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O controle penal das infrações de menor potencial ofensivo e a efetividade da Lei 9.099/95: análise dos termos circunstanciados atendidos pela Brigada Militar na Comarca de Santa Rosa no ano de 2011

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Academic year: 2021

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UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ANGELA MARINES HUPPES

O CONTROLE PENAL DAS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO E A EFETIVIDADE DA LEI 9.099/95

ANÁLISE DOS TERMOS CIRCUNSTANCIADOS ATENDIDOS PELA BRIGADA MILITAR NA COMARCA DE SANTA ROSA NO ANO DE 2011

Santa Rosa (RS) 2012

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ANGELA MARINÊS HUPPES

O CONTROLE PENAL DAS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO E A EFETIVIDADE DA LEI 9.099/95

ANÁLISE DOS TERMOS CIRCUNSTANCIADOS ATENDIDOS PELA BRIGADA MILITAR NA COMARCA DE SANTA ROSA NO ANO DE 2011

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DECJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientadora: MSc. Ester Eliana Hauser

Santa Rosa (RS) 2012

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FOLHA RESERVADA PARA A APROVAÇÃO DA BANCA

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Dedico este trabalho a todos que, de uma forma ou outra, me auxiliaram, me apoiaram e ampararam durante minha trajetória acadêmica, especialmente meu marido Jonas, que pacientemente aceitou as necessárias ausências.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, acima de tudo, pela vida, força e coragem.

À minha querida orientadora professora Ester, por sua dedicação, disponibilidade e atenção dispensadas.

Ao meu amado marido Jonas, que mesmo alheio ao direito, se revelou um parceiro de jornada.

A todos que colaboraram de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho, minha muito obrigada!

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“A liberdade compreende até o direito de delinquir, mas não o direito de permanecer impune após ter-se delinquido.” Dinardi L. E.

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RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica analisa a Lei 9.099/95, norma criadora e regulamentadora dos Juizados Especiais Criminais, para apuração das infrações de menor potencial ofensivo. Abordar-se-á seus princípios, objetivos e procedimento, bem como buscar, a partir da pesquisa bibliográfica e da análise dos Termos Circunstanciados atendidos pela Brigada Militar na Comarca de Santa Rosa no ano de 2011, avaliar, se e em que medida a Lei 9.099/95 atende aos objetivos a que se propôs quando foi editada, especialmente no que se refere à prevenção de infrações de menor potencial ofensivo.

Palavras-Chave: Lei 9.099/95. Princípios. Objetivos. Brigada Militar. Efetividade. Prevenção.

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ABSTRACT

The present work of monographic research will analyze the Law 9.099/95, creative rule and regulatory of Special Criminal Courts, for counting of less offensive potential infractions. We will approach their principles, objectives and procedure, as well as we will look for, from the bibliographical research and the analysis of Detailed Terms assisted by the Military Brigade in the District of Santa Rosa in the year of 2011, to evaluate, if and in that extend the Law 9.099/95 assist the objectives that it intended when it was edited, especially in what it refers to the prevention of less offensive potential infractions.

Keywords: Law 9.099/95. Principles. Objective. Military Brigade. Effectiveness. Prevention.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1 A LEI 9.099/95, OS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS E O ATENDIMENTO ÀS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO ... 13

1.1 Contexto histórico e espírito da lei ... 13

1.2 Princípios orientadores da Lei 9.099/95 ... 18

1.3 A apuração das infrações de menor potencial ofensivo no âmbito dos juizados especiais criminais ... 20

1.3.1 Termos circunstanciados ... 22

1.3.2 Composição civil ... 23

1.3.3 Transação penal ... 25

1.3.4 Procedimento sumaríssimo ... 28

2. A ATUAÇÃO DA BRIGADA MILITAR NAS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO ... 31

2.1 A Brigada Militar: atribuições constitucionais ... 31

2.2 A atuação da Brigada Militar nas infrações de menor potencial ofensivo ... 36

2.2.1 Base legal e competência para confecção de boletins de ocorrência 38 2.2.2 A atuação da Brigada Militar nas infrações de menor potencial ofensivo ... 40

2.3 A atuação da Brigada Militar nas infrações de menor potencial ofensivo na Comarca de Santa Rosa no ano de 2011: análise quantitativa ... 42

3. O PAPEL DA BRIGADA MILITAR NA EFETIVIDADE DA LEI 9.099/95 E O CONTROLE PUNITIVO DAS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO: considerações críticas ... 49

3.1 A composição de danos e atendimento ao interesse da vítima ... 49

3.2 A aplicação consensual de penas não privativas de liberdade e os princípios da jurisdicionalidade e da culpabilidade... 53

3.3 A efetividade da Lei 9.099/95 – considerações a partir da atuação da Brigada Militar na Comarca de Santa Rosa no ano de 2011 ... 61

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CONCLUSÃO ... 64

REFERÊNCIAS ... 68

APÊNDICE A - Roteiro para coleta de dados junto à Brigada Militar sobre infrações de menor potencial ofensivo atendidas no ano de 2011 ... 73

ANEXO 1 - Portaria SJS nº 172 de 16 de novembro de 2000 ... 74

ANEXO 2 - Autorização publicada em Boletim Interno para coleta de dados junto à SSPO. ... 78

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho abordará a Lei 9.099/95, norma pela qual foram criados e regulamentados os Juizados Especiais Cíveis e Criminais Estaduais. No que compete aos aspectos criminais, os juizados tem competência para processar, julgar e executar as decisões envolvendo infrações de menor potencial ofensivo, entendidas como as de pena máxima de até dois anos.

Serão apresentados e analisados os princípios, objetivos e o procedimento aplicado, bem como se buscará, a partir da análise dos Termos Circunstanciados atendidos pela Brigada Militar na Comarca de Santa Rosa no ano de 2011, avaliar, se e em que medida a Lei 9.099/95 atende aos objetivos a que se propôs quando foi editada, especialmente no que se refere à prevenção de infrações de menor potencial ofensivo.

Passados mais de quinze anos da edição da norma, essa análise se faz pertinente, pois as autoridades policiais e judiciais se vêem diante de uma realidade que não condiz com o quadro moldado quando da criação da norma.

Para a realização deste trabalho foram efetuadas pesquisas bibliográficas e por meio eletrônico, bem como a análise das ocorrências atendidas pela Brigada Militar nos municípios da Comarca de Santa Rosa durante o ano de 2011 que ensejaram a confecção de Termos Circunstanciados.

Inicialmente, no primeiro capítulo, será abordado o teor da norma, seus princípios orientadores, a forma de apuração das infrações de menor potencial ofensivo no âmbito dos juizados especiais criminais mediante confecção de Termo Circunstanciado, as tentativas de conciliação através da composição civil, seguida

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de proposta de transação penal, e por último, a instauração de procedimento sumaríssimo.

No segundo capítulo falar-se-á sobre atuação da Brigada Militar no atendimento de ocorrências envolvendo delitos de menor potencial ofensivo. Também serão feitos apontamentos sobre suas atribuições constitucionais, a competência para confecção dos boletins de ocorrência, o processamento dos Termos Circunstanciados, sua remessa e acompanhamento dos procedimentos após a remessa ao JECrim (Juizado Especial Criminal), finalizando com uma análise quantitativa das infrações de menor potencial ofensivo atendidas pela instituição nos municípios da Comarca de Santa Rosa no ano de 2011.

