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A fragilidade da prova testemunhal em face da presunção de veracidade

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UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

JEAN FRANCESCO ZARDIN WAGNER

A FRAGILIDADE DA PROVA TESTEMUNHAL EM FACE DA PRESUNÇÃO DE VERACIDADE

IJUÍ (RS) 2011

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JEAN FRANCESCO ZARDIN WAGNER

A FRAGILIDADE DA PROVA TESTEMUNHAL EM FACE DA PRESUNÇÃO DE VERACIDADE

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador (a): MSc. Patrícia Borges Moura

IJUÍ (RS) 2011

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Dedico este trabalho aos meus familiares e amigos que me auxiliaram e ampararam-me durante estes anos da minha caminhada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por guiar meus passos e fortalecer minha vida.

Aos meus pais, por seu amor incondicional.

A minha irmã, pelas alegrias que me proporciona todos os dias.

A minha orientadora, pela sua

dedicação, disponibilidade e zelo.

Aos meus mestres e colegas que colaboraram de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho, meu muito obrigado!

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“É pior cometer uma injustiça do que sofrê-la, porque quem a comete transforma-se num injusto e quem a sofre não.”

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RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica fez uma análise do sistema processual penal acusatório brasileiro, no intuito de demonstrar os princípios gerais aplicáveis às provas, para então identificar as garantias do acusado e fazer prosperar a verdade frente a uma decisão judicial. A prova tem como principal finalidade motivar o Julgador, indicando a existência daquela verdade alegada de forma precisa e coerente, buscando atingir os requisitos necessários para a aplicação de uma sanção estatal. Dentre os meios de comprovação dos fatos, destacou-se a prova testemunhal, a qual muitas vezes é incerta, falha e enganosa. Constatou-se que a consequência da presunção de verdade advém da influência negativa na subjetividade judicial de valoração da prova testemunhal, uma vez que sendo frágil o meio probatório, o mesmo pode acarretar decisões judiciais injustas.

Palavras-Chave: Direito Processual Penal. Prova testemunhal. Presunção de verdade.

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ABSTRACT

This research work has made a monographic analysis of Brazilian accusatory system of criminal procedure, in order to demonstrate the general principles applicable to the proof, and then identify the guarantees of the accused and to prosper the truth before a court. The proof has as main purpose to motivate the judge, indicating the existence of that alleged fact accurately and consistently, seeking to meet the requirements for the imposition of a state penalty. Among the means of verification of the facts, pointed to testimony, which sometimes is not unclear, misleading and fails. It was found that the effect of the presumption of truth comes from the negative influence about the judicial subjectivity of the evidence by witnesses, since the medium is weak evidence, it can lead to unfair judgments.

Keywords: Criminal Procedure Law. Testimonial evidence. Presumption of truth.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 09

1 A PROVA NO PROCESSO CRIMINAL ... 12

1.1 Sistemas processuais penais e o modelo acusatório no Brasil ... 12

1.2 Princípios processuais penais aplicáveis à prova ... 15

1.3 A verdade no processo penal – a visão garantista ... 18

1.4 Prova penal – conceito, importância e espécies ... 20

2 A FRAGILIDADE DA PROVA TESTEMUNHAL EM FACE DA PRESUNÇÃO DE VERACIDADE ... 25

2.1 Os motivos geradores do problema ... 25

2.2 A consequência da presunção de verdade e sua influência na subjetividade judicial de valoração da prova ... 30

2.3 Análise de casos jurisprudenciais ... 33

CONCLUSÃO ... 39

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa monográfica versa sobre a fragilidade da prova testemunhal em decorrência da presunção de veracidade. Busca delimitar os pontos negativos da estrutura probatória testemunhal, no intuito de analisar o problema da sua aplicação pelo Poder Judiciário e as reais consequências quando único meio capaz de se chegar à verdade.

A questão central é verificar se a prova testemunhal produzida perante o juízo criminal, a qual muitas vezes é utilizada como o principal meio de prova para a elucidação dos fatos, pode ser considerada frágil, tendo em vista que muitas pessoas faltam com a verdade em seus depoimentos, ou mesmo em razão da falibilidade da memória humana. Da mesma forma, pretende certificar se o julgador pode aferir os depoimentos testemunhais que trazem interesses outros que não sejam o esclarecimento dos fatos, uma vez que a testemunha é capaz de omitir ou modificar circunstâncias que levariam à verdade real de um caso concreto.

Quando a prova testemunhal perde sua consistência através de relatos precários e descabidos, não apresentando elementos suficientes para a convicção do juiz, consequentemente, tais provas serão prejudiciais tanto para a acusação como para a defesa, exceto se forem provas produzidas pela acusação, pois nesse caso, sua fragilidade estaria a beneficiar a defesa.

A presunção de que os homens narrem a verdade, muitas vezes, não leva em conta que o ser humano é emocional, sendo passível de erros e de vontade de

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beneficiar àquele mais próximo. Isto contrapõe a ideia de decisões judiciais justas e coerentes, modificando verdades impostas por situações inconsistentes.

O trabalho objetiva avaliar a fragilidade da prova testemunhal em face da sua presunção de verdade, buscando realizar uma análise da sua aplicação imediata, sem as precauções necessárias para a garantia da eficácia do meio probatório em análise, qual seja a prova testemunhal.

O tema mostra-se de extrema relevância para a sociedade, uma vez que uma prova testemunhal que assegure a verdade dos fatos trará a garantia plena do efetivo cumprimento de justiça requerido por todos. Neste sentido, o conhecimento obtido na elaboração desta pesquisa será de suma importância, pois sabendo das dificuldades enfrentadas na prova testemunhal haverá uma maior facilidade na sua compreensão e consequentemente na solução do problema.

A abordagem ao assunto será desenvolvida em dois capítulos. O primeiro responsável por delinear e realizar uma abordagem ampla do conteúdo a ser estudado: a prova no processo criminal, para uma melhor compreensão e localização da temática. O segundo diz respeito ao tema propriamente dito: a fragilidade da prova testemunhal em face da presunção de inocência, em que o conteúdo refere-se à pontuação dos problemas decorrentes dessa fragilidade e as possíveis soluções, tendo como base de verificação os casos jurisprudenciais existentes.

O primeiro capítulo divide-se em quatro itens: sistemas processuais penais e o modelo acusatório no Brasil; princípios processuais penais aplicáveis à prova; a verdade no processo penal – a visão garantista e a prova penal – conceito, importância e espécies.

O primeiro item busca esclarecer sobre os modelos processuais penais existentes e suas definições, enfocando o modelo acusatório utilizado pelo Brasil para demonstrar a vantagem processual do mesmo e seu funcionamento. O segundo item identifica os princípios norteadores das provas em matéria criminal visando alcançar as garantias processuais das partes envolvidas no processo.

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Ainda, o primeiro capítulo apresenta, em seu terceiro tópico a verdade no processo penal, esclarecendo o mito da verdade real e os limites ao poder judicial de valoração da prova. Como último item, o texto realiza a conceitualização da prova no processo criminal, demonstrando a sua importância e descrevendo as espécies de provas existentes no ordenamento jurídico brasileiro, dando ênfase à prova testemunhal.

O segundo capítulo divide-se em três itens: os motivos geradores do problema; a consequência da presunção de verdade e sua influência na subjetividade judicial de valoração da prova e a análise de casos jurisprudenciais.

O primeiro tópico apresenta os principais motivos e razões da fragilidade da prova testemunhal, fazendo uma breve descrição dos problemas que ocasionam a inconsistência da prova testemunhal. O segundo item elenca as consequências trazidas pela presunção de veracidade da prova testemunhal nos processos e demonstra a possível fragilidade das decisões judiciais baseadas tão somente na palavra das testemunhas.

Para finalizar o segundo capítulo, o terceiro tópico realiza a análise de casos jurisprudenciais, comprovando a existência de julgados obtidos com provas testemunhais presumidamente verdadeiras.

