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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA ERIKA BARRETTO ALVES

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA

ERIKA BARRETTO ALVES

AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DO USO DAS COLEIRAS IMPREGNADAS COM INSETICIDA PARA O CONTROLE DA LEISHMANIOSE VISCERAL NO

MUNICÍPIO DE MONTES CLAROS, MG

Rio de Janeiro 2016

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ERIKA BARRETTO ALVES

AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DO USO DAS COLEIRAS IMPREGNADAS COM INSETICIDA PARA O CONTROLE DA LEISHMANIOSE VISCERAL NO MUNICÍPIO

DE MONTES CLAROS, MG

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor em Saúde Coletiva.

Orientador: Prof. Dr. Guilherme Loureiro Werneck

Rio de Janeiro 2016

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A474 Alves, Erika Barretto.

Avaliação da efetividade do uso das coleiras impregnadas com inseticida para o controle da Leishmaniose Visceral no município de Montes Claros, MG / Erika Barretto Alves. – Rio de Janeiro: UFRJ / Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2016.

108 f.; 30 cm.

Orientadora : Guilherme Loureiro Werneck

Tese (Doutorado) – UFRJ / Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2016.

Referências: f. 96-106.

1. Leishmaniose. 2.Leishmaniose Visceral. 3.Doenças Parasitárias. 4. Inseticidas. I. Werneck, Guilherme Loureiro. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva. III. Título.

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Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Instituto de Estudos em Saúde Coletiva - IESC Doutorado em Saúde Coletiva

Erika Barretto Alves

Avaliação da efetividade do uso das coleiras impregnadas com inseticida para o controle da leishmaniose visceral no município de Montes Claros, MG.

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor em Saúde Coletiva.

Aprovada em ____/____/2016

________________________________________________________________________ Dr. Guilherme Loureiro Werneck, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

________________________________________________________________________ Dr. Ronir Raggio Luiz, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

________________________________________________________________________ Dr. Reinaldo Souza dos Santos, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

________________________________________________________________________ Dr. Fabiano Borges Figueiredo, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

________________________________________________________________________ Dr. Vinícius Silva Belo, Universidade Federal de São João Del Rei

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Agradecimentos

Agradeço a Deus por ter me abençoado nesta árdua caminhada.

À minha mãe, Nádia, o ar que respiro, pela força, entusiasmo, apoio, amor e por ser a melhor e mais participativa mãe do mundo.

Ao meu pai, César, o homem da minha vida, por todo amor a mim dedicado, por mostrar a importância da família, pelo exemplo de fé, garra e ética, de quem sentirei saudades até meu último dia.

À minha irmã, de sangue e de alma, Livia, pela amizade, parceria em todos os momentos, amor e suporte.

Aos meus avós, Barretto e Cecília, meus amores, pela atenção, compreensão, dedicação, confiança e, claro, pelos paparicos.

Aos meus avós, Clélio e Apparecida, pelo incentivo aos estudos, pela força, nobreza e pelo exemplo de união que sempre foram.

Ao meu namorado, Fábio, pelo apoio, compreensão, dedicação, disponibilidade e carinho.

Aos meus tios, Clélio, Luiz, Nelson, Helder e Homero, homens muito especiais, que têm papel fundamental na minha vida.

À minha tia/madrinha, Lu, amiga e incentivadora.

Às minhas tias, Sônia, Jussara e Fátima, pelas palavras de carinho.

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Ao meu orientador, Guilherme Loureiro Werneck, por quem tenho muita admiração, pela leveza das orientações, pela compreensão, humildade, disponibilidade, gentileza e por ser um profissional de extrema competência e ética.

À Márcia Castro, minha supervisora no Doutorado Sanduíche na Harvard School of Public Health, pela disponibilidade, compreensão e colaboração.

Aos queridos Léia e Carlos pelo constante apoio.

Às minhas super amigas Ligia e Estela (Mara), pela lealdade e generosidade.

Às minhas grandes amigas Gisele e Carol, mesmo longe, sempre presentes com suas mensagens de incentivo e carinhosas.

À minha amiga de todos os dias, Carol Borges, pelo companheirismo, disponibilidade e pelas boas risadas.

Às amigas, Tatiana, Penha, Dila e Márcia, sempre atenciosas, cuja amizade extrapolou o ambiente de trabalho.

Às amizades conquistadas ainda no Mestrado e que se mantém presentes: Anna Barreto, Érika Magliano, Fábio Rebouças, Thaíse Gasser e Lilia Marques.

Aos meus presentes de Boston: Adriana, Luan, Eloah, Val, Bia e Camila, pessoas especiais que chegaram para ficar em minha vida.

Ao corpo docente do IESC/UFRJ, que com toda certeza foi essencial para minha formação.

Aos funcionários do IESC/UFRJ, Fátima, Roberto e Nadja, sempre prestativos e gentis.

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RESUMO

ALVES, Erika Barretto. Avaliação da efetividade do uso das coleiras impregnadas com inseticida para o controle da leishmaniose visceral no município de Montes Claros, MG. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) – Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

A leishmaniose visceral (LV) é amplamente distribuída em todo o mundo e ainda persiste como um importante e global problema de saúde pública. No Brasil, as medidas de controle atualmente adotadas não têm sido capazes de evitar a propagação da doença. Foi realizado um ensaio de intervenção comunitária na cidade de Montes Claros, Estado de Minas Gerais, área de alta transmissão. Duas estratégias de controle foram alocadas aleatoriamente: (1) as medidas de controle atualmente recomendadas pelo Programa de Vigilância e Controle da LV (eutanásia de cães infectados e controle vetorial) e (2) uso de coleiras impregnadas com deltametrina, adicionalmente às medidas de controle recomendadas pelo Programa de Vigilância e Controle (área de intervenção). No início do estudo, foi realizado um censo entre cães domiciliados para detectar a prevalência de infecção por L.infantum. O monitoramento da infecção canina (áreas de controle e intervenção) e a substituição das coleiras (área de intervenção) ocorreram em ciclos posteriores, realizados aos 12, 18 e 24 meses após o inquérito inicial. Em cada visita o cão era testado e o proprietário respondia a um questionário sobre as características gerais do animal. Modelos de regressão logística multinível foram utilizados para testar o efeito das coleiras sobre o risco de infecção canina, com domicílios como unidades de segundo nível (clusters). Participaram do estudo 17.409 cães, sendo 9.658 na área de intervenção e 7.751 na área de controle. A prevalência de infecção no inquérito inicial foi similar entre as áreas (p = 0.632). O risco de infecção foi 51% menor na área de intervenção. Para cada cão adicional no domicílio, o risco de infecção aumentou cerca de 9% (OR = 1.09, IC 95% 1.06 - 1.12). Dos cães que participaram no segundo ciclo, quase 48% eram novos no estudo, o que mostra a alta reposição canina. A perda da coleira entre o primeiro eo segundo ciclo foi de 56%. O uso de coleiras como medida de controle foi efetivo, no entanto, é necessário considerar questões importantes para sua implementação, como a renovação canina e a substituição de dispositivos perdidos. Estudos sobre a relação custo-eficácia do uso de colares como uma medida de controle são recomendados.