Já no terceiro capítulo, a partir dos princípios e objetivos abarcados pela Lei 9.099/95, apresentam-se algumas considerações acerca das medidas aplicadas na composição e na transação penal, bem como das penas decorrentes do procedimento sumaríssimo, sob o enfoque dos princípios da jurisdicionalidade, devido processo legal e da culpabilidade. Também será avaliada a efetividade da norma e a contribuição da Brigada Militar enquanto ente responsável pela elaboração de Termos Circunstanciados pode dar no sentido de assegurar a efetividade da norma.

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1 A LEI 9.099/95, OS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS E O ATENDIMENTO

ÀSINFRAÇÕESDE MENORPOTENCIALOFENSIVO

O conflito é inerente à natureza humana, uma vez que o homem é um ser social. Ele se apresenta de diversas formas e em diversos locais; segundo Bobbio, Matteucci e Pasquino (1983, p. 225), “[...] o conflito é uma forma de interação entre os indivíduos, grupos, organizações e coletividades [...]”.

A sociedade, de acordo com suas características próprias, institui mecanismos informais de controle social e quando estes falham, surge o Estado intervindo através do direito penal.

O Brasil se insere nesse contexto; nossos mecanismos históricos de controle social são a escola, a religião e a família, relegando-se ao Estado a última e derradeira instância de solução de seus conflitos, através do sistema penal. Conforme Prado (2006, grifo nosso), somente quando for indiscutível a gravidade da sanção penal, com todas as suas consequências é que se ativa a “força máxima penal”.

Ainda assim, os conflitos sociais são diversos, em variadas graduações e de naturezas diversas e é grande o número de situações em que se recorre ao Estado, através do monopólio do poder punitivo em matéria penal, na busca pela solução dos litígios.

1.1 Contexto histórico e espírito da lei

Na década de 1980, mesmo com a democratização, após um longo período ditatorial, o Brasil ainda mantinha um arcaico mecanismo de processamento das lides penais: o Código de Processo Penal em vigor datava de 1941, com poucas atualizações, aliás, permanece assim até hoje. Questões complexas e crimes graves

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tinham o mesmo processamento que questões simples, de menor gravidade, com pouca ou nenhuma repercussão social. Casos graves misturavam-se a questões simples, sem tratamento diferenciado, sobrecarregando o sistema com processos que poderiam ser facilmente resolvidos.

Tal fato contribuía para a sobrecarga do serviço policial e judiciário e para o caos de um sistema penal que não conseguia atender principalmente aos interesses das vítimas, que viam os infratores impunes, beneficiados pela morosidade do sistema. Inúmeras eram as lides judiciais que se amontoavam nos tribunais, sem que o Estado conseguisse dar resposta às partes.

A ideia de atender aos interesses da vítima e de dar tratamento diferenciado ao pequeno transgressor, que através de um procedimento mais célere efetivamente seria punido, trazia consigo a esperança de “desinchar” o sistema judiciário. Tal ideia emergiu e se consolidou durante a Assembleia Constituinte, a partir da qual se construiu o texto da Constituição Federal de 1988 que teve inserido, em seu art. 98, inciso I, o seguinte texto:

Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau. (grifo nosso).

Entretanto, a norma constitucional carecia de regulamentação, o que foi sanado com a edição da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995. Originária do Projeto de Lei nº 1.480-A, de 1989, que por sua vez, teve o Anteprojeto iniciado por um grupo de estudo enquanto a Constituinte ainda não havia encerrado os trabalhos, somente veio a se tornar lei em 1995.

A partir da regulamentação, os Estados foram autorizados a criar seus Juizados Especiais, civis e criminais, o que se deu de forma relativamente rápida. Atualmente, a instalação dos Juizados Especiais está efetivada pelos Estados, dentro de sua organização judiciária. No Rio Grande do Sul, nas Comarcas de vara única, as infrações de menor potencial ofensivo são julgadas pelo Juiz Titular da

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vara, com pauta própria; já em Comarcas maiores, há o Juizado Especial, com um Juiz Titular.

Importante mencionar que a elaboração da Lei 9.099/95 ocorreu em meio a clamor popular, num contexto histórico de redemocratização do país e neoliberalismo socioeconômico1. Importantes juristas participaram do grupo de trabalho que editou o Projeto de Lei nº 1.480-A, como a professora de direito processual penal Ada Pelegrinni Grinover, e os Procuradores de Justiça do Estado de São Paulo Antonio Magalhães Gomes Filho e Antônio Scarance Fernandes. Os idealizadores da nova norma levantavam a bandeira em sua defesa, conforme se observa na sua Exposição de Motivos 2:

Com efeito, a ideia de que o Estado possa e deva perseguir penalmente, sem exceção, toda e qualquer infração, sem admitir-se, em hipótese alguma, certa dose de discricionariedade ou disponibilidade da ação penal pública, mostrou com toda evidência sua falácia e hipocrisia. Na prática, operam diversos critérios de seleção informais e politicamente caóticos, inclusive entre os órgãos de persecução penal e judiciais. Não se desconhece que, em elevadíssima percentagem de certos crimes de ação penal pública, a polícia não instaura o inquérito, e o Ministério Público e o Juiz atuam de modo a que se atinja a prescrição. Nem se ignora que a vítima - com que o Estado até agora pouco se preocupou - está cada vez mais interessada na reparação dos danos e cada vez menos na aplicação da sanção penal. É por essa razão que atuam os mecanismos informais da sociedade, sendo não só conveniente como necessário que a lei introduza critérios que permitam conduzir a seleção dos casos de maneira racional e obedecendo a determinadas escolhas políticas.

Doutrinadores da época a viam como uma esperança de um ordenamento diferenciado, que beneficiaria não somente as partes, mas também o sistema castrense, conforme se observa em Figueira Junior e Lopes (1997, p. 30-31, grifo do autor), segundo os quais

1 Entende-se por neoliberalismo socioeconômico a economia de livre mercado ou sistema de livre iniciativa na qual os agentes econômicos agem de forma livre, com pouca ou nenhuma intervenção dos governos. Por extensão, o intervencionismo estatal nas demais áreas tende a reduzir, a exemplo do direito penal.

2 Exposição de Motivos ou justificação é a fundamentação do projeto a ser submetido à apreciação; é por meio dela, que o(s) autor (es) expõe(m) os argumentos que demonstram a necessidade e os benefícios da proposição, de acordo com o seu julgamento. A exposição de motivos deve vir logo em seguida ao texto normativo.

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[...] essa nova forma de prestar jurisdição significa antes de tudo um avanço legislativo de origem eminentemente constitucional, que vem dar guarida aos anseios antigos de todos os cidadãos, especialmente aos da população menos abastada, de uma justiça apta a proporcionar uma prestação de tutela simples, rápida, econômica e segura, capaz de levar à liberação da indesejável litigiosidade contida.

Segundo Capez (2009, p. 573) foi um grande passo para a substituição da jurisdição contenciosa por uma jurisdição de consenso, assegurando à vítima a reparação do dano, e evitar a instauração de um processo que, além de moroso, muitas vezes lhe resultaria inócuo. Agora, “a vítima deixa de ser mera colaboradora da justiça [...] para assumir o papel de protagonista; seus interesses, inclusive os civis, não são esquecidos pelo processo penal.” (CAPEZ, 2009, p. 575). É sabido que à vítima importa não somente a punição de seu ofensor, como também, se não principalmente, a reparação do dano sofrido3.