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1 A PROVA NO PROCESSO CRIMINAL

É por meio da prova que o processo criminal poderá ser resolvido com justiça, de forma a absolver ou condenar um acusado segundo a realidade fática, reproduzida no processo pelas alegações e respectivos elementos probatórios, a fim de se chegar o mais próximo possível da verdade. Para que essa solução seja alcançada é necessário que o processo siga o trâmite legal e garanta ao acusado os seus direitos.

A prova tem como principal finalidade fornecer elementos a formar a convicção do julgador, indicando a existência daquela “verdade” alegada de forma precisa e coerente, buscando atingir os requisitos para a aplicação de uma sanção estatal. Ressalta-se que as provas devem ser colhidas em observância aos princípios existentes e ao modelo processual penal em vigor.

1.1 Sistemas processuais penais e o modelo acusatório no Brasil

Com o surgimento do Direito Processual Penal, sobrevém a necessidade de organizar este novo ramo do direito e todos os seus conhecimentos em um sistema, para que efetivamente seja aplicado com todos os seus detalhes. No intuito de garantir a punição dos autores de delitos através da busca da verdade real, o sistema vem a ser o modelo utilizado na atividade jurisdicional para nortear todos os procedimentos e toda a produção de provas.

Os sistemas existentes são o inquisitório, no qual o julgador tem o papel de acusar e julgar; o acusatório, no qual o juiz irá apenas julgar; e o misto, que combina os dois sistemas anteriores. Historicamente, o sistema inquisitório foi imposto pelo Estado à sociedade de forma arbitrária, sendo que apenas com o passar dos anos as garantias processuais foram sendo enfocadas.

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O sistema inquisitório vem a ser o modelo no qual o juiz inicia suas funções acusando o réu e, ao final, julga o mesmo. Assim, Valter Kenji Ishida (2009, p. 19) caracteriza o sistema:

No processo inquisitório, a autoridade (inquisidor) assume a persecução desde a apuração até o julgamento, abrangendo ainda as funções de acusador e julgador. O direito de defesa é limitado, sendo a defesa meramente decorativa. Não há publicidade (no processo penal, fora o sigilo previsto no art. 20 do CPP, a regra é a publicidade). A falta de publicidade leva a uma instrução escrita. O acusado é objeto do processo e não parte do processo. A confissão é a rainha das provas.

No sistema acusatório há a divisão de funções, sendo o juiz o responsável apenas por julgar, a acusação fica a cargo do acusador e o réu tem o direito à sua defesa. Nesse sistema, na atualidade, as garantias constitucionais proporcionam um processo justo, teoricamente livre de qualquer pré-julgamento do juiz. Gilberto Thums (2006, p. 237) conceitualiza o tema:

Pode-se designar o sistema acusatório como um complexo de normas e princípios fundamentais ordenamente dispostos a partir de um princípio basilar, que é o princípio acusatório. Baseia-se na divisão de tarefas nas persecução penal, apresentando um acusador, um defensor e um órgão julgador. Todos independentes e com clara definição de seus papéis, estando as partes em posição de igualdade.

O terceiro sistema, nomeado misto, integra as garantias do sistema acusatório e o poder de inquisição do julgador, dividindo-se o processo em duas fases e adaptando características próprias para cada uma destas fases. Ishida (2009, p. 20) descreve:

O sistema misto é uma combinação da forma inquisitória com a forma acusatória (instalação posterior do contraditório). É uma adaptação e provém da Revolução Francesa. Desenvolve-se de maneira escalonada e bipartida. A primeira fase, a instrutória, é secreta, escrita e presidida por um juiz armado de poderes inquisitivos. Na segunda fase, a contraditória, admite-se o amplo exercício do direito de defesa.

O processo penal brasileiro admite como sistema o acusatório, cabendo ao juiz decidir a lide com as provas trazidas ao processo, seja pela defesa ou pela acusação, da qual o órgão do Ministério Público é incumbido. Apesar de muitas vezes tal sistema apresentar falhas, deixando que as garantias constitucionais do

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réu passem despercebidas, é o modelo acusatório o ideal para a sociedade brasileira, devendo ser utilizado de forma sábia pelos lidadores do Direito.

Para que o sistema acusatório produza os devidos efeitos, o processo penal brasileiro adota a fase policial, a qual é responsável pela realização de diligências e coleta de informações acerca do fato criminoso e antecede a fase judicial, visando à imparcialidade do juiz, na medida em que este não participa de tal produção. No primeiro momento, a autoridade policial busca elucidar o fato delituoso e sua provável autoria e poderá indiciar aquele que acredita ser o autor do fato, levando ao conhecimento do Ministério Público, que analisará a autoria e a materialidade do delito, tomando as medidas cabíveis e encaminhando o processo à esfera judicial, caso entenda haver justa causa para uma acusação formal.

Geraldo Prado (2006, p. 173), ilustra sobre a realização da fase policial:

Assim, faz-se necessária, antes da propositura da ação penal condenatória, qualquer que seja ela, a realização de uma investigação criminal, que a rigor demanda a instauração de inquérito policial ou peças de informação (artigos 5° e 27 do Código de Processo Penal), visando reunirem-se indícios de autoria e prova razoável da existência da infração penal. Pelas leis vigentes, o inquérito policial, quase sempre um procedimento de natureza jurídica administrativa, é dirigido pela autoridade policial encarregada do exercício da atividade de polícia judiciária (artigo 144, § 1°, inciso IV, e § 4°, da Constituição da República), enquanto as peças de informação, de caráter oficial, tem lugar em crime de ação pública, quando a notícia da infração penal é levada diretamente e por escrito ao conhecimento do Ministério Público.

O inquérito policial não é contraditório, contando apenas com atos de investigação e não atos de prova propriamente dita, tendo a defesa conhecimento das provas produzidas na fase judicial, fazendo com que o acusado, muitas vezes, não possua um tratamento igualitário como parte no processo.

Apesar da existência do inquérito policial, considerado por muitos autores como inquisitório, é através da distribuição de funções que o sistema acusatório busca assegurar de forma justa as garantias do réu, uma vez que nos outros sistemas, o Estado é a parte visivelmente mais forte. Paolo Tonini (2002, p. 16) explica:

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O sistema acusatório fundamenta-se em um princípio oposto, qual seja o princípio dialético. Considera-se que a verdade é acertada com mais eficácia se as funções processuais forem distribuídas entre sujeitos que têm interesses contrapostos. Ao juiz imparcial incumbe apenas decidir com base nas provas trazidas pela acusação e pela defesa. A escolha realizada pelo juiz entre as diversas reconstruções do fato histórico é estimulada por meio do contraditório entre sujeitos impulsionados por interesses contrapostos. Uma vez admitido o principio dialético, dele decorrem algumas consequências em matéria de prova.

Tonini (2002, p. 17) ainda descreve as consequências da divisão das funções com relação às provas:

Uma vez admitido o principio dialético, dele decorrem algumas consequências em matéria de prova. Os poderes de investigação, admissão, produção e valoração da prova não podem ser distribuídos a um único sujeito, ou seja, devem ser distribuídos entre o juiz, à acusação e à defesa, de modo que ninguém possa deles abusar. Nesse sistema, é indispensável a regulamentação da matéria da prova.

A escolha do modelo acusatório no Brasil como sistema processual penal busca dar ao acusado uma maior defesa, devendo as garantias constitucionais serem respeitadas e aplicadas ao processo. Evita-se o abuso do poder punitivo por parte do Estado, a quem cabe julgar de forma imparcial e, se cabível, impor e fazer cumprir a sanção.

1.2 Princípios processuais penais aplicáveis à prova

No intuito de adaptar os direitos almejados pela realização das provas, surgem os princípios norteadores, os quais poderão ser aplicados no caso concreto em meio à lacuna da lei ou mesmo visando a orientar e reger o processo ou, de forma restrita, o sistema probatório.

