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O princípio da presunção de inocência e o cumprimento da pena de prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória

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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – UNIJUÍ

STENIO MARCIO KWIATKOWSKI ZAKSZESKI

O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E O CUMPRIMENTO DA PENA DE PRISÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA

CONDENATÓRIA

IJUÍ 2017

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STENIO MARCIO KWIATKOWSKI ZAKSZESKI

O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E O CUMPRIMENTO DA PENA DE PRISÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA

CONDENATÓRIA

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito, no Curso de Graduação em Direito da UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: Professora Ma. Emmanuelle de Araujo Malgarim

Ijuí 2017

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, consagro o presente trabalho à Deus, fonte de todo o conhecimento e de toda a sabedoria, meu refúgio e minha fortaleza.

Em segundo lugar, agradeço à minha família, que foi o berço das primícias do meu existir. Em especial, dedico esta obra à minha digníssima mãe, Marcia Eloiza Kwiatkowski, e ao meu amado pai, Estevo Oldemar Zakszeski, que não mediram esforços para me ajudar na caminhada acadêmica.

Agradeço também à minha amada noiva, Thalia Langner, meu oriente de ternura e inspiração.

Ainda, dedico os mais elevados elogios à minha Orientadora, Professora e Mestra Emmanuelle de Araujo Malgarim, que foi mui atenciosa, dedicada, compreensiva, pacificadora, e durante todo o período de um ano me instruiu com muita inteligência, elevando-me o intelecto e mostrando-me as veredas para alcançar o sucesso neste trabalho.

Enfim, agradeço à todas os amigos e amigas que me ajudaram, direta e indiretamente, a seguir em frente até alcançar o meu objetivo.

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“Eles torcem as leis para poderem fazer o mal. Ajuntam-se para destruir os justos e condenar os inocentes à morte!”

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RESUMO

O presente trabalho analisou o princípio da presunção de inocência, na forma em que está insculpido junto ao rol dos direitos e garantias fundamentais, na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, inciso LVII. Ainda, abordou os diferentes posicionamentos adotados pelo Supremo Tribunal Federal a respeito do alcance a ele atribuído pela constituição. Também, esta monografia apresenta uma pesquisa sobre as diferentes formas de prisão admitidas pela legislação penal brasileira. Nesse sentido, foram analisadas as importantes modificações ocorridas no sistema processual penal após a promulgação atual Carta Magna, que fizeram com que o sistema processual penal brasileiro fosse reorganizado para atender às novas diretrizes constitucionais. Estas mudanças extinguiram algumas espécies de prisão, como por exemplo a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível, hipótese em que o réu era obrigatoriamente recolhido a prisão para poder recorrer da sentença. Após essas alterações na legislação infraconstitucional, restaram como espécies de prisão provisória, apenas a prisão preventiva e a prisão temporária. Porém, surgiu uma discussão a respeito da prisão definitiva, acerca do momento em que o réu poderia iniciar o cumprimento da pena de prisão. Alguns entendiam que a presunção de inocência era óbice à execução da pena antes do transito em julgado. Outros entendiam que, após uma confirmação da sentença condenatória em segunda instancia, a presunção de inocência seria relativizada para permitir que se iniciasse a execução da pena. Em 1991, o STF foi instado a se manifestar sobre o assunto, e fixou o entendimento no sentido de que a presunção de inocência não impede que o réu inicie o cumprimento da pena de prisão após a confirmação da sentença penal condenatória em segunda instancia, mesmo que ainda lhe reste os recursos às instâncias superiores. No entanto, em 2009 esse posicionamento sofreu um revés, e a partir de então, o STF passou a proibir o início do cumprimento da pena de prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. Esse entendimento perdurou por aproximadamente sete anos, quando em 2016 o STF, novamente, passou a adotar o posicionamento fixado em 1991. Nesse contexto, o trabalho em tela apresenta uma análise dos votos dos ministros da maior corte de justiça do país, nos mais emblemáticos julgamentos a respeito do princípio da inocência e o cumprimento da pena de prisão antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, a saber os julgamentos dos habeas corpus n° 68726, n° 84078 e n° 126292, e ainda, o julgamento conjunto da ações diretas de constitucionalidade n° 43 e n° 44.

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ABSTRACT

The present paper analyzed the principle of presumption of innocence, as it is inscribed along the list of fundamental rights and guarantees, in the Federal Constitution of 1988, in its article 5, item LVII. He also addressed the different positions adopted by the Federal Supreme Court regarding the scope assigned to it by the constitution. Also, this monograph presents a research on the different forms of detention allowed by the Brazilian penal legislation. In this sense, we analyzed the important changes that occurred in the criminal procedural system after the current Magna Carta promulgation, which caused the Brazilian criminal procedural system to be reorganized to comply with the new constitutional guidelines. These changes extinguished some types of imprisonment, such as imprisonment resulting from an enforceable conviction, in which case the defendant was obliged to take prison in order to appeal the sentence. After these changes in the infraconstitutional legislation, only temporary custody and temporary detention remained as species of provisional arrest. However, a discussion arose about the definitive arrest, about the moment in which the defendant could begin the fulfillment of the prison sentence. Some felt that the presumption of innocence was an obstacle to the execution of the sentence before a final judgment. Others understood that, after confirmation of the conviction at second instance, the presumption of innocence would be relativized to allow the execution of the sentence to begin. In 1991, the STF was asked to express its views on the matter, and established the understanding that the presumption of innocence does not prevent the defendant from commencing the sentence of imprisonment after confirmation of the conviction in the second instance, even Which still has the resources to the upper levels. However, in 2009 this positioning suffered a setback, and from then on, the STF began to prohibit the beginning of the execution of the sentence of imprisonment before the final sentence of the condemnatory sentence. This understanding lasted for about seven years, when in 2016 the STF again adopted the position established in 1991. In this context, the work on screen presents an analysis of the votes of the ministers of the country's largest court, in the most emblematic Judgments regarding the principle of innocence and the fulfillment of the sentence of imprisonment before the final sentence of the conviction, namely the judgments of habeas corpus n ° 68726, n ° 84078 and n ° 126292, and also the joint judgment of actions Constitutionality n ° 43 and n ° 44. Keywords: Presumption of innocence. Constitution. Prison. Related searches.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...08

1 PRISÃO CAUTELAR PROCESSUAL: VISÃO PANORÂMICA ...11

1.1 Das prisões cautelares: conceito ...13

1.2 Das prisões cautelares: espécies ...16

1.3 Das prisões cautelares: requisitos comuns ...18

1.4 Da prisão em flagrante ...20

1.5 Da prisão preventiva ...23

1.6 Da prisão temporária...25

1.7 Da prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível ...27

1.8 Da prisão decorrente de pronúncia ...29

1.9 Da Constitucionalidade da Prisão decorrente de sentença penal condenatória ...31

2. PRISÃO PROCESSUAL DECORRENTE DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA E O PRINCÍPIO DA INOCÊNCIA: UM ESTUDO À LUZ DA PONDERAÇÃO DE VALORES CONSTITUCIONAIS ...33

2.1 Do Princípio da Presunção de Inocência ...34

2.2 Relação entre princípio da presunção de inocência e princípio da não culpabilidade ...41

2.3 Prisão Processual Decorrente de Sentença Penal Condenatória e sua (in) constitucionalidade: uma análise do recente julgamento do Supremo Tribunal Federal ...46

CONCLUSÃO ...61

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INTRODUÇÃO

Em suma, o presente trabalho tratou de um conflito existente entre dois institutos antagônicos: a presunção de inocência e a prisão sem condenação com trânsito em julgado.

