São Paulo

UTN - Universal Trial Number

VRT - Vinicius Rabelo Torregrossa

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1 INTRODUÇÃO 21

2 REVISÃO DA LITERATURA 23

2.1 Coagulopatias hereditárias

2.1.1 Hemofilias e Doença de von Willebrand 2.1.1.1 Hemofilias

2.1.1.2 Doença de von Willebrand

2.2 Exodontias em pacientes portadores de coagulopatias hereditárias 2.3 A terapia antifibrinolítica

2.3.1 Agentes antifibrinolíticos

2.3.2 Ácido tranexâmico – um antigo e ainda importante inibidor da fibrinólise 23 23 23 27 29 32 32 34 3 PROPOSIÇÃO 40 3.1 Objetivo geral 3.2 Objetivos específicos 40 40 4 MÉTODOS 41 4.1 Desenho do estudo 4.2 Local do estudo 4.3 População e amostra 4.3.1 Critérios de inclusão 4.3.2 Critérios de exclusão 4.3.3 Considerações éticas 4.4 O ensaio clínico 4.4.1 Técnica de randomização 4.4.2 Avaliação clínica pré-cirúrgica

4.4.2.1 Indicadores de saúde bucal 4.4.2.2 Prescrição medicamentosa

4.4.3 Protocolo de reposição de fatores da coagulação 4.4.3.1 TRFC pré-cirúrgica (dia D0) 41 41 41 41 42 42 44 44 45 45 48 49 49

(19)

4.4.5 Exodontias

4.4.5.1 Estratificação do grau de complexidade da exodontia 4.4.5.2 Medidas de segurança e monitoramento

4.4.6 Avaliação clínica pós-cirúrgica (dia D+7)

4.4.6.1 Avaliação clínica de falha da hemostasia local

4.4.6.2 Avaliação clínica do processo de cicatrização da ferida cirúrgica

4.5 Análise metabolômica do ácido tranexâmico em plasma e saliva 4.5.1 Aquisição dos espectros de RMN

4.5.2 Detecção e quantificação do ATX 4.6 Análise estatística 51 54 54 55 55 57 59 59 59 62 5 RESULTADOS 63 5.1 Caracterização da amostra 5.2 Avaliação da saúde bucal

5.3 Procedimentos cirúrgicos de exodontia

5.3.1 Avaliação clínica do processo de cicatrização da ferida cirúrgica 5.4 Eventos adversos

5.5 Análise metabolômica do ácido tranexâmico no plasma e saliva 5.5.1 Detecção e quantificação do ATX no plasma

5.5.2 Detecção e quantificação do ATX em saliva

63 67 67 73 76 78 78 78 6 DISCUSSÃO 80 7 CONCLUSÃO 87 REFERÊNCIAS 88 APÊNDICES

Apêndice 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Apêndice 2 - Formulário de coleta de dados

Apêndice 3 - Formulário de recomendações pós-operatórias

Apêndice 4 - Material ilustrativo fornecido aos participantes do grupo experimental 109 109 116 144 145

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ANEXOS

Anexo 1 – Certificado de aceite do trabalho no CEP da FCM/UNICAMP Anexo 2 – Certificado de aceite do trabalho no CEP do HCFMRP/USP Anexo 3 – Certificado de aceite do trabalho no CEP da FOP/UNICAMP

150 150 172 175

(21)

1 INTRODUÇÃO

As coagulopatias hereditárias compreendem um espectro variável de doenças hemorrágicas resultantes da deficiência quantitativa e/ou qualitativa de fatores da coagulação (BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006).

A realização de procedimentos odontológicos invasivos, como exodontias, em pacientes portadores de coagulopatias hereditárias (PCH) está frequentemente associada a um risco aumentado de complicações decorrentes de sangramentos na cavidade bucal (Sindet-Pedersen & Stenbjerg, 1986). A quantidade e gravidade destes sangramentos relacionam-se majoritariamente com o tipo de coagulopatia apresentada, fatores sistêmicos e locais do paciente (van Galen et al., 2015).

Na cavidade bucal, a hemostasia após procedimentos odontológicos invasivos pode ser modulada por fatores locais inerentes às características da intervenção (van Galen et al., 2015). Fatores como o grau de complexidade da exodontia, o número de dentes ou de raízes extraídas, as dimensões da ferida cirúrgica, a presença de processos inflamatórios e/ou infecciosos podem influenciar a gravidade dos episódios de sangramento no período pós-cirúrgico (Cortellini et al., 1992; Cicala & Cirino, 1998; Corrêa et al., 2006; Serrati et al., 2006; van Galen et al., 2015).

O desafio hemostático após uma exodontia parece ser ainda maior em decorrência da atividade fibrinolítica se portar de maneira exacerbada na cavidade bucal (Sindet-Pedersen et al., 1987a). Isto ocorre em função da produção e liberação de ativadores de plasminogênio tecidual (t-PA) pelas glândulas salivares (Kjaeldgaard & Kjaeldgaard, 1986; Kjaeldgaard & Kjaeldgaard, 1987; Sindet-Pedersen et al., 1990; Haze et al., 1994; Virtanen et al., 2006) e pelas células epiteliais da mucosa bucal (Southam, 1981). Um aumento da liberação do t-PA também foi verificado na presença de processos inflamatórios e/ou infecciosos (Björlin & Nilsson, 1968; Serrati et al., 2006) e relacionado à intensidade do trauma cirúrgico local (Basso, 2009). A exacerbação da atividade fibrinolítica na cavidade bucal está associada à dissolução precoce do coágulo sanguíneo e subsequente manifestação de episódios de sangramento secundários às exodontias (Sindet-Pedersen et al., 1990).

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O uso de agentes antifibrinolíticos, por via tópica ou sistêmica, vem sendo tradicionalmente recomendado na Odontologia como método hemostático adjuvante para o preparo de exodontias em situações onde há a expectativa de sangramento pós-cirúrgico (Forbes et al., 1972; Sindet-Pedersen & Stenbjerg, 1986; Ramström et al., 1989; Sindet-Pedersen et al., 1989; Borea et al., 1993; Ramstrom et al., 1993; Waly, 1995; Senghore & Harris, 1999; Zanon et al., 2000; Carter et al., 2003; Lee et al., 2005; Coetzee, 2007; Ripollés-de Ramón et al., 2013; Nuvvula et al., 2014; Soares et al., 2015; Queiroz et al., 2018).