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ABSTRACT

ALVES, Erika Barretto. Avaliação da efetividade do uso das coleiras impregnadas com inseticida para o controle da leishmaniose visceral no município de Montes Claros, MG. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) – Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

Visceral Leishmaniasis is widely distributed worldwide and it still persists as an important and global public health problem. In Brazil, the control measures currently adopted have not been able to prevent the spread of the disease. A community intervention trial was carried out in the city of Montes Claros, state of Minas Gerais, area with high transmission. Two control strategies were randomly allocated: (1) the control measures usually recommended by the Control Program of the Brazilian Ministry of Health (sacrifice of infected dogs and vector control) and (2) use of deltamethrin-impregnated dog collars in addition to the control measures recommended by Control Program (intervention area). At the beginning of the study, a census survey was carried out among domiciled dogs to detect the prevalence of

L.infantum infection. Monitoring of canine infection (control and intervention areas) and

replacement of collars (intervention area) occurred through visit cycles at 12, 18 and 24 months after the initial survey. At each visit the dog was tested and the owner answered a questionnaire about the general characteristics of the animal. Multilevel logistic regression models were used to test the effect of collars on the risk of canine infection, with households as second level units (clusters). 17.409 dogs participated in the study, 9.658 in the intervention area e 7.751 in the control area. The prevalence of infection in the initial survey was similar between the areas (p=0.632). The risk of infection was 51% lower in the intervention area. For each additional dog at home, the risk of infection increased by about 9% (OR = 1.09, 95% CI 1.06-1.12). Of the dogs that participated in the second cycle, almost 48% were new to the study, which shows the high canine replacement. The loss of collar between the first and second cycle was 56%. The use of collars as a control measure was effective, however, it is necessary to consider the key issues for its implementation, such as canine renewal and replacement of lost devices. Studies on the cost-effectiveness of use of collars as a control measure are recommended.

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LISTA DE TABELAS

Artigo 1

Tabela 1 – Distribuição dos cães segundo participação nos ciclos e área de intervenção, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 51 Tabela 2 – Características dos cães, prevalência de infecção e proporção de cães

soropositivos recolhidos por área de intervenção, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 53 Tabela 3 – Destino dos cães sororreagentes no primeiro ciclo segundo área de intervenção, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 54 Tabela 4 - Perda de seguimento dos cães soronegativos entre o primeiro e segundo ciclos, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 55 Tabela 5 – Perda de coleiras entre ciclos subseqüentes, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 55 Artigo 2

Tabela 1 – Prevalência de infecção por ciclo e área de intervenção, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 71 Tabela 2 – Percentual de recolhimento de cães soropositivos para L. infantum segundo área de intervenção, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 72 Tabela 3 – Proporção de coleiras perdidas entre visitas subsequentes, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 72 Tabela 4 – Características dos cães por área de intervenção, município de Montes Claros-MG, Brasil, 2012 – 2015 ... 73 Tabela 5 – Incidência de infecção (I) por L. infantum e o Risco Relativo (RR) bruto e seu intervalo de confiança de 95% (IC 95%) para associação entre a leishmaniose visceral canina e determinadas características do cão, município de Montes Claros, Brasil, 2012 – 2015 ... 74 Tabela 6 – Modelo multivariado – Odds Ratio (OR) ajustado e seu respectivo intervalo de confiança (IC 95%) e p-valor para associação entre infecção canina e as variáveis

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Artigo 3

Tabela 01 – Modelo multivariado – Odds Ratio (OR) ajustado e seu respectivo intervalo de confiança (IC 95%) e p-valor para associação entre infecção canina e as áreas de intervenção, município de Montes Claros, Brasil, 2012 – 2015 ... 94

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LISTA DE GRÁFICOS

Artigo 3

Gráfico 1 – Incidência de Leishmaniose Visceral no município de Montes Claros-MG, 2001 a 2015 ... 92 Gráfico 2 – Prevalência de infecção canina, segundo área e ciclo, município de Montes Claros – MG ... 93 Gráfico 3 – Prevalência de infecção canina nos bairros, segundo área e ciclo, município de Montes Claros-MG ... 94

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CCZ EIE DPP ELISA HIV IDRM IFI LC LV

Centro de Controle de Zoonoses Ensaio imunoenzimático

Dual Path Platform

Enzyme Linked Immunosorbent Assay

Human Immunodeficiency Virus – Vírus da Imunodeficiência Humana

Intradermorreação de Montenegro Imunofluorescência indireta Leishmaniose cutânea Leishmaniose visceral

LVC Leishmaniose visceral canina LVH Leishmaniose visceral humana

PVCLV Programa de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral WHO World Health Organization

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ... 16 1.1 CICLO DE BIOLÓGICO ... 17 1.1.1. Leishmania infantum ... 17 1.1.2 Reservatório ... 17 1.1.3 Flebotomíneo ... 18 1.2 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS ... 20

1.3 A LEISHMANIOSE VISCERAL NO BRASIL ... 23

1.4 ASPECTOS CLÍNICOS, DIAGNÓSTICOS E TERAPÊUTICOS DA LV EM HUMANOS ...23

1.4.1 Aspectos Clínicos... ... 24

1.4.2 Diagnóstico... ... 25

1.4.3 Tratamento... ... 27

1.5 ASPECTOS CLÍNICOS, DIAGNÓSTICOS E TERAPÊUTICOS DA LV EM CÃES... ... 28 1.5.1 Manifestações Clínicas... ... 28 1.5.2 Diagnóstico... ... 29 1.5.3 Tratamento... ... 31 1.6 VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA... ... 31 1.7 CONTROLE... ... 32 2 JUSTIFICATIVAS... ... 36 3 OBJETIVOS... ... 37 4 MATERIAIS E MÉTODOS... ... 38 4.1 DESENHO DO ESTUDO... ... 38

4.2 CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE DOS LOCAIS DE ESTUDO... .. 38

4.2.1 Critérios de seleção do município... ... 38

4.2.2 Critérios avaliados após seleção inicial... ... 38

4.3 CENÁRIO DO ESTUDO... ... 39 4.4 PLANO AMOSTRAL... ... 39 4.5 AFERIÇÃO E COLETA... ... 40 4.5.1 Procedimentos pré-encoleiramento... ... 41 4.5.2 Coleta de Sangue... ... 41 4.5.3 Provas sorológicas... ... 41

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4.5.4 Utilização de colares impregnados com deltametrina 4%... .. 42

4.5.5 Acompanhamento dos efeitos adversos ... 42

4.6. VARIÁVEIS DO ESTUDO... ... 42 4.7. ANÁLISE ESTATÍSTICA... ... 43 5 RESULTADOS... ... 44 5.1 ARTIGO 1... ... 44 5.2 ARTIGO 2... ... 65 5.3 ARTIGO 3... ... 86 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS... ... 102 REFERÊNCIAS ... 103 ANEXO A ... 114

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1 INTRODUÇÃO

As leishmanioses são zoonoses que atingem os indivíduos mais pobres entre as populações mais pobres (ALVAR ET AL, 2006). São causadas por protozoários do gênero

Leishmania, que inclui mais de 20 espécies, e pertencem ao quadro das doenças mais

negligenciadas mundialmente (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010).

As leishmanioses podem ser classificadas quanto à sua forma clínica como: leishmaniose cutânea, mucocutânea e visceral. A leishmaniose cutânea (LC) é a forma mais comum da doença, com uma estimativa de 0,7 a 1,3 milhão de casos registrados anualmente no mundo. Aproximadamente 95% dos casos ocorrem nas Américas, Bacia do Mediterrâneo, Oriente Médio e Ásia Central. Os países mais atingidos são Afeganistão, Argélia, Brasil, Colômbia, Irã, Paquistão, Peru, Arábia Saudita e Síria. Em relação à leishmaniose mucocutânea, cerca de 90% dos casos ocorrem na Bolívia, Peru e Brasil (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2014).

A Leishmaniose visceral (LV) é a forma mais grave, em virtude de sua alta incidência e letalidade, especialmente em indivíduos não tratados, além de ser considerada como emergente em indivíduos soropositivos para o vírus da imunodeficiência humana (HIV) (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2014; ALVAR, 2008). Dada sua crescente importância, na América Latina existe a real necessidade de mais pesquisas visando uma maior compreensão da co-infecção HIV/LV, suas manifestações clínicas e imunopatogenia nesses pacientes imunodeprimidos (LINDOSO et al., 2014).

A LV tem uma distribuição bastante abrangente no mundo, com registros na Ásia, Europa, Oriente Médio, África e nas Américas, onde também é chamada de leishmaniose visceral americana e calazar neotropical. Todavia, aproximadamente 90% dos casos ocorrem em apenas seis países, são eles: Índia, Bangladesh, Sudão, Sudão do Sul, Etiópia e Brasil. E, na América Latina, onde a doença já foi descrita em 12 países, mais de 90% dos casos ocorrem no Brasil, principalmente na região Nordeste. (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2015; ALVAR, 2012; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; CENTER FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2010).