O campo delimitado para a análise deste duelo é a oscilante jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que ora faz prevalecer o direito do indivíduo frente a sociedade, ora o reverso.

Sabe-se que a presunção de inocência é tida como diadema do processo penal. Ela está presente em todas as constituições democráticas da atualidade. Sua principal função é frear os abusos e arbitrariedades da atividade punitiva do Estado frente ao indivíduo.

Historicamente, se tem notícias do instituto da presunção de inocência, de forma bem primitiva, na antiguidade. Porém, foi com o surgimento dos ideais iluministas, fruto da luta dos cidadãos pelo reconhecimento de seus direitos frente ao Estado, que muitos países passaram a positivar a presunção de inocência em suas constituições, com o objetivo de impedir que o Estado viesse a perseguir e punir cidadãos aos caprichos da tirania. Um dos primeiros documentos a carregar a presunção de inocência consigo foi a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789. Em seu artigo 9° havia a determinação para que todo o acusado fosse considerado inocente até que lhe sobreviesse uma declaração de culpa, ou seja, uma condenação.

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Assim, a presunção de inocência foi caminhando pelo tempo, passando por momentos quem ganhou maior e menor abrangência dentro do ordenamento jurídico dos países pós-iluministas. Sem dúvida, um período crítico foi o começo do século XX, especialmente após a primeira grande guerra, onde, possivelmente, a presunção de inocência sofreu os maiores ataques desde 1789, restando o seu conceito e aplicação sobremaneira esvaziado.

Atualmente, no Brasil, a Constituição Federal de 1988 possui insculpida em seu art. 5°, inciso LVII, a presunção de inocência, que aliás está elevada a nível de princípio democrático.

Todavia, desde a promulgação da atual constituição brasileira, começaram a surgir debates acalorados sobre o alcance da aplicação do referido princípio. O ponto de maior tensão, desde 1988 até hoje, reside no início do cumprimento da pena de prisão antes da sentença condenatória transitar em julgado.

Os posicionamentos doutrinários são divergentes quanto ao tema. Parte da doutrina entende que o réu não pode ser preso tão somente pelo fato de ter tido a condenação confirmada em segunda instância. Por outro lado, há quem entenda que como os recursos às instâncias superiores não possuem efeito suspensivo, a presunção de inocência não é óbice para que o réu inicie o cumprimento da pena de prisão, inclusive nas hipóteses da sentença ainda não estar com o status de trânsito em julgado.

Naturalmente, a discussão foi parar na esfera jurisprudencial, e chegou ao Supremo Tribunal Federal. Desde o ano de 1991 até 2016, foram ao menos cinco julgamentos emblemáticos com repercussão geral.

Atualmente, o entendimento que prevaleceu no Pretório Excelso foi aquele que admite a execução da pena antes da sentença transitar em julgado, após a confirmação da sentença condenatória em segunda instância. Ressalta-se que o placar deste julgamento em plenário o mais apertado possível. Na verdade houve um empate, o que ensejou o voto de minerva da presidente da corte, fazendo que o posicionamento supracitado prevalecesse.

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Nesse contexto, o trabalho em tela procura propiciar uma reflexão crítica a respeito da volubilidade do entendimento do STF no que tange ao tema, apontando-se algumas incongruências nas decisões da maior corte de justiça do Brasil.

Outrossim, o STF passou a impor ao réu uma prisão fundamentada unicamente em uma confirmação da sentença em segunda instância. Todavia, tal espécie de prisão não está prevista no ordenamento jurídico penal brasileiro. Aliás, não cabe a um órgão do Poder Judiciário criar uma nova espécie de prisão não contemplada pela legislação penal. Além disso, existem alguns cenários que não foram contemplados pelos votos vencedores que fixaram o atual entendimento.

Diante dessas incógnitas e contrapontos, surge uma necessidade de se aprofundar a análise do conflito existente entre o Estado e o indivíduo, entre o interesse coletivo e o interesse individual, buscando acomodar ambos os lados, sempre, a luz da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, a presente monografia abarca conceitos doutrinários a respeito das diversas espécies de prisão admitidas em nosso ordenamento jurídico penal pátrio, bem como as decisões do plenário do Supremo Tribunal Federal nos

Habeas Corpus nº 68726 de 1991, nº 84078 de 2009 e nº 126292 de 2016. Ainda,

foram objeto de pesquisa os votos dos ministros do STF nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) nº 43 e nº 44.

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1 PRISÃO CAUTELAR PROCESSUAL: VISÃO PANORÂMICA

Antes de adentrar especificamente no estudo das prisões cautelares é necessário trazer à baila alguns apontamentos à respeito do campo em que se inserem essas medidas. Para que se possa ter uma visão cristalina e correta a respeito das prisões penais, é necessário que antes se tenha noção da relação entre a prisão o processo penal e a constituição.

A prisão penal pertence ao campo da justiça penal. Esse campo é cruzado por forças opostas. Em um lado está o interesse do Estado em punir e no lado oposto estão os direitos fundamentais do cidadão. Em outras palavras poderia se dizer que no campo da justiça penal combatem entre si a eficiência da justiça (contra a impunidade) e garantia da justiça (contra a arbitrariedade). Sobre esse combate Binder (2006, p. 20), com muita propriedade explica que

por una parte, se busca que el programa punitivo del Estado, es decir, que las decisiones de utilizar la violencia del Estado (cárcel) en determinados conflictos que han sido entonces definidos como delitos sean efectivas. El objetivo es, visto desde esta perspectiva, la construcción de una pérsecución penal efectiva y la gran tarea por delante es reducir os enormes niveles de impunidad que existen, en especial en los delitos más graves, los que causan más daño a la sociedad. Por otra parte, se busca que al utilizar el poder penal del Estado no se produzcan abusos y arbitrariedades que puedan arruinar la vida de una persona. Por ello se construyen límites. Al conjunto de esos límites los conocemos como sistema de garantías y el objetivo es proteger a cada ciudadano del peligro del uso arbitrario, injusto o ilegal del poder penal.