O ácido tranexâmico (ATX) é o agente antifibrinolítico mais utilizado mundialmente (Levy et al., 2018). O ATX é utilizado com o intuito de promover um aumento da estabilidade do coágulo sanguíneo através da inibição da fibrinólise (Tengborn et al., 2015). Em pacientes PCH, seu uso concomitante à terapia de reposição de fatores da coagulação (TRFC) apresenta vantagens relacionadas à redução de episódios de sangramento e de doses adicionais de concentrados de fatores da coagulação (van Galen et al., 2015).

Apesar dos benefícios relacionados à terapia antifibrinolítica com o ATX, a preocupação com o desenvolvimento de eventos tromboembólicos secundários a seu uso sistêmico é motivo de divergências na comunidade científica (Dalury, 2010; Holmströn et al., 2012).

Devido ao potencial de reduzir sangramentos com mínima absorção sistêmica, o uso tópico do ATX tem sido tema de investigação nos últimos anos (Ker et al, 2013; van Galen et al., 2015; Montroy et al., 2018). Contudo, poucos ensaios clínicos randomizados controlados avaliaram a efetividade, segurança e a absorção sistêmica gerada após o uso tópico do ATX como terapia hemostática adjuvante após procedimentos invasivos (Sindet-Pedersen, 1987; Almer, 1992; Wong, 2010; McCormack, 2012).

Portanto, o objetivo desse estudo foi avaliar a eficácia e segurança do uso tópico versus sistêmico do ATX para exodontias em pacientes PCH. O objetivo secundário foi identificar e quantificar a presença do ATX em plasma e saliva após o seu uso tópico versus sistêmico.

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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 COAGULOPATIAS HEREDITÁRIAS

As coagulopatias hereditárias constituem um grupo heterogêneo de doenças hemorrágicas em que há a deficiência congênita quantitativa e/ou qualitativa de proteínas plasmáticas envolvidas no processo de coagulação (BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006).

A classificação das coagulopatias hereditárias ocorre em função da etiologia e grau da anormalidade encontrados no processo de coagulação (Srivastava et al., 2013). Cerca de 95% das coagulopatias hereditárias incluem anormalidades no fator von Willebrand (FvW), e nos fatores VIII (FVIII) e IX (FIX) da coagulação, responsáveis por causar a Doença de von Willebrand (DvW) e as hemofilias A e B, respectivamente (Sadler, 1994; Ragni, 2006). Os outros 5% restantes correspondem às coagulopatias hereditárias raras (CHR), que incluem alterações do fibrinogênio, protrombina, dos fatores V, VII, X, XI, XIII, além de deficiências combinadas dos fatores V e VIII da coagulação (BRASIL, Manual das coagulopatias hereditárias raras, Ministério da Saúde, 2015).

No Brasil, 22.932 indivíduos foram registrados com algum tipo de coagulopatia hereditária no ano de 2015 (BRASIL, Perfil das coagulopatias hereditárias no Brasil, Ministério da Saúde, 2017). Deste total, 9.908 (43,21%) eram portadores de Hemofilia A, 1.948 (8,49%) eram portadores de Hemofilia B e 7.220 (31,48%) eram portadores da DvW. Em relação às CHR, 1.542 indivíduos foram registrados, e a deficiência de fator VII correspondeu a mais da metade dos casos (BRASIL, Perfil das coagulopatias hereditárias no Brasil, Ministério da Saúde, 2017).

2.1.1 Hemofilias e Doença de von Willebrand

2.1.1.1 Hemofilias

A hemofilia é uma doença hemorrágica hereditária caracterizada pela deficiência ou anormalidade da atividade coagulante do FVIII (hemofilia A) ou FIX (hemofilia B) da coagulação (World Federation of Haemophilia, 2013).

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A etiopatogenia das hemofilias está relacionada a mutações nos genes F8 (hemofilia A) ou F9 (hemofilia B), localizados na porção 2.8 do braço longo do cromossomo X (Srivastava et al., 2013). Esta característica confere um padrão de transmissibilidade recessiva quase exclusivo a indivíduos do sexo masculino que herdaram o gene pelo lado materno (BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006). A taxa de mutações espontâneas é particularmente alta e pode afetar até 30% dos casos (Ragni, 2006).

A anormalidade no processo de hemostasia ocorre de forma similar nas hemofilias A e B. Enquanto que a hemostasia primária e a formação do tampão plaquetário encontram-se preservadas, a constituição e estabilização do coágulo sanguíneo encontram-se deficientes (Bolton-Maggs & Pasi, 2003). Isto se deve à formação defeituosa da fibrina, que resulta em um coágulo sanguíneo poroso, pouco aderente e mais susceptível à dissolução pelo sistema fibrinolítico (Chapin & Hajjar, 2015).

O modelo celular da coagulação põe em evidência o papel do FVIII e FIX na adequada geração de trombina, fundamental no processo de coagulação (Hoffman & Moroe, 2001; Hoffman, 2003). Após uma lesão vascular, há a ativação do complexo constituído pelo fator tecidual e o fator VII, que modulam a geração do fator Xa. Esta produção necessita ser amplificada pelo FVIII e FIX para permitir que o processo de coagulação avance. Ou seja, nas hemofilias A e B, onde há uma deficiência quantitativa do FVIII ou FIX, a amplificação e consolidação da geração do fator Xa será insuficiente para sustentar a hemostasia. Isto se traduz clinicamente na manutenção de um quadro característico de sangramento tardio (Bolton-Maggs & Pasi, 2003).

O diagnóstico das hemofilias leva em consideração dados do histórico familiar e de complicações hemorrágicas, além de testes laboratoriais confirmatórios (Bolton-Maggs & Pasi, 2003). Histórico positivo para episódios de sangramento espontâneos ou após pequenos traumas, ainda nos primeiros anos de vida, ou de sangramentos excessivos após procedimentos cirúrgicos devem ser investigados (BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006). O diagnóstico confirmatório é realizado por meio da dosagem da atividade coagulante do FVIII e FIX. O diagnóstico diferencial para outras coagulopatias, como a DvW, é mandatório (Srivastava et al., 2013).

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A classificação das hemofilias A e B é baseada na atividade residual coagulante relacionada aos níveis plasmáticos do FVIII e FIX, respectivamente (White, 2001):

➢ Hemofilia leve – Atividade residual de FVIII ou FIX varia de 5 UI/dL

a 40 UI/dL, ou de 5% a < 40% do normal;

➢ Hemofilia moderada – Atividade residual de FVIII ou FIX varia de 1

UI/dL a 5 UI/dL, ou de 1% a 5% do normal;

➢ Hemofilia grave – Atividade residual de FVIII ou FIX é < 1 UI/dL, ou

< 1% do normal.