No Brasil, a doença é conhecida popularmente como calazar, e seu agente etiológico é

Leishmania infantum. Esta espécie recebeu este nome por ter sido identificada, em 1904, em

crianças com anemia esplênica infantil (CENTER FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2010; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; BRASIL, 2006). Há

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evidências de que este parasito tenha vindo do Sudoeste da Europa para o Novo Mundo em várias correntes imigratórias, especialmente de países endêmicos, como Portugal e Espanha. A partir daí, Leishmania se disseminou rapidamente pela América do Sul, principalmente em decorrência da migração, urbanização e do comércio (KUHLS et al., 2011).

O cão doméstico, incriminado como reservatório primário do parasito, tem papel crucial na dinâmica de transmissão da LV (QUINNELL & COURTENAY, 2009). Há evidências da correlação espacial entre a incidência de casos humanos e a prevalência da infecção em cães, sendo que, em áreas urbanas, em geral, a infecção canina precede o aparecimento dos casos humanos (ZOGHLAMI, et al., 2014; OLIVEIRA et al, 2001; BRASIL, 2006; SILVA et al, 2001; BEVILACQUA et al, 2001). Saraiva et al. (2011) identificaram em seu estudo que os casos humanos de LV e os testes positivos para leishmaniose visceral canina (LVC) estavam geograficamente relacionados.

1.1 CICLO DE BIOLÓGICO

1.1.1 Leishmania infantum

A leishmaniose visceral é causada por protozoários pertencentes ao gênero Leishmania e à família Trypanosomatidae. No Brasil, assim como nas Américas, a espécie causadora da LV é a Leishmania infantum, um parasito celular obrigatório das células do sistema fagocítico mononuclear (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). Este agente pode se apresentar de duas formas: a promastigota, que é flagelada e extracelular, no trato digestivo do flebotomíneo, e a amastigota, que é aflagelada e intracelular, no hospedeiro mamífero. Sua presença gera uma supressão reversível e específica da imunidade mediada por células, o que possibilita sua disseminação no organismo (ALEXANDER et al., 1999).

1.1.2 Reservatório

O cão doméstico desempenha o papel de reservatório do parasito no ambiente urbano, e canídeos selvagens (por exemplo, raposas) e marsupiais no ambiente silvestre. Em geral, a infecção canina apresenta maior prevalência que a humana e costuma preceder a ocorrência de casos humanos. Em estudo desenvolvido na Bahia, verificou-se que a distribuição dos casos de LV canina se assemelhava com a dos casos humanos (SHERLOCK & ALMEIDA, 1970).

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O seu papel no ciclo de transmissão do parasito no meio urbano não deve ser subestimado, ainda mais considerando a alta freqüência de cães com infecção assintomática, que também podem transmitir o parasito (BRASIL, 2006; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). Estudos têm mostrado que, quanto mais intensas as manifestações clínicas da doença, maior a infecciosidade do animal, contudo, mesmo sem apresentar sintomas, o animal apresenta carga parasitária suficiente para transmitir o parasito ao flebotomíneo (SOARES et al., 2010; QUINNELL & COURTENAY, 2009). Em recente estudo conduzido em Belo Horizonte, observou-se que, de todos os cães identificados como soropositivos, 45% eram assintomáticos (LARA-SILVA et al, 2015). Os cães, assim como o homem, têm baixo número de parasitos circulantes, todavia, sua eficiência como fonte de infecção vem da abundância de amastigotas na pele (VEXENAT, 1994).

Em países da Ásia, principalmente no subcontinente indiano, a leishmaniose visceral é antroponótica, na qual o reservatório é o ser humano, diferentemente do que ocorre nas Américas e na região mediterrânea da Europa e África, onde humanos não desempenham papel relevante como fonte de infecção (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010).

1.1.3 Flebotomíneo

Os flebotomíneos são os vetores da LV, popularmente conhecidos no país como mosquito palha ou birigui (BRASIL, 2006). No Brasil existem duas espécies principais ligadas à transmissão de L. infantum, os flebtomíneos Lutzomyia longipalpis e Lutzomyia

cruzi, sendo a primeira apontada como a de maior importância epidemiológica (SARAIVA et

al., 2011; BRASIL, 2006). Em estudo realizado em Pernambuco, foram capturadas, por meio de armadilhas, quatro espécies de flebotomíneo, Lutzomyia longipalpis, Lutzomyia evandroi,

Lutzomyia lenti e Lutzomyia sallesi, sendo quase a totalidade da primeira espécie e com

predominância de machos (COSTA, 2011). Assim como Costa (2011), Saraiva et al. (2011) também identificaram um maior número do vetor no ambiente peridomiciliar, em comparação ao intradomiciliar, uma vez que este tem menos caracterísitcas que atraem o flebotomíneo (SARAIVA et al., 2011; COSTA, 2011). Outro fator importante foi a escassez do inseto em domicílios que não contavam com a presença de animais domésticos (COSTA, 2011). L.

longipalpis tem ampla distribuição no território nacional, podendo ser encontrada em

qualquer das cinco regiões brasileiras, inclusive na região Sul, que registrou sua ocorrência pela primeira vez em 2009 (SOUZA et al., 2009). Originalmente, L. Longipalpis, nas regiões Norte e Nordeste, era encontrada nas matas, participando do ciclo silvestre de transmissão da

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doença. Gradualmente esse inseto foi se adaptando ao ambiente rural e, no fim dos anos 80, observou-se sua adaptação ao ambiente urbano, particularmente na periferia das grandes cidades. Esse processo adaptativo dessas espécies vetoras pode ser constatado em várias áreas urbanas de cidades endêmicas. Os bairros onde há maior número do flebotomíneo são, em geral, locais onde houve devastações, o que tornou as matas escassas, e onde se formaram ilhas de vegetações isoladas (BARATA et al., 2005).

Além de sua significativa adaptabilidade a diversos ambientes, L. longipalpis também se destaca por sua versatilidade no que diz respeito à fonte de alimentação, uma vez que demonstram capacidade de se alimentar em uma considerável variedade de animais, o que aumenta sua importância epidemiológica (BARATA et al., 2005). Estes insetos possuem o corpo revestido por pêlos, são de cor clara e pequenos, medindo de 1 a 3 mm de comprimento. Na fase larvária, desenvolvem-se em ambiente úmido e rico em matéria orgânica e de baixa luminosidade, entretanto, na fase adulta se adaptam a ambientes diversos.

L. longipalpis se mostra resistente à variação da temperatura, sem comprometimento das suas

atividades. Além disso, seu ciclo evolutivo não sofre importantes alterações em conseqüência da variação da luminosidade e temperatura. Durante e após a estação das chuvas há um aumento na densidade populacional dos flebotomíneos, resultando, em princípio, em um período de maior transmissão da LV. Sua atividade é crepuscular e noturna, sugerindo que o repasto sanguíneo também ocorre neste período. À noite também, a maior parte das fêmeas desova e ocorre o maior número de eclosões de ovos adultos (RANGEL et al., 1987). Durante o dia mantém-se em repouso, em locais úmidos e sombreados, protegendo-se de ventos e predadores naturais (BRASIL, 2006). Em geral, a oviposição e a eclosão de adultos da L.

longipalpis ocorrem sob penumbra ou ausência completa de luz. Ainda que não indispensável,

verifica-se um melhor desempenho no ciclo evolutivo do vetor em ambiente escuro (RANGEL et al., 1987).

Em estudo para conhecimento da biologia do flebótomo em cativeiro, observou-se uma predileção alimentar eclética das larvas de L. longipalpis, sugerindo grande capacidade de adaptação a diferentes ambientes na natureza. Apenas as fêmeas do flebotomíneos são hematófagos, entretanto, assim como os machos, estas também utilizam seiva vegetal como fonte de alimento, sem substituir o sangue. Observou-se que todas as fêmeas sobreviveram até o quinto dia sem o repasto sanguíneo e, no oitavo dia, 15% delas estavam mortas por privação de sangue. O ciclo evolutivo de ovo a adulto se mostra mais prolongado para os descendentes dos flebótomos alimentados em cão e hamster. Além disso, o cão, como fonte de alimento, proporciona uma alta percentagem de desova e produtividade das fêmeas, (RANGEL et al.,

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1986). Esse flebótomo possui grande facilidade para adquirir infecção de cães com LV e a infecção é altamente transmissível entre cão-flebotomomíneo-cão (VEXENAT et al., 2004).