Buscando o equilíbrio entre uma e outra força, surge o processo penal, em seu caráter instrumental. Em relação ao Estado porque precisa do processo para punir, conforme ensina Lopes Jr. (2014) “a pena sem processo é inconcebível”. E, em relação ao indivíduo, segundo o mesmo autor, com a “a finalidade constitucional-garantidora da máxima eficácia dos direitos e garantias fundamentais, em especial da liberdade individual”.

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la segunda función de las formas procesales se relaciona con la construcción de limites al poder penal. El uso del poder penal ha generado a lo largo de la historia muchas arbitrariedades. Sería miope aquella generación que desconociera los sufrimientos que el uso arbitrario e injusto de la justicia penal ha causado a lo largo de la historia

E, o processo penal, por sua vez, é plenamente subordinado a constituição, e essa subordinação, segundo Prado (2005), decorre da “primazia constitucional na superposição das normas jurídicas, influindo decisivamente na demarcação do âmbito de legitimidade, validade e eficácia das leis”. E, ainda, conforme o mesmo autor, “Constituição e Processo Penal lidam com algumas importantes questões comuns: a proteção aos direitos fundamentais e a separação dos poderes”.

Assim, para concluir o esclarecimento a respeito da relação entre o sistema processual e a constituição de um país, traz-se à baila, novamente, os ensinamentos de Prado (2005), ao asseverar que

na verdade, o sistema processual está contido no sistema judiciário, por sua vez espécie do sistema constitucional, derivado do sistema político, implementando-se deste modo um complexo de relações sistêmicas que metaforicamente pode ser desenhado como de círculos concêntricos, em que aquele de maior diâmetro envolve o menor, assim sucessivamente, contaminando-o e dirigindo-o com os princípios adotados na Lei Maior.

Nessa ótica, torna-se cristalino o entendimento que o processo penal de um país deve refletir os elementos garantistas de sua constituição. Aliás, o processo penal deve ser interpretado a luz da constituição.

No caso do Brasil, tanto a constituição quanto a lei exigem que a prisão seja absolutamente necessária, ou seja somente em casos excepcionais. A regra é a liberdade, a prisão é a exceção. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5 °, inciso LXI, estabelece que

ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

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Ultrapassadas essas considerações iniciais, porém não menos importantes, adentra-se mais um pouco no estudo das prisões cautelares no Brasil.

1.1 Das prisões cautelares: conceito

Para começar o estudo das prisões cautelares, necessário se faz avocar alguns conceitos doutrinários.

O primeiro deles é conceito de prisão. Nucci (2014), de forma ampla e genérica assevera que “prisão é a privação da liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, por meio do recolhimento da pessoa humana ao cárcere”.

Capez (2012, p. 301), por sua vez, trouxe maior conteúdo ao conceito de prisão, definindo-a como sendo

a privação da liberdade de locomoção em virtude de flagrante delito ou determinada por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

Távora (2013, p. 547), a seu tempo, é quem traz um conceito ainda mais esclarecedor, abrangendo o discernimento entre a prisão-pena e a prisão processual. Segundo o autor

a prisão é o cerceamento da liberdade de locomoção, é o encarceramento. Pode advir de decisão condenatória transitada em julgado, que é a chamada prisão pena, regulada pelo Código Penal, com o respectivo sistema de cumprimento, que é verdadeira prisão satisfativa, em resposta estatal ao delito ocorrido, tendo por título a decisão judicial definitiva.

Diante da analise conceitual acima é possível perceber as primeiras duas grandes espécies de prisão, a prisão-pena – após a condenação transitada em julgado – e a prisão cautelar – antes da sentença condenatória transitar em julgado.

Via de regra, deveria ocorrer somente na segunda hipótese. Isso em decorrência do princípio da presunção de inocência, que está consagrado na

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Constituição Federal, em seu inciso LVII, in verbis: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

De acordo com o art. 283 do Código de Processo Penal (CPP), com redação dada pela Lei nº 12.403 de 20111,

ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

O preceito contido na nova redação dada ao artigo 283 reflete a garantia dada ao indivíduo pelo inciso LXI, do artigo 5º da Constituição Federal de 1988.

No entanto, existem hipóteses em que a prisão poderá ser aplicada antes de haver uma sentença condenatória transitada em julgado. Aliás, pode ocorrer prisão antes de sequer haver sentença condenatória recorrível. Távora (2013, p. 547) ensina que

no transcorrer da persecução penal, contudo, é possível que se faça necessário o encarceramento do indiciado ou do réu, mesmo antes do marco final do processo. Isto se deve a uma necessidade premente devidamente motivada por hipóteses estritamente previstas em lei, traduzidas no risco demonstrado de que a permanência em liberdade do agente é um mal a ser evitado. Surge assim a possibilidade da prisão sem pena, também conhecida por prisão cautelar, provisória ou processual, que milita no âmbito da excepcionalidade, afinal, a regra é que a prisão só ocorra com o advento da sentença definitiva, em razão do preceito esculpido no art. 5°, inciso LVII da CF, pois "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

A doutrina reconhece o aparentemente conflito existente entre a prisão cautelar e o direito à liberdade. Nas palavras de Nucci (2014)

observa-se, então, o natural confronto entre a liberdade e a segurança, quando se trata de aplicar, na prática, as normas penais e processuais penais. Porém, não havendo direito absoluto,

1 Lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de

1941 - Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências.

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flexibilizando-se cada um deles na medida exata da necessidade de aplicação dos demais, tem-se que a liberdade individual é de suma relevância, desde que não deva abrir espaço para a aplicação da pena – sanção fixada em decisão definitiva, respeitado o devido processo legal. Do mesmo modo, a liberdade individual cede espaço à segurança pública, também individualizada, sob o ângulo de cada cidadão beneficiado, abrindo caminho para a aplicação da prisão cautelar.

Em um primeiro momento, chama a atenção a difícil coexistência entre dois institutos conflitantes e antagônicos: a prisão cautelar e a presunção de inocência, haja vista que o primeiro é a restrição da liberdade do indivíduo antes da sentença – e bem antes dela transitar em julgado – e o segundo, é garantia fundamental de caráter inviolável.

Buscando um equilíbrio entre a prisão cautelar e a presunção de inocência, doutrinadores apontam que ambos podem coexistir, na medida em que o primeiro deve ser maximizado face ao segundo, que por sua vez deve ser aplicado tão somente em casos excepcionais.

Nesse sentido, ensina Lopes Jr. (2012, p. 239)

a presunção de inocência, enquanto princípio reitor do processo penal, deve ser maximizada em todas suas nuances, mas especialmente no que se refere à carga da prova (regla del juicio) e às regras de tratamento do imputado (limites à publicidade abusiva [estigmatização do imputado] e à limitação do (ab)uso das prisões cautelaes).

Um importante aspecto trazido pelo autor é que “a presunção de inocência impõe um verdadeiro dever de tratamento (na medida em que exige que o réu seja tratado como inocente”. (Lopes Jr., 2012, p. 239).