No Brasil, a prevalência dos casos de hemofilia A e B foi mapeada na população de acordo com a gravidade da doença (BRASIL, Perfil das coagulopatias hereditárias no Brasil, Ministério da Saúde, 2017). Em relação à hemofilia A, 39,36% dos diagnósticos correspondiam à forma grave, 24,67% dos casos à forma leve e 22,98% dos casos à forma moderada. Em relação à hemofilia B, 32,6% dos casos correspondiam à forma moderada, 32,08% dos casos à forma grave e 21,97% dos casos à forma leve (BRASIL, Perfil das coagulopatias hereditárias no Brasil, Ministério da Saúde, 2017).

A frequência e gravidade dos episódios de sangramento nas hemofilias A e B são semelhantes e estão intimamente relacionadas aos níveis plasmáticos circulantes do FVIII e FIX, respectivamente (Bolton-Maggs & Pasi, 2003). Nas hemofilias leves, sangramentos espontâneos normalmente estão ausentes e é comum observar sangramentos associados a traumas maiores e/ou procedimentos cirúrgicos. Nas hemofilias moderadas, sangramentos espontâneos são ocasionais e estão relacionados a traumas ou a procedimentos cirúrgicos. Nas hemofilias graves, pode-se obpode-servar sangramentos articulares (hemartropode-ses) e/ou musculares espontâneos, ou relacionados a mínimo trauma (BRASIL, Manual de hemofilia, Ministério da Saúde, 2015).

O tratamento convencional dos episódios de sangramento nas hemofilias acontece através da reposição específica do fator da coagulação deficiente (Srivastava et al., 2013). As modalidades do tratamento convencional das hemofilias são definidas de acordo com a periodicidade com que a TRFC é administrada. O tratamento pode ser sob demanda ou profilático: O tratamento sob demanda consiste

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na administração da TRFC somente após um episódio de sangramento. Já o tratamento profilático consiste no uso regular da TRFC no intuito de prevenir episódios de sangramento através da manutenção de níveis plasmáticos suficientemente elevados do fator deficiente (BRASIL, Manual de hemofilia, Ministério da Saúde, 2015). O tratamento profilático pode ser contínuo (52 semanas ao ano) ou intermitente (< 45 semanas ao ano), e possui três modalidades: 1. primária, com início antes de evidências de alteração osteocondral; 2. secundária, com início após duas ou mais hemartroses e antes da evidência de alteração osteocondral; 3. terciária, com início após evidências de alteração osteocondral (Srivastava et al., 2013).

Uma alternativa para o tratamento de sangramentos leves a moderados inclui o uso do acetato de desmopressina (DDAVP) (BRASIL, Manual de hemofilia, Ministério da Saúde, 2015). Utilizado desde a década de 70 em pacientes com hemofilia A, este análogo sintético da vasopressina causa o aumento transitório, em até seis vezes, dos níveis plasmáticos basais do FVIII proveniente dos reservatórios endógenos contidos na parede vascular (Mannucci et al., 2018). O uso do DDAPV na hemofilia A é indicado para os portadores das formas leve e moderada da doença que apresentam boa resposta terapêutica ao medicamento (Loomans et al., 2018). O DDVP não afeta os níveis plasmáticos do FIX, portanto não apresenta valor terapêutico na hemofilia B (Mannucci et al., 2018).

A mais significante complicação no tratamento das hemofilias é a presença de inibidores, que são aloanticorpos policlonais IgG direcionados contra o FVIII ou FIX exógeno proveniente da TRFC (Srivastava et al., 2013). Esta condição acomete aproximadamente 20-30% dos pacientes com hemofilia A grave e 3-5% dos pacientes com hemofilia B grave (Valentino et al., 2015). A presença de inibidores na hemofilia está associada a sangramentos graves com baixa resposta à terapia convencional, alta morbidade, significativo impacto na qualidade de vida e aumento considerável dos custos envolvidos no tratamento (Berntorp et al., 2006; Valentino et al., 2015).

O conhecimento acerca da etiopatogenia, classificação, manifestações clínicas, complicações e das modalidades de tratamento das hemofilias é de fundamental importância para o planejamento e execução de procedimentos invasivos, como exodontias, neste grupo de pacientes (Levy et al., 2018).

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2.1.1.2 Doença de von Willebrand

A Doença de von Willebrand (DvW) é a coagulopatia hereditária mais comum em diferentes populações humanas (Pasi et al., 2004). Sua causa está relacionada à deficiência qualitativa e/ou quantitativa do FvW (Sadler, 1994).

A DvW afeta ambos os sexos e é resultado de mutações no gene codificador do FvW, localizado na porção 12 do braço curto do cromossomo 12 (Sadler, 1994). Diferentemente das hemofilias, seu padrão de herança pode ser autossômico dominante (tipos 1, subtipos 2A e 2B) ou recessivo (subtipo 2N e tipo 3) (BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006).

O FvW é uma proteína adesiva multifuncional que apresenta papel regulatório crítico do sistema hemostático, com sítios de ligação ao colágeno, às glicoproteínas plaquetárias e ao FVIII da coagulação (Montgomery & Flood, 2016). O FvW tem duas funções principais: 1. os polímeros maiores do FvW são necessários à adesão normal das plaquetas ao subendotélio nos locais de lesão da parede vascular; 2. os polímeros de todos os tamanhos do FvW participam da síntese, liberação e da formação de complexos estáveis com o FVIII no plasma sanguíneo (Sharma & Flood, 2018). Portanto, duas coagulopatias hereditárias são capazes de causar alterações nos níveis plasmáticos do FVIII: hemofilia A e DvW (Longo, 2015).

O diagnóstico da DvW leva em consideração dados do histórico familiar e de episódios de sangramento já manifestados, além de testes laboratoriais confirmatórios e discriminatórios (BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006). Classicamente, os pacientes que apresentam sangramentos recorrentes e/ou histórico familiar positivo para a DvW são submetidos à dosagem do FvW (FvW:Ag) e à investigação da atividade coagulante do FVIII (FVIII:C) e do FvW via cofator ristocetina (FvW:Rco) (Budde et al., 2002). Exames discriminatórios podem ser realizados, como a agregação plaquetária induzida por ristocetina, a análise multimérica do FvW e ensaios de ligação entre o FvW e FVIII (FvW:FVIIIB) e entre o FvW e o colágeno (FvW:CB – Collagen Binding

Assay) (Sharma & Flood, 2018).