O ciclo de transmissão se inicia quando a fêmea do flebotomíneo, cuja longevidade está em torno de 20 dias, ao sugar o sangue de um mamífero infectado, ingere macrófagos infectados pela forma amastigota da Leishmania. Esse macrófago é rompido no trato digestivo anterior, liberando o parasito, que se reproduz e se diferencia em formas flageladas chamadas de promastigotas, que colonizam o esôfago e faringe do vetor, onde permanecem aderidas pelo flagelo, quando se diferenciam em formas infectantes (FREITAS et al., 2012; BRASIL, 2006). Após essa fase, ao realizarem novo repasto sanguíneo em um hospedeiro, as fêmeas liberam junto com a saliva essas formas promastigotas infectantes, denominadas promastigotas metacíclicas, que na epiderme do hospedeiro serão fagocitadas por células do sistema mononuclear fagocitário. Dentro dos macrófagos, diferenciam-se em amastigotas, multiplicam-se até o rompimento dos mesmos, ocasionando disseminação hematogênica para outros tecidos ricos em células do sistema mononuclear fagocitário, como linfonodos, fígado, baço e medula óssea. O período de incubação no homem varia de 10 dias a 24 meses, com média de 2 a 6 meses, e no cão esse período é bastante variado, de 3 meses a muitos anos, com média de 3 a 7 meses (BRASIL, 2006).

1.2 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS

A cada ano, no mundo, são estimados de 200.000 a 400.000 novos casos de LV e 59 mil óbitos pela doença (ALVAR et al., 2012). No âmbito mundial, são 76 países com registro de casos, sendo 12 deles nas Américas, onde, segundo estimativas, ocorrem de 4.500 a 6.800 novos casos por ano. A doença vem aumentando sua importância em termos de saúde pública em virtude de sua urbanização (ALVAR et al., 2012; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2007; MARINS, 2011; SILVA et al., 2001; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2012).

As características do parasito, as características ecológicas dos sítios de transmissão, exposição atual e passada da população ao parasito, e as questões referentes ao comportamento humano influenciam o padrão epidemiológico de ocorrência da doença. Como os cães são os reservatórios para a L. infantum e também atraem flebotomíneos, especialmente Lu. Longipalpis, o hábito de manter esses animais dentro de casa expõe os indivíduos a um maior risco de infecção (FRANÇA-SILVA, 2003). Constatou-se que qualquer raça de cão está susceptível ao parasito, independentemente de idade e sexo, contudo, características referentes ao comprimento do pêlo do animal podem ter maior

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importância na prevalência de infecção (BELO et al., 2013; FRANÇA-SILVA, 2003). Foram identificados como fatores de risco para infecção o pêlo curto do animal, a rotina de dormir no quintal e o tamanho do cão, mostrando que cães de médio e grande porte seriam mais suscetíveis, provavelmente por passarem maior tempo fora da residência e por terem maior superfície corporal, o que facilitaria a ação do vetor (PENAFORTE et al., 2013; COURA-VITAL et al., 2013; BELO et al., 2013). Ademais, os cães são considerados a maior fonte de infecção para o flebotomíneo na transmissão da LV para o homem e outros animais, mesmo não apresentando, muitas vezes, qualquer sinal de doença (SOARES et al., 2011; QUINNELL & COURTENAY, 2009). O animal assintomático pode ter baixa carga parasitária na pele e ainda assim apresentar alta infectividade em relação ao vetor, tal como um cão sintomático (BORJA, 2013).

Muitos estudos classificam o cão doméstico como reservatório primário da LV, argumentando que esses animais frequentemente apresentam alta prevalência de infecção e infecciosidade, infecções duradouras e estão fortemente presentes no ambiente peridoméstico, local de ocorrência da doença (QUINNELL, 2009). Outros animais tidos como potenciais reservatórios, como raposa e gambá parecem não ser os responsáveis pelo alto número de casos da doença, já que não são encontrados em abundância e não tem muita proximidade com humanos (DIETZE et al., 1997).

A presença de galinheiro nas proximidades, além ser uma fonte de alimentos para o inseto, acarretando um maior contato deste com os cães e humanos, atrai animais silvestres carnívoros, que são também reservatórios para LV (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; SILVA et al., 2001). A criação de galinhas é uma atividade muito comum em áreas urbanas, peri-urbanas e rurais em todo o país, contudo, galinheiros foram identificados como os locais preferenciais de alimentação da L. longipalpis, com evidências, inclusive, de que estejam correlacionados à alta soropositividade entre cães, o que mostraria a relevância dessas aves para a alta densidade de flebotomíneos. Vale ressaltar que todas as aves são refratárias à infecção, não havendo relatos de sua atuação como reservatório do parasito (DIAS et al., 2003). Assim sendo, é possível que estratégias de controle direcionadas para as formas imaturas do vetor nesse microhabitat obtivessem melhores resultados na redução das formas adultas, o que ocasionaria na queda da transmissão (CASANOVA et al., 2013; OLIVEIRA, 2010).

Tradicionalmente, a doença aparece predominantemente em lugares mais remotos (áreas rurais), com pessoas de classe socioeconômica menos favorecida e desprovidas de cuidados à saúde, principalmente em países em desenvolvimento (WORLD HEALTH

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ORGANIZATION, 2008). A pobreza aumenta o risco de LV, já que habitações mais pobres e sob condições sanitárias precárias, como falta de gestão de resíduos e sem tratamento de esgoto, também propiciam à aproximação do vetor (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). A doença está intimamente relacionada às mudanças no ambiente tais como desmatamento, construção de barragens, novos sistemas de irrigação, urbanização e migração de pessoas não imunes para áreas endêmicas (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010b). Desde 1980, o Brasil tem vivido um aumento acentuado no número de casos de LV. As epidemias antes restritas ao ambiente rural se expandiram para as áreas urbanas. As várias modificações na estrutura rural do país como os períodos de seca intensa e a falta de terras, geraram uma forte migração para a periferia dos centros urbanos , locais que não oferecem infra-estrutura ou condições sanitárias adequadas e que aproximam as habitações do ciclo silvestre da doença. Nesse contexto, encontram-se pessoas susceptíveis entrando em áreas de transmissão e muitas vezes mal nutridas, ocasionando um risco para a doença ainda maior (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010c; GONTIJO & MELO, 2004).

Mudanças ambientais e climáticas também estão relacionadas ao risco de transmissão do parasito. Dependendo do sítio de transmissão, mudanças naturais ou feitas pelo homem podem resultar tanto no aumento quanto na diminuição da incidência da doença. Dentre essas modificações, pode-se incluir a urbanização, domiciliação do ciclo de transmissão, entrada de assentamentos em áreas próximas à floresta e adaptação do vetor a esses ambientes modificados pelo homem. O risco geralmente é maior para aquelas pessoas que habitam áreas periféricas próximas a focos naturais e, portanto, ao ciclo silvestre (BRASIL, 2006; GONTIJO & MELO, 2004). Esse fenômeno tem sido muito freqüente no Brasil, onde há uma ocupação acelerada e desordenada das periferias das cidades de grande e médio porte (BARRETO et al., 2011; GONTIJO & MELO, 2004).

