Derivada exterior
T. Pracano-Pereira
23 de mar¸co de 2010
Dedu¸c˜ao da derivada exterior Vou partir de um resultado conhecido para concluir pelo uso de uma f´ormula que ´e uma defini¸c˜ao do s´eculo 19.
Para isto vou construir um sistema de codifica¸c˜oes entre as quais calcular ´
areas ser´a uma delas e um caso particular, a ´area do disco de raio r ´e πr2
ser´a o meu objetivo final.
Se vocˆe quiser vou montar um sistema de complica¸c˜oes cujo resultado final ser´a uma forma simplificada de calcular uma integral!
Complicar significa montar uma teoria! o caso particular aparece como um exemplo da teoria...vale a pena se a teoria produzida tiver m´ultiplas aplica¸c˜oes. Complico um caso mas ganho um algoritmo.
Considere a fun¸c˜ao F (x, y) = 1 a fun¸c˜ao constante. 1. Sobre o dom´ınio Cr = {(x, y) ; x 2 + y2 ≤ r} a integral dupla Z Cr Z F(x, y)dxdy = Z Cr Z dxdy
tem que ser igual a πr2
. Porque ´e simplesmente o volume de cilindro de altura 1 cuja base ´e Cr ent˜ao o volume do c´ılindro ´e numericamente igual
`a ´area da base.
Observe que Cr ´e um disco cuja fronteira ´e um m´ultiplodo c´ırculo
trigonom´e-trico, ´e este o significado do parˆametro r que est´a indexando os elementos da fam´ılia de discos - o raio.
2. A transforma¸c˜ao
T : R2
−→ R2
(1) (r, θ) 7→ (x, y) = (r cos(θ), r sin(θ)) (2) recodifica o c´ırculo Cr usando um retˆangulo.
A imagem do retˆangulo Qr = [0, r] x [0, 2π] por T ´e o disco Cr,
T (Qr) = Cr
3. Posso agora falar de uma fam´ılia de retˆangulos associada a uma fam´ılia de discos, definindo
Qρ = [0, ρ] x [0, 2π]
um retˆangulo com um lado vari´avel ρ ∈ [0, ρ] posso ver a codifica¸c˜ao T como uma transforma¸c˜ao do plano:
• Se ρ = 0 o resultado ´e um disco de raio zero, um ponto. • Se ρ for igual a 1, o resultado ´e o c´ırculo trigonom´etrico.
• Se ρ < 1 resulta num c´ırculo de raio menor do que 1, contido no c´ırculo trigonom´etrico.
• Retˆangulos s˜ao mais simples do c´ırculos... e vocˆe pode ver que temos uma codifica¸c˜ao poderosa se mexermos nos dois lados dos retˆangulos podem surgir novas figuras: setores de disco por exemplo... experi-mente! N˜ao h´a riscos de explos˜oes e vocˆe pode obter gr´aficos inter-essantes usando gnuplot que tem a capacidade de fazer gr´aficos de curvas parametrizadas.
Enfim, de um lado uma fam´ılia de retˆangulos, do outro lado uma fam´ılia de discos centrados na origem.
A imagem por T de um retˆangulo de lado1
ρ´e o disco de raio ρ: a imagem de Qρ por T ´e o disco de raio ρ com centro em (0, 0) Cρ
4. De maneira an´aloga, posso interpretar a integral como uma codifica¸c˜ao: dado um dom´ınio Cr = {(x, y) ; x2+ y2 ≤ r} a integral dupla
Z Cr Z F(x, y)dxdy = Z Cr Z dxdy
´e um n´umero, depende do processo F . No caso acima, F = 1 resultando no n´umero πr2
. F ´e a matriz2
deste processo, a matriz desta transforma¸c˜ao. Nesta forma de ver tenho:
Qρ 7→ CT ρ F
7→ 2πρ
e obviamente posso considerar uma infinidade de dom´ınios nesta cadeia de transforma¸c˜oes. Vou continuar com os dom´ınios Qρ pelos objetivos que
tenho em vista mas vocˆe est´a vendo que h´a muita coisa com que posso tranformar ou codificar. Infelizmente o retorno, a decodifica¸c˜ao pode n˜ao ser muito padronizada e n’algum momento temos que nos preocupar com isto porque sempre precisamos de pares3
: codifica¸c˜ao, decodifica¸c˜ao. N˜ao vou me preocupar com esta quest˜ao, codifica¸c˜ao, decodifica¸c˜ao, neste momento (neste texto). Mas fica lan¸cada a quest˜ao.
1
Curiosa? curioso? por que eu n˜ao mexo no outro lado? 2
Mudando a fun¸c˜ao F mudam os resultados... 3
5. Vou agora usar este sistema de codifica¸c˜oes para re-interpretar (reparametrizar) a integral Z C Z F(x, y)dxdy
no retˆangulo Q usando a transforma¸c˜ao T - considerando que integral ´e tamb´em uma transforma¸c˜ao F
F (rC) = Z
C
Z
F(x, y)dxdy = πr2
transformando um disco de raio r em sua ´area πr2
, ou qualquer regi˜ao limitada do plano em sua ´area. Ent˜ao para que
F (T (Qr)) = πr 2
Mas deixe que eu fa¸ca a pergunta que vocˆe deve estar se fazendo: e qual ´e objetivo? Olhe de onde parti:
Z Cr Z F(x, y)dxdy = Z Cr Z dxdy = 2πr
e eu n˜ao sei calcular esta integral, embora eu consiga facilmente escrever um programa semelhante a exer05 00.calc para calcular aproximada-menteesta integral. Vou mostrar-lhe que esta sucess˜ao de id´eias nos levam a um algoritmo para o c´alculo desta integral mas vai nos for¸car a passar por uma inven¸c˜ao que os matem´aticos do s´eculo 19 fizeram para que as contas funcionassem.