O princípio do livre convencimento motivado, previsto no art. 93, IX, Constituição Brasileira de 1988, é dirigido ao juiz, o qual deve fundamentar todas as suas decisões, embasando-as e limitando-as nos fatos trazidos ao processo através das provas colhidas no decorrer do mesmo. O julgador tem plena liberdade em

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valorar as provas, apreciando de forma pessoal o que está nos autos, mas sempre buscando sua convicção nas circunstâncias já impostas.

Outro princípio inerente à prova diz respeito à presunção de inocência, o qual prevê que o acusado não será considerado culpado dos fatos que venham a lhe ser imputados até o momento da sua condenação. Também tem assento constitucional, previsto no artigo 5º, LVII, Constituição Brasileira de 1988. Tida como uma garantia de quem está sendo processado, ou simplesmente investigado, a presunção de inocência imputa à acusação o dever de provar as alegações contra aquele, caso contrário, ou havendo dúvida, deverá ser concedida a absolvição do acusado.

Deste, decorre o princípio do in dubio pro reo, que também é considerado garantia constitucional por força do previsto no parágrafo 2º do art. 5º, que reconhece outros direitos e garantias reconhecidos em tratados internacionais dos quais o Brasil seja signatário. No caso, o Pacto de São José da Costa Rica (1969). prevê o aludido princípio, estabelecendo que em caso de dúvida, a decisão deve ser favorável ao réu.

Quando uma prova é juntada ao processo, pelo princípio do contraditório (art. 5º, LV, CB/88), ambas as partes deverão se manifestar nos autos, devendo ser dada a oportunidade das partes exercerem o seu direito de realizar a contraprova. O contraditório é o meio pelo qual as partes são cientificadas dos procedimentos realizados, podendo interferir conforme necessite.

Por sua vez, a ampla defesa (art. 5º, LV, CB/88) auxilia no uso das provas pelas partes, fazendo com que o sujeito processual possa buscar seu direito de forma ampla e, a princípio, sem restrições. São livres as partes para produzir qualquer prova em direito permitida. Assim, esta garantia constitucional disponibiliza uma maior consistência nas alegações apresentadas.

Para demonstrar a importância do contraditório, Cristina di Gesu (2010, p. 47) afirma que:

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O réu encontra-se na posição de hipossuficiente no processo, diante da dupla atuação do Estado, ora como parte através do Ministério Público, ora como poder atuante pelo órgão jurisdicional. Contudo, a aludida desigualdade é superada através da garantia do contraditório, essencialmente através da igualdade de oportunidades, da igualdade de tratamento, da simétrica paridade de armas.

Todas as provas, bem como a sua produção, respeitado o segredo de justiça, deverão ser públicas, é o que preceitua o princípio da publicidade (art. 5º, LX, CB/88), sobre a ótica de que os atos judiciais devem ser informadores do processo. Ainda, há de ser ressaltado o princípio da oralidade, no qual se embasam a maioria das provas dispostas no Código de Processo Penal. Nesse aspecto, preceitua Fernando Capez (2010, p. 382):

[...] deve haver a predominância da palavra falada (depoimentos, debates, alegações); os depoimentos são orais, não podendo haver a substituição por outros meios, como as declarações particulares. Como corolário desse princípio, decorrem outros dois subprincípios, quais sejam, o da imediatidade do juiz com as partes e com as provas e o da concentração.

Todas as provas levantadas no processo devem ser analisadas em conjunto pelo magistrado, contudo, de forma alguma uma prova irá prevalecer sobre outra, todas devem estar no mesmo nível para só então serem valoradas de forma diversa, se assim entender o julgador. Assim, com a motivação na decisão judicial, o direito pleiteado estará garantido ao final do processo.

Realizada a prova no processo criminal, mesmo que solicitada pela acusação ou pela defesa, elas deixam de pertencer a uma ou a outra. Pelo princípio da comunhão das provas, as mesmas passam a pertencer ao processo, podendo ser utilizadas por ambas as partes para formularem um juízo, o qual pode convencer o juiz. Da mesma maneira, as provas servem de base ao magistrado, que deve usar as mesmas para fundamentar sua decisão.

De acordo com Capez (2010, p. 382):

Princípio da aquisição ou comunhão da prova: isto é, no campo penal, não há prova pertencente a uma das partes; as provas produzidas servem a ambos os litigantes e ao interesse da justiça. As provas, na realidade, pertencem ao processo, até porque são destinadas à formação da convicção do órgão julgador.

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Sejam os princípios constitucionais, infraconstitucionais ou gerais do Direito, eles devem ser assegurados a todos os acusados, para que as provas realmente sejam elucidativas e aptas a esclarecer os fatos delituosos e alcançar uma verdade capaz de chegar a uma decisão justa.

1.3 A verdade no processo penal – a visão garantista

Vige no processo criminal brasileiro um sistema probatório que visa à verificação da verdade real dos fatos, reconstruindo através das provas colhidas, a sequência exata dos acontecimentos do caso concreto, no intuito de apresentar ao juiz a realidade de um passado. Sabe-se que a verdade plena, na maioria das vezes, é inalcançável, visto que o sistema é passível de erros, sejam humanos ou técnicos.

Sustenta Thums (2006, p. 197):

Adotar-se a verdade real como princípio processual revela um aspecto preocupante de índole tendenciosa do legislador, diante dos contornos imprecisos do conceito. O meio pelo qual se alcança a verdade, segundo os ditames definidos na legislação, representa uma pobreza científica atroz. Para o sistema inquisitório justifica-se qualquer diligência na busca da verdade, legitimando os poderes instrutórios do julgador. A hipervalorização do interrogatório e a dialética estabelecida entre a versão do réu com as demais provas vão formar uma “verdade”, a que se dá o rótulo de real, como se fosse um reflexo no espelho do fato ocorrido. Há, portanto, um erro conceitual inominável, que acaba sendo assimilado como mito ou dogma.

A verdade real é um mito, pois é inalcançável. No processo, não se deve permitir a busca da verdade a qualquer custo, até porque, do contrário, não haveria o respeito às garantias constitucionais, em especial se não se levar em conta que os fatos importantes ao direito são históricos e jamais vão ser trazidos à lide de forma ampla e minimalista. A reconstituição de um fato sempre será falha, na medida em que devemos contar com a presença de pessoas para identificar o que realmente ocorreu, e de sua memória, que com o tempo, torna-se insegura.

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No Brasil, a prova testemunhal é um dos principais meios de prova existentes, porém apresenta-se falha na busca da verdade dos fatos pretéritos, pois além de não fornecer dados técnicos que uma prova pericial poderia deduzir, conta-se com o diferencial da visão de cada ser humano, que enxerga com os seus olhos os fatos e faz a sua interpretação, não se importando com o restante dos acontecimentos que envolvem o fato.

Nesse sentido, Aury Lopes Jr. (2005, p. 263) leciona:

O crime é história, passado e, como tal, depende exclusivamente da memória de quem narra. A fantasia/criação faz com que o narrador preencha os espaços em branco deixados na memória com as experiências verdadeiras, mas decorrentes de outros acontecimentos. A imaginação colore a memória com outros resíduos.

Ainda, no entender de Lopes Jr. (2005, p. 264), as verdades trazidas ao processo pelas partes devem levar em consideração a sua forma de eleição, sendo que a verdade real entra em conflito consigo mesma, pois, a figura do juiz-ator, acaba sendo desmentida pelos pré-juízos ao caminhar junto com o sistema inquisitório.

Mesmo que a verdade real seja um mito, muitas vezes a verdade propriamente dita, também é debatida. Muitas provas ditas como verdades, são equivocadamente confundidas com meros indícios. As narrações das testemunhas nem sempre são plausíveis, levando a outro rumo as investigações e gerando a inconsistência da prova.