No decorrer da história, a vítima ocupou diferentes papéis; durante o período medieval, ela ocupava lugar de destaque no sistema jurídico penal, mas a partir do instante em que o Estado assumiu o monopólio da punição, ela foi relegada a um segundo plano. O conflito humano, expresso pela prática do delito, deixou de ser visto como uma contenda entre seres singulares (particulares) e passou a representar um conflito entre o acusado e a sociedade. O próprio conceito material de crime traz esta noção, ao definir o crime como todo ato lesivo ou que expõe a perigo bens jurídicos fundamentais para a vida em sociedade.

O “abandono” da vítima pelo sistema de justiça criminal foi, em certa medida, compensado pela inclusão, nas legislações penais contemporâneas, da reparação ao dano causado pelo crime como critério para concessão de benefícios penais. No Código Penal Brasileiro, por exemplo, a reparação do dano aparece como requisito para a concessão de vários benefícios penais, como o sursis e o livramento condicional.

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A consistente crítica elaborada pelo pensamento abolicionista, construída a partir de 1970, que teve como base a análise da realidade operacional dos sistemas penais contemporâneos, demonstrou que a simples imposição da sanção penal não resolve o conflito, mas apenas o elimina temporariamente, podendo este voltar a se manifestar, de forma mais violenta, em momentos posteriores e que o retorno da vítima à condição de protagonista do sistema de justiça criminal, bem como o atendimento aos seus interesses, poderia representar um avanço em matéria de tratamento/resolução de conflitos.

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Buscava-se, também, que com tratamento diferenciado às pequenas infrações, através de um procedimento mais célere, que o Poder Judiciário, em razão da menor carga de trabalho, pudesse atender melhor as demais questões, mais graves. Além do que, se estaria efetivando a garantia de acesso à justiça, especialmente por parte das vítimas de crimes menos graves, que em razão da morosidade processual, sequer a ela recorriam, permanecendo nas cifras negras do sistema. Obviamente, acesso à justiça não significa simplesmente assegurar que as camadas populares cheguem ao poder judiciário, mas, sobretudo, que recebam uma prestação jurisdicional de qualidade.

Não poderíamos deixar de mencionar a busca do restabelecimento da confiança, ou da credibilidade, bastante abalada, na capacidade do Poder Judiciário em resolver demandas de forma ágil, especialmente quando estes fossem provenientes das classes populares.

Por outro lado, buscava também a lei oferecer tratamento diferenciado aos autores de pequenas infrações, com aplicação de penas não privativas de liberdade, sem que se perdesse a natureza repressivo-preventiva da pena e sim, efetivamente ocorresse prevenção de novos delitos. Tal afirmação confirma-se no exposto no item 8 do Anteprojeto de Lei4, segundo o qual

São estes, em apertada síntese, os aspectos principais do projeto, cuja filosofia se insere no filão que busca dar efetividade à norma penal, ao mesmo tempo em que privilegia os interesses da vítima, sem descurar jamais das garantias do devido processo legal.

Entende-se, portanto, que a nova lei buscava atender aos interesses do Estado, da vítima, e porque não dizer, do próprio autor das pequenas infrações, eis que ele também espera atendimento digno quando de sua submissão à decisão jurisdicional.

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1.2 Princípios orientadores da Lei 9.099/95

Princípios são os preceitos fundamentais de uma norma, são orientadores da atividade estatal quando de sua aplicação aos casos concretos. Assim, a partir dos princípios de uma norma, percebe-se o que quis o legislador quando de sua elaboração e é a partir dos princípios que a lei será interpretada.

Segundo Miguel Reale (2002, p. 305, grifo do autor),

Os princípios são “verdades fundantes” de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isso é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis.

Como norma inovadora, o Anteprojeto de Lei já definia quais seriam os critérios e princípios orientadores do processo de causas de menor complexidade penal. Tais princípios também foram mantidos no Projeto, incluídos na Exposição de Motivos e elencados na primeira parte do art. 2º da Lei, e são consonantes com os objetivos da lei, expostos ao final do mesmo artigo, sendo todos voltados a simplificar procedimentos e dar agilidade à solução das causas. Segundo Ada Pellegrini et al (1997), ambos tem especial relevância, pois norteiam a atividade do legislador e são a base para eventuais dúvidas ou interpretações.

São princípios orientadores da Lei 9.099/95 a oralidade, a informalidade, a economia processual e a celeridade.

Pelo princípio da oralidade, os atos são primordialmente orais, devendo ser reduzidas a termo somente as questões essenciais. As declarações das partes e das testemunhas (art. 65), a representação e a queixa (art. 75 e 77), eventuais embargos declaratórios (art. 83) e até mesmo o oferecimento da denúncia (art. 77) são orais; somente o essencial é objeto de registro escrito (DOS SANTOS; CHIMENTI, 2008, p. 273). Por exemplo, o art. 74 declara que a composição dos danos civis será reduzida a termo, bem como o art. 75 prevê a manifestação da queixa ou representação de forma verbal, devendo ser reduzida a termo.

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Pelo princípio da informalidade ou simplicidade, que está explicitado no art. 65 da Lei, não se exige o mesmo rigor processual utilizado nos procedimentos comuns. Os atos deverão ser simplificados e, uma vez atingida sua finalidade, deverão ser considerados válidos. Conforme Capez (2009, p. 575) “Atingida a finalidade a que se destinava o ato, bem como não demonstrada qualquer espécie de prejuízo, não há que se falar em nulidade.” Há doutrinadores que veem na finalidade (ou na finalidade e prejuízo) um novo princípio, correlato da informalidade, de modo que os atos processuais somente serão pasíiveis de anulação se houver comprovado prejuízo ao processo ou às partes.

O princípio da economia processual decorre da informalidade, de modo que “os atos processuais devem ser praticados no maior número possível, no menor espaço e da maneira menos onerosa” (CAPEZ, 2009, p. 575). Deste princípio decorre, por exemplo, a adoção do procedimento sumaríssimo que concentra diversos atos processuais em um único momento, como se verá mais adiante. No entendimento de Figueira Junior e Lopes (1997, p. 64), dados os princípios orientadores, o procedimento adotado pode ser verdadeiramente denominado sumaríssimo.

O princípio da celeridade decorre dos princípios anteriores, buscando dar rapidez na execução dos atos processuais, encurtando o tempo entre a prática da infração e a prestação punitiva do Estado, e impede que a prescrição permita a impunidade do infrator (MIRABETTE, 2002). Tal princípio se evidencia, por exemplo, na determinação constante no art. 69, segundo o qual a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência deverá lavrar o Termo Circunstanciado e o encaminhar, de pronto, ao Juizado, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.

A inclusão dos princípios de forma explícita no texto legal não obsta sua influência nos demais ditames da lei. Suas premissas atingem inclusive as situações que necessariamente implicam em morosidade, como o envolvimento de autor e vítima residentes em Comarcas distintas; para tal, o art. 66 autoriza a citação por carta precatória. Também interferem na forma das citações, que são, de regra, pessoais, vedada apenas a citação por edital, eis que incompatível com a natureza

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do procedimento. Não sendo localizado o autor, o feito deverá ser encaminhado ao juízo comum.