Em áreas endêmicas, a maior parte dos casos de LV ocorre em crianças menores de 10 anos, sendo 41% delas menores de cinco anos (BRASIL, 2006). Outros estudos identificaram que a incidência da doença foi maior entre as crianças de até quatro anos de idade (CARDIM et al., 2015; VIEIRA et al., 2014). Além disso, nestas áreas, a maioria dos adultos já tem história de infecção clínica ou subclínica, sendo que aproximadamente 30% deles apresentam a Intradermorreação de Montenegro (IDRM) positiva sem registro de doença prévia. Todavia, em locais com foco de introdução recente, adultos são igualmente atingidos (BRASIL, 2006). No Brasil, são mais comuns infecções assintomáticas e formas mais brandas que manifestações mais intensas da doença, apenas 20% dos indivíduos infectados desenvolvem a doença clássica (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). Cardim et al. (2015)

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identificaram maior letalidade entre os indivíduos de 40 a 59 anos de idade, enquanto que VIEIRA et al. (2014) encontraram maior letalidade em indivíduos com 60 anos e mais, em função da existência de comorbidades. Dentre os principais fatores de risco para a evolução para LV estão a má nutrição, fatores genéticos e outras doenças infecciosas. Com relação às doenças infecciosas como fator de risco, a infecção pelo HIV merece destaque nesse contexto, já que um indivíduo portador desse vírus apresenta maior risco de desenvolver leishmaniose visceral, bem como de ter sua resposta ao tratamento antirretroviral prejudicada (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2003; NASCIMENTO et al., 2005).

1.3 A LEISHMANIOSE VISCERAL NO BRASIL

A região nordeste é a que concentra o maior número de registros da doença no país, contabilizando quase 50% dos casos notificados no ano de 2012. As taxas de incidência da LV vêm aumentando não apenas na região nordeste, mas também nas regiões Norte, Centro-Oeste e Sudeste. Os casos entre crianças de 0 a 9 anos respondem por quase 50% do total. Em 2012, foram registrados aproximadamente 3.000 casos da doença no país. Sua letalidade está na ordem dos 6% (BRASIL, 2013). Existem no Brasil atualmente 138 municípios considerados de transmissão intensa do parasito (MARINS, 2011). A primeira grande epidemia brasileira ocorreu em Teresina, no Piauí, entre 1981 e 1986, quando foram registrados quase mil casos da doença. A maioria destes, oriundos de bairros recém formados, de assentamento de migrantes (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2002; COSTA, 1990; BRASIL, 2013) .

Em 1950, apenas um terço da população habitava as cidades, hoje esse número já é superior a 50%. Na América do Sul, mais de 70% da população vive nas cidades e essa realidade e tendência trazem consigo doenças de caráter rural para dentro de áreas urbanas. Acrescenta-se a esse processo a presença marcante do flebotomíneo nesses subúrbios pobres, já que por vezes o novo migrante leva consigo cães, galinhas e porcos, gerando acúmulo de matéria orgânica, criando um ambiente extremamente favorável à existência de Lutzomyia

longipalpis, uma vez que o inseto se adapta facilmente às condições peridomésticas (WORLD

HEALTH ORGANIZATION, 2002).

1.4 ASPECTOS CLÍNICOS, DIAGNÓSTICOS E TERAPÊUTICOS DA LV EM HUMANOS

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1.4.1 Aspectos clínicos

Os sintomas clássicos de LV são febre, hepato e esplenomegalia, palidez, hiporexia, tosse e dor abdominal. A infecção por L. infantum no homem gera hiperplasia reticuloendotelial que afeta o baço, fígado, mucosa do intestino delgado, medula óssea, linfonodos e outros tecidos linfóides. Uma grande parte dessas células está parasitada. O tempo de vida dos leucócitos e eritrócitos fica reduzido, provocando granulocitopenia e anemia. A função hepática pode estar alterada ou não; e a produção de protrombina diminui, o que juntamente com a trombocitopenia pode acarretar hemorragia mucosa grave. A diarréia pode ocorrer como resultado de parasitismo e ulceração do intestino. Seu aparecimento, assim como de emagrecimento e vômitos podem significar marcadores de mau prognóstico. Infecções intercorrentes são comuns em estados mais avançados, principalmente pneumonia e gastroenterite, causas freqüentes de óbito (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; OLIVEIRA et al., 2010).

Quanto à sua sintomatologia, a infecção por L. infantum pode diversificar bastante, gerando desde manifestações inaparentes e oligossintomáticas, caracterizada por quadro clínico discreto, de curta duração e que geralmente culmina em cura espontânea, a manifestações graves, que se não tratadas levam o paciente ao óbito (BRASIL, 2006).

Os pacientes com a LV, ou seja, indivíduos com sintomatologia, apresentam como quadro clínico clássico febre, perda de peso, esplenomegalia, acompanhada ou não de hepatomegalia, além de alterações no hemograma evidenciando anemia, trombocitopenia e/ou leucopenia. Essas manifestações podem surgir em meses, e até anos após a picada do flebotomíneo infectado. O diagnóstico pode ser sorológico, parasitológico ou pelo método do PCR (amplificação do DNA do parasito) (CENTER FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2008). No primeiro estudo de âmbito nacional sobre os fatores de risco para o óbito por LV, no qual se criou um sistema de score referente ao prognóstico da doença, os sinais de maior risco para morte seriam esplenomegalia, fraqueza, hemorragia, icterícia, idade igual ou inferior a um ano ou superior a 19 anos, co-infecção com HIV e infecção bacteriana. A observação destes sinais permitiria a identificação de casos potencialmente mais severos (COURA-VITAL et al., 2014). Alvarenga et al. (2010) relatam letalidade de 18,4% em pacientes com comorbidade, acompanhados em unidade de referência para o tratamento da doença.

Quando a doença evolui sem que diagnóstico e tratamento sejam feitos, a letalidade pode chegar a quase 100%. É comum que nesses pacientes as causas do óbito sejam

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sangramentos agudos, broncopneumonias, septicemias, insuficiência cardíaca devido à anemia grave, caquexia, coagulopatias transfusionais e/ou infecções bacterianas (BRASIL, 2006; INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2003).

1.4.2 Diagnóstico

O diagnóstico da LV ainda é algo complexo, uma vez que a doença apresenta semelhanças clínicas com outras e em virtude da ausência de um padrão de referência apropriado. Atualmente, o que se utiliza como referência é a demonstração microscópica do parasito no baço, medula óssea, linfonodos ou aspirados do fígado, contudo, tanto a punção quanto a leitura das lâminas exigem um alto grau de conhecimento, o que o torna inviável para utilização em campo. Além deste aspecto, o teste parasitológico, embora apresente boa especificidade, tem a sensibilidade influenciada pela amostra do tecido e qualidade da leitura. Sendo assim, como consequência destas limitações, muitos testes sorológicos vêm sendo utilizados como alternativa (ASSIS et al, 2012a).

O diagnóstico da infecção em casos assintomáticos é realizado por meio de positividade em exames sorológicos como enzyme linked immunosorbent assay (ELISA) e imunofluorescência indireta (IFI) ou ainda mediante reatividade à intradermorreação de Montenegro (IDRM) (BRASIL, 2006). Todos os exames sorológicos apresentam duas principais limitações como meio diagnóstico de LV: a primeira é que anticorpos específicos permanecem detectáveis até vários anos após a cura, assim, uma recidiva pode não ser fielmente diagnosticada pela sorologia; e a segunda é que uma parte bastante significativa de pessoas saudáveis, sem história de leishmaniose visceral, que vive em áreas endêmicas, é positiva para anticorpo anti-leishmania devido às infecções assintomáticas (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2012).

A IDRM é um teste que consiste na inoculação de um extrato antigênico de leishmanias na face anterior do antebraço, cuja leitura é realizada 48-72 horas após esse procedimento. É considerado negativo caso não haja qualquer sinal da inoculação e, positivo caso haja enduração igual ou maior a cinco milímetros (FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, 2003). Este teste é, portanto, um indicativo de infecção atual ou passada por Leishmania. Ele, entretanto, não é utilizado para diagnosticar a doença LV, já que se torna positivo após a cura clínica na maior parte dos pacientes, por um período médio de seis meses a três anos após término do tratamento (BORGES et al., 2003; BRASIL, 2006). Uma pesquisa, realizada na cidade de Teresina, no Piauí, cujo objetivo era identificar os fatores associados à positividade

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da IDRM em uma área urbana com grande força de transmissão, mostrou que essa positividade foi maior em homens, em pessoas proprietárias de cão por período igual ou maior a três anos e 19% maior para cada aumento de dez anos na idade do indivíduo (GOUVÊA et al., 2007) .