´
E isto mesmo! Eles torceram as contas para que os c´alculos funcionassem! Este “m´etodo” se repete monotonamente na hist´oria das ciˆencias apenas procuramos torn´a-lo mais respeit´avel, como estou fazendo aqui, montando uma teoria, complicando aquilo que foi um “tour de force”.
da complicada codifica¸c˜ao que montei acima: F (Cr) = (3) R Cr R F (x, y)dxdy = R Qr R F (T (ρ, θ))dxdy = (4) = F (T (Qr)) = R Qr R 1dxdy (5) dx = cos(θ)dρ + −ρsin(θ)dθ dy = sin(θ)dρ + ρcos(θ)dθ (6) dρdρ = 0 dθdθ = 0 dρdθ = −dθdρ um produto anti-comutativo (7) dxdy = (8) cos(θ)sin(θ)dρdρ + ρcos2 (θ)dρdθ + (9) −ρsin2 (θ)dθdρ − ρ2 sin(θ)cos(θ)dθdθ = (10) = ρcos2 (θ)dρdθ + ρsin2 (θ)dρdθ (11) dxdy = ρdρdθ (12) R Qr R 1ρθdρ = (13) R2π 0 Rr 0 ρdθdρ = R2π 0 dθ Rr 0 ρdρ = (14) =ρ22| r 0 (2π) = πr2 (15) Os matem´aticos do s´eculo 19 precisaram de inventar o produto anticomuta-tivoexpresso na equa¸c˜ao (7) para dar significado ao “produto de diferenci-ais” que n˜ao tinha um sentido mas que eles sentiam que precasaria ter para construir a teoria das integrais m´ultiplas. Isto n˜ao foi uma inven¸c˜ao iso-lada, surgiu das “contas” que todos estavam fazendo numa mesma ´epoca, mas foi preciso quase um s´eculo se passasse para que uma teoria coerente colocasse estas contas de um conjunto organizado de id´eias (a teoria das formas diferenci´aveis). O nome inicial foi produto exterior.
Consequentemente
dxdy = ρdθdρ
tornando verdadeiros os c´alculos e criando uma forma simples para a in-tegral Z Cr Z F(x, y)dxdy = Z Cr Z dxdy = 2πr
que eu n˜ao sabia calcular. Eu interrompi a constru¸c˜ao para lhe mostrar onde eu queria chegar, mas preciso dar um t´ermino coerente `a pequena teoria que eu estava montando para deix´a-lo no ponto para ser usada posteriormente.
A equa¸c˜ao (6) ´e um sistema de equa¸c˜oes que pode ser interpretado como um produto de matrizes: dx dy = cos(θ)dρ −ρsin(θ) sin(θ)dρ ρcos(θ) · dρ dθ (16) dx dy = J(T ) dρ dθ (17)
6. A Jacobiana de T ´e a derivada de T4
´e ∂x ∂ρ ∂x ∂θ ∂y ∂ρ ∂y ∂θ ! = cos(θ) −ρsin(θ) sin(θ) ρcos(θ) (18) e o determinante da Jacobiana de T ´e
det(J(T )) = ρ
e vocˆe pode ver que a inven¸c˜ao dos matem´aticos do s´eculo 19 foi bem feita, uma vez que aparece ρ na equa¸c˜ao (12) com o objetivo de corrigir o produto de diferenciais - de dxdy para dρdθ. O produto de diferenciais representa nas integrais bivariadas o que o diferencia representa nas inte-grais univariadas - a unidade de medida. No caso das bivariadas, unidade de ´area. Ora quando passamos por uma transforma¸c˜ao, como T se produz uma “distor¸c˜ao” nas unidades de ´area de um espa¸co para o outro que fica memorizado no determinante da Jacobiana. No c´alculo univariado isto aparece na derivada da fun¸c˜ao composta:
(T oF )′ = T′(F (x))F′(x) comparando, aqui T′
´e a jacobiana da fun¸c˜ao univariada, agora temos uma matriz, ent˜ao este n´umero ´e um determiante. Os determinantes s˜ao o fator de distor¸c˜ao que uma matriz produz no espa¸co. Os matem´aticos do s´eculo 19 estavam descobrindo isto!
Este produto de “diferenciais” se chama “produto exterior” e foi inventado no s´eculo 19 para tornar poss´ıvel a mudan¸ca de parˆametros nas integrais. No s´eculo 20 ele foi explicado melhor numa teoria chamada “teoria das formas diferenciais” que foi o n´ucleo da produ¸c˜ao cient´ıfica de Henri Cartan.
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Um nome que os matem´aticos do s´eculo 19 inventaram porque n˜ao entendiam que uma matriz de derivadas parciais era uma derivada.