Nesse sentido, Luigi Ferrajoli (2002, p. 106) aduz:

Aos fins de nossa análise, é oportuno, antes de tudo, distinguir os fatos e os dados probatórios, segundo sejam experimentados direta ou indiretamente a indução do fato-delito. Afastando-me da linguagem corrente, proponho chamar de prova o fato probatório experimentado no presente, do qual se infere o delito ou outro fato do passado, e de indício o fato provado do passado, do qual se infere o delito ou outro fato do passado que, por sua vez, tenha o valor de um indício.

Pela lógica, vislumbra-se que os acontecimentos do fato devem ser interpretados, não há maneira de experimentá-los, tão pouco de adquirir uma

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certeza, restando analisar somente as consequências do fato através do meio probatório para se chegar a uma conclusão.

Outro fator relevante é o lapso temporal do fato até o momento da sentença judicial. Com o passar do tempo, a memória humana traz os esquecimentos, as idéias adquiridas anteriormente são transformadas pelos mais diversos motivos, e, consequentemente, as verdades inerentes ao fato também se desconstituem.

Destacando a influência negativa do tempo no meio probatório, Lopes Jr. (2005, p. 264) enfatiza que o binômio tempo/velocidade desempenha um relevante papel, não apenas pela memória que se perde com o passar do tempo, mas também porque os acontecimentos perdem-se.

A verdade não deve ser um simples princípio norteador da prova, tem que ser uma forma de garantir com eficiência a condenação de um acusado, a qual a culpa foi devidamente e amplamente provada ao longo de todo o processo através das provas carreadas nos autos, e a absolvição daquele a quem ainda restou dúvida acerca da sua culpa, talvez, pela ineficiência da prova testemunhal.

1.4 Prova penal – conceito, importância e espécies

As provas são os meios pelos quais serão elucidados os fatos do processo criminal para que o juiz possa julgar o caso concreto de forma precisa e coerente. É através dela que será buscada a verdade dos fatos, apurando a autoria e a materialidade do delito em questão, de forma a garantir os requisitos necessários para o prosseguimento do feito.

Aduz Nicola Framarino Dei Malatesta (1996, p. 19) que “sendo a prova o meio objetivo pelo qual o espírito humano se apodera da verdade, sua eficácia será tanto maior quanto mais clara, mais plena e mais seguramente ela induzir no espírito a crença de estarmos de posse da verdade.” Dessa forma, a prova é validada pelas

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pessoas simplesmente por elas acreditarem que estão resolvendo o problema da melhor forma possível.

A prova tem como principal finalidade motivar o juiz de direito, demonstrando a existência daquela verdade alegada pela parte. Utilizada para instruir o processo, ela é essencial para a constituição do direito, uma vez que pode levar o conhecimento de um fato pretérito até o julgador.

Nesse sentido, segundo Capez (2010, p. 342):

Sem duvida alguma, o tema referente à prova é o mais importante de toda a ciência processual, já que as provas constituem os olhos do processo, o alicerce sobre o qual se ergue toda a dialética processual. Sem provas idôneas e validas, de nada adianta desenvolverem-se aprofundados debates doutrinários e variadas vertentes jurisprudenciais sobre temas jurídicos, pois a discussão não terá objeto

Demonstrado brevemente o conceito e a importância das provas em matéria criminal, resta esclarecer as espécies de prova que podem ser colhidas para garantir que a instrução criminal seja eficiente e produza os efeitos esperados. Para cada situação específica, cabe a utilização de uma espécie de prova, com suas características comuns, que determinam a forma da sua produção.

Quando a matéria discutida exigir conhecimento técnico, a prova pericial é fundamental. Um dos principais exames, utilizado para esclarecer os mais diversos crimes, é o corpo de delito, requisito indispensável para os crimes que deixam vestígio, como por exemplo a qualificadora de destruição e rompimento de obstáculo à subtração da coisa, presente no crime de furto.

O interrogatório do acusado (que para o legislador ainda está relacionado entre os meios probatórios, mas que a doutrina majoritária reconhece sua natureza jurídica de meio de defesa, hoje reforçada pelas recentes alterações no Código de Processo Penal1) é o momento oportuno para ele dar a sua versão dos fatos perante

1

A Lei 11.719/08 alterou o artigo 531, para fazer constar que o interrogatório procede toda a produção probatória, sendo realizado apenas ao final da instrução. Quanto a Lei 11.690/08 e a Lei 11900/09, as mesmas vieram para modificar alguns procedimentos de produção das provas, principalmente no que diz respeito às perícias, depoimento do ofendido e interrogatório do réu.

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o juízo competente. A lei determina que o acusado deve ser devidamente qualificado, sendo cientificado do seu direito de permanecer em silêncio, para só então ser perguntado a respeito da sua pessoa e dos fatos motivadores do processo. Sobre o direito do acusado em permanecer calado, o autor Euclides Ferreira da Silva Junior (2000, p. 123) refere que:

O réu não é obrigado a responder às perguntas do juiz, já que possui o direito de calar, em virtude do princípio de que “ninguém é obrigado a fornecer prova contra si mesmo”, mas será advertido de que seu silêncio poderá ser interpretado em prejuízo da própria defesa.

Se o réu tem o direito de silenciar diante da acusação que lhe é feita, de outra senda ele poderá confessar os seus atos. Porém, somente a confissão não basta para que o magistrado desenvolva seu juízo de certeza, é necessário que se analise todo contexto probatório para assegurar a verdade dos fatos.

Aquele que sofreu as consequências do delito, chamado de ofendido ou de vítima, vai ajudar a esclarecer os fatos com certas reservas, pois é ele o possuidor do direito. Em determinados delitos, como os crimes contra a liberdade sexual, sua palavra ganha força probatória, pois muitas vezes é a única prova processual.

A prova de reconhecimento de pessoas e coisas vem para criar um juízo de certeza sobre algo, é ela que fornece convicção acerca da identidade de um objeto ou de uma pessoa através de suas peculiaridades. Todavia, deverão existir certos cuidados para que realmente a prova seja consistente, devendo o reconhecedor, de forma prévia, caracterizar a coisa. O reconhecimento de pessoas e coisas é bastante utilizado para restituir os produtos furtados ou roubados para a vítima, bem como para identificar o réu como tendo sido o autor do fato.

Quando duas ou mais pessoas, podendo ser elas testemunhas, ofendidos, partes ou acusados, entram em conflito em seus depoimentos, surge a acareação. Esta espécie de prova nada mais é do que o confronto visual e o debate para a resolução dos pontos controvertidos do seu relato. William Silva (1997, p.125) critica o método probatório dizendo que:

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Acareação é um depoimento em conjunto. De pouco resultado na prática e de valor probatório muito pequeno, pois pouca gente retira aquilo que referiu em juízo, sustentando sempre o que disse anteriormente ao confronto. Assim, o acareamento é pôr em presença, uma das outras, pessoas cujas declarações não são concordes. Impõe-se a acareação quando as declarações colidem em pontos que gerem prejuízo para a verdade real. Seu valor, como toda prova em matéria penal, isoladamente, é relativo.

Uma das provas mais utilizadas no processo é a documental, não possuindo requisitos quanto a sua forma. Documento é simplesmente um papel que representa um fato, seja ele escrito ou gráfico, podendo ele ser utilizado como prova ou confeccionado para ser usado como tal. Trazido pelas partes ou de ofício pelo juiz, o documento pode ser juntado livremente ao processo, no momento oportuno, desde que observado o princípio do contraditório.

Apesar do indício não dar certeza da materialidade ou da autoria de um delito ou de um fato que se busca verificar, ele é responsável por apresentar possíveis soluções ou convicções a respeito de outras provas. O Código de Processo Penal, em seu artigo 239, conceitua indício como circunstância conhecida e provada que pode demonstrar a existência de outras circunstâncias.