Entre os sorológicos, o ELISA e IFI são os mais utilizados no Brasil. Um resultado reagente deve ser utilizado em combinação com achados clínicos para que um diagnóstico de LV seja sustentado. Apenas um teste reagente na ausência de manifestações clínicas sugestivas de LV não valida o início do tratamento. Quanto ao diagnóstico parasitológico, como já mencionado anteriormente, este consiste na visualização da forma amastigota do parasito pelo exame microscópico de aspirados de tecidos. É o teste confirmatório clássico para LV. Embora possua alta especificidade, sua sensibilidade é variável, sendo maior para punção aspirativa esplênica (93-99%) que para punção de medula óssea (53-86%) e linfonodos (53-65%). E a detecção do DNA do parasito por PCR no sangue ou aspirado de medula óssea é mais sensível que o exame microscópico, todavia seu uso é atualmente restrito a hospitais de referência e centros de pesquisa (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; BRASIL, 2006).

Devido à dificuldade do diagnóstico, cada vez mais se faz necessária a utilização de métodos de simples execução, interpretação e que gerem rapidamente o resultado. Os testes rápidos possuem sensibilidade e especificidade variáveis dependendo da região e do fabricante. O teste imunocromatográfico rápido que utiliza o antígeno rK39, de uma forma geral, tem apresentado bom desempenho no subcontinente indiano, diferentemente dos resultados observados no leste da África e no Brasil, que apresentaram sensibilidades e especificidades (61% e 91%, respectivamente) mais baixas (CUNNINGHAM et al., 2012; ASSIS et al., 2008; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2012). Entretanto, em estudo conduzido em quatro estados brasileiros (Maranhão, Piauí, Bahia e Minas Gerais), foi encontrada sensibilidade de 93% e especificidade de 97%, o que permitiria a recomendação deste método para diagnóstico rápido de LV (ASSIS et al, 2008).

Os testes menos invasivos como ELISA, IFI e PCR, requerem profissionais capacitados e maior estrutura laboratorial, uma alternativa seria a utilização do Teste de Aglutinação Direta (Direct Agglutination Test – DAT), um teste sorológico facilmente aplicável ao campo, não invasivo e de alta sensibilidade no diagnóstico de casos novos de LV (ASSIS et al, 2012b; ASSIS et al, 2011; BERN et al, 2000).

Os testes diagnósticos vêm avançando ao longo dos anos, entretanto, nenhum deles apresenta sensibilidade e especificidade de 100%, são, portanto, freqüentemente utilizados

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juntamente com parâmetros clínicos e epidemiológicos (GONTIJO & MELO, 2004). Visando um melhor desempenho dos testes, há recomendações para uso de leitura em série, utilizando-se primeiramente um teste rápido, que é mais simples e mais barato (ASSIS et al, 2012b).

1.4.3 Tratamento

Os medicamentos utilizados para tratamento da LV no Brasil são o antimonial pentavalente e a anfotericina B. O Ministério da Saúde (MS) recomenda o antimoniato de N-metil glucamina, como droga de primeira escolha, contudo, a decisão deve ser pautada na faixa etária, presença de gravidez e comorbidades. Esse medicamento pode ser administrado ambulatorialmente, por via endovenosa ou intramuscular (BRASIL, 2009; BRASIL, 2011a).

O antimoniato possui como principal efeito adverso prejuízos sobre o sistema cardiovascular, o que exige um rigoroso acompanhamento, com o objetivo de detectar arritmias. A anfotericina B é ofertada pelo MS sob duas apresentações, anfotericina B lipossomal e anfotericina B desoxicolato, ambas com eficácia semelhante. Quanto aos efeitos adversos, estes são numerosos, frequentes, dose dependentes e altamente tóxicos para o endotélio vascular (BRASIL, 2009). Foi visto que pacientes submetidos ao tratamento com as três drogas apresentam alterações bioquímicas e no status nutricional (GATTO et al, 2013).

As decisões terapêuticas em países endêmicos devem ser baseadas na relação de risco-benefício dos medicamentos, no cenário dos serviços de saúde, na avaliação dos medicamentos leishmanicidas e em algumas considerações do âmbito da saúde pública, como a prevenção de resistência medicamentosa (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). A taxa de falha no tratamento com o uso desses medicamentos em pacientes imunocompetentes com LV no Novo Mundo é menor que 2% (SANTOS et al., 2002). Antes do início do tratamento, o paciente deve ser rigorosamente examinado em virtude dos efeitos colaterais do composto, principalmente sobre o aparelho cardiovascular, pois o medicamento pode gerar distúrbios de repolarização. Ainda que o tratamento instituído seja o adequado, a taxa de letalidade da doença pode alcançar 5 % (WERNECK, 2010) ou mesmo 10% em alguns locais, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (2010). O prognóstico torna-se ainda pior quando associado à presença de comorbidades. Em estudo realizado com pacientes diagnosticados com LV, no grupo que apresentava comorbidade, a letalidade chegou a 18,4% (MONREAL et al., 2010). O diagnóstico oportuno e o tratamento apropriado são as formas de se evitar o óbito, uma vez a doença instalada. Uma estratégia a ser discutida, visando um tratamento bem sucedido, poderia ser o desenvolvimento e validação de um score unificado

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de severidade para a LV, de maneira a orientar a escolha terapêutica mais adequada (MELO & FORTALEZA, 2013)

Os obstáculos que envolvem o tratamento da LV são muitos, vão desde a dificuldade de acesso aos serviços públicos de saúde até o pouco conhecimento sobre a real efetividade das drogas disponibilizadas para tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), quer dizer, o quanto as medidas terapêuticas recomendadas são de fato baseadas em ensaios clínicos e opiniões de especialistas (MELO & FORTALEZA, 2013)

É uma realidade que drogas para LV não tem sido desenvolvidas, e aquelas que são desenvolvidas em laboratórios de pesquisa não chegam aos pacientes mais vulneráveis. Embora progressos tenham sido alcançados, o regime terapêutico vigente está muito aquém do ideal. Além de um número disponível bastante reduzido, as drogas utilizadas no tratamento da LV envolvem outras dificuldades, como o desenvolvimento de resistência, eficácia limitada para as diferentes cepas e custo (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2012).

Nas situações em que o paciente não reside próximo à unidade de saúde de referência, e necessita se submeter a grandes deslocamentos, o tratamento pode ser bastante custoso e influenciar a adesão do indivíduo. Na medida em que a maioria das drogas prescritas é administrada por via intravenosa, torna-se impossível a condução do tratamento no domicílio. É importante que gestores e profissionais de saúde sejam flexíveis no sentido de adequar o tratamento às especificidades da população, minimizando as barreiras existentes. (FREITAS-FILHO et al, 2012; THORNTON et al, 2010).

Há propostas de combate à LV que visam o desenvolvimento de drogas de administração oral, facilitando assim a conclusão do tratamento. Companhias farmacêuticas têm engavetado pesquisas para o desenvolvimento de melhores drogas, argumentando que seus consumidores seriam incapazes de pagar os valores necessários para compensar o investimento feito (HAYDEN, 2014).