Ainda, Lopes Jr. (2012, p. 777) assevera que:

essa opção ideológica (pois eleição de valor), em se tratando de prisões cautelares, é da maior relevância, pois decorre da consciência de que o preço a ser pago pela prisão prematura e desnecessária de alguém inocente (pois ainda não existe sentença definitiva) é altíssimo, ainda mais no medieval sistema carcerário brasileiro.

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Na mesma direção, concluiu Gomes Filho (1991, p. 86),

no que diz respeito à disciplina da prisão cautelar, matéria que constitui objeto principal de nosso estudo, as implicações desses dois novos preceitos constitucionais são evidentes; com efeito, ao proclamar que o acusado é considerado inocente antes da condenação definitiva e assegurar que a privação do direito de liberdade somente se fará mediante o “devido processo”, o constituinte estabeleceu parâmetros bastante nítidos para uma necessária revisão dos conceitos que resultavam da orientação autoritária do Código de 1941 e do casuísmo que inspirou a legislação anterior.

Essencialmente, em face dessas garantias, não é legítima a prisão anterior à condenação transitada em julgado, senão por exigências cautelares indeclináveis de natureza instrumental ou final, e depois de efetiva apreciação judicial, que deve vir expressa através de decisão motivada.

Diante do exposto, conclui-se que, por ser uma exceção à regra, a prisão cautelar somente poderá ocorrer em casos absolutamente necessários. Trata-se de uma das medidas cautelares que o Código de Processo Penal prevê, segundo Lopes Jr. (2012, p. 778), para “garantir o normal desenvolvimento do processo e, como consequência, a eficaz aplicação do poder de penar”.

1.2 Das prisões cautelares: espécies

Como já dito anteriormente, quanto a classificação das prisões, em matéria penal, salvo raras exceções, doutrinariamente se divide as prisões em duas grandes espécies: a prisão-pena e a prisão cautelar.

Antes de aprofundar o estudo das prisões cautelares e suas espécies, oportuno se faz recordar a finalidade a que se destinam. Para tanto, Avena (215, p. 968) ensina que

a prisão provisória é aquela que ocorre antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. Não tem por objetivo a punição do indivíduo, mas sim impedir que venha ele a praticar novos delitos (relacionados ou não com aquele pelo qual está segregado) ou que sua conduta interfira na apuração dos fatos e na própria aplicação da sanção correspondente ao crime praticado.

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Capez (2012, p. 301), por sua vez, define a prisão cautelar (ou processual) como aquela

imposta com finalidade cautelar, destinada a assegurar o bom desempenho da investigação criminal, do processo penal ou da futura execução da pena, ou ainda a impedir que, solto, o sujeito continue praticando delitos. É imposta apenas para garantir que o processo atinja seus fins. Seu caráter é auxiliar e sua razão de ser é viabilizar a correta e eficaz persecução penal. Nada tem que ver com a gravidade da acusação por si só, tampouco com o clamor popular, mas com a satisfação de necessidades acautelatórias da investigação criminal e respectivo processo.

Nas palavras de Nucci (2014), é aquela que ocorre em “caráter excepcional, buscando-se assegurar o curso do processo, sem qualquer espécie de deturpação, além de proporcionar, em situações específicas, segurança à sociedade, pode-se decretar a prisão cautelar”.

Sobre as espécies de prisões cautelares, alguns doutrinadores, a exemplo de Nucci (2014) entendem que

constituem espécies de prisão processual cautelar, quanto ao momento de decretação: a) prisão temporária; b) prisão em flagrante; c) prisão preventiva; d) prisão em decorrência de pronúncia; e) prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível; f) condução coercitiva de réu vítima, testemunha, perito ou de outra pessoa que se recuse, injustificadamente, a comparecer em juízo ou na polícia.

Capez (2012, p. 328), a seu tempo considera que

antes do trânsito em julgado da condenação, o sujeito só poderá ser preso em três situações: flagrante delito, prisão preventiva e prisão temporária. No entanto, só poderá permanecer nessa condição em duas delas: prisão temporária e preventiva.

Nessa linha também se posicionou Avena (2015, p.968-969), ao entender que com o advento da Lei 12.403/20112, antes do trânsito em julgado da sentença

condenatória “a prisão do indivíduo apenas pode decorrer de prisão em flagrante, prisão temporária (Lei 7.960/1989) ou de prisão preventiva”. No entanto, o doutrinador limitou ainda mais o rol de hipóteses de prisão cautelar ao asseverar que

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“a prisão em flagrante, agora, não é hábil a manter o agente flagrado sob custódia, exigindo-se, para esta finalidade, que o juiz converta-o em prisão preventiva”.

Dessa forma, conclui-se que hoje em dia, com as alterações sofridas pelo sistema processual penal brasileiro, especialmente com o advento das Leis 11.689/083 e 12.403/114, restaram apenas duas espécies de prisões cautelares.

Avena (2015, p. 936) filia-se à esse entendimento ao concluir que

no sistema atual, restam como prisões cautelares, em sua própria essência, apenas a prisão preventiva e a prisão temporária, esta última regulamentada na Lei 7.960/1989, e, no caso de crimes hediondos, no art. 2º, § 4º, da Lei 8.07211990.

A seguir, passa-se ao estudo mais detalhado a respeito das prisões cautelares e suas espécies.

1.3 Das prisões cautelares: requisitos comuns

As prisões cautelares, por serem medidas que colidem diretamente com o princípio da presunção de inocência e atingem um dos mais importantes direitos fundamentais do cidadão, a liberdade, somente devem ser adotadas em casos excepcionais, com estrita observância dos requisitos legais autorizadores destas medidas.

A respeito dos requisitos indispensáveis para a decretação da prisão cautelar, Lopes Jr. (2012, p. 779) ensina que

no processo penal, o requisito para a decretação de uma medida coercitiva não é a probabilidade de existência do direito de acusação alegado, mas sim de um fato aparentemente punível. Logo, o correto é afirmar que o requisito para decretação de uma prisão cautelar é a existência do fumus commissi delicti, enquanto probabilidade da ocorrência de um delito (e não de um direito), ou, mais especificamente, na sistemática do CPP, a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria.

3 Lei nº 11.689, de 9 de junho de 2008. Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de

1941 – Código de Processo Penal, relativos ao Tribunal do Júri, e dá outras providências.

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Ainda, além do fummus comissi delicti outro requisito é necessário para que se possa falar em decretação da prisão cautelar, trata-se do periculum libertatis. O doutrinador conceitua este requisito como sendo o risco a que se submete o processo penal em decorrência da situação de liberdade do sujeito passivo. Nas palavras do doutrinador Lopes Jr. (2012, p. 780) é "o perigo ao normal desenvolvimento do processo (perigo de fuga, destruição da prova) em virtude do estado de liberdade do sujeito passivo)".