Esses princípios dão o tom da nova norma, sem prejuízo de outros princípios já inseridos sistema jurídico brasileiro, como o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório. Ao serem inseridos no texto na norma, são colocados em destaque, transparecendo a intenção do legislador em observá-los na prestação jurisdicional. Eles visam diferenciar o procedimento, tornando-o rápido, porém assegurando os direitos e garantias fundamentais aos envolvidos na lide.

1.3 A apuração das infrações de menor potencial ofensivo no âmbito dos juizados especiais criminais

Uma vez criada a lei, coube a ela delimitar seu alcance, o que foi feito pelo art. 61, inicialmente determinando sua competência para conciliação, julgamento e execução de infrações de menor potencial ofensivo, que incluíam as contravenções penais e crimes com pena máxima cominada de até um ano, desde que outra lei não determinasse procedimento especial. Em 2001 foi editada a Lei 10.259, que criou os juizados especiais criminais também na Justiça Federal, prevendo nela o alcance para crimes com pena máxima de até dois anos, independente do procedimento previsto, gerando discordância entre as duas esferas. Surgiu então uma discussão de que o novo texto feria o princípio da isonomia, questão resolvida somente em 2006, com a edição da Lei 11.313, que alterou o art. 61 da Lei 9.099/95, ampliando o seu alcance para todos os crimes com pena máxima cominada de até dois anos. Para a regra de fixação de competência não se computam as agravantes ou atenuantes, mas apenas a pena em abstrato, uma vez que estas apenas incidem na pena ao término da ação.

Importante a objeção que ambas as leis fazem, ao excluir de seu alcance delitos com procedimento determinado por lei especial. Aqui estão inseridos os delitos militares, com competência privativa da Justiça Militar, inclusive com vedação expressa no art. 90-A da Lei 9.099/95. Outro exemplo são os delitos cometidos

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contra a mulher, previstos na Lei 11.340/06, cujo art. 41 veda a aplicação da Lei 9.099/95.

Por outro lado, em 2003 foi editada a Lei 10.741/03, mais conhecida como Estatuto do Idoso, segundo a qual se aplica aos crimes nela previstos o procedimento (sumaríssimo) da Lei 9.099/95 e apenas subsidiariamente, no que couber, as disposições do Código Penal e de Processo Penal. Conforme dos Santos e Chimenti (2008, p. 265), neste caso “[...] o intuito do legislador foi tornar mais célere e eficiente a punição para aquele que atenta contra os idosos e não beneficiar aqueles que praticam crimes contra idosos com medidas como a transação penal.”

Em resumo, quis o legislador que a vítima idosa tenha chances de ver seu ofensor punido ainda em vida, o que poderia ser inviável se o procedimento fosse o ordinário. Isso não significa que os crimes contra o idoso foram alçados ao status de menor potencial ofensivo, apenas previu a aplicação do mesmo procedimento.

Há, no entanto, circunstâncias que excluem a competência dos Juizados Especiais, inseridas no art. 60 da Lei 9.099/95. São os casos em que ocorra conexão ou continência. Mas o parágrafo único do mesmo artigo assegura que sempre que uma infração seja julgada

[...] perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis. (art. 60, § único da Lei 9.099/95).

Além de delimitar seu âmbito de competência, a Lei 9.099/95 trouxe importantes inovações ao introduzir na legislação penal brasileira institutos como a composição, a transação penal e o procedimento sumaríssimo.

A seguir abordaremos as figuras do Termo Circunstanciado, documento que substitui o Inquérito Policial como peça informativa; como ocorre a composição civil dos danos entre autor e vítima, e quais as consequências que ela acarreta, seguida da transação penal, proposta pelo Ministério Público ao autor, e, em última opção, a instauração da ação penal sob o procedimento sumaríssimo.

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1.3.1 Termos circunstanciados

Um instituto importante foi criado pelo art. 69 da Lei 9.099/95, segundo o qual

A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo

circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do

fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários (grifo nosso).

O Termo Circunstanciado é o documento instrutório que substitui o Inquérito Policial sempre que a autoridade policial estiver diante de uma infração de menor potencial ofensivo. Trata-se de um documento sucinto, em que

[...] elabora-se um relatório sumário, contendo a identificação das partes envolvidas, a menção à infração praticada, bem como todos os dados básicos e fundamentais que possibilitem a perfeita individualização dos fatos, a indicação das provas, com o rol de testemunhas, quando houver [...] (CAPEZ, 2009, p. 586).

Aqui surge o primeiro momento perceptível da aplicação dos princípios, uma vez que a substituição do Inquérito Policial pelo Termo Circunstanciado é a personificação da oralidade, simplicidade, celeridade, economia processual e informalidade. Percebe-se que, por meio dele, um procedimento policial moroso e meticuloso como o inquérito policial é substituído por um documento conciso que concentra as informações indispensáveis para a persecução criminal e a composição de danos.

A concentração de informações se associa à simplicidade das informações contidas no Termo Circunstanciado, ou, conforme Figueira Junior e Lopes (1997, p. 472), Termo de Ocorrência. No entendimento desses autores, trata-se de uma peça que não carece de rebuscamento, nem formalidades especiais,

Na qual a autoridade policial que tomar conhecimento de infração de menor potencial ofensivo, com autor previamente identificado, registrará de forma sumária as características do fato, súmula dos relatos apresentados pelas partes e testemunhas à autoridade policial, que não necessita tomá-los por termo. (FIGUEIRA JUNIOR; LOPES, 1997, p. 472).

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No entendimento de Capez (2009), não há necessidade de Inquérito Policial, pois basta o Termo Circunstanciado, no qual conste um relato sumário identificando a infração, a identificação das partes, a indicação de provas presentes e rol de testemunhas, se houver. Segundo o mesmo autor, a informalidade é tão presente, que o termo pode ser lavrado pelo policial militar que atender a ocorrência, sem necessidade de deslocamento a uma Delegacia de Polícia. Inclusive, atualmente tal entendimento é pacífico, e as polícias militares do Brasil estão aptas a lavrar o termo e a Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul foi uma das pioneiras nessa atuação, conforme veremos no capítulo seguinte.

Outro fator importante trazido pela nova norma é a substituição da prisão em flagrante pelo simples encaminhamento do autor ao Juizado Especial Criminal, ou o compromisso daquele em comparecer à audiência preliminar. Aqui se observa a intenção do legislador em dar tratamento diferenciado ao pequeno transgressor, não lhe impondo prisão em flagrante ou pagamento de fiança.

Uma vez finalizado pela autoridade policial, o Termo Circunstanciado, acompanhado de objetos, documentos e quaisquer materiais apreendidos, será encaminhado diretamente ao Juizado Especial Criminal. São exemplos de documentos o auto de constatação de danos, o croqui de acidente de trânsito com lesões e fotografias. Sempre que forem necessários exames complementares ou periciais, estes deverão acompanhar o Termo, como auto de exame de corpo de delito de lesões corporais e laudo toxicológico.

1.3.2 Composição civil

Uma das principais inovações trazidas pela Lei 9.099/95 foi a introdução da composição civil como estratégia de reparação imediata dos danos oriundos da prática delitiva. Com a composição, buscou-se devolver, em certo sentido, o protagonismo à vítima do delito, garantindo-se a ela um espaço de fala, de reconhecimento e de reparação dos danos materiais ou morais sofridos. Assim, a

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composição civil é um acordo firmado entre autor e vítima, objetivando a reparação de eventuais danos, materiais ou morais.