Com o intuito de obter elementos imediatos que auxiliem na produção das provas, para que as mesmas não desapareçam com o passar do tempo, tem-se a busca e apreensão de coisas ou pessoas. A busca e apreensão também ainda está alocada pelo legislador entre os meios probatórios, enquanto a doutrina reconhece sua natureza jurídica de medida cautelar. De qualquer modo, a apreensão é a consequência do êxito da busca determinada judicialmente, seja ela para garantir um direito ou preservar importantes provas para o devido trâmite legal do processo em questão. Capez (2010, p. 387), assim descreve a apreensão:

A apreensão consiste na detenção física do bem material desejado e que possa servir como meio de prova para a demonstração da infração penal. O ato, por sua vez, se formaliza em um auto circunstanciado, o qual contém a descrição completa de todo o acontecido, devendo ser assinado pelos executores e testemunhas presenciais.

Possuindo grande influência nos julgados, a prova testemunhal é muito utilizada em matéria criminal, apesar de ser amplamente contestada. A testemunha é a responsável por elucidar todos os fatos que vão levar à verdade dos fatos,

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cabendo a ela dizer a verdade do que souber. No ordenamento jurídico brasileiro, todas as pessoas poderão prestar depoimento, sendo descritas na lei apenas as hipóteses em que as pessoas são isentas de prestar testemunho ou proibidas de realizá-lo.

Silva (1997, p. 123) caracteriza:

Testemunha é o personagem que se acha presente no momento em que o fato se dá. Fala e reflete o que viu. A individualidade da testemunha por si só influi no modo de observação. Na maioria das vezes, por aparecer por acaso, só presta atenção a algumas características do fato. Certos preconceitos, certa disposição a fazem dar aos fatos cores imaginárias, e muitas vezes ela acredita ter visto aquilo que deseja. O intervalo decorrido entre o acontecimento e o depoimento pode modificar as coisas. É que a imaginação transforma a lembrança dos fatos confiados a memória. Por isso é que a testemunha, quando depõe muito tempo depois dos fatos, não sabe destacar o que viu das criações de suas fantasias.

A prova produzida nos processos criminais é, muitas vezes, exclusivamente testemunhal, por isso carece de certos cuidados na sua análise. Elementos como a falibilidade da memória humana, a modificação das circunstâncias pela vontade do depoente e o interesse no resultado da decisão devem ser percebidos pelo julgador no momento de aferir os testemunhos, tema a ser melhor desenvolvido no próximo capítulo.

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2 A FRAGILIDADE DA PROVA TESTEMUNHAL EM FACE DA PRESUNÇÃO DE VERACIDADE

Dentre os meios de comprovação dos fatos, destacou-se a prova testemunhal, a qual deve ser analisada em conjunto com os demais atos probatórios do processo para haver uma maior segurança jurídica nas decisões judiciais. Sendo frágil o meio probatório, o mesmo pode acarretar provimentos jurisdicionais tidos como injustos.

Se utilizada com exclusividade no processo, a prova testemunhal deve ser interpretada com extremo cuidado, pois muitas vezes é incerta, falha e enganosa. O magistrado deve estar consciente que existe esta possibilidade, não devendo presumir todos os relatos como verdades absolutas.

2.1 Os motivos geradores do problema

Para que uma testemunha relate a verdade dos fatos, fundamental que ela exprima duas verdades, a primeira diz respeito ao fato propriamente dito e a segunda refere-se à sua vontade de expressar o conhecimento do fato. A pessoa deve estar apta a perceber como se deram os fatos na realidade e disposta a contar tudo que observou naquele momento.

Àqueles que não possuem discernimento para compreender todas as circunstâncias envoltas ao crime, sejam eles os absolutamente ou relativamente incapazes, ou simplesmente as pessoas que não conseguem perceber a verdade por falta de intelectualidade e compreensão, devem ter seus depoimentos relativizados.

Da mesma forma com que são tratados os testemunhos daqueles que não concebem a verdade dos fatos, devem ser tratados os que não dizem a verdade. Segundo o autor Malatesta (1996, p. 344):

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São inidôneos, por deficiente vontade de dizer a verdade, todos aqueles que, por um dever moral, são levados a escondê-la. Consideremos como uma causa de falta de idoneidade somente o impulso para mentir, consistente num dever moral, pois qualquer outro impulso, não só pode ter igual força, mas também, qualquer que seja sua força, pode sempre contrapor-se-lhe a coação da lei, obrigando a depor sob a ameaça das penas destinadas a atingir o falso testemunho.

Não basta que os depoimentos não sejam falhos e não queiram enganar, é preciso que os depoimentos sejam exteriorizados de forma que se possa compreendê-los. A linguagem utilizada pelo interlocutor é de suma relevância, uma vez que, se precisa e clara, irá tornar a declaração inequívoca.

Percebendo a possibilidade de haver tentativas de deturpação da verdade dos fatos, seja pela falta, seja pela omissão, o legislador criou o artigo 342 do Código Penal, que tipifica o falso testemunho, aplicando pena de reclusão de um a três anos e multa para quem faz afirmação falsa ou simplesmente nega ou cala a verdade como testemunha.

O Código de Processo Penal dispõe sobre o procedimento a ser adotado pelo juiz quando constatado o crime de falso testemunho. O artigo 211 preceitua que se o juiz, ao pronunciar sentença final, reconhecer o crime, remeterá cópia do depoimento à autoridade policial para a instauração de inquérito policial.

Sobre o crime de falso testemunho, Celso Delmanto caracteriza (2007, p. 872):

Fazer afirmação falsa. Trata-se de conduta comissiva, na qual o agente afirma inverdade. b. Negar a verdade. Nesta hipótese, o sujeito ativo nega o que sabe. c. Calar a verdade. Nesta última modalidade, o agente silencia, omite o que sabe (é a chamada reticência). A falsidade deve ser relativa a fato juridicamente relevante ou potencialmente lesiva, pois se a circunstância em nada influi, se não há possibilidade de prejuízo, apesar da inverdade, não haverá falso testemunho.

O auge da prova testemunhal é o momento da exteriorização do conhecimento da testemunha ocular, em que a convicção do magistrado é formada. A linguagem coerente e convincente são essenciais, contudo, Malatesta (1996, p. 362) propõe a analise de novos elementos:

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Mas, além dos depoimentos, há exterioridades indiretamente reveladoras do espírito mesmo na pessoa do depoente: é o complexo daqueles indícios que emanam do conteúdo pessoal da testemunha e aumentam ou diminuem sua credibilidade. A segurança ou excitação de quem depõe, a calma ou perturbação de seu semblante, sua desenvoltura como de quem quer dizer a verdade, seu embaraço como de quem quer mentir, um só gesto, um só olhar, por vezes, podem revelar a veracidade ou mentira da testemunha. Eis mil outras exterioridades que devem também ser consideradas nos testemunhos, para bem avaliá-los.

A declaração de uma testemunha não deve possuir contradições, qualquer discordância deve ser verificada para que não haja qualquer manifestação de inverdades ou simplesmente de uma falsa memória. Gesu (2010, p. 129) afirma que do mesmo modo, a coerência nas diversas declarações de uma testemunha também não configuram a sua veracidade, porque todas podem ter sido induzidas a pensar da mesma forma.

Quando uma pessoa presencia a cena de um crime, necessário que se esclareça se as circunstâncias em que ocorreu o delito eram sabidas pela mesma, se o local em que se deu o fato era do seu conhecimento, bem como o modo que ela visualizou os acontecimentos. Tudo porque se a testemunha já era conhecedora do objeto ou indivíduo em questão, terá maiores elementos para propiciar o entendimento de como se deu o litígio.

Quando a percepção for mais complexa, a testemunha irá distinguir detalhes com maior capacidade e exatidão. Gesu (2010, p. 130) considera:

Elementar que a vítima de um delito e eventual testemunha presencial – as quais tiveram contato direto com o imputado, tendo a oportunidade de observá-lo porque o rosto ou parte dele estava descoberto -, tenham mais facilidade de reconhecê-lo posteriormente. O mesmo ocorre com a identificação de objetos, na medida em que esta é facilitada se efetivamente pertenciam à pessoa ofendida, devido ao contato prévio.