1.5 ASPECTOS CLÍNICOS, DIAGNÓSTICOS E TERAPÊUTICOS DA LV EM CÃES

1.5.1 Manifestações Clínicas

A LV no cão é uma doença sistêmica grave, cujo quadro clínico está diretamente relacionado à resposta imunológica do animal infectado. As manifestações clínicas variam de uma aparência sadia até uma condição de extremo comprometimento (BRASIL, 2006). A

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sintomatologia dos cães infectados por Leishmania infantum pode ser categorizada de acordo com a classificação de Mancianti modificada (1988). São considerados casos assintomáticos aqueles que não apresentam qualquer sinal ou sintoma referente à infecção pelo parasito, oligossintomáticos são os que apresentam linfoadenopatia, discreta perda de peso e/ou pêlo opaco, e os sintomáticos são os animais que manifestam todos ou alguns dos sinais mais graves da doença, como alterações cutâneas, especialmente úlceras, eczema furfuráceo, alopecia, além de onicogrifose, rigidez de membros inferiores, ceratoconjuntivite etc. O autor ainda acrescenta que a resposta do cão ao tratamento com antimoniais ocorre em função das condições clínicas do animal. Naqueles com manifestações mais severas foi constatada uma taxa de cura mais baixa, diferentemente dos assintomáticos, cuja taxa de cura foi a mais elevada.

1.5.2 Diagnóstico

Em 2011 foi publicado o novo protocolo de diagnóstico de LV em cães, pelo Ministério da Saúde, no qual se recomenda a utilização do teste rápido imunocromatográfico como o método de triagem e o ELISA como método confirmatório (BRASIL, 2011b).

O teste imunocromatográfico rápido Dual Path Platform (DPP®), produzido por Bio-Manguinhos/Fiocruz, é utilizado para a detecção dos anticorpos específicos K26/K39 e gera o resultado em 20 minutos (GRIMALDI et al, 2012; SCHUBACH, 2011). Em estudo, cujo objetivo era avaliar este método a partir de um painel de soro de cães, definidos previamente como verdadeiramente positivos e negativos, foi mostrado que o teste apresenta potencial aplicabilidade em campo para diagnóstico de cães com manifestações clínicas mais severas. O teste mostrou aumento da capacidade diagnóstica com a progressão da doença. Sua sensibilidade foi de 47% na identificação de cães infectados assintomáticos e de 98% para cães sintomáticos, além de uma especificidade de 96% (GRIMALDI et al, 2012). Em estudo conduzido em uma área endêmica em Fortaleza/CE, cujo objetivo era avaliar a eficácia deste teste, foi utilizada uma combinação de resultados de diferentes técnicas, em virtude da ausência de um método diagnóstico padrão-ouro. A execução do teste em amostras de sangue total utilizando leitura visual e em soro, utilizando leitura visual ou eletrônica, apresentou resultados semelhantes, sensibilidade de 88% e especificidade de cerca de 73%, sugerindo a viabilidade do teste em trabalhos de campo sem o auxílio de instrumentos eletrônicos, além de gerar o resultado em apenas 20 minutos (SCHUBACH, 2011). Em pesquisa implementada para se validar o ensaio imunoenzimático EIE® e DPP® para diagnóstico de LV canina,

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utilizando o teste de imunofluorescência indireta como padrão-ouro, observou-se que a capacidade do teste imunocromatográfico de detectar a infecção variava de acordo com o quadro clínico da doença, alta sensibilidade para detecção de infecção em cães sintomáticos e baixa em cães assintomáticos. O teste obteve melhores resultados que o EIE, o que o tornaria melhor opção como teste de triagem sorológica em programas de controle (QUEIROZ JUNIOR, 2011).

Um outro estudo comparou o novo protocolo de diagnóstico de LV canina, adotado pelo Ministério da Saúde, com o antigo. Foi identificado que tanto a prevalência quanto a incidência de infecção foram superiores com a utilização do novo protocolo, sugerindo que a magnitude da infecção em regiões endêmicas até então estava sendo subestimada (COURA-VITAL et al, 2014). Apesar da substituição de métodos, a sensibilidade dos antígenos utilizados nestas técnicas ainda está aquém do ideal, o que reforça a necessidade de validação de novos antígenos (FARIA & ANDRADE, 2012).

É fundamental que os testes diagnósticos tenham boa acurácia, uma vez que os resultados definirão se o animal será eliminado ou não (COURA-VITAL et al, 2014). Um avanço significativo no controle da LV no futuro poderia estar atrelado à melhoria dos atuais exames sorológicos, de maneira a reduzir a freqüência de resultados falso-negativos (DINIZ et al, 2008). Além disso, é essencial que haja um método de fácil execução, rápido, de maneira e reduzir o longo tempo de espera entre coleta da amostra e obtenção do resultado, e confiável, sob o ponto de vista dos proprietários dos animais (QUEIROZ JUNIOR, 2011).

Um fator complicador para o diagnóstico clínico de LV nos cães é o fato de haver um grande número de animais assintomáticos e oligossintomáticos, embora haja estudo mostrando que os sintomáticos são cerca de quatro vezes mais infectantes para o flebotomíneo em comparação com os oligossintomáticos e assintomáticos. Todavia, essas últimas duas formas clínicas não podem deixar de serem consideradas na epidemiologia da LV em áreas endêmicas, uma vez que são capazes de infectar o flebotomíneo (MICHALSKY et al., 2007; BRASIL, 2006; MOLINA et al, 1994). Em estudo no qual foram utilizados modelos matemáticos para se avaliar a efetividade dos programas de controle, focando na importância da infecção assintomática canina, aponta-se que, em áreas de muito baixa transmissão, eliminar apenas os cães sintomáticos geraria resultados satisfatórios, com a vantagem de ser um programa que removeria muito poucos cães saudáveis, o que também ocasionaria um maior nível de aceitação por parte da população. Por outro lado, em áreas de elevada endemicidade, sacrificar apenas cães sintomáticos não seria suficiente, uma vez que a

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população de cães assintomáticos já seria capaz de manter a transmissão (COSTA et al., 2013).

Outro ponto a ser considerado é que para a identificação da espécie de Leishmania circulante é essencial que a confirmação parasitológica, para diagnóstico da LV no cão, seja seguida da determinação da variabilidade fenotípica e genotípica do parasito (MADEIRA et al., 2004).

1.5.3 Tratamento

Os medicamentos utilizados no tratamento de LV humana não são indicados para o tratamento da LV canina em virtude da sua baixa eficácia nestes animais somada à possibilidade de promover resistência do parasito. Um número muito significativo de cães tratados, mesmo alcançando a cura clínica, retoma sua infectividade, o que mascara assim esta fonte de infecção (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010).

No Brasil, a Portaria Interministerial Nº 1.426, de 11 de julho de 2008 determina a proibição do tratamento de cães com leishmaniose visceral, infectados ou doentes, com produtos de uso humano ou não-registrados, em todo o território nacional.

1.6 VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA

Segundo o Ministério da Saúde (2006), configura-se um caso humano suspeito de LV quando o indivíduo oriundo de área com ocorrência de transmissão apresenta febre e esplenomegalia ou quando o indivíduo proveniente de área sem ocorrência de transmissão apresenta essas mesmas manifestações, desde que descartados os diagnósticos diferenciais mais freqüentes da região. Um caso humano confirmado é aquele definido através de critério clínico laboratorial, ou seja, quando o parasito é encontrado nos exames parasitológicos direto e/ou cultura ou quando imunofluorescência reativa com título de 1:80 ou mais, desde que excluídos outros diagnósticos diferenciais; ou através de critério clínico epidemiológico, qual seja, paciente de área de transmissão de LV, com suspeita clínica sem confirmação laboratorial, mas com resposta favorável ao teste terapêutico. O profissional que maneja o caso deve notificá-lo ao sistema de vigilância epidemiológica, usando a definição de caso, já que é uma doença de notificação compulsória. Esse tipo de registro abrange apenas uma fração do número real de doentes, uma vez que o acesso ao atendimento para doença

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negligenciada é limitado e os casos tratados no setor privado muitas vezes não são notificados, gerando assim, a subestimação do número de casos.

Uma dificuldade para a vigilância da doença é a descentralização das atividades para o nível municipal, que esbarra muitas vezes em uma infraestrutura deficitária frente a um agravo muito complexo (NASCIMENTO et al., 2008). Visando-se a redução de mortes por LV, é necessário instrumentalizar os profissionais de saúde de maneira a torná-los capazes de conduzir e empoderar esse serviço localmente (LUZ et al., 2009).