Comparecendo vítima e autor à audiência preliminar, a primeira providência é verificar a possibilidade de consenso entre as partes e composição de eventuais danos morais ou materiais sofridos pela vítima. Quando a infração for de ação penal privada ou pública condicionada à representação, a composição implica em renúncia à queixa, ou seja, a vítima abre mão de processar criminalmente o autor. Essa regra é relativa, pois não sendo a reparação total e havendo mais de um ofensor, a extinção somente abrange os participantes do acordo, permanecendo a ação em relação ao(s) demais (DOS SANTOS; CHIMENTI, 2008, p. 287).

Também a conciliação exclui a possibilidade de ação civil ex delicto, uma vez que esta decorre da existência de um processo penal com sentença condenatória, e, ocorrendo a renúncia de queixa, a ação penal sequer se inicia.

Segundo dos Santos e Chimenti (2008, p. 287, grifos dos autores)

[...] o art 74 da Lei n. 9.099/95 agiliza eventual execução do dano decorrente do delito, pois fora do Juizado especial a reparação depende da execução da sentença condenatória (certa quanto ao an debeatur, mas não em relação ao quantum debeatur- art. 63 do CPP) ou da actio civilis ex

delicto (art. 64 do CPP).

A doutrina encontra defensores e críticos dessa nova forma de resolução de conflitos: “A composição civil não é transação penal. Suprime do ofendido direito de iniciar ação penal ou de oferecer representação. A Lei 9.099/95 eliminou a persecução penal por meio do acordo em matéria civil”. (COSTA, 2000, p. 289). Segundo a mesma autora, fatos mesclando esfera civil e penal tem a reparação estimulada e a persecução penal não só é desmotivada, como desconsiderada.

Já Bittencourt (1997, p. 78, grifo do autor) entende que

Finalmente, a Lei 9.099/95 dá uma importância extraordinária para a reparação do dano ex delicto, tornando-a prioritária em relação à composição penal. [...] Enfim, a reparação do dano ex delicto, é mais um dos grandes méritos deste novo diploma legal.

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Interessante salientar que a composição é reduzida a termo, com sentença homologada e com validade de título executivo judicial. Entretanto, ela não precisa ser, necessariamente, de cunho monetário, é possível em crimes contra a honra, por exemplo, o simples pedido de desculpas e o compromisso de respeito mútuo resolver a lide. A sentença que homologa a composição civil, entendida como acordo mútuo, é irrecorrível, não cabendo sequer ação rescisória e tem por consequência a extinção da punibilidade do acusado.

Figueira Junior e Lopes (1997, p. 478), entendem que

A composição dos danos causados pela infração penal deve ser considerada sob duas hipóteses profundamente diversas entre si: Nos casos de infrações cuja ação penal seja de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação do ofendido e nos casos de infrações cuja ação seja pública incondicionada. [...] Nos casos em que se deixa total ou parcialmente ao arbítrio da vítima a iniciativa de deflagração da persecução penal, composto o dano por acordo homologado, nada mais haverá a reclamar na esfera dos Juizados Especiais ou em qualquer outro procedimento criminal.

Nas ações públicas incondicionadas, a composição dos danos civis é apenas fase antecedente da transação, e uma independe da outra.

Nas infrações sem vítimas individuais, ou seja, naquelas infrações em que a vítima é a coletividade ou o próprio Estado, passa-se diretamente à propositura da transação penal.

1.3.3 Transação penal

A transação é um acordo que pode ser celebrado entre o Ministério Público e o acusado, sem a participação da vítima. O Ministério Público oferece ao acusado uma pena não privativa de liberdade, que, se aceita, dispensa a instauração do processo.

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[...] amparada pelo princípio da oportunidade ou da discricionariedade e consiste na faculdade de o órgão acusatório dispor da ação penal, isto é, de não promovê-la sob certas condições, atenuando o princípio da obrigatoriedade, que, assim, deixa de ter valor absoluto. (CAPEZ, 2009, p. 588).

A proposta de transação é subsequente à composição. Ela surge quando o delito for de ação penal privada ou pública condicionada e a composição resulta inexitosa, ou se a ação for pública incondicionada. Sendo ação penal pública condicionada ou privada, a vítima pode apresentar ou não seu desejo de representação ou queixa. Não o fazendo, o procedimento fica suspenso aguardando sua manifestação no prazo legal, que não ocorrendo, extingue a ação pela decadência. Como a lei dos juizados especiais não prevê norma específica, permanece a regra geral do CPP para a decadência, que é de seis meses a contar do dia em que a vítima vier saber quem é o autor do crime ou do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia (art. 38 e 103 do CPP).

Manifestado o interesse de representação, ou se a ação for pública incondicionada, o Ministério Público propõe a denominada transação penal. Este é mais um instituto inovador trazido pela Lei 9.099/95. O Ministério Público analisa a viabilidade legal, pois ela somente pode ser proposta se estiverem presentes os requisitos do art. 76, que são: não ter o acusado sofrido condenação anterior por crime, não tenha existência de transação anterior no lapso de cinco anos e se seus antecedentes, sua personalidade, os motivos e circunstancias do crime recomendem a medida. Se todos estiverem presentes, é proposta a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa. A transação penal é uma faculdade do Ministério Público em dispor da ação penal5, ou seja, a ação sequer é promovida mediante aceitação da transação. Este é o motivo pelo qual até essa fase não se exige a presença de advogado acompanhando o acusado.

A sentença de transação somente poderá ser prolatada mediante a aceitação pelo autor do fato dos termos da transação, e o recurso cabível é a apelação (art. 82 da Lei 9.099/95), diferente da sentença que homologa a composição civil, que é irrecorrível. Num primeiro momento, tal premissa parece contraditória, eis que

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incoerente recorrer de decisão à qual concordou; entretanto, tal recurso decorre do princípio do duplo grau de jurisdição em matéria penal e por mais que pareça haver incoerência, a possibilidade de recurso é fundamental, uma vez que a concordância do acusado, nem sempre, deriva de uma plena compreensão da proposta. Sabe-se, na prática, que muitos acusados aceitam a transação por receio do processo e até mesmo sem compreenderem exatamente a pena que lhe foi imposta, principalmente quando desacompanhados de advogado.

Muito se discutiu sobre a natureza da sentença derivada da transação penal, se condenatória ou homologatória, tendo entendido o STF que se trata de sentença homologatória (DOS SANTOS; CHIMENTI, 2008, p. 288), eis que homologa um acordo entre Ministério Público e autor (que sequer chega a ser denominado réu) e não implica em declaração judicial de culpa.

A sentença de transação implica no cumprimento, pelo autor, de suas decisões. A sentença de transação não gera reincidência, e não gera efeitos civis de execução da sentença, mas não impede a propositura de ação civil ex delicto. O autor não terá o fato incluído em seus antecedentes judiciais, exceto para fins de nova transação no prazo depurativo de cinco anos.

A lei foi omissa em determinar as consequências em caso de descumprimento da pena aplicada na transação penal. Entretanto, seguindo os princípios contidos na norma, o entendimento jurisprudencial dominante é que, descumprida a pena imposta na transação, a sentença será desconstituída e os autos serão encaminhados ao Ministério Público para que o mesmo ofereça a denuncia. Assim se manifesta inclusive o Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: HABEAS CORPUS.LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS.