Távora e Alencar (2013, p. 547-548), a respeito da prisão antes da condenação

se deve a uma necessidade premente devidamente motivada por hipóteses estritamente previstas em lei, traduzidas no risco demonstrado de que a permanência em liberdade do agente é um mal a ser evitado. Surge assim a possibilidade da prisão sem pena, também conhecida por prisão cautelar, provisória ou processual, que milita no âmbito da excepcionalidade, afinal, a regra é que a prisão só ocorra com o o advento da sentença definitiva, em razão do princípio insculpido no art. 5º, inciso LVII da CF [...].

Partindo do pressuposto consagrado na Constituição da República Federativa do BRASIL de 1988, que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória"5, o questionamento que surge é: pode

haver coexistência entre as prisões cautelares e o princípio da presunção de inocência?

Segundo Lopes Jr (2012, p. 783) alguns princípios "permitirão a coexistência de uma prisão sem sentença condenatória transitada em julgado com a garantia da presunção de inocência." O autor ensina que essa convivência entre institutos tão antagônicos é regida pela obediência aos princípios da jurisdicionalidade e motivação, contraditório, provisionalidade, excepcionalidade e proporcionalidade.

Após as reformas sofridas pelo sistema processual penal brasileiro, oriundas, principalmente, da Lei n° 12.403/116, a doutrina majoritária firmou

entendimento que, atualmente, existem três modalidades de prisões cautelares no

5 Art. 5°, inc. LVII. 6 Cf. nota 1.

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ordenamento jurídico-penal, a prisão em flagrante, a prisão preventiva e a prisão temporária.

1.4 Da prisão em flagrante

A prisão em flagrante, atualmente, pode ser considerada como uma medida pré cautelar, principalmente após as alterações trazidas pela reforma processual penal de 20117.

A origem do termo flagrante remota à antiguidade, no latim flagrare significa queimar, arder. Nas palavras de Capez (2012, p. 314) "é o crime que ainda queima, isto é, que está sendo cometido ou acabou de sê-lo". Devido ao fato de sua ocorrência se dar enquanto o crime está sendo praticado ou momentos depois, a prisão em flagrante foge a regra da necessidade de haver ordem escrita do juiz competente.

A prisão em flagrante pode ser subdividida em várias espécies.

Segundo Capez (2012, p. 315) o flagrante próprio "é aquele em que o agente é surpreendido cometendo uma infração penal ou quando acaba de cometê-la", está previsto no art. 3028, incisos I e II do Código de Processo Penal. Importante ressaltar

que a expressão "acaba de cometê-la" significa que o crime ocorrera com absoluta imediatidade ao ato da prisão.

O flagrante impróprio "ocorre quando o agente é perseguido, logo após cometer o ilícito, em situação que o faça presumir ser o autor da infração”. (CAPEZ, 2012, p. 315). Este flagrante está previsto no art. 302, inciso III9 do referido diploma

legal. Nesse caso, deve-se atentar para o fato da expressão "logo após" não ter a

7 Conjunto de relevantes alterações introduzidas do Código de Processo Penal, no que tange à prisão, à

liberdade provisória, à fiança, e, sobretudo, às medidas cautelares pessoais alternativas à prisão provisória, as quais foram inseridas no artigo 319 do Código de Processo Penal. Essas alterações se deram por meio da Lei n°12.403, aprovada em 4 de maio de 2011, pelo Congresso Nacional.

8 Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:

I - está cometendo a infração penal; II - acaba de cometê-la;

9 III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que

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mesma interpretação rigorosa que ganhou no inciso anterior. Aqui se admite um lapso temporal um pouco mais dilatado, "compreendendo todo o espaço necessário para a polícia chegar ao local, colher as provas elucidadoras da ocorrência do delito e dar início à perseguição do autor". (CAPEZ, 2012, p. 315)

O flagrante presumido, previsto no art. 302, inciso IV10 do CPP, é aquele em

que o sujeito ativo do delito é preso logo após a sua prática, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que o façam ser, presumidamente, o autor da infração. Neste caso, a expressão "logo após" ganha uma interpretação que admite um lapso temporal ainda maior do que aquela que ocorre no flagrante impróprio.

Para compreender melhor a dimensão da interpretação admita das expressões "acaba de cometê-la" e "logo após", oportuna a elucidação trazida por Capez (2012, p. 316)

a expressão 'acaba de cometê-la', empregada no flagrante próprio, significa imediatamente após o cometimento do crime; 'logo após', no flagrante impróprio, compreende um lapso temporal maior; e, finalmente, o 'logo após', do flagrante presumido, engloba um espaço de tempo maior ainda.

Dentro do gênero flagrante, ainda existe o flagrante compulsório. Essa espécie está descrita no art. 30111, segunda parte, do Código de Processo Penal e

determina a obrigatoriedade dos agentes policiais em efetuar a prisão quando diante da situação de flagrante. Segundo o dispositivo "... as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito". Nos dizeres do jurista Capez (2012, p. 316) "o agente é obrigado a efetuar a prisão em flagrante, não tendo discricionariedade sobre a conveniência ou não de efetivá-la". Abrange as hipóteses do art. 302 (flagrante próprio, impróprio e presumido).

Ao contrário, o flagrante facultativo "consiste na faculdade de efetuar ou não o flagrante, de acordo com critérios de conveniência e oportunidade" (CAPEZ, 2012, p. 316). Essa espécie de flagrante diz respeito às pessoas comuns do povo e está

10 IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor

da infração.

11 Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que

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prevista no art. 301, primeira parte, do Código de Processo Penal, in verbis: "qualquer do povo poderá [...] prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito".

Existe também um outro tipo de flagrante, o preparado ou provocado. Ocorre quando "o agente, policial ou terceiro, conhecido como provocador, induz o autor à prática do crime, viciando a sua vontade, e, logo em seguida, o prende em flagrante". (CAPEZ, 2012, p. 316). Na verdade, é um exemplo de crime impossível haja vista que as circunstâncias devidamente articuladas afastam por completo a possibilidade da consumação do delito. O STF já se manifestou no sentido de considerar atípica a conduta praticada em sede de flagrante provocado, é o que se depreende da Súmula 145, in verbis: "Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação".

Há ainda uma outra espécie de flagrante, o esperado, que de certa forma assemelha-se ao provocado. Porém neste caso os agentes responsáveis pela prisão aguardam o momento exato em que o crime será cometido, sem qualquer induzimento ou instigação. "Considerando que nenhuma situação foi artificialmente criada, não há que se falar em fato atípico ou crime impossível". (CAPEZ, 2012, p. 317).