1.7 CONTROLE

Não há evidências do impacto positivo das estratégias usualmente utilizadas para o controle da LV, ao contrário, elas têm se mostrado pouco efetivas para contenção da disseminação da doença no país, uma vez que o número de casos de LV apresenta tendência de crescimento, além de propagação da transmissão da doença para locais até então não afetados (ROMERO & BOELAERT, 2010). Elas estão pautadas nas seguintes medidas: diagnóstico precoce e tratamento dos casos, redução da população de flebotomíneos e eliminação dos reservatórios. Sendo assim, o controle da doença não pode ser alcançado investindo-se em apenas uma única intervenção de maneira isolada (MAIA-ELKHOURY et al., 2008; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010; GONTIJO & MELO, 2004; BRASIL, 2006). É fundamental um criterioso controle das ações para eliminação de cães soropositvos, uso de inseticida com ação residual, assim como para vigilância epidemiológica (BARATA et al., 2013). Existem muitas razões para a relativa inefetividade do controle de reservatórios, em parte, ela vem sendo atribuída ao longo tempo entre a realização do exame sorológico e a eliminação do cão, à baixa sensibilidade da sorologia para identificar cães infectados e a baixa cobertura da população de cães infectada (ZUBEN & DONALISIO, 2016; MENON et al., 2016). Além disso, em aproximadamente 45% dos domicílios, dos quais o cão é recolhido para ser sacrificado em conseqüência de infecção, há reposição dos animais em um ano. Essa renovação canina por cães geralmente mais jovens acarreta algumas implicações epidemiológicas como maior suscetibilidade e capacidade de procriação dos mesmos (ANDRADE, 2007).

Existem muitos métodos para o controle dos flebotomíneos em ambiente doméstico e peridoméstico, destacando-se o uso de produtos químicos, gestão ambiental e proteção pessoal. Ainda que alguns métodos possam provocar um efeito consistente sobre a população dos insetos, é fortemente recomendado que mais de um método faça parte da estratégia de

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controle. Essa escolha depende da compreensão de aspectos locais da epidemiologia da leishmaniose e um conhecimento detalhado da espécie do vetor envolvida, seu habitat, alcance de vôo, preferências alimentares, locais de repouso, ciclo circadiano e sazonalidade. O planejamento para manejo do vetor exige uma avaliação inicial da ecologia da área, formulação de metas operacionais, escolha de método apropriado e monitoramento e avaliação do programa. Além disso, dois outros pontos das medidas de controle são cruciais, o custo-efetividade e a aceitabilidade da comunidade (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010).

Para o controle vetorial, o PVCLV recomenda o controle químico com inseticida de ação residual a cada três ou quatro meses, sendo esta ação destinada apenas ao inseto adulto. Essa intervenção é indicada para áreas com transmissão intensa e moderada, com surto de LV ou com registro do primeiro caso autóctone. Os produtos recomendados para esta prática são a deltametrina e cipermetrina (BRASIL, 2006).

Atualmente, para o controle de doenças vetoriais no país, é preconizado que se considerem três aspectos: a urbanização da população, a transformação do caráter eminentemente rural dessas doenças de maneira concomitante com a transmissão urbana ou peri-urbana e a descentralização das atividades do seu controle para os municípios (TAUIL, 2006). Uma das grandes dificuldades para o controle vetorial, além da descontinuidade das ações, é a recusa dos moradores em permitir a borrifação intra e/ou peridomiciliar (ZUBEN & DONALISIO, 2016). Costa (2008) sustenta em seu estudo ainda que pesquisas precisam ser feitas para que o déficit de informação relativo ao controle da LV seja superado, principalmente em relação ao papel dos cães na amplificação da transmissão nas cidades, à utilização de novos inseticidas com ação efetiva e aos determinantes ecológicos e moleculares envolvidos no ciclo de transmissão do protozoário. É importante salientar que para o controle de doenças endêmicas como a LV, também é de extrema necessidade que se criem meios para que a população amplie seus conhecimentos acerca do assunto a fim de que se reduza o risco de exposição (GAMA et al., 1998) .

No âmbito mundial, existem cinco pontos- chave para a eliminação de doenças transmitidas por vetor, incluindo a LV. O primeiro é viver em ambiente pacífico, em locais de conflito fica extremamente difícil a implementação de qualquer programa de controle. O segundo é um compromisso político a longo prazo, as prioridades da saúde não podem estar sujeitas às mudanças de governo. O terceiro ponto é o financeiro, que também depende de compromissos a longo prazo. O quarto se refere à necessidade de métodos de controle bem

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sucedidos e o quinto, e último, é a educação em saúde pública (KILLICK-KENDRICK, 2010).

A eliminação da LV na América Latina ainda não é um objetivo factível, considerando a complexidade da doença e a diversidade das regiões atingidas, além de conhecimento insuficiente, intervenções inadequadas, falta de apoio político e investimento. Para que uma real mudança ocorra, é imprescindível vontade política e um sistema de vigilância fortalecido para qualificar os dados, já que esses são fundamentais para a tomada de decisão (ROMERO & BOELAERT, 2010).

Uma alternativa que se mostrou viável como medida de controle no âmbito da saúde pública foi o uso de inseticidas tópicos de deltametrina para cães. Essas formulações apresentaram bons resultados em relação à sua atividade residual contra Lutzomyia

longipalpis e ao custo (COURTENAY, 2009). Outra estratégia é o uso de coleiras

impregnadas com deltametrina, cujo custo-efetividade parece vantajoso em locais onde os cães são o principal reservatório. Sua aceitabilidade pela população em áreas nas quais se tem como estratégia de controle a remoção de cães soropositivos deve ser consideravelmente maior (DAVID et al., 2001).

Pesquisas têm demonstrado a eficácia das coleiras impregnadas com deltametrina 4% ao impedir que a fêmea do vetor se alimente no cão e ao causar a morte do flebotomíneo (OLIVEIRA LIMA, 2002; LUCIENTES, 2002; REITHINGER, 2001; DAVID et al., 2001). Em estudo experimental, Killick-Kendrick et al. (1997) identificaram que a coleira protegeu os cães de 96% das picadas de flebotomíneos a eles expostos e que mais de 70% das fêmeas do vetor, em um período de duas horas de exposição, se alimentaram do sangue dos cães do grupo controle, valor bastante superior aos 13% identificados no grupo de intervenção. A proporção geral de morte dos flebotomíneos foi menor que 16% entre os cães do grupo controle e maior que 45% entre os encoleirados. O autor identificou um pequeno intervalo de tempo, uma semana, entre a colocação da coleira e o alcance da eficácia máxima, que durou até, pelo menos, a 34ª semana, período do seguimento.

Em Andradina/SP, os resultados de um estudo mostraram a efetividade das coleiras no que se refere à queda da prevalência canina e da incidência de casos humanos, quando associadas às medidas de controle vigentes. Contudo, ressaltou-se que um programa de controle de LV, independentemente do uso desta nova ferramenta, exige uma rigorosa estruturação do município e ações planejadas, quadro bastante diferente do atual, no qual freqüentemente ocorre a descontinuidade das ações (CAMARGO-NEVES et al., 2004).

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Na Itália, há evidências de que o uso dessas coleiras é efetivo na redução do risco de infecção por L. infantum, assim como de que seu uso em massa se mostra mais impactante em períodos de maior força de transmissão, do que em períodos de baixa transmissão (MAROLI et al., 2002). Em estudos conduzidos no Iran, foi visto que o encoleiramento dos cães se mostrou bastante efetivo na proteção contra flebotomíneos, reduzindo significativamente a transmissão (FERROGLIO et al., 2008; HALBIG et al., 2000; GAVGANI et al., 2002).

Um estudo italiano sugere que o encoleiramento canino pode gerar modificações até no curso clínico da infecção por L. infantum. Os cães não encoleirados apresentaram significativamente mais sinais de leishmaniose, além de uma progressão mais rápida do quadro. Esse tipo de proteção se daria pela redução nos estímulos antigênicos, em conseqüência do menor número de picadas infecciosas dos flebotomíneos (MANZILLO et al., 2006).

Referências

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