TRANSAÇÃO PENAL. DESCUMPRIMENTO: DENUNCIA. SUSPENSAO CONDICIONAL DO PROCESSO. REVOGAÇÃO. AUTORIZAÇÃO LEGAL. 1. Descumprida a transação penal, há de se retornar ao status quo ante a fim de possibilitar ao Ministério Público a persecução penal (Precedentes). 2.A suspensão condicional decorre de autorização legal, sendo ela passível até mesmo após o prazo final para o cumprimento das condições fixadas, desde que os motivos estejam compreendidos no intervalo delimitado pelo juiz para a suspensão do processo(Precedentes).(BRASIL, 2006).

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Seguindo esse entendimento, uma vez descumprida a sentença estabelecida em nível de transação, será iniciada a ação penal mediante rito sumaríssimo.

1.3.4 Procedimento sumaríssimo

Não sendo cabível a transação, esta não sendo aceita pelo autor, ou o autor não comparecendo à audiência preliminar, é que efetivamente inicia a ação penal, mediante procedimento sumaríssimo. Tal procedimento, que é baseado nos princípios da economia processual e da celeridade, visa à apuração do fato imputado ao acusado, garantindo-se a este, não obstante a maior celeridade, a possibilidade de refutação da hipótese acusatória, mediante o exercício do contraditório e da ampla defesa, o que não ocorre na transação penal.

Já na audiência preliminar o Ministério Público poderá oferecer a denúncia quando presentes os elementos indispensáveis, caso contrário, é marcada uma audiência de instrução e julgamento, pois podem ser necessárias maiores elucidações sobre os fatos. Sempre que possível, as partes já sairão intimadas para a nova audiência, em não sendo possível, serão intimadas posteriormente.

Na audiência de instrução e julgamento, estando as partes presentes, agora acompanhadas de advogado, novamente o juízo proporá conciliação, que, exitosa, resultará em homologação por sentença e extinção do feito. Rechaçada, o Ministério Público oferece a denúncia com base nos elementos disponíveis, como o Termo Circunstanciado, eventuais exames ou documentos. Se pelas circunstâncias do caso, ou por sua complexidade, não seja possível o imediato oferecimento da denúncia, o Ministério Público pode requerer ao juiz as diligências que entender necessárias ou a remessa para o juizado comum (DOS SANTOS; CHIMENTI, 2008, p. 298-299).

Uma vez oferecida a denúncia e “recebida a peça acusatória, iniciará o Juiz a instrução, ouvindo-se a vítima, as testemunhas arroladas pela acusação e, após, as

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testemunhas arroladas pela defesa.” (LOPES JUNIOR, 2011, p. 270). Não há definição legal para o número máximo de testemunhas, entretanto, tem se observado o limite de cinco, eis que o CPP prevê este como limite para o procedimento sumário, e não seria lógico o sumaríssimo aceitar número maior que este (DOS SANTOS; CHIMENTI, 2008, p. 299).

Por último, o réu estando presente, será interrogado e em seguida o Ministério Público se manifesta, abrindo-se espaço para os debates orais. Após os debates orais, se existirem, será proferida a sentença, que por força do § 3º do art. 81, está dispensada do relatório, devendo, no entanto, conter os elementos de convicção do juiz, ou seja, sua motivação, além da base legal e do dispositivo. Conforme Bittencourt, “a culminância da persecutio criminis ocorre com a prolação da sentença. [...] a fundamentação e a parte dispositiva continuam iguais; devem ser sobradamente fundamentadas.” (BITTENCOURT, 1997, p. 90, grifo do autor). O teor da sentença será inserido no Termo de Audiência, e

[...] se for absolutória a decisão, deverá preencher os requisitos do art. 386, se condenatória, os do art. 387, ambos do mesmo estatuto [...]. Da sentença condenatória ou absolutória, cabem embargos de declaração (art. 83) e apelação (art. 82) e os erros materiais podem ser corrigidos de ofício (art. 83, § 3º). (MIRABETTE, 2002, p. 207).

Segundo os arts. 1º e 60 da norma, os juizados teriam competência para executar suas decisões, entretanto, a mesma norma reservou para si somente a execução da pena de multa, cujo cumprimento deve ser feito na Secretaria do Juizado (art. 84 da lei); já as penas restritivas de direitos e privativas de liberdade, cumuladas ou não com multa, são processadas no órgão competente. A regra vale tanto para sentença homologatória de transação, como a terminativa do procedimento sumaríssimo.

E qual a consequência para o autor em caso de descumprimento dessa sentença? Segundo o art. 85 da Lei 9.099/95, não cumprida a pena de multa, será ela convertida em pena privativa da liberdade, ou restritiva de direitos. Entretanto, a pena de multa dos juizados especiais não é uma nova espécie de pena, é a mesma pena de multa existente no Código Penal. A Lei 9.268/96 alterou o art. 51 do Código Penal, e a partir de então a pena de multa, após o trânsito em julgado da sentença,

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passou a ser considerada dívida de valor, não sendo mais cabível a conversão em pena restritiva de direitos ou privativa de liberdade. A mesma lei ainda prevê a aplicação das normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição. Assim, a regra do art. 85 está tacitamente revogada. As demais penas (privativa de liberdade ou restritiva de direitos), são reguladas pelo art. 86 da Lei 9.099/95, segundo o qual serão processadas perante o órgão competente, e sujeitas aos ditames da Lei de Execuções Penais.

Os recursos são encaminhados ao órgão de segundo grau, que são as Turmas Recursais, compostas por três juízes em exercício em primeiro grau de jurisdição.

Em síntese, podemos afirmar que a Lei 9.099/95, surgiu no ordenamento jurídico brasileiro num contexto social de redemocratização do país, com dispositivos jurídicos e sociais inovadores, tanto no aspecto processual como no aspecto humano, substituindo a forma contenciosa de solução das lides por uma forma consensual, em que o Estado ainda mantém para si o monopólio da justiça, mas flexibilizando procedimentos, com vistas ao atendimento dos interesses das partes diretamente envolvidas, buscando por um lado a satisfação da vítima, não somente em ver seu ofensor punido, mas também em ter ressarcido o dano sofrido e por outro, o autor de infrações de menor ofensividade ter um tratamento jurisdicional coerente com sua lesividade social, mantendo a natureza preventivo-repressiva do sistema penal.

No capítulo seguinte veremos a atuação da Brigada Militar nos delitos de menor potencial ofensivo, a partir de suas atribuições constitucionais, a base legal e competência para confecção de boletins de ocorrência na forma de Termo Circunstanciado, seu processamento e acompanhamento junto aos juizados especiais, especialmente pela Brigada Militar nos municípios da Comarca de Santa Rosa, bem como uma análise quantitativa das ocorrências atendidas durante o ano de 2011 na referida Comarca.

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2 A ATUAÇÃO DA BRIGADA MILITAR NAS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

Neste capítulo será feita uma exposição sobre a participação da Brigada Militar no atendimento das infrações de menor potencial ofensivo. Serão analisadas suas atribuições constitucionais enquanto polícia militar do Estado do Rio Grande do Sul, sua doutrina de trabalho e como se dá a intervenção nas infrações de menor potencial ofensivo, estando ou não presente o autor do fato, bem como o processamento e encaminhamento das ocorrências e seu desfecho. Também serão apresentados dados relativos à atuação da Brigada Militar em relação a estas infrações nos municípios da Comarca de Santa Rosa no ano de 2011.