A DvW apresenta 07 subtipos, que podem ser classificados em defeitos quantitativos e qualitativos (Sadler, 1994):

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Defeitos quantitativos:

➢ Tipo 1 – Deficiência quantitativa parcial do FvW associada a

quadros de sangramento leve/moderado;

➢ Tipo 3 – Deficiência quantitativa grave do FvW associada a níveis

plasmáticos extremamente reduzidos do FVIII.

Defeitos qualitativos:

➢ Tipo 2, subtipo A (2A) – Deficiência qualitativa do FvW associada com a ausência de polímeros de alto e médio peso molecular; ➢ Tipo 2, subtipo B (2B) – Deficiência qualitativa do FvW caracterizada

pelo aumento da ligação às plaquetas associada com a perda de polímeros de alto peso molecular e trombocitopenia leve;

➢ Tipo 2, subtipo M (2M) – Deficiência qualitativa do FvW

caracterizada por defeitos na interação com as plaquetas na presença de polímeros de alto peso molecular;

➢ Tipo 2, subtipo N (2N) – Deficiência qualitativa que resulta na

diminuição da afinidade do FvW pelo FVIII, com subsequente redução dos níveis plasmáticos de FVIII;

➢ Tipo plaquetário – Excessiva interação plaqueta-FvW, com

subsequente remoção precoce dos polímeros funcionais do FvW e das plaquetas, caracterizado por um quadro de trombocitopenia e doença hemorrágica;

O tipo 1 da DvW é o mais prevalente na população, correspondendo a 85% dos casos diagnosticados, seguido pelo Tipo 2 e seus subtipos (Robertson et al., 2008). O Tipo 3 é o mais raro de ser encontrado, e afeta cerca de 1/1.000.000 de indivíduos (Nichols et al., 2008).

No Brasil, apenas 21,86% dos pacientes portadores da DvW apresentam diagnóstico de subtipo, dos quais 71,42% possuem o Tipo 1, 9,25% o Subtipo 2A, 4,31% o Subtipo 2B, 2,09% o Subtipo 2N, 0,42% o Subtipo 2M, 7,92% o Tipo 3 e 0,21% o Tipo plaquetário (BRASIL, Perfil das coagulopatias hereditárias no Brasil, Ministério da Saúde, 2017).

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As manifestações hemorrágicas mais frequentes na DvW incluem a presença de sangramentos mucocutâneos excessivos e prolongados em feridas triviais, hematomas, epistaxe, menorragia, sangramento gengival e após procedimentos cirúrgicos, como exodontias (Sharma & Flood, 2018). Crianças e adultos jovens que apresentam a forma leve da doença, mas que não experimentaram desafios hemostáticos significativos, podem não possuir história prévia de sangramentos (Montgomery & Flood, 2016). Tipicamente, apenas pacientes diagnosticados com o Tipo 3 apresentam sangramento musculoesquelético espontâneo, como observado nas formas graves das hemofilias, devido aos níveis baixos de FVIII (Robertson et al., 2008).

As duas principais modalidades de tratamento para a DvW incluem o uso do DDAVP e de concentrados de fatores de coagulação contendo FVIII e FvW (concentrado FVIII/FvW) (Goodeve & James, 2018). Pacientes com DvW do Tipo 1 são os melhores candidatos a utilizar o DDAVP (BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006). Para estes pacientes, o DDAVP deve ser previamente testado e, havendo resposta terapêutica, poderá ser utilizado no tratamento de sangramentos leves/moderados, ou no preparo pré-cirúrgico de cirurgias de pequeno e médio porte (Miesbach & Berntorp, 2017). O DDAVP é ineficaz para pacientes com DvW do Tipo 3, e para a maioria dos Subtipos 2, que devem ser tratados com a reposição de concentrados FVIII/FvW (Robertson et al., 2008).

Assim como nas hemofilias, a prevenção de complicações hemorrágicas associadas a procedimentos invasivos em portadores da DvW requer um adequado planejamento, que deve levar em consideração a classificação da coagulopatia, a terapia de reposição utilizada e a associação de métodos hemostáticos locais (Hsieh et al., 2017).

2.2 EXODONTIAS EM PACIENTES PORTADORES DE COAGULOPATIAS HEREDITÁRIAS

Procedimentos invasivos na cavidade bucal são amplamente realizados na rotina de tratamento odontológico. A maior parcela destes procedimentos compreende as exodontias, que normalmente estão associadas a sangramentos pós-cirúrgicos

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autolimitantes em indivíduos saudáveis (Hewson et al., 2011). Entretanto, em pacientes portadores de coagulopatias hereditárias (PCH), até mesmo procedimentos odontológicos invasivos menores podem precipitar sangramentos excessivos e prolongados, com significativo impacto na qualidade de vida destes pacientes (Kouides, 2005)

É comum que alguns pacientes PCH evitem buscar tratamento odontológico devido à preocupação com o potencial risco de sangramentos secundários às exodontias (Hsieh et al., 2017). Esta situação provavelmente resultará na necessidade de cuidados emergenciais em situações de dor, que geralmente poderá requerer procedimentos mais complexos e invasivos, com maior risco de sangramento (Hewson et al., 2011).

A preocupação com episódios de sangramento secundários às exodontias também é frequente entre Hematologistas e Cirurgiões Dentistas envolvidos nos cuidados médicos-odontológicos de pacientes PCH (Hsieh et al., 2017). Episódios de sangramento na cavidade bucal destes pacientes comprometem a cicatrização da ferida cirúrgica, predispõem a infecções secundárias e atrasam a conclusão do tratamento odontológico, com significativo impacto na qualidade de vida dos pacientes (Rakocz et al., 1993; Hewson et al., 2011). Além disso, há um aumento considerável dos custos associados ao tratamento em decorrência do maior consumo de concentrados de fatores da coagulação, da necessidade de novas consultas e do recrutamento de diversos profissionais de saúde envolvidos na atenção interdisciplinar aos pacientes (Abed & Ainousa, 2017).

A frequência e a gravidade dos episódios de sangramento na cavidade bucal de pacientes PCH submetidos a exodontias pode variar em decorrência de fatores sistêmicos e locais (van Galen et al., 2015). Os principais fatores sistêmicos capazes de modular os sangramentos incluem a doença de base e a TRFC utilizada (Bajkin et al., 2012). Já os fatores locais associam-se predominantemente às características da exodontia, como o número de dentes extraídos, a necessidade de confecção de retalhos mucosos ou da remoção de osso, além da presença de processos inflamatórios e/ou infecciosos no sítio cirúrgico (van Galen et al., 2015; Hsieh et al., 2017).

A atividade fibrinolítica presente na cavidade bucal também é considerada um importante fator capaz de modular a incidência de sangramentos secundários às

(31)

exodontias (Sindet-Pedersen et al., 1987a). Sua atividade exacerbada na cavidade bucal está ligada à produção e liberação fisiológica de ativadores de plasminogênio tecidual (t-PA) pelas glândulas salivares maiores e pelas células epiteliais descamadas da mucosa bucal (Kjaeldgaard & Kjaeldgaard, 1986; Kjaeldgaard & Kjaeldgaard, 1987; Sindet-Pedersen et al., 1987a; Sindet-Pedersen et al., 1990). A elevada atividade do t-PA na saliva resulta na clivagem precoce da proenzima plasminogênio em plasmina, com subsequente início da fibrinólise do coágulo sanguíneo recém-formado (Virtanen et al., 2006).

Altas concentrações do t-PA também foram detectadas no fluido crevicular gengival (Lamster & Novak, 1992), especialmente em vigência da doença periodontal (Kinnby et al., 1994; Kinnby et al., 1996; Yin et al., 2000; Kardeşler et al., 2011) e após a extração de terceiros molares mandibulares intraósseos (Gersel-Pedersen, 1979; Schatz et al., 1987). Nestas condições, a fibrinólise local foi capaz de agravar a inflamação gengival, acelerar a destruição dos tecidos periodontais e reduzir o potencial de reparação tecidual (Catellani, 1979; Olofsson et al., 2003).

Em 2009, Basso avaliou a atividade fibrinolítica no plasma, na saliva e no sangue alveolar de pacientes anticoagulados submetidos a exodontias. Uma maior atividade fibrinolítica foi encontrada no sangue alveolar quando comparado ao plasma e à saliva. Este achado foi correlacionado ao nível de inflamação gengival e ao trauma cirúrgico no sítio da exodontia, sugerindo uma possível relação entre os efeitos inflamatórios locais e a atividade fibrinolítica na cavidade bucal.

Considerando-se a complexidade envolvida na obtenção da hemostasia após exodontias em pacientes PCH, além das complicações provenientes dos episódios de sangramento e do uso recorrente da TRFC, a busca por métodos hemostáticos complementares tornou-se tema recorrente no cuidado interdisciplinar das coagulopatias hereditárias (Anderson et al., 2013; Rea et al., 2014).

Neste contexto, a terapia antifibrinolítica desponta como um método eficaz, seguro e de baixo custo para a prevenção e tratamento de episódios de sangramento em pacientes PCH (Hermans et al., 2011).

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2.3 A TERAPIA ANTIFIBRINOLÍTICA

A dissolução precoce da fibrina em condições onde há uma fragilidade estrutural na sua formação, ou em condições de hiperfibrinólise, pode ser prevenida e/ou minimizada pelo uso da terapia antifibrinolítica (Levy et al., 2018).

Revisões sistemáticas e estudos de metanálise comprovaram a eficácia da terapia antifibrinolítica tanto para a profilaxia como para o tratamento de sangramentos, com impacto na redução do uso de hemoderivados e na diminuição dos custos associados a procedimentos cirúrgicos em diferentes cenários clínicos (Roos et al., 2003; Gurusamy et al., 2011; Henry et al., 2011; Ker et al., 2013; Martin-Hirsch et al., 2013; Novikova et al., 2015; van Galen et al., 2015; McNicol et al., 2016; Estcourt et al., 2016; Montroy et al., 2018).

2.3.1 Agentes antifibrinolíticos

A descoberta dos agentes antifibrinolíticos ocorreu no começo da década de 1950, quando experimentos revelaram que o aminoácido lisina foi capaz de inibir seletivamente a ativação do plasminogênio (Levy et al., 2018). Desde então, três fármacos com ação antifibrinolítica foram desenvolvidos para uso em humanos: 1. Ácido épsilon-aminocapróico (EACA); 2. Aprotinina; 3. Ácido Tranexâmico (ATX) (Henry et al., 2011).

O EACA é um inibidor sintético da ativação do plasminogênio (Levy et al., 2018) e foi o primeiro agente antifibrinolítico amplamente utilizado na prática clínica após traumas ou cirurgias (Estcourt et al., 2016). Seu uso é indicado em condições de fibrinólise exacerbada, como após a isquemia e reperfusão dos tecidos relacionada ao uso da circulação extracorpórea em cirurgias cardíacas (Dhir, 2013). O uso do EACA apresentou baixo custo e boa eficácia sob doses elevadas, e seus principais efeitos adversos incluíram náusea, hipotensão, arritmias cardíacas, rabdomiólise e insuficiência renal (Manjunath et al., 2002).

A aprotinina é um inibidor de protease de amplo espectro extraído do tecido pulmonar bovino (Donahue & Price, 2002), e é considerada o mais potente agente antifibrinolítico disponível (Levy et al., 2018). A aprotinina apresenta a maior meia-vida

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plasmática entre os agentes antifibrinolíticos e consegue inibir reversivelmente a ação de diversas proteases presentes no plasma sanguíneo, como a tripsina, plasmina, calicreína e a elastase (Mojcik & Levy, 2001). Apesar da sua alta efetividade, questões relacionadas à sua segurança, como as elevadas taxas de óbito registradas após o seu uso em cirurgias cardíacas, fizeram com que a comercialização da aprotinina fosse suspensa pela maioria das agências regulatórias internacionais em 2008 (Fergusson et al., 2008).

Assim como o EACA, o ATX também é um análogo sintético da lisina (Tengborn et al., 2015). O ATX é formado pelo aminoácido trans-ácido 4-amino-metil-ciclohexano carboxílico, que possui forte atração pelo sítio de ligação da lisina ao plasminogênio por um mecanismo de competição farmacológica (Figura 1). Sua ação bloqueia a interação do plasminogênio com a fibrina e inibe de forma reversível o processo de fibrinólise (Dunn & Goa, 1999; Cada & Levien, 2010).

Figura 1 – Esquema ilustrativo do mecanismo de competição farmacológica

utilizado pelo ATX para inibir a dissolução da fibrina.

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O ATX foi considerado de seis a dez vezes mais potente que o EACA, e apresentou uma sustentação mais efetiva da atividade antifibrinolítica nos tecidos (Melander et al., 1965; Dunn & Goa, 1999). Sua maior tolerabilidade e segurança clínica fizeram com que se tornasse o agente antifibrinolítico mais prescrito nos dias atuais (Tengborn et al., 2015; Levy et al., 2018).

2.3.2 Ácido tranexâmico – um antigo e ainda importante inibidor da fibrinólise

Descoberto em 1962 por Okamoto & Okamoto, o ATX foi extensivamente estudado como método hemostático adjuvante em situações de trauma ou em procedimentos cirúrgicos, onde a fibrinólise local e/ou sistêmica constituem-se como fatores atuantes para a manutenção do quadro de sangramento (Dunn e Goa, 1999; McCormack, 2012, Tengborn et al., 2015; Levy et al., 2018).

Estudos randomizados controlados e meta-análises demonstraram que o ATX apresenta resultados superiores quando comparado ao uso de placebo em desfechos clínicos importantes, como na morte por eventos hemorrágicos, na incidência de sangramento pós-cirúrgico e na necessidade de transfusões sanguíneas (Laupacis & Fergusson, 1997; Wong et al., 2010; Ghandi et al., 2013; Ker et al., 2013; Roberts et al., 2013; Das et al., 2015).

A capacidade de melhorar a estabilidade na formação do coágulo sanguíneo através da inibição da fibrinólise fez com que o ATX fosse rapidamente introduzido como medida hemostática adjuvante para a profilaxia e tratamento de episódios de sangramento em pacientes PCH (Tengborn et al., 2015). Desde então, diretrizes preconizadas pelas principais organizações de cuidados aos pacientes PCH recomendam o uso do ATX isolado, ou em associação à TRFC, previamente a procedimentos cirúrgicos neste grupo de pacientes (Pasi et al., 2004; Brewer & Correa, 2005; BRASIL, Manual de Atendimento Odontológico a Pacientes com Coagulopatias Hereditárias, Ministério da Saúde, 2005; BRASIL, Manual de tratamento das coagulopatias hereditárias, Ministério da Saúde, 2006; BRASIL, Hemofilia congênita e inibidor: manual de diagnóstico e tratamento de eventos hemorrágicos, Ministério da Saúde, 2008; Srivastava et al., 2013; BRASIL, Manual de

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hemofilia, Ministério da Saúde, 2015; BRASIL, Manual das coagulopatias hereditárias raras, Ministério da Saúde, 2015).

A posologia recomendada para o uso do ATX pode variar de acordo com a topografia e a extensão do procedimento cirúrgico, com a doença de base, presença de insuficiência renal e risco à trombose (Dunn e Goa, 1999). A somatória desses fatores contribui para a divergência dos protocolos descritos na literatura acerca da posologia e vias de administração do ATX (McCormack, 2012).

Estudos demonstraram que após a administração por via endovenosa de 10 mg/Kg de ATX, a maior concentração plasmática foi obtida em menos de 60 minutos (Andersson et al., 1965), com uma meia-vida plasmática entre 80-120 minutos (Pilbrant et al., 1981; McCormack, 2012). A excreção do ATX é predominantemente renal e a sua excreção terminal ocorreu em até oito horas após a administração por via endovenosa (Pilbrant et al., 1981).

Após a administração por via oral de 10mg/Kg, o ATX foi rapidamente absorvido, independentemente da ingestão concomitante com alimentos (Pilbrant et al., 1981), e apresentou uma biodisponibilidade de 33% (McCormack, 2012). A máxima concentração plasmática após a sua administração por via oral foi observada em 120-180 minutos (Eriksson et al., 1971), com meia-vida de eliminação de 120 minutos e excreção terminal em até onze horas (McCormack, 2012).

O ATX foi capaz de difundir-se no meio intracelular e extracelular (Dunn & Goa, 1999), e atravessou as barreiras hematoencefálica (Tovi & Tulin, 1972) e placentária (Kullander & Nilsson, 1970). O ATX também pôde ser encontrado no líquido sinovial de articulações (Ahlberg et al., 1976) e em baixas concentrações no leite materno (Eriksson et al., 1971). Na saliva, a presença do ATX não foi detectada após a administração por via oral de 1 grama do medicamento (Sindet-Pedersen, 1987b). Trabalhos in vitro e in vivo, demonstraram que a concentração plasmática mínima necessária para o ATX inibir efetivamente a fibrinólise nos tecidos deve estar entre 5-15 mg/L (Benoni et al.,1995; Fiechtner et al., 2001).

A presença de efeitos adversos relacionados à terapia com o ATX é relativamente incomum e na maioria dos casos incluiu sintomas gastrointestinais leves dose-dependentes (Preston et al., 1995). Em raras ocasiões o uso do ATX foi associado à necrose cortical renal (Koo et al., 1999; Odabas et al., 2001), reações

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ortostáticas (Vermylen et al., 1968), alterações visuais (Kitamura et al., 2003) e à oclusão da artéria central da retina (Wijetilleka et al., 2017).

A principal preocupação relacionada ao uso do ATX ainda reside em seu potencial efeito trombogênico (Henry et al., 2011; Sawamura et al., 2009; Roberts et al., 2013; Tengborn et al., 2015), já demonstrado em trabalhos in vitro (Eisenberg et al., 1988; Winters et al., 1991) e in vivo (Eisenberg & Miletich, 1989). A explicação para um maior risco trombótico incorre no uso da terapia antifibrinolítica em quadros clínicos onde há um aumento da ação protrombótica relacionada à extensiva ativação do plasminogênio e das plaquetas (Eisenberg et al., 1988). Todavia, uma maior taxa de eventos tromboembólicos não foi reportada em diversos trabalhos randomizados controlados (Berntorp et al., 2001; Sukeik et al., 2011; Ross et al., 2012; Roberts et al., 2013).

Em pacientes com hemofilia e inibidores que necessitam do tratamento com agentes bypassing para o controle de sangramentos, a recomendação para o uso da terapia antifibrinolítica com o ATX é tema controverso na literatura científica (Holmström et al., 2012; Srivastava et al., 2013; Tran et al., 2013). A combinação da inibição da fibrinólise com uma maior geração de trombina secundária ao uso de agentes bypassing pode conferir a estes pacientes um maior risco para o desenvolvimento de eventos tromboembólicos (Windyga et al 2016).