A revogada Lei n° 9.034/9512, conhecida como Lei do Crime Organizado em

seu art. 2º, II, criou a figura do flagrante prorrogado ou retardado, que nada mais é do o adiamento do momento do flagrante, com o objetivo de coletar maiores evidências acerca do crime. Neste tipo de flagrante a autoridade policial realiza um acompanhamento do fato delituoso até o momento em que julga ser o mais propício para efetuar a prisão. Capez (2012, p. 317-318) assevera que

somente é possível esta espécie de flagrante diante da ocorrência de crime organizado, ou seja, somente 'em ação praticada por organizações criminosas ou a ela vinculada. Dito de outra maneira: exclusivamente no crime organizado é possível tal estratégia. Fora da organização criminosa é impossível tal medida'. Difere do esperado, pois, neste, o agente é obrigado a efetuar a prisão em

12 Lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção

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flagrante no primeiro momento em que o ocorrer o delito, não podendo escolher um momento posterior que considerar mais adequado, enquanto no prorrogado, o agente policial tem a discricionariedade quanto ao momento da prisão.

Uma ressalva quanto a aplicação do flagrante prorrogado fora dos casos da Lei de Crime Organizado, ocorre nos crimes tipificados pela Lei n° 11.343/200613, a

Lei de Drogas.

Por fim, quanto às espécies de flagrante, apesar de não existir na legislação penal pátria, a doutrina reconhece ainda o flagrante forjado ou fabricado, em que agentes "plantam", em determinado lugar, provas de uma infração que não aconteceu com o intuito de instigar a prática de um outro crime. (CAPEZ, 2012, p. 318).

1.5 Da prisão preventiva

A prisão preventiva possui natureza cautelar, ou seja, pode ocorrer antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. Aliás, pode ser decretada a qualquer momento, desde a fase pré-processual (inquérito policial) até antes da sentença transitar em julgado.

Nucci (2014) ao conceituar prisão preventiva, ensina que "é a principal modalidade de prisão cautelar, de cuja base nascem as demais. Portanto, para se sustentar uma prisão em flagrante, por exemplo, torna-se imperioso checar se os requisitos da preventiva estão presentes".

Por se tratar de uma medida excepcional, para que seja decretada a prisão preventiva é necessário que se estejam fielmente presentes todos os requisitos autorizadores. A doutrina cita, ao menos, três requisitos: a materialidade do crime (prova da sua existência); indícios suficientes de autoria (prova razoável da autoria); e que a prisão preventiva seja decretada para a garantia da ordem pública ou da

13 Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre

Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências.

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ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, e/ou assegurar a aplicação da lei penal, conforme estabelece o artigo 31214 do Código de Processo

Penal.

O Código de Processo Penal brasileiro estabeleceu em seu artigo 312 os requisitos ou fundamentos, cuja observância é obrigatória, para a decretação da prisão preventiva. E, no artigo 31315, estão descritas as condições de

admissibilidade desta modalidade de prisão cautelar.

Sobre os fundamentos da prisão preventiva, o art. 312 diz que

a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (BRASIL, Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941)

O primeiro fundamento, a ordem pública, é o mais polêmico entre doutrinadores. Sua conceituação não é fácil e, geralmente, sua interpretação e abrangência, na prática, é eivada de subjetividade.

O juiz, quando fundamenta o decreto de prisão preventiva na garantia da ordem pública, basicamente, leva em consideração a reiteração da conduta. Porém isso não é regra uníssona.

Nucci (2014), a seu tempo, considera o termo garantia da ordem pública, abarca a análise de um grande espectro subjetivo, que leva em conta "a gravidade da infração penal, periculosidade do réu, repercussão provocada pelo crime,

14 Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por

conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

15 Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

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envolvimento com o crime organizado e execução anormal ou brutal do delito”. Segundo o autor, apesar de haver julgadores que levam em conta apenas um desses aspectos, deveriam estar presentes, ao menos, dois desses fatores.

No que diz respeito à garantia da ordem econômica, basicamente, são os aspectos subjetivos da ordem pública aplicados a ordem econômica. Nas palavras de Nucci (2014)

a garantia da ordem econômica segue os prumos da anterior, porém, focaliza, primordialmente, a magnitude da lesão concreta à ordem econômico-financeira causada pelo agente, bem como a continuidade da afetação da economia, calcada em atos concretos do acusado.

A prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem econômica caberá, por exemplo, nos crimes financeiros cometidos por organizações criminosas, onde existe uma verdadeira conturbação da ordem econômica.

1.6 Da prisão temporária

A prisão temporária tem sido cada vez mais objeto de exploração tanto pela prática quanto pela imprensa, na medida que todos os dias noticia-se a sua ocorrência.

Para conceituar prisão temporária, avoca-se o ensinamento de Nucci (2014), quando diz que “trata-se da modalidade de prisão cautelar voltada à garantia da eficiência da investigação policial, quando no contexto de determinados crimes graves.”

A prisão temporária é a única das prisões processuais que não está prevista no Código de Processo Penal. Esta prisão está regulamentada na Lei n. 7960/198916, a qual, no art. 1.º, prevê as seguintes hipóteses de cabimento:

I – Quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; II – Quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade;

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III – Quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado, nos crimes de homicídio doloso, sequestro ou cárcere privado, roubo, extorsão, extorsão mediante sequestro, estupro, epidemia com resultado morte, envenenamento de água potável ou alimentos ou medicamentos com resultado morte, associação criminosa, genocídio, tráfico de drogas e nos crimes contra o sistema financeiro. (BRASIL, Lei n° 7.960, de 21 de dezembro de 1989).

Pode-se dizer que esta modalidade de prisão processual é também chamada de prisão do inquérito, porque somente pode ocorrer nesta fase pré-processual, durante as investigações. Não existe prisão temporária fora do inquérito.

Nas palavras de Avena (2015, p. 1061)

a prisão temporária não pode ser decretada ou mantida após o recebimento da denúncia pelo juízo competente. Isso porque, como já dissemos, visa essa forma de custódia, primordialmente, a assegurar o êxito das investigações que antecedem ao ajuizamento da ação penal. Logo, se esta já foi ajuizada, desaparece o móvel que poderia conduzir o juiz ordenar a custódia.

Com relação a aplicação da prisão temporária, a doutrina e jurisprudência não são uníssonas. No entanto, a corrente majoritária entende que a prisão temporária só pode ser decretada nos crimes previstos no inciso III17 do art. 1º e

ocorrendo uma das outras duas hipóteses de cabimento.

17 III - quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de

autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2°);

b) seqüestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1° e 2°); c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°);

d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1° e 2°);

e) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°);

f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);

g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);

h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único); i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1°);

j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285);

l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal;

m) genocídio (arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 2.889, de 1° de outubro de 1956), em qualquer de sua formas típicas;

n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei n° 6.368, de 21 de outubro de 1976); o) crimes contra o sistema financeiro (Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986). p) crimes previstos na Lei de Terrorismo.