2.1 A Brigada Militar: atribuições constitucionais

No Brasil, as polícias militares originaram-se das Forças Policiais criadas durante o Brasil Império, que foram extintas na revolução de 1964, quando os militares assumiram o governo. Naquele momento, o governo pretendia manter um controle rígido sobre as corporações policiais armadas que existiam no país e, em virtude disso, extinguiu as Guardas Civis e estendeu as normas fiscalizadoras do Exército sobre as Polícias Militares, inclusive, nomeando oficiais do Exército para comandá-las em todos os Estados. Com o passar do tempo, especialmente com o fim da ditadura, as polícias militares se modificaram, adaptando-se aos novos tempos, entretanto, algumas características foram mantidas, sendo a principal delas, a sua natureza militar. Pode-se dizer que sua estrutura hierárquica é semelhante à do Exército, sendo atualmente comandada por oficiais policiais militares de carreira. Manteve-se, inclusive no texto constitucional de 1988, a atribuição de forças auxiliares e reserva do Exército, o que significa que em caso de estado de emergência ou de sítio, ou em decorrência de uma guerra, as polícias militares poderão ser requisitadas pelo Exército para exercerem funções diversas da área de segurança pública. (ROSA, 2007).

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As atribuições das polícias militares dos estados encontram-se na Constituição Federal de 1988, em seu art. 144, que estatui:

Art. 144 - A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. [...]

§ 5º - Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.

§ 6º - As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

§ 7º - A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

Assim, formada está a rede de segurança pública, estruturada através dos diversos órgãos, cada um com atribuição específica.

Mas o que se entende por segurança pública? O texto constitucional refere que o serviço de segurança pública deve ser exercido “para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”, ou seja, assegurar a ordem pública e proteger o cidadão e seu patrimônio. O conceito de ordem pública é abrangente, eis que pressupõe uma situação de normalidade, de condição minimamente harmoniosa e contra quaisquer alterações o Estado pode se impor, buscando restabelecê-la, tais como greves ou paralisação de serviços públicos essenciais ou ainda catástrofes naturais. Já a segurança pública conceitua-se mais claramente em seu sentido negativo, ou seja, ao refletirmos o que seria uma situação de “insegurança pública”. Assim, necessário que o Estado mantenha seu poder de polícia, que, segundo Celso de Mello consiste “na atividade estatal de condicionar a liberdade e a propriedade, ajustando-as aos interesses coletivos” (MELLO, 1999, p. 559), sendo a atividade de polícia uma das formas de exercício do poder de polícia, exercido através de órgãos constituídos para garantir que as pessoas convivam com aceitáveis condições de harmonia. Eis a razão dos termos “segurança pública”, “ordem pública”, “poder de polícia” e “poder da polícia” estarem

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intimamente ligados e do texto constitucional assegurar a segurança como uma dos direitos fundamentais, diluído nos incisos do art. 5º, entendendo-se segurança como direito individual contra o Estado e contra terceiros (art. 5º, II, X, XI) e coletivo ou difuso (art. 5º, XVI, XVII, XVII e XIX).

A Constituição de 1988 atribui a diversos órgãos a realização da segurança pública. À Polícia Federal compete apurar infrações penais contra a ordem pública ou social, contra bens, serviços e interesses da União, bem como delitos com repercussão interestadual e transfronteiriços, como contrabando e descaminho, tráfico internacional de drogas; a ela também compete exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras, além de, com exclusividade, exercer as funções de polícia judiciária da União.

A Polícia Rodoviária Federal, segundo sua denominação, destina-se ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais, assim como a Polícia Ferroviária Federal ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais.

As polícias civis, órgãos estaduais, destinam-se à atuação repressiva, na persecução penal, exercendo a atividade de polícia judiciária dos Estados.

Já as polícias militares são órgãos estaduais, subordinados ao Poder Executivo estadual, ou mais especificamente ao Governador do Estado, que é a autoridade máxima das polícias estaduais, e autoridade competente para nomear os seus comandantes. Às polícias militares (PM) cabem as atividades de policiamento ostensivo e de preservação da ordem pública. Entende-se por policiamento ostensivo a atividade visível e facilmente identificável, que não é realizado de forma velada, mas ostensiva, com uniforme, veículos, instrumentos e equipamentos que ajudam na identificação do policial. Segundo Loureiro (2012)

[...] durante o exercício da função de policiamento ostensivo, imediatamente, a população reconhece os policiais militares como instrumentos de força física legítima, pois aparecem em viaturas, usam armamento leve e utilizam a técnica policial de combate à criminalidade.

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Trata-se, portanto, de um serviço preventivo efetuado de forma contínua, se antepondo a qualquer evento, previsível ou não. A atividade de polícia militar é preventiva na medida em que acompanha e vigia as atividades normais da sociedade, inibindo condutas antissociais, intervindo em situações que se apresentem como anormais, independentemente de se constituírem ou não um ilícito penal. Mas ela também atua de forma repressiva, na razão de sua pronta resposta a fatos criminais em situação de flagrância, caracterizando a chamada repressão penal imediata.

Plácido e Silva (1973, p. 1101) diz que

[...] entende-se por ordem pública a situação e o estado de legalidade normal, em que as autoridades exercem suas precípuas atribuições e os cidadãos as respeitam e acatam , sem constrangim ento ou protesto. Não se confunde com a ordem jurídica, embora seja uma consequência desta e tenha sua existência formal justamente dela derivada. Já Lazzarini (1999), entende que “ordem pública é uma situação de fato oposta à desordem”; enquanto Moreira Neto (1987) afirma que é uma situação “que muda no tempo e no espaço em função de concepções políticas e jurídicas”.

Nesse interim, a preservação da ordem pública consiste em assegurar que as pessoas possam gozar de condições razoáveis de convivência e de harmonia, circunstâncias estas que não são imutáveis, mas adequam-se ao tempo e local. A função de garantir a ordem pública é atribuída, em suma, “às Policiais Militares, o que implica na manutenção da ordem no estado de normalidade, seu restabelecimento quando rompida e seu aperfeiçoamento quando necessário.” (BRIGADA MILITAR, 2009)6.

Segundo Lazzarini (1996, p. 61) a competência das polícias militares é tão ampla no sentido de “preservar a ordem pública” que

[...] engloba inclusive a competência específica dos demais órgãos policiais, no caso de falência operacional deles, a exemplo de suas greves e outras

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causas, que os tornem inoperantes ou ainda incapazes de dar conta de suas atribuições, pois, a Polícia Militar é a verdadeira força pública da sociedade. Bem por isso as Polícias Militares constituem os órgãos de preservação da ordem pública para todo o universo da atividade policial em tema de ordem pública e, especificamente, da segurança pública.

Por serem órgãos estaduais, há diferenças na atuação da polícia militar nos diversos estados do país, em razão de convênios locais, que estendem ou restringem ações, especialmente no que compete à fiscalização de trânsito, atividade de polícia ambiental e serviço de bombeiros e defesa civil.