O crime é sempre uma reconstrução do passado, às vezes mais longínquo, outras mais recente, no que tange aos fatos que o cercam. Porém, essa reconstrução, no mais das vezes, depende da memória de quem narra o ocorrido. E, nesse sentido, quanto maior o lapso temporal entre o crime e o depoimento da testemunha, maior a probabilidade de ocorreram esquecimentos, os quais são inerentes aos seres humanos e à sua memória.

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Quando há falta de memorização, as pessoas, por serem dotadas de imaginação, ainda podem preencher tais lacunas com experiências semelhantes já vividas ou com detalhes que são favoráveis ao ângulo com que visualizou as imagens. Gesu (2010, p. 137) explica os riscos da interpretação pela testemunha:

É claro que o “ideal” seria a colheita e análise do conjunto probatório totalmente despido dos riscos endógenos (internos) e exógenos (externos ao processo). Contudo, isso está fora de cogitação, pois as pessoas não vivem em uma redoma de vidro, completamente isoladas de influências externas ou estanques às modificações no tempo. E mesmo que assim fosse, a própria memória e a imaginação poderiam trair a idéia de representação exata do acontecimento.

O magistrado deve estar atento a todos os detalhes perceptíveis de serem enganosos. Observando as testemunhas é possível atentar para reações físicas que exprimam a vontade de ludibriar a outrem. Assim como os depoimentos testemunhais podem aferir verdades sobre fatos relevantes ao feito, do mesmo modo o interrogatório do réu, e o depoimento pessoal da vítima.

Fernando de Almeida Pedroso (1994, p. 36) relata reações que tornam duvidoso o depoimento do acusado, sendo semelhante à das testemunhas:

No que concerne, porém, às reações do interrogando (verbi gratia: narração titubeante, voz trêmula e hesitante, tremor dos membros inferiores ou mãos, sorriso de escárnio e ironia, frieza do olhar, gestos de impaciência ou revolta etc.), preciso é que se tenha certo apuro na sua afeição, para que não se incida em equivoco.

Quando a testemunha analisa o espaço em que ocorreu o delito, imprescindível que ao reproduzir verbalmente o que foi observado, que o faça sem sugestionar. Além disso, importante ressaltar os fatores externos relativos à produção da prova, tais como a temperatura ambiente, condição climática, intensidade de luz, entre outros. Os fatores podem contribuir para que se sugestione de forma diversa da realidade.

A entonação da palavra proferida pela testemunha pode refletir sua veracidade, fazendo com que seu depoimento seja creditado positivamente. Nesse sentido, Malatesta (1996, p. 361) aduz que quando o modo de depor revela

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animosidade na testemunha, a falta da serenidade em seus espírito irá diminuir-lhe a credibilidade, mostrando a existência de paixões que podem ser um impulso à mentira, bem como será causa de descrédito o depoimento prestado com afetação.

Em se tratando do depoimento da vítima, diga-se que ver o seu direito sendo ameaçado, faz nascer uma vontade de buscar a reparação pelo Estado, possibilitando uma percepção menos aguçada e com mais possibilidades de erro. Malatesta (1996, p. 404) aborda o problema:

Nem as observações do ofendido apresentam grande garantia de exatidão quanto ao modo de consumação do crime contra a propriedade; a ele se misturam sempre o sentimento da violação do próprio direito, o qual tolhe a calma e a conseqüente percepção exata dos detalhes das coisas.

O método com que são colhidos os depoimentos também acarretam sua fragilidade, pois tanto a acusação quanto a defesa manejam a seu favor os questionamentos a serem realizados para a elucidação dos fatos, muitas vezes aproveitando-se da má oratória da testemunha ou de sua situação, seja de infante, idoso ou de baixo índice de escolaridade.

Gesu (2010, p. 147) alerta que o entrevistador tem grande potencial de influenciar negativamente aquilo que a vítima e a testemunha efetivamente sabem sobre o delito, ao manipular os questionamentos, a fim de adequá-los à hipótese que melhor lhe couber.

Diante da enormidade de fatores que podem fragilizar a prova testemunhal, sejam eles intrínsecos ou extrínsecos ao homem, presumir como verdadeiros os depoimentos, sem uma análise adequada e rigorosa, é assumir o risco de sobrevirem consequências negativas no devido andamento dos processos judiciais.

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2.2 A consequência da presunção de verdade e sua influência na subjetividade judicial de valoração da prova

A natureza humana permite aos indivíduos perceber e narrar a verdade, contudo, esta presunção de verdade pode ser facilmente abalada, eis que os seres humanos são dotados de condições particulares que integram a personalidade de cada testemunha e fazem com que seus depoimentos sejam incertos e inseguros.

A presunção da veracidade humana é a base para a valoração da prova testemunhal. Malatesta (1996, p. 319) discorre o fundamento dessa afirmação:

O fundamento, portanto, da afirmação de pessoa em geral, e do testemunho em especial, é a presunção de que os homens percebam e narrem a verdade, presunção fundada, por sua vez, na experiência geral da humanidade, a qual mostra como na realidade e no maior número de casos, o homem é verídico; verídico, pela tendência natural da inteligência, que encontra na verdade, mais facilmente que na mentira, a satisfação de um bem ingênito; verídico, pela tendência natural da vontade, a quem a verdade aparece como um bem e a mentira como um mal; verídico, enfim, porque esta tendência natural da inteligência e vontade é fortificada no homem social não só pelo desprezo da sociedade para com o mentiroso, mas também pelas penas religiosas e penas civis que se erguem ameaçadoras sobre sua cabeça.

O fundamento para a credibilidade do testemunho seria a presunção de que determinada testemunha não queira ludibriar ou omitir fatos, falando tão somente a verdade. A veracidade adquire valoração através de requisitos objetivo e subjetivo, sendo que os primeiros são perceptíveis, de forma direta, aos olhos do magistrado.

Nos requisitos subjetivos para a valoração da prova é que são demonstradas com maior clareza as presunções de veracidade, visto a dificuldade de perceber a subjetividade na testemunha. Malatesta (1996, p. 393) ilustra:

Quanto aos requisitos subjetivos, estes, ao contrário, muitas vezes, não se tem conhecimento exato da sua existência ou inexistência na testemunha particular. Ora, sendo certo que, precisamente quando falta o conhecimento positivo ou negativo dos requisitos da credibilidade, é que a presunção de veracidade se afirma fazendo-o supor e visto que este conhecimento falta principalmente em se tratando de requisitos subjetivos, compreende-se como a presunção da veracidade tenha sua maior eficácia relativamente à credibilidade subjetiva da testemunha.

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A credibilidade da fala verdadeira é a base para toda prova testemunhal, porém deve ser medida pelas condições próprias de cada testemunha, podendo ser valorada positivamente, restritamente ou extinta na sua totalidade, quando constituir erro que acarrete na sua incerteza probatória.

Se a testemunha deve narrar a verdade é o magistrado que deve valorar e avaliar os testemunhos. Apesar do poder que lhe foi conferido, o magistrado é humano, e por mais imparcial que seja não há como não se falar no seu subjetivismo no momento de analisar as provas e julgar a lide. Para Gesu (2010, p. 159):

O juiz não é a mera boca da lei, resumindo-se tão somente a dar uma solução ao problema a partir da simples aplicação do fato à norma. Ao sentenciar, o magistrado diz o que sente. E o papel do sentimento do juiz é algo fundamental, evidenciado pela própria etimologia da palavra “sentença”, a qual tem origem no verbo “sentire”. Por meio da sentença o juiz experimenta uma emoção, ele sente e declara o que sente.

Os juízes devem estar convictos quando da tomada da decisão que vai dar fim a uma lide, a certeza dos fatos que envolvem o crime tem que ser absolutamente segura. O convencimento é afastado dos vícios e predomina a naturalidade do magistrado, ou seja, as provas são sopesadas por sua iniciativa e não das apreciações realizadas por terceiros.