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Capez (2012, p. 343) à seu tempo, entende que

para a decretação da prisão temporária, o agente deve ser apontado como suspeito ou indiciado por um dos crimes constantes da enumeração legal, e, além disso, deve estar presente pelo menos um dos outros dois requisitos, evidenciadores do periculum in mora. Sem a presença de um destes dois requisitos ou fora do rol taxativo da lei, não se admitirá a prisão provisória.

Outras considerações importantes acerca da prisão temporária dizem respeito ao prazo e a legitimidade.

O prazo da prisão temporária será de 5 dias prorrogáveis por mais 5 em caso de excepcional necessidade, conforme estabelece o art. 2º18, caput, ou, em se

tratando de crimes hediondos ou assemelhados, o prazo será de 30 dias prorrogáveis por mais 30, desde que comprovada extrema necessidade desse proceder (art. 2º, §4º, da Lei 8.072/1990, com alteração da Lei 11.464/2007)19.

Sobre a legitimidade, Capez (2012, p. 343) observa que “a prisão temporária pode ser decretada em face da representação da autoridade policial ou de requerimento do Ministério Público. Não pode ser decretada de ofício pelo juiz”.

1.7 Da prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível

Esta prisão derivava do antigo artigo 39320, inc. I, do Código de Processo

Penal, que previa como consequência da sentença condenatória recorrível, em regra, ser o réu preso ou conservado na prisão em que se encontrasse. A exceção à essa regra era nos casos do réu ser primário e possuir bons antecedentes, ou se, o crime pelo qual foi condenado fosse afiançável, o réu pagasse a fiança.

O revogado artigo preceituava

18 Art. 2° A prisão temporária será decretada pelo Juiz, em face da representação da autoridade policial

ou de requerimento do Ministério Público, e terá o prazo de 5 (cinco) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.

19 § 4° - A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos

crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.

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Art. 393. São efeitos da sentença condenatória recorrível:

I - ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança; II - ser o nome do réu lançado no rol dos culpados. (BRASIL, Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941).

O art. 59421 do Código de Processo Penal, por sua vez, trazia uma situação

parecida, dispondo que “o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto”. Em outras palavras, determinava que o réu somente poderia apelar se estivesse recolhido a prisão ou se, sendo crime afiançável, pagasse a fiança. Havia algumas exceções nos casos de ser primário, possuir bons antecedentes ou ter sido condenado por infração que permitisse livrar-se solto.

Avena (2015, p. 1058) caracterizou essa modalidade de prisão

como forma de prisão ex lege, pois imposta por lei,

independentemente da verificação de sua efetiva necessidade pelo Poder Judiciário, à luz das circunstâncias próprias do caso concreto.

A Lei 11.719/0822, revogou expressamente o art. 594 do Código de Processo

Penal que tratava da prisão decorrente de sentença condenatória recorrível. Atualmente a matéria está regulamentada pelo parágrafo único do art. 387 do referido diploma legal, com as redação trazidas pela Lei 12.736/2012, que dispõe que

o juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, ser for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.

Porém, após isso, o tema ainda persistiu controvertido, tendo em vista que a Lei 11.719/0823 proibiu a prisão do réu para apelar, mas manteve o art. 393 que

21 Revogado pela Lei nº 11.719, de 2008.

22 Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008. Altera dispositivos do decreto-lei n° 3.689, de 3 de outubro de

1941 - código de processo penal, relativos à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos.

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previa ser efeito da sentença condenatória a prisão do réu. A polêmica somente foi definitivamente resolvida com a Lei 12.403/201124, que revogou expressamente o

dispositivo.

Dessa forma, é possível concluir que após o advento da Lei 12.403/2011, extinguiu-se essa espécie de prisão no Brasil. Não existe mais a obrigatoriedade da prisão após a sentença condenatória recorrível. Agora, por força do artigo 387, §1° do Código de Processo Penal brasileiro, cabe ao juiz, no momento da sentença condenatória, decidir sobre a imposição da prisão preventiva ou outra medida cautelar.

Avena (2015, p. 1059), com muita propriedade ensina que

a única prisão que poderá ser determinada ao réu solto após a prolação da sentença penal condenatória e antes de seu trânsito em julgado é a preventiva, condicionada, obviamente. a que estejam presentes seus requisitos autorizadores, e, ainda, que não sejam cabíveis as medidas alternativas do art. 319 (art. 282, § 6°), não mais subsistindo, pois, a prisão da sentença condenatória recorrível como uma forma própria e autônoma de prisão provisória.

Aliás, estando o princípio da presunção de inocência insculpido na Constituição Federal, seria paradoxal exigir que o indivíduo condenado fosse recolhido à prisão enquanto ainda lhe restasse chance de alcançar a absolvição.

1.8 Da prisão decorrente de pronúncia

Anteriormente às modificações sofridas pelo Código de Processo Penal brasileiro, oriundas da Lei 11.689/0825, a prisão decorrente da sentença de

pronúncia era uma espécie autônoma de prisão.

A redação do artigo 408, §1° do Código de Processo Penal, em vigor antes da Lei 11.689/08, estabelecia que ao pronunciar o réu, o juiz o recomendaria a prisão, in verbis: “na sentença de pronúncia o juiz declarará o dispositivo legal em cuja sanção julgar incurso o réu, recomendá-lo-á na prisão em que se achar, ou

24 Cf. nota 1. 25 Cf. nota 3.

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expedirá as ordens necessárias para sua captura”. (BRASIL, Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941).

A prisão decorrente de pronúncia era a regra. A liberdade era exceção, em casos em que o réu fosse primário e de bons antecedentes, conforme preceituava o § 2° do referido artigo, in verbis: “se o réu for primário e de bons antecedentes, poderá o juiz deixar de decretar-lhe a prisão ou revogá-la, caso já se encontre preso”. (BRASIL, Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941).

Essa era uma espécie de prisão que se assemelhava a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível. Ambas as espécies de prisão eram autônomas. Para serem aplicadas, bastava a ocorrência de um ato jurídico. No primeiro caso, a pronúncia. No segundo, a condenação, ainda que recorrível.

Após as reformas do Código de Processo Penal, advindas da Lei 11.689/08, a situação mudou. Hoje, o artigo 413, em seu § 3°, estabelece que

o juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código. (BRASIL, Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941)

Agora, cabe ao juiz determinar, quando da pronúncia, se mantém, revoga ou decreta a prisão preventiva do pronunciado, ou ainda, se lhe aplica outra medida cautelar diferente da prisão. Porém, em qualquer que seja sua decisão, sempre deverão ser observados os requisitos gerais autorizadores das medicas cautelares, e a prisão somente poderá ocorrer em uma das hipóteses previstas no artigo 31226

do Código de Processo Penal.

26 Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem

econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o). (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

(31)

No entanto, após tecidas essas considerações, uma pergunta ainda paira no ar: qual a espécie de prisão pode ser aplicada ao réu pronunciado?

Para elucidar a questão, avoca-se o ensino de Avena (2015, p. 1058), ao asseverar que

com as modificações determinadas pela Lei 12.403/2011, a prisão em flagrante passou a exigir conversão em preventiva para o fim de manter preso o agente (art. 310, II) e tendo em vista que, no âmbito do Código de Processo Penal, não há previsão de qualquer outra forma de prisão cautelar capaz de ser ordenada em relação ao réu pronunciado, depreende-se que a prisão a que alude o art. 413, § 3°, pode ser, unicamente, a prisão preventiva.

O fato é que tanto a prisão decorrente de pronúncia quanto a prisão decorrente da sentença condenatória recorrível foram extintas do ordenamento processual penal brasileiro.

1.9 Da Constitucionalidade da Prisão decorrente de sentença penal condenatória

No Brasil, por muito tempo se permitiu a prevalência da ideia de que após ser condenado em primeira instância o réu necessariamente deveria ser recolhido à prisão, sob pena de ser-lhe negado o direito a recorrer da decisão. Ou seja, a prisão era pressuposto para que o réu condenado pudesse apelar da sentença que o condenou.

Essa espécie de prisão subsistia por si, decorrente do revogado artigo 594, cuja redação de 1973 preceituava que

o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto. (BRASIL, Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941, redação dada pela Lei nº 5.941, de 22.11.1973).

Antes do advento da Constituição Federal de 1988 este artigo não gerava grandes discussões doutrinárias e nem muitas divergências jurisprudenciais. Porém

(32)

após a Constituição Federal de 1988, o conflito se tornou mais notável, pois a nova constituição havia trazido toda uma nova diretriz democrática e cidadã e o ordenamento jurídico penal – como tantos outros – precisou ser readequado à nova realidade criada pelo constituinte.

Nesse momento começaram a surgir as maiores divergências quanto à possibilidade da prisão prevista no art. 594 continuar a subsistir por si ante o advento da nova Carta Magna, que trouxe consigo o princípio da presunção de inocência (art. 5°, inc. LVII) insculpido no rol de garantias fundamentais do indivíduo e condicionou o cumprimento da pena à um inovador pressuposto: o trânsito em julgado da sentença.

Vinte anos após, em 2008 o artigo 594 do Código de Processo Penal foi enfim revogado, e abriu-se caminho para o entendimento jurisprudencial que viria a ser consagrado no STF no ano seguinte, a saber, aquele que vê na presunção de inocência – agora com assento constitucional a nível de garantia – óbice para que o réu seja obrigado a iniciar o cumprimento da pena de prisão antes do trânsito em julgado da sentença.

Dessa forma, o instituto da prisão decorrente da sentença condenatória, tratado como espécie autônoma de prisão, foi removido do ordenamento jurídico penal pátrio.

Após isso, por um breve tempo, doutrinariamente, restaram bastante nítidas as seguintes situações: somente após a sentença transitar em julgado o réu poderá ser obrigado a dar início ao cumprimento da pena de prisão, essa espécie de prisão ficou conhecida como prisão-pena; antes de existir sentença penal condenatória transitada em julgado, a única espécie de prisão é a provisória, que por sua vez se desdobra em preventiva e temporária, ambas de natureza cautelar, porém a primeira regida pelo artigo 312 do Código de Processo Penal, e a segunda pela Lei n° 7.960/89.

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2 PRISÃO PROCESSUAL DECORRENTE DE SENTENÇA PENAL

CONDENATÓRIA E O PRINCÍPIO DA INOCÊNCIA: UM ESTUDO À

LUZ DA PONDERAÇÃO DE VALORES CONSTITUCIONAIS

A possibilidade de se executar a pena de prisão antes do esgotamento de todas as vias recursais já era vista com ressalvas por doutrinadores desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. À exemplo de Tourinho Filho (2007, p. 795) “uma vez que a Magna Carta dispõe que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (art. 5°, LVII), é um não-senso executar uma decisão sujeita a recurso extraordinário”.

De um lado a presunção de inocência, de outro a segurança pública. Esse choque entre dispositivos gerou ampla e acalorada discussão. O conflito aparente nessa época foi sendo aos poucos superado. A doutrina e a jurisprudência passaram a entender que, em que pese o princípio da presunção de inocência estar insculpido na constituição, nela também estavam assegurados outros direitos e garantias como a paz social, a segurança pública e, até mesmo, a dignidade da pessoa humana, sob a ótica da vítima de um delito.

Assim, o conflito entre a presunção de inocência e a prisão processual decorrente da sentença penal condenatória, já não era mais tratado como um conflito hierárquico entre normas, mas sim um conflito entre direitos do mesmo nível constitucional, e portanto passou a ser solucionado por meio da técnica da ponderação.

A jurisprudência passou a aceitar a coexistência entre as prisões provisórias e a presunção de inocência, principalmente no que tange a prisão em decorrência da sentença condenatória recorrível.

Apesar de toda a discussão, o assunto parecia ter sido pacificado em 1990, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou a súmula 9, in verbis: “a exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”. (BRASIL. Súmula 9/STJ - 08/03/2017. Recurso. Apelação.

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Prisão provisória. Presunção de inocência. CF/88, art. 5º, LVII e LXI. CPP, arts. 393, I, e 594. Lei 6.368/76, art. 35).

No entanto, em 2008, novas mudanças e novos ares pairaram sobre o sistema processual penal brasileiro. O artigo 594 do Código de Processo Penal foi enfim revogado pela Lei 11.719/08. E, assim, viriam alguns anos de relativa tranquilidade doutrinária e jurisprudencial acerca do tema, com a inclinação ao entendimento de que a presunção de inocência acompanharia o indivíduo até a sentença definitiva transitar em julgado.

2.1 Do Princípio da Presunção de Inocência

O princípio da presunção de inocência é a coroa de um estado democrático de direito. Todo o ordenamento jurídico penal orbita em sua volta. O ministro Nilson Naves, do Superior Tribunal de Justiça, em uma de suas decisões, com muita ousadia, disse que

presume-se que toda pessoa é inocente, isto é, não será considerada culpada até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, princípio que, de tão eterno e de tão inevitável, prescindiria de norma escrita para tê-lo inscrito no ordenamento jurídico. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 45.416/MG. Relator: Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA. 6ª Turma, Julgamento em: 03/11/2005, publicado no DJ de 10/04/2006 p. 304).

A ideia de presunção de inocência ganhou força “entre os postulados fundamentais que presidiram a reforma do sistema repressivo empreendida pela revolução liberal do século XVIII”. (GOMES FILHO, 1991, p. 9).

No entanto, existem estudos que apontam existir uma origem ainda mais remota da ideia de presunção de inocência, datada na antiguidade, no direito romano.

O advogado mexicano Oscar Uribe Benítez fez um estudo e esboçou algumas evidências sobre as origens da presunção de inocência na antiguidade. O advogado e professor de ciência penais, com base nos estudos do doutrinador

Referências

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