É nesse cenário que o uso tópico do ATX desponta como uma alternativa promissora para o controle local da hemostasia, sem gerar uma absorção sistêmica significante (Ker et al, 2013). Em procedimentos cirúrgicos extensos, como em artroplastias de joelho ou em cirurgias ortopédicas para substituição de quadril, o uso tópico do ATX foi efetivamente utilizado como método hemostático adjuvante (Almer et al., 1992; Wong et al., 2010; Montroy et al., 2018). Nestas condições, o uso tópico do ATX foi capaz de reduzir as taxas de sangramento pós-cirúrgico de forma equivalente ao seu uso sistêmico, com a vantagem de não induzir a um estado de hipercoagulabilidade (Ker et al., 2013; Montroy et al., 2018).

Na Odontologia, o uso do ATX por via tópica ou sistêmica vem sendo extensivamente reportado por diversos autores há mais de quatro décadas (Forbes et al., 1972; Ramström et al., 1989; Sindet-Pedersen & Stenbjerg, 1986; Ramstrom et al., 1989; Sindet-Pedersen et al., 1989; Borea et al., 1993; Ramstrom et al., 1993; Waly, 1995; Senghore & Harris, 1999; Zanon et al., 2000; Carter et al., 2003; Lee et

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al., 2005; Coetzee, 2007; Ripollés-de Ramón et al., 2013; Nuvvula et al., 2014; Peisker et al., 2014; Soares et al., 2015; Queiroz et al., 2018).

Em pacientes PCH, existe a recomendação para que o ATX seja administrado por via oral, 24 horas antes da realização de procedimentos odontológicos invasivos, e mantido por até 07 dias no período pós-cirúrgico (BRASIL, Manual de Atendimento Odontológico a Pacientes com Coagulopatias Hereditárias, Ministério da Saúde, 2005; van Galen et al., 2015).

Outras formas farmacêuticas do ATX podem ser utilizadas topicamente na cavidade bucal após procedimentos invasivos odontológicos (Figura 2). Soluções parenterais foram utilizadas com sucesso através de bochechos (Sindet-Pedersen & Stenbjerg, 1986; Sindet-Pedersen, 1987b; Senghore & Harris, 1999), pela irrigação do alvéolo dental (Anand et al., 2015), ou embebidas em gaze e comprimidas localmente após exodontias (Queiroz et al., 2018). Comprimidos foram macerados e dissolvidos em água para a realização de bochechos (Coetzee, 2007), ou ainda macerados e misturados com solução de cloreto de sódio a 0,9% para formação de pasta a ser colocada no interior do alvéolo dental (Gersel-Pedersen, 1979), ou sobre a ferida cirúrgica (Figura 3) (BRASIL, Manual de Atendimento Odontológico a Pacientes com Coagulopatias Hereditárias, Ministério da Saúde, 2005).

(38)

Figura 3

Fonte: Ambulatório de Odontologia do Hemocentro de Campinas/UNICAMP.

Exemplo de uso tópico do ATX após exodontia. Neste caso foi confeccionado um macerado a partir de 02 comprimidos (total de 500 mg) diluídos em NaCl 0,9%, que foi aplicado sobre o sítio cirúrgico.

Fonte: Imagem do próprio autor.

Figura 2 – Diferentes formas farmacêuticas do ATX. Da esquerda para direita: solução

(39)

Ripollés-de Ramón et al., (2013) utilizaram uma nova formulação tópica do ATX como método hemostático adjuvante para exodontias em pacientes anticoagulados. Os autores avaliaram a eficácia e efeitos locais sobre a cicatrização da ferida cirúrgica após o uso do ATX apresentado sob a forma de gel bucal bioadesivo a 8%. Os resultados demonstraram que o uso tópico do ATX em gel bucal bioadesivo a 8% após exodontias foi capaz de favorecer os processos locais de coagulação e cicatrização nas primeiras 48-72 horas do período pós-cirúrgico (Ripollés-de Ramón et al., 2013).

Apesar do promissor papel do uso tópico do ATX como método hemostático adjuvante para exodontias, pouco se sabe sobre a absorção sistêmica gerada após o seu contato com a mucosa bucal e sobre os efeitos locais gerados sobre o processo de cicatrização da ferida cirúrgica pelo uso tópico das apresentações comerciais disponíveis.

(40)

3 PROPOSIÇÃO

3.1 OBJETIVO GERAL

➢ Avaliar a eficácia e segurança do uso tópico versus sistêmico do ácido tranexâmico (ATX) como terapia hemostática adjuvante para exodontias em pacientes portadores de coagulopatias hereditárias.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

➢ Avaliar a incidência de desfechos clínicos no período pós-cirúrgico, como episódios de sangramento, processo de cicatrização local da ferida cirúrgica e eventos adversos;

➢ Identificar e quantificar o ATX em plasma e saliva após o seu uso tópico versus sistêmico.

(41)

4 MÉTODOS

4.1 DESENHO DO ESTUDO

Este foi um ensaio clínico de tratamento fase III, prospectivo, paralelo, com dois braços, randomizado controlado, aberto e multicêntrico.

4.2 LOCAL DO ESTUDO

Para a fase clínica do estudo, a triagem dos participantes foi realizada de forma simultânea nas seguintes instituições:

a) Centro coordenador: Ambulatório de Odontologia do Hemocentro de Campinas, Centro de Treinamento Internacional em Hemofilia (IHTC “Cláudio Luiz Pizzigatti Correa”), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas, São Paulo;

b) Instituição coparticipante: Serviço de Estomatologia e Odontologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP), Universidade de São Paulo (USP), Ribeirão Preto, São Paulo.

Para a fase laboratorial do estudo, a filtragem das amostras ocorreu nas dependências do Laboratório de Biologia Molecular do Departamento de Patologia Oral, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP/UNICAMP), Piracicaba, São Paulo. A análise metabolômica das amostras foi realizada no Laboratório Nacional de Biociências do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBio/CNPEM), Campinas, São Paulo.

4.3 POPULAÇÃO E AMOSTRA

4.3.1 Critérios de inclusão

Os seguintes critérios foram adotados para a inclusão de participantes neste estudo:

(42)

a) Indivíduos de ambos os sexos com idade ≥ 18 anos; b) Ser portador de coagulopatia hereditária;

c) Possuir cadastro e seguir em acompanhamento clínico pela equipe de Médicos hematologistas em uma das instituições participantes do estudo;

d) Apresentar indicação precisa para exodontia(s).