A prova deve ser referida como a certeza do processo, sendo a responsável pala condenação judicial, ela vem a ser o meio pelo qual a certeza subjetiva se relaciona com a verdade, formando a convicção do juiz. Malatesta (1996, p. 85) afirma que a prova é a relação particular e concreta entre a convicção e verdade, constatando que a natureza de toda relação é determinada pela natureza dos seus limites, sendo na consideração da verdade objetiva e na convicção subjetiva que vão ser encontrados os princípios supremos da prova em geral.

Contudo, a obtenção da prova real é impossível, pois a realidade dos fatos é pretérita, e devido a esse lapso temporal existente, torna-se extremamente difícil demonstrar os detalhes do fato e as percepções humanas envolvidas.

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O magistrado deve ter o máximo de subsídios probatórios a fortalecer a probabilidade delitiva e sua autoria para que possa condenar sem correr o risco de cometer um equivoco, do qual dependerá a liberdade de uma pessoa. Lopes Jr. (2006, p. 285) refere:

Em suma, o processo penal tem uma finalidade retrospectiva, onde, através das provas, pretende-se criar condições para a atividade recognitiva do juiz acerca de um fato passado. As partes buscam sua captura psíquica (para mantê-lo em crença), sendo que o saber decorrente do conhecimento desse fato legitimará o poder contido na sentença. Ou seja, o poder do juiz não precisa da “verdade” para se legitimar, até porque, sendo ela impossível de ser obtida no processo, teríamos de assumir que o poder é ilegítimo. Logo, diante do excesso epistêmico da “verdade”, importa é o convencimento, formado a partir do que está e ingressou legalmente no processo.

Mais do que simplesmente julgar sem exprimir os anseios que carrega desde criança, tal como o hábito, a decisão tem que ser imposta de forma raciocinada. Malatesta (1996, p. 51) refere:

O convencimento deve ser raciocinado, não determinando de que natureza devem ser as razões que legitimam o convencimento. E muitas vezes, as preocupações e prevenções subjetivas da pessoa dão um tal peso a motivos fúteis, que os fazem considerar-se como razões suficientes. Ora, é importante pra a noção do convencimento judicial acrescentar que as razões que o determinaram devem ser de natureza tal que criem a convicção em qualquer outra pessoa razoável, a quem sejam expostas.

Para que a sentença seja justa, propõe Malatesta (1996, p. 77):

Deverá, quem julga, estar portanto prevenido, não só contra aquela primeira espécie de engano que leva a rejeitar como incríveis fatos que, em verdade, são críveis, mas também contra esta outra espécie de engano que leva a admitir, como críveis, fatos incríveis. E, por conseguinte, deverá ele, com espírito sereno, ávido somente de verdade, colocar-se fora e acima daquelas correntes apaixonadas de ideias e daqueles ambientes viciados, motivados na multidão, tanto pelas fascinações irracionais do bem, como pelos medos irracionais do mal.

A consequência da presunção de verdade advém da influência negativa na subjetividade judicial de valoração da prova testemunhal, uma vez que sendo frágil o meio probatório, o mesmo pode acarretar em decisões judiciais injustas. Para que esta subjetividade do magistrado seja afastada completamente, propiciando uma decisão de todo justa, a subjetividade presente nos depoimentos deve ser excluída, analisando-se tão somente a verdade real.

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Sempre que uma testemunha prestar seu depoimento, supõe-se que a mesma fale a verdade, seja como um instinto natural aos humanos ou como forma de obediência às leis. Esta presunção de que ela diga a verdade deve ser tida como parâmetro, ao menos, ao tempo do início da sua declaração, até que por outro motivo não haja desconfiança de que esteja proferindo inverdades.

A valoração da prova testemunhal devido a sua exclusividade de utilização nos processos judiciais, bem como a consequência da subjetividade judicial nos julgados estaduais e nacionais serão devidamente comprovadas no item a seguir.

2.3 Análise de casos jurisprudenciais

A busca pela verdade para a solução dos litígios com a tomada das decisões pelo juiz traz a necessidade da busca pela prova testemunhal, uma vez que possui baixo custo ao Estado, é facilmente alcançada e as demais provas, como exemplo as periciais, muitas vezes são inconcebíveis, já que o sistema brasileiro sofre com a falta de estrutura para este fim.

Com a ineficiência de recursos que possibilitariam uma maior compreensão para a resolução dos casos, o Poder Judiciário é obrigado a julgar, na maioria das vezes, tão somente pelos depoimentos, gerando insegurança pela instabilidade que é própria desse tipo probatório. É por conta disso, que em inúmeros processos as partes recorrem à segunda instância para a garantia dos seus direitos, causando uma demora excessiva na sua resolução, já que os tribunais estão lotados abarrotados de processos em situação idêntica.

Não é difícil de encontrar julgados de matéria criminal, em qualquer tribunal brasileiro, por mais diverso o tipo penal em questão, que permite verificar em seu teor somente a análise de provas testemunhais. O primeiro caso refere-se à ementa do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

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APELAÇÃO. ART. 311, 'CAPUT', DO CP. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. COLOCAÇÃO DE PLACAS EM MOTOCICLETA. CHAMADA DE CORRÉU. PROVA SUFICIENTE. A chamada de corréu, quando convergente com confissão extrajudicial do apelante, é suficiente para confirmar a acusação. Apelação da defesa, improvida. (RIO GRANDE DO SUL, 2011a).

A adulteração do sinal identificador do veículo, qual seja a substituição da placa original da motocicleta, restou comprovada unicamente pelo depoimento de testemunhas, acarretando na condenação em primeiro e segundo grau. Evidenciou-se no discorrer do acórdão que a decisão foi fundamentada exclusivamente pelos depoimentos do réu e do corréu, gerando insegurança jurídica.

A palavra do corréu foi largamente utilizada para demonstrar a autoria do réu, contudo, aquele, pela situação que ocupava no processo, tinha motivos suficientes para alterar a verdade, eis que interessado em eximir-se da responsabilidade penal que lhe era imputada. A fragilidade da prova testemunhal é visível, eis que qualquer adulteração deveria ser comprovada tecnicamente.

Em crimes contra a liberdade sexual, na grande maioria das vezes, a palavra da vítima é o único meio probatório, considerando suficiente para comprovar a autoria do crime. Assim, o julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CRIME. CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. ESTUPRO. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. AMEAÇA. CONCURSO MATERIAL. PROVA. CONDENAÇÃO MANTIDA. A materialidade e a autoria restaram suficientemente comprovadas, para ambos os delitos, pela prova produzida nos autos, notadamente considerando o depoimento da vítima - que então contava com 12 anos -, que afirmou, no que se relaciona ao estupro, que teve relação íntima com JOSE ELOIR, conhecido da família, tendo sido forçada naquela ocasião. Mesmo que assim não fosse, a violência seria presumida, caracterizadora do delito contra menor de 14 anos, presunção que pode ser relativizada, diante do caso concreto, hipótese que não se afigura, ante a notória inexperiência da vítima em matéria sexual. PENA. DOSIMETRIA. A pena-base de cada um dos fatos (estupro e ameaça) foi fixada no mínimo legal, passando a pena definitiva para este quantum, somadas, diante do concurso material. APELO DA DEFESA DESPROVIDO. (RIO GRANDE DO SUL, 2011b).

No presente caso, verifica-se a condenação do réu pelos crimes de estupro e ameaça. Apesar das provas serem frágeis em crimes contra a liberdade sexual, por se tratarem de delitos sem testemunhas oculares e formas concretas e eficientes de

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comprovar a participação dos réus, o depoimento da vítima deve ser altamente valorado.

A jurisprudência gaúcha dominante entende que, sendo o depoimento da vítima coerente, harmônico e de forma a narrar com precisão os fatos, não havendo outro meio probatório, por não ter vestígio físico ou visível, a palavra da vítima pode ser suficiente para uma sentença condenatória.

Apesar das considerações críticas acerca da valoração da prova testemunhal, é amplamente utilizada nos processos criminais e, não raras as vezes, com importância suficiente para um juízo condenatório, mesmo em processos cuja persecução penal tem como objeto crimes materiais, que deixam vestígios, como forma de suprir (até porque a lei permite – art. 167 ou 168, CPP) o exame de corpo de delito direto – o mesmo vale para o depoimento pessoal da vítima, nos crimes sexuais. Como se vê na decisão do Superior Tribunal de Justiça a seguir colacionada:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME

DE ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. DIVERGÊNCIA

JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. VIOLAÇÃO AO ART. 5.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E AO ART. 100 DO CÓDIGO PENAL. INEXISTÊNCIA. DESNECESSIDADE DE REPRESENTAÇÃO FORMAL.

TESE DE AUSÊNCIA DE PROVAS PARA A CONDENAÇÃO.

DEPOIMENTO DA VÍTIMA. MEIO IDÔNEO. FRAGILIDADE DO

CONJUNTO PROBATÓRIO NÃO DEMONSTRADA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N.º 7 DESTA CORTE. 1. A alegada divergência jurisprudencial não restou demonstrada nos moldes previstos no art. 541, parágrafo único, do Código de Processo Civil, e no art. 255 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.

2. Conforme cediço na doutrina e na jurisprudência, a representação, condição de procedibilidade exigida nos crimes de ação penal pública condicionada, prescinde de rigores formais, bastando a inequívoca manifestação de vontade da vítima ou de seu representante legal no sentido de que se promova a responsabilidade penal do agente.

3. Para a comprovação da prática do crime sexual, a palavra da vítima, corroborada por provas testemunhais idôneas e harmônicas, autorizam a condenação, ainda mais porque o Juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo se utilizar, para formar a sua convicção, de outros elementos colhidos durante a instrução criminal.

4. Agravo regimental desprovido. (BRASIL, 2011).

Outro caso refere-se ao crime de abandono material, no qual a dificuldade em buscar outras provas além da testemunhal é muito elevada. Segue a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

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ABANDONO MATERIAL. EXIGÊNCIA DO DOLO. ÔNUS DE PROVÁ-LO. CONDENAÇÃO MANTIDA. O delito de abandono material só se caracteriza, se o agente, possuindo recursos para prover a subsistência da família, deixa de fazê-lo por livre e espontânea vontade. Pune-se o comportamento egoístico daquele que, tendo condições, abandona os seus. Exige-se o dolo. E, tendo em vista o disposto no artigo 156 do Código de Processo Penal, caberia à Defesa, demonstrada a obrigatoriedade do réu em prover seus filhos, que a recusa era justificada, que não existiu o dolo na negativa dos alimentos. Contudo, não se provou que as crianças nunca estiveram

abandonadas (depoimento policial) ou que o apelante estava

desempregado ou sem renda pessoal. Ao contrário, a Acusação mostrou que as vítimas sofreram com a falta de alimentos que, repetindo, foi egoisticamente negado pelo recorrente. Tem-se, assim, que o abandono material foi intencional. Condenação mantida. DECISÃO: Apelo defensivo desprovido. Unânime. (RIO GRANDE DO SUL, 2010).

Provou-se exclusivamente pela prova testemunhal que o pai abandonou materialmente o filho, deixando de prover-lhe o sustento. A decisão referiu que os depoimentos, de vizinhos e da mãe da criança, mostraram-se seguros e comprovaram a existência do delito de abandono por si só. Até porque a discussão se deu em torno do elemento subjetivo – o dolo, e, neste caso, não há prova material a comprovar sua existência ou não.

O sistema processual brasileiro permite ao juiz de direito valorar as provas segundo o seu conhecimento, de acordo com o conjunto probatório adquirido no decorrer da instrução criminal. O próximo julgado, do Superior Tribunal de Justiça demonstra a valoração da prova testemunhal em crimes para os quais seriam imprescindíveis a realização de exame de corpo de delito:

HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. EMPREGO DE CHAVE FALSA. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. CONDENAÇÃO COM BASE NA PROVA TESTEMUNHAL. LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.

1. De acordo com o sistema de valoração de provas instituído no processo penal brasileiro, o magistrado é livre para formar o seu convencimento acerca dos fatos submetidos à persecução penal, desde que devidamente fundamentado com arrimo no conjunto probatório produzido nos autos. 2. Não se podendo falar, portanto, em hierarquia de provas, não há ilegalidade na condenação do paciente pelo crime de tentativa de furto qualificado em razão do emprego de chave falsa, com base apenas nos depoimentos colhidos no âmbito do devido processo legal.

PROVA PERICIAL. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO. VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ARTIGO 158 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INOCORRÊNCIA. CRIME QUE NÃO DEIXA VESTÍGIOS. PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

1. A produção da prova pericial reclama a necessidade de elucidar fatos que demandam conhecimentos específicos em determinada área do conhecimento, excepcionalidade não encontrada na hipótese, já que a

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utilização da chave falsa foi confirmada pelas testemunhas ouvidas em juízo. 2. Ademais, como a figura delitiva em apreço não deixa vestígios, inexiste a obrigação de se proceder ao exame de corpo de delito previsto no artigo 158 do Código de Processo Penal. Precedente do STF.

CORRUPÇÃO ATIVA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO APROFUNDADO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO WRIT.

ÉDITO CONDENATÓRIO FUNDAMENTADO COM BASE NO

DEPOIMENTO DE POLICIAIS MILITARES. MEIO DE PROVA IDÔNEO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO NÃO DEMONSTRADA. ORDEM DENEGADA.

1. A alegada inocência do paciente, a ensejar a pretendida absolvição, é questão que demanda aprofundada análise de provas, o que é vedado na via estreita do remédio constitucional, que possui rito célere e cognição sumária, sendo, portanto inviável a revisão das razões e motivos pelos quais as instâncias ordinárias formaram convicção pela prolação do édito condenatório em desfavor do paciente. 2. Ademais, conforme entendimento desta Corte, o depoimento de policiais responsáveis pela prisão em flagrante do acusado constitui meio de prova idôneo a embasar o édito condenatório, mormente quando corroborado em Juízo, no âmbito do devido processo legal. 3. Ordem denegada. (BRASIL, 2009).

A respeitável decisão aduz que não há hierarquia de provas, não havendo motivos para falar em ilegalidade quando o juiz estiver convencido através da prova testemunhal. Nesse sentido, leciona Eugênio Pacelli de Oliveira (2008, p. 359), referindo-se ao disposto no artigo 158 do Código de Processo Penal, o qual preceitua que quando a infração deixar vestígios será indispensável o exame de corpo de delito:

A exigência de prova técnica somente haverá de ser feita quando a existência de determinado elemento do crime só puder ser provada por meio de conhecimento técnico. O mencionado dispositivo, ainda que esse tenha sido eventualmente o seu propósito primitivo, não pode ser lido como a consagração tardia da evolução científica da tecnologia probatória. Ora, sabemos todos quão precárias são todas e quaisquer ciências para nos curvarmos, irrefletida e acriticamente, à certeza científica. Se houver um fato, qualquer fato, cuja existência, a senso comum, ao alcance do conhecimento dito vulgar, pode ser comprovada por outro meio de prova, qualquer prova, não haverá de se falar na prova específica. O específico que fizemos acompanhar o vocábulo prova estará sempre na dependência da natureza do delito e dos fatos a serem provados, como ocorre, por exemplo, no exame cadavérico, na identificação de arcada dentária etc.

É sabido da deficiência estrutural do Estado para a aquisição de provas periciais nos processos, restando na maioria dos casos a busca pela verdade do fato somente através da prova testemunhal ou, quando possível, a antiga busca e apreensão de objetos. Faltam técnicos e equipamentos, acarretando em longa espera na conclusão das pericias, isto quando há a possibilidade de colher um material e encaminhar para a realização do exame.

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