No Rio Grande do Sul a polícia militar e os bombeiros militares são integrantes da mesma instituição, denominada Brigada Militar, e, seguindo previsão constitucional federal, a Constituição Estadual prevê suas atribuições nos art. 129 e seguintes, in verbis:

Art. 129: À Brigada Militar, dirigida pelo Comandante-Geral, oficial do quadro da Polícia Militar, do último posto da carreira, de livre escolha, nomeação e exoneração pelo Governador do Estado, incumbem a polícia ostensiva, a preservação da ordem pública, a guarda externa dos presídios e a polícia judiciária militar

Parágrafo único - São autoridades policiais militares o Comandante-Geral da Brigada Militar, os oficiais e as praças em comando de fração destacada Art. 130 - À Brigada Militar, através do Corpo de Bombeiros, que a integra, competem a prevenção e combate de incêndios, as buscas e salvamento, e a execução de atividades de defesa civil

§ 1º - A seleção, o preparo, o aperfeiçoamento, o treinamento e a especialização dos integrantes da Brigada Militar são de competência da Corporação

§ 2º - Incumbe à Corporação coordenar e executar projetos de estudos e pesquisas para o desenvolvimento da segurança pública, na área que lhe é afeta

Art. 132 - Os serviços de trânsito de competência do Estado serão realizados pela Brigada Militar (grifos nossos).

Observa-se, portanto, que a gama de atribuições da PM gaúcha é abrangente, no sentido de assegurar segurança pública à população, realizando patrulhamento ostensivo, o que, por conseguinte, incide em ação repressiva sempre que estiver configurada alguma situação que altere a condição normal de tranquilidade pública, trabalhando na guarda externa de casas prisionais, reprimindo qualquer tentativa de evasão de presos, prestando serviço de trânsito nas rodovias estaduais, e talvez, a menos conhecida pela população, a pesquisa, o estudo, a formulação de projetos e pesquisas afetas à segurança pública, dentro do que lhe incumbe, e sua execução; isto porque a execução dos serviços prestados não ocorre

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aleatoriamente, e sim em decorrência de análises e estudos sobre as condições sociais, políticas, políticas públicas e contexto histórico que repercutam na criminalidade e na forma mais adequada de preveni-la e combatê-la.

2.2 A atuação da Brigada Militar nas infrações de menor potencial ofensivo

Tendo como referência as atribuições definidas constitucionalmente, quando o policial é acionado, ou se depara com uma ocorrência, deve adotar as medidas cabíveis. De acordo com a natureza do fato será o procedimento adotado. Há casos em que a ocorrência deve ser encaminhada às autoridades competentes, que não a polícia militar; como um menor em situação de vulnerabilidade que não configure delito, deve ser encaminhado ao Conselho Tutelar local; quando o delito for transfronteiriço ou de competência da Justiça Federal, o fato deve ser encaminhado à Delegacia da Polícia Federal com circunscrição sobre o local do fato. Quando se tratar de delito excluído do rol de menor potencial ofensivo, e presente a situação de flagrância, o autor será conduzido preso à Delegacia de Polícia. Se ausente, independente da natureza da infração, caberá registro na forma de boletim de ocorrência, conforme veremos adiante.

Mas nem sempre foi assim. Em situações de prática de delitos, a atuação da Brigada Militar restringia-se a conduzir as partes à Delegacia de Polícia, Civil ou Federal, com circunscrição sobre o fato. As partes tinham de relatar os fatos para o policial militar (Policial Militar, ou PM, ou, como é conhecido no Rio Grande do Sul, “brigadiano”) no local da ocorrência, para que este tomasse ciência do fato e pudesse adotar as medidas cabíveis, e repetir tudo na Delegacia, para efetivar o registro.

Com a vigência da Lei 9.099/95, com seus princípios objetivando dar celeridade e pronto encaminhamento ao juizado, surge a discussão sobre o papel das polícias militares nos delitos de menor potencial ofensivo.

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Apesar de logo após a edição da lei as polícias militares já discutirem sobre sua participação nos delitos de menor potencial ofensivo, no Rio Grande do Sul, somente a partir do ano de 2001, efetivamente, a Brigada Militar passou a confeccionar Boletins de Ocorrência, seja na forma de Comunicação de Ocorrência (COP), seja na forma de Termo Circunstanciado (TC). Atualmente, qualquer policial militar, em qualquer município, tem condições de atender cidadãos envolvidos em ocorrências policiais de qualquer natureza; isso favorece especialmente aquelas comunidades em que não há atendimento ininterrupto da Polícia Civil, e as pessoas que tenham dificuldade de locomover-se até um órgão policial para registrar a ocorrência, uma vez que a Brigada Militar atende em domicílio.

O Boletim de Ocorrência é o documento operacional destinado ao registro dos Termos Circunstanciados (TC) e Comunicações de Ocorrências Policiais (COP). Esses boletins são lavrados pelo policial militar que efetivamente atender à ocorrência, e neles devem ser registrados os dados essenciais do fato. O registro é feito de próprio punho pelo policial, em formulário contínuo7, colhendo o relato das partes, devidamente assinados, arrolando testemunhas e anexando documentos correspondentes, como autos de apreensão, de constatação de danos, objetos, etc.

Após o atendimento, esse formulário é encaminhado ao setor administrativo local, que o insere no Sistema Integrado de Polícia (SIP), e transmitido on line à Delegacia de Polícia com circunscrição sobre o fato. Se o registro for feito na forma de Comunicação de Ocorrência Policial, o formulário será rubricado e arquivado no quartel da Brigada Militar local, sujeito a controle pelo Ministério Público, através de recorrentes inspeções; se for Termo Circunstanciado, o formulário original é inserido, juntamente com a versão digital, no Termo a ser remetido ao Juizado Especial Criminal.

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2.2.1 Base legal e competência para confecção de boletins de ocorrência

Conforme acima exposto, com a edição da Lei 9.099/95, surgiram especulações acerca da participação, e principalmente da competência das polícias militares em confeccionar o Termo Circunstanciado, durante o atendimento às infrações de menor potencial ofensivo. A polêmica surgiu em razão do próprio texto da norma, que em seu art. 69 estabeleceu que

A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo

circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do

fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários (grifo nosso).

Ao utilizar a expressão “autoridade policial”, a norma, numa interpretação literal e restrita, limitou a lavratura do TC ao Delegado de Polícia, em consonância com o texto do Código de Processo Penal. Entretanto, essa interpretação ia de encontro aos princípios da Lei, especialmente o da celeridade, uma vez que, na prática, não mudaria o primeiro atendimento às partes envolvidas em ocorrência, que deveriam contar suas versões ao PM, para depois serem encaminhadas a uma Delegacia de Polícia, onde novamente contariam suas versões ao Delegado de Polícia para somente então lavrar o TC.

Logo após a edição da Lei 9.099/95, começaram as primeiras movimentações para sua efetivação e as polícias militares passaram a discutir como seria sua participação nesse processo. A Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul foi pioneira no movimento de inclusão efetiva das polícias militares no atendimento das ocorrências de menor potencial ofensivo. Na cidade de Rio Grande, em janeiro do ano de 1996, o Comando do 6º Batalhão da Brigada Militar editou uma nota de instrução8 regulamentando a atuação do efetivo local no atendimento destas ocorrências. Esta norma foi, já em fevereiro do mesmo ano, adotada em nível estadual, sendo posteriormente suspensa, em razão das dificuldades de operacionalização.

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Nota de Instrução é um tipo de norma interna da Brigada Militar, que visa padronizar procedimentos, orientando o efetivo quanto a circunstâncias peculiares à atividade.

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