4.3.2 Critérios de exclusão

Os seguintes critérios foram adotados para a exclusão de participantes neste estudo:

a) Não concordar em assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE (Apêndice 1);

b) Ser incapaz de dar o próprio consentimento por razões psiquiátricas e/ou mentais;

c) Possuir idade < 18 anos; d) Ser edêntulo total;

e) Mulheres gestantes ou puérperas; f) Apresentar risco para trombose;

g) Apresentar hematúria macroscópica nos últimos 6 meses;

h) Apresentar aloanticorpos inibidores para concentrados de FVIII ou FIX da coagulação (≥ 0,6 UB);

i) Apresentar hipersensibilidade ao ATX, e/ou ao anestésico local utilizado neste estudo;

j) Ter utilizado o ácido acetilsalicílico, ou antiinflamatórios não-esteróides (AINES) nas últimas duas semanas que antecederam a exodontia.

4.3.3 Considerações éticas

Este estudo atendeu às exigências éticas e científicas fundamentais preconizadas pela resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde para

(43)

pesquisas envolvendo seres humanos e foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) da FCM/UNICAMP – parecer n. 2.584.313, CAAE: 27173414.4.1001.5404 (Anexo 1), do HCFMRP/USP – parecer n. 2.600.519, CAAE: 27173414.4.3001.5440 (Anexo 2) e da FOP/UNICAMP – parecer n. 2.599.432, CAAE: 27173414.4.3002.5418 (Anexo 3). Após a leitura e explanação de seu conteúdo, todos os participantes assinaram o TCLE previamente à sua inclusão no estudo. Os participantes ainda receberam seguimento clínico regular, através de consultas de retorno, para a finalização de seu tratamento odontológico.

Em concordância com a resolução da ANVISA – RDC 36/2012 (BRASIL, 2002), este estudo foi aprovado e divulgado publicamente pelo Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos/ReBEC (identificador primário RBR-2jx9r5) e identificado na

International Clinical Trials Registry Platform (ICTRP) da Organização Mundial de

Saúde (OMS), sob número do UTN (Universal Trial Number) U1111-1206-4180. Este estudo foi contemplado em 2016 pelo Grant Bayer Hemophilia Awards

– Caregiver Award (Bayer HealthCare LLC). A empresa PharmaKin. Com. Cosm. Ltda

cedeu gratuitamente as bisnagas contendo o gel bucal bioadesivo de ATX a 8% (Kin Exogel®, PharmaKIN Com. Cosm. Ltda., São Paulo, SP, Brasil) utilizadas nos procedimentos cirúrgicos de exodontia alocados no grupo experimental.

(44)

4.4 O ENSAIO CLÍNICO

4.4.1 Técnica de randomização

Os participantes que preencheram os critérios de inclusão no estudo prosseguiram para uma consulta baseline conduzida pelos pesquisadores-executantes do centro coordenador ou da instituição coparticipante: Vinicius Rabelo Torregrossa (VRT) e Tatiane Cristina Ferrari (TCF), respectivamente. Para cada procedimento cirúrgico de exodontia executado, os participantes foram randomicamente alocados em um dos grupos do estudo. Caso algum participante apresentasse a necessidade de múltiplas exodontias, e houvesse a indicação de fracionamento dos procedimentos cirúrgicos em mais de uma consulta, cada novo procedimento seria igualmente randomizado e incluído no estudo sob anuência do participante e mediante nova assinatura do TCLE. Para estes casos foi aplicado um

washout1 mínimo de 15 dias.

A randomização permutada em blocos foi utilizada de modo a assegurar uma distribuição igualitária do número de participantes em ambos os grupos do estudo. O processo utilizado permitiu à randomização aleatória simples (cara ou coroa) em blocos de dez participantes. Desta forma, após um dos grupos atingir o número de cinco participantes, cada novo procedimento incluído no estudo era automaticamente alocado para o outro grupo até que um bloco de dez fosse completado, e então o processo era reiniciado.

Os procedimentos cirúrgicos de exodontia foram randomizados em dois grupos:

a) Grupo controle – foi prescrito o ATX (comprimidos de 250 mg) por via oral (15 mg/kg de peso) três vezes ao dia, durante 07 dias consecutivos, com início da terapia 24 horas antes da(s) exodontia(s) (Manual de Atendimento Odontológico a Pacientes com Coagulopatias Hereditárias, Ministério da Saúde, 2005);

b) Grupo experimental – após a(s) exodontia(s) foi recomendada a aplicação tópica do gel bucal bioadesivo de ATX na concentração de

1 “Washout”, ou período de repouso, é o tempo que o participante da pesquisa fica sem utilizar o medicamento que está sendo testado para que haja cessação de um possível efeito residual.

(45)

8% (Kin Exogel®, PharmaKIN Com. Cosm. Ltda., São Paulo, SP, Brasil) sobre a ferida cirúrgica. O gel foi mantido em posição com o auxílio de uma gaze estéril interposta entre os dentes por 30 minutos. Os participantes foram orientados a reaplicar o gel de ATX, como acima explicado, três vezes ao dia, durante 07 dias consecutivos;

4.4.2 Avaliação clínica pré-cirúrgica

Esta avaliação ocorreu na consulta baseline e consistiu na coleta de dados anamnésicos, exame dos tecidos moles e duros da cavidade bucal e solicitação de imagens radiográficas panorâmicas e/ou periapicais. Todos os participantes foram devidamente orientados quanto aos cuidados relativos à higiene bucal, que incluiu técnicas de escovação e uso do fio dental.

Os dados coletados foram preenchidos em ficha clínica específica elaborada para o estudo (Apêndice 2) e salvos em uma plataforma online segura (REDCap application - “Research Eletronic Data Capture” - http://project-redcap.org/).

4.4.2.1 Indicadores de saúde bucal

A condição de saúde bucal dos participantes foi avaliada através dos seguintes instrumentos:

a) CPO-D – Índice de dentes cariados, perdidos e obturados (Klein e Palmer, 1938); O CPO-D é um índice recomendado pela OMS para medir e comparar a experiência de cárie dentária nas populações. Este índice é avaliado através do exame clínico intrabucal com o auxílio de espelho clínico odontológico e sonda exploradora. Seu valor expressa a média de dentes cariados, perdidos e obturados em um grupo de indivíduos (OMS, 2013). Foram considerados como “cariados” os dentes que apresentaram evidências clínicas de descalcificação, com presença de cavidade visível em qualquer uma de suas faces (vestibular, lingual, mesial, distal e oclusal), dentes que apresentaram restaurações provisórias e/ou deficientes em suas margens e raízes residuais. Foram considerados como “restaurados”

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