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Ieabelle Vida1 Giannini. A Ave Resgatada: "A Impossibilidade da leveza do Ser"

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(1)

Ieabelle Vida1 Giannini

A Ave Resgatada:

"A

Impossibilidade da leveza do Ser"

Dissertação de me8trado apresentada ao Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Orientadora: Maria Aracy de PBdua Lopea da Silva

São Paulo 1 Q Q 1 a---

(2)

Agradecimentos

A Maria Aracy de PBdua Lopes da Silva, orientadora e amiga, quero agradecer a confianca, o incentivo e o carinho em todos os momentos.

Sou grata à Lux Vidal, mãe e amiga que me deu a oportunidade de uma longa convivência com os indios.

Ao Prof. Dr. Jacques Vieillard do Departamento de Zoologia da Unicamp meu eterno agradecimento.

Aos colegas do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.

Meus agradecimentos especiais à: Dominique Gailoi~, Vanessa Lea, Vincent Carelli, Virglnia Valadão, Andrk Villas Boas, Maria Tereza Lopes Garcia da Silva, Marina Tronca, Luiz Grupioni e Marta Azevedo pela "forca".

Ao CNPq, à Fapesp e à Finep que concederam bolsas financiando minha pesquisa entre os Xikrin, sou agradecida. A Funai pelas "caronas" possibilitando assim minha entrada em uma brea isolada.

Ao Flávio, companheiro, Lutcho, Thiago e Mayra, meus filhos não tenho como agradecer a compreen~ão e pa ciencia nas minhas ausências, a torcida durante a elaboração desta dissertação, o carinho que dedicaram aos Xikrin que inúmeras vezes se hospedaram em casa.

A Comunidade Xikrin do Catet6 dedico este trabalho. Conheço

-

os desde pequena quando alguns deles f r e q a e n t ~ ~ m a nossa casa. F=i à aldeia pela primeira

vez

quando

(3)

havia acabado o m e u curso de b i o l o g i a . Foram e l e s que me introduziram à Antropologia e n e s t e s e n t i d o abriram um novo caminho na minha v i d a .

Biblioteca Digital Curt Nimuendajú http://www.etnolinguistica.org

(4)

"Ce qu'il y a de plus profond dans l'homme, c'est la peau

...

en tant qu'il se connaít. Mais ce qu'il y a de.-. vraiment profond dane l'honune,

en tant qu'il s'ignore..

.

c'est le foie. "

Paul Valéry: L'idée Fixe, Ed. de la Pléiade. Vol.11. Paris/Gallimard, 1960: pp. 215 e 217.

"Le spectacle, nous voudriona le suggérer, se presente comme si c'était la plume elle

-

même qui faisait ces "vrais hommes" que sont le Kayapo, le Kamayura, le Tembé ou le Wayana; comme si pour cette civilisation améridienne tout entière l'expression la plus forte de l'identité consistait a "faire

l'oiseau".

Daniel Schoepf: "Bourquoi la p l m e ? Ordre, esthétique et identité dans les cultures amkridiennes".

In:

L'art de la plume. MuSée d'ãthographie. Genebra.

(5)

Esta diseertação tem como objetivo contribuir para o

preenchimento de uma lacuna nas interpretacães sobre os Jê, tanto a nivel dos estudos sobre sistemas de etnoclassificação dos seres da natureza quanto das concepções relativas a cosmologia. Para atingi

-

10, procurei responder, baaicamente, a indagacaes relativas aos modos pelos quais a alteridade é tratada pelos Kayapó- Xikrin a nivel cosmol6gico (e não apenas sociológico); as relações entre Natureza e Cultura e suas mediacões; aos modos como a humanidade Kayapó se constrói e se concebe.

O

foco da pesquisa, para a consecução dos objetivoa propostos, centrou - se no estudo da etnoclassificação da avifauna pelos Kayapó- Xikrin do sul do Pará e do simbolismo das aves nos vários campos da vi8a social em que são significativas.

A dissertação compõe

-

se de duas partes. Na primeira, analiso a etnoclassificação Xikrin da avifauna. Na segunda, dedico

-

me ao estudo da cosmologia, abordando temas como 08

dominios c6srnicos e seus atributos; 08 rituais de nominacão

masculina e feminina TBkAk

-

Nhiok, as noçaes de pessoa, de contágio e de doença. Por fim, trabalho com dados relativos ao xarnanismo entre os Xikrin.

(6)

Indice

...

1

.

A

metodologia da coleta de dados 12

...

2

.

Etnoclaasificacão e Taxonomia 14

Parte

I:

Etnoclaeeificacão Xikrin

Capitulo

I

.

Abordagena teóricas: uma avaliação da bibliografia eepecializada

...

1 . Antropologia cognitiva e etnoclaesfficacão 21

...

2 . Os eetudos 8obre a sociedade e a cultura Kayap6 35 Capítulo I 1 .

A

classificacão Xikrin do mundo animal

...

1

.

As categorias iniciais e sua8 mbdivisões 39

...

.

2 A classificacão das aves 47

...

2.a

.

O trabalho com os informantes 48

...

.

.

.

2.b Nomenclatura Formacão doe nomes 49

...

2.b.l . Os termos onomatop6icoe 50

...

.

2.b.2 Os nome8 descritivoa 5 3

...

3

.

Classificação taxon8mfca 5 5 4 . Conclusõee

...

68 Parte 11: Coernologia Xikrin

...

Capitulo I11

.

Domínios c6smicos 73

1

.

O dominio da terra 1.a

.

A

floresta

...

76 1.b

-

A

clareira

...

8 2 2 . O mundo aquBtico

...

90 3

.

O mundo subterrBneo

...

9 2

...

4 . O domínio do céu 9 4

5 . ReflexBes sobre os atributos dos dominios

...

(7)

C a p i t u l o I V

.

O s r i t u a i s e o s d i f e r e n t e s dominios

c6smicos

...

106 1

.

Retomada dos r i t u a i e pela comunidade

X i k r i n do C a t e t e

...

107 2

.

I n i c i a c ã o e nominacão:

...

c o n e i d e r a c õ e s i n i c i a i s 111 3 . O s r i t u a i s de nominacão TBkàk- Nhiok 3.a

.

08 p r e p a r a t i v o s : a c a c a c o l e t i v a

...

114 3 . b

.

D e s c r i c ã o do r i t u a l d e nominacão ma8culina

T&k&

...

115 3.c

.

D e ~ c r i c ã o do r i t u a l d e nominacgo

feminina Nhiok

...e...

123

C a p i t u l o V . Nocão de p e e e o a e e t i o l o g i a Kayap6

.

X i k r i n : a

v i v ê n c i a i n d i v i d u a l da6 relac8ee e n t r e domfnios c6smicos

...

1 . O corpo e o s elementos i n t e r n o s do peesoa 142

...

2 . O a s p e c t o e x t e r n o d a p e a s o a Xikrin: a p e l e 152 3

.

Contágio. resguardo e doenca e n t r e o s X i k r i n

..

165

...

4

.

C l a s s i f i c a c ã o d a e d o e n ~ a a 161 4 . a

.

Doenca c u j o a g e n t e 6 uma a g r e s s ã o por alma

...

163 4.b

.

Doença c u j o a g e n t e 6 a a g r e s s ã o animal

...

4 . b . l

.

A alma animal p e n e t r a no i n d i v i d u o 164 4 . b . 2

.

A alma animal rouba a e n e r g i a v i t a l

do i n d i v i d u o

...

166 4.c

-

Doença c u j o a g e n t e 6 a f e i t i c a r i a

...

167

...

4.d

- O

r e i n o v e g e t a l : dominio i n t e r m e d i á r i o 168

...

C a p i t u l o V I . O xamaniemo e n t r e oa X i k r i n 174 2

.

Aliados do xamã

...

186 Consideracões F i n a i s

...

189

(8)
(9)

Nesta dissertação, o objeto de estudo são as aves, vista de duas perspectivas complementares: a da etnoclassificação e a de seus significados simb6Licos na cosmologia Kayap6

-

Xikrin.

Ela tem como objetivo contribuir para o preenchimento de uma lacuna nas interpretações sobre os

J e

tanto a nivel dos estudos sobre sistemas de etnoclassificacão das espécies naturais quanto das concepcões relativas a cosmologia. Para atingi - 10, procurei conduzir a pesquisa orientada por questões como as que se seguem: se existem sistemas para tratar conceitual e ritualmente a relacão de alteridade na organizacão social J ê

--

como amplamente demonstrada na literatura específica

--

, não haveria também sistemas com~lexos Para o tratamento da alteridade no nivel coamol6gico? Dada a dicotomia Natureza/Cultura, como são concebidas ou constituídas as mediações entre ambas? Se o indivíduo encontra a sua identidade através de suas relacões com os outros (amigos formais, nominadores, etc

. . .

) como a humanidade Kayapó que se autodefine como 08 verdadeiros humanos, se constr6i

e se concebe? Como se dão as relaçaes ou a interface entre a Natureza e a Sociedade Xikrin?

Na primeira parte desta dissertacão, compreendida pelos capitulas

I

e 11, realizo o que foi a minha primeira proposta de pesquisa: analisar a etnoclassificacão Xikrin da avifauna. Para tanto, foi necessário. mesmo sue brevemente, entender a

(10)

detalhando a categoria das aves.

Se. para analisar e interpretar o8 dados obtidos nesta primeira parte da dissertação, tive que separá

-

10s do8 dados sobrle cosrnologia, representações e xamanismo, os Indios não o

fazem. Eles, sem dúvida, me conduziram para a compreensão do significado simb6lico das aves, tema da segunda parte desta dissertação.

Sendo assim, analiso no capitulo 111 os dominios cósmicos e seus atributos. No capitulo IV descrevo e analiso os rituais de nominacão masculina e feminina

T U *

-

Nhiok pois, através deles, percebemos o significado das aves no universo e na concepção da humanidade formulada pelos Xikrin.

Foi necessArio, em um outro momento, tratar a noção de pessoa Xikrin, a noção de contágio e a noção de doença para entender como se dão as relaç6es entre os humanos e oe diferentes dominios cdsmicos. Este tema constitui o capitulo

V,

que é

importante para a compreensão do xamanismo entre os Xikrin, objeto do último capitulo. Se, durante toda a dissertação procuro a concepção Xikrin de humanidade, os xamãs (concebidos como detentores da sabedoria, intermediários entre os diferentes domlnios cósmicos e a humanidade) são, na realidade, seres plenos.

A compreenaão do que seja, para os Xikrin, a definição mesma da natureza humana foi o resultado obtido ao fim do trajeto percorrido peia pesquititi. E s e â busca levou

e

dieserteção, como se

(11)

verá, até campos diversos da vida social, como os rituais, a nomina~ão, a iniciacão, a nocão de pessoa, a medicina indigena e o xamani~mo, caminhos para o conhecimento da cosmologia Xikrin e do lugar da humanidade no universo.

Buscando as aves onde elas estivessem presentes com significados simbblicos prbprios, a pesquisa, inicialmente voltada para o estudo da etnoclassificacão da avifauna acabou revelando o lugar central das aves na cosmovisão dos Xikrin. Afinal, como esta dissertação procura demonstrar, a ave corresponde, como imagem simbblica privilegiada, B concepção Xikrin do que seJa a prbpria humanidade.

O grupo indigena Kayapó - Xikrin do Catete, (familia linguiatica Jê), está localizado no sudeste do Pará, municipio de Marabá. O s , Xikrin foram estudados por Protásio Frikel ( 1963 e

1968 ) e por L w Vidal a partir de 1969, destacando

-

se entre outras publicações a sua monografia sobre estes i n d i o ~ (1977). Neste livro, a autora trata do hist6rico do grupo, das relações inter e intratribais, da organização social, dando Gnfase à classificação por categorias de idade ( como sendo a expressão da estrutura social, de modo global ) e 8 vida ritual atravks da análise pormenorizada de uma cerimonia de nominação e iniciação. Nesta obra encontramos também dados sobre as relações entre Natureza e Cultura, apesar de não terem sido tratadas com profundidade.

(12)

nomenclatura indigena das aves. Fui convidada por ela, devido & minha formacão em Biologia, a trabalhar com seus dados. Minha pesquisa iniciou

-

se no ano de 1985 quando obtive uma bolsa de aperfei~oamento em Antropologia pelo CNPq. sob a orientacão da Profa. Dra. Maria Aracy de Pddua Lopes da Silva. O projeto apresentado tinha como objetivo estudar a classificação indlgena da avifauna.

Os índios Xikrin possuem um conhecimento minucioso de seu meio, plantas e animais, nomeando as espéciee. Trata - se de uma situacão semelhante B relatada por Smith (apud Lévi -Strauss,

1962: I?), com rela~ão a uma sociedade africana: "Pela primeira vez na minha vida, eu me acho em uma comunidade onde as crianças de dez anos na0 me são S ~ p e r i ~ r e S em matem&tica, mas eu estou em um lugar onde cada planta, selvagem ou cultivada, tem um nome e um uso bem definido, onde cada homem, cada mulher e cada criança, conhecem centenas de esp5cies. Nenhum deles acreditar6 que eu seja incapaz, mesmo que eu queira, de saber tanto quanto eles".

Entre os Xikrin, mulheres, homens e crianças informam sobre a nomenclatura indlgena das espécies. Os índios me procuravam para escutar fitas contendo os cantos de aves e ver as ilustrações, material este previamente preparado para minha pesquisa de campo. 6m alguns momentos, tive a impressão de possuir um material que suscitava discussões entre eles e possibilitava o aprendizado das criancas. Adultos e crianças imitava o canto das aves e posteriormente pediam para gravá- i08

.

(13)

Estes aspectos diferenciam o meu trabalho do realizado por Darei1 Posey, junto aoe Gorotire, no curso de seu levantamento em etnobiologia, dadas as condições de coleta de informações em cada pesquisa. Comparadas tais condições,

observa

-

se que existe uma diferenca de atitude entre os dois grupos. Para Poaey (1979:90), oe Gorotire achavam fastidioso o trabalho de identificaç80 das espécies, atitude esta contrária a dos Xikrin, cuja boa vontade e entusiasmo facilitavam o trabalho de pesquisa antropológica. A metodologia que foi aplicada na

pesquisa de campo é um fator que pode explicar e ~ t a diferenca.

1

-

A metodologia da coleta de dados

Na

minha opinião, a atitude dos Xikrin est6 intimamente relacionada ao método auditivo e visual empregado na pesquisa. No inicio do trabalho busquei, como requisito essencial da pesquisa, a obtenção de uma linguagem comum entre os indios e a pesquisadora, visando a obtenç8o de informações seguras e eficazes. Para isto, seria necessário

um

mktodo cuja leitura pudesse ser feita por informantes indlgenas e entendida por um peaquisador que não tivesse conhecimento da lingua Xikrin. Por outro lado, o método deveria possibilitar a coleta de dados suficientes para uma an8lise comparativa entre a classificação nativa (também chamada classificaçBo folk ou etnoclas~ificacão) e

a classificação cientlfica.

Para a elaboracão de um metodo que satiefizesse tais requisitos, efetuei, antes da realização do trabalho de campo junto a comunidade Xiktifi dc C1tet6~ iim lewmtmnento das aves

(14)

existentes na região (Tocantins

-

Itacaiunas, Pará). Para tanto utilizei inicialmente a bibliografia sobre a localização geográfica das aves no Brasil, especialmente as obras de Oliveira Pinto (1938, 1978) intituladas Catálogo daa Aves do Brasil e Novo Catálogo daa Aves do Brasil. Nelas encontramos as esp5cies e sua distribuicão geogrhfica.

Após este primeiro estudo, elaborei fichas cadastrais para cada espécie existente na região do Cateté, contendo informacões sobre a nomenclatura cientifica, a nomenclatura popular, os hábitos, a alimentaçgo e a nidificação. Estes dados foram obtidos nas obras de Helmut Sick ( 1 9 8 4 ) e Augusto Ruschi (1979). No caso especifico dos Psitacideos, utilizei

-

me do livro de

J.

Forshaw (1977) intitulado Parrots of the World.

De acordo com a orientação do Prof. Dr. Jacques Vieillard, ornitblogo da Faculdade de Zoologia da Unicamp, pesquisei os cantos das aves existentes em meu levantamento e, posteriormente, gravei

-

os em fitas, intercalando

-

os por espécies, a partir do acervo organizado por aquele professor. Cada canto recebeu uma identificacão nas fichas previamente elaboradas, onde acrescentei, posteriormente, a8 informações dos indios.

O

instrumento acústico neste caso é de fundamental importância, por duas razbes b6sicas: primeiro, cada espécie possui

um

canto especifico. Os estudos bioacústicos das aves mostram que as manifestaç6es sonoras são tão importantes quanto OE âapectcs morfológicos; de acordo com Helmut Sick (1988: 43):

(15)

"A voz trai uma ave que não se vê ou que não ee consegue ver suficientemente bem, na densa vegeta~ão, no v60,

A

hora do crepúsculo ou

A

noite" ; em segundo lugar," muitas eepecies são de dificil identificacão pois vivem na parte alta da mata. Frequentemente não se chega a ver direito mais de dois terços das aves, devido B vegetação fechada do ambiente neotropical".

6m muitos casos, ~8 aves não possuem cantos especificas mas sim manifestações sonoras que não podem ser satisfatoriamente utilizada6 na identificação das espécies. Com a intenção de auxiliar, complementar e comprovar a identificação ac6stica, elaborei material ilustrat ivo das aves.

A identificação das espécies pelos Xikrin através do canto e das ilustrações das aves mostrou - se

um

método de leitura transparente, tanto para eles como para a pesquisadora. A8 discussões foram fontes preciosas de dados e os objetivos aos quais me propunha foram alcançados. Este método lembra o diagrama de parentesco que, num primeiro momento, proporciona uma linguagem comum entre o informante indigena e o pesquisador e, por outro lado, proporciona dados cognitivos interessantes.

Do ponto de vista metodológico separei os dados sobre a etnoclassificação dos outros dados relativos ao significado simbólico das aves. Após ter finalizado a pesquisa sobre etnoclassificação da avifauna, retomei os dado8 obtidos, sobre a cosmologia, rituais e xamanismo, pesquisando - os.

2

-

Etnoolassificaç€io

e

Taxonomia

< 1 - - 3 4 v.ú&

I..

C4 m n r n n a

(16)

classificar ou de pensar taxonomicamente 6 algo compartilhado w l o e Xikrin e peloe membroe de

nossa

sociedade.

E,

na verdade, algo muito mais geral, cuja universalidade 6 apontada por Hanson (1973: 6): "O fato eupremo da diversidade animal 6 que a sua variedade é descrita, de modo muito eimificativo, em termos de grupos descontinuoe chamados de espécies. A universalidade desta observação é tão largamente aceita que ela parece um lugar comum".

Sempre me perguntei ae Carlos Lineu (1707

-

1778) teria criado os princípios da sistematizac~o ou Taxonomia. Minha conclusão, ao contr6rio. foi a de que ele comprovou a existência de taxonomias nativas pre- existentes ao seu estudo. Seu trabalho foi o de sistematizar o material colhido por viajantes e naturalistas previamente agrupado e nomeado pelos nativos. Encontrei reforço a minhas ideias no8 escritos de dois a u t o r e ~ . que delas compartilham:

Rui

Coelho (1989: 91). em

um

artigo dedicado a temas ligados h ~ 0 g n i ç ã 0 e aos processos culturais deixa, no ar, a pergunta: " Teria Lineu o privilegio de ter atingido a coisa em si?". Na mesma direcão, lembro a colocacão de Patrick Menget ( 7 : 6 9 ) :

"I1 n'est que de lire les naturalistes voyageurs du

XIX

sibcle au Bresil pour s'apercevoir qu'une grande partie de leurs observations sur l'avifaune est un damarcage direct

--

parfois explicite

--

du savoir indigene que les recherches ult8rieures dea ornitologues ont tres largement confirmes

".

Através de uma observacão feita pelo próprio Lineu, ao ae referir aos indioe Guarani, encontramos, mais m a vez, a comprovação de meu pensmerito: "2t'iuir;ô -*--**- V F ~ L um Y)Y

-

r - + n - ~ +

Y~...-~-..~-

4 n l l a " ( = = ~ d

(17)

Storni, 1944: 11).

% levarmos em conta os principias da SistemBtica ou Taxonomia do naturalista sueco Carloa Lineu, observamos que uma es&cie é um grupo de organismos que se assemelham a uni dado tipo

de forma, e que

um

genero 6 um grupo de espécies que têm certas caracteristicaa comuns. Lineu também introduziu categorias mais altas ou inclusivas, das quais são reconhecidas ate hoje: a ordem, a classe e o reino. 0 agrupamento dos gêneros em ordens, das ordens em classes e das classes em reinos, foi feita basicamente da mesma forma pela qual as espécies foram colocadas em géneros, ou seja, pelas semelhanças entre elas. A presença ou ausência de certas caracterfsticas fundamentais determinam a inclusão ou não dos seres dentro de um mesmo grupo. Cada

um

destes niveis é denominado taxon (plural: taxa). Os

taxa

são categorias nomeadas e inclusivas, isto 6 , o reino engloba todas as classes, cada classe engloba um certo número de genêros, 0s quais, por sua vez, englobam um certo número de espkcies.

Este sistema reflete uma "classificação natural", isto b , ressalta as verdadeiras semelhanças (afinidades reveladas pela forma, anatomia, e hábitos 1 e diferenças entre espécies, géneros, ordens, classes e reinos. Como coloca Hanson (1973: 13):

"Lineu nunca tornou expiicito seu sentido intuitivo a respeito do que entendia por "verdadeiras" semelhanças e diferencas, ou uma "classificação natural", mas devido a sua mente sensivel e inteligente ele conseguiu resultados prdticos cu3as linhas gerais ainda hoje permanecem vAlidas".

(18)

acordo com estas regras que os cientistas adotam, criam ou usam os nomes cientibicos dos animais e plantas. A nomenclatura bindria 6 composta de dois nomes em latim, sendo que o primeiro define o genero e o segundo a esphcie. Por exemplo, em Homo

-

sapiens, nome que Lineu deu para o Homem, Homo é o nome do gênero e sapiene é

o

nome da esphcie.

Com tantos tipos de animais e numerosos taxonomistas trabalhando para denomink

-

10s em diferentes paises, desde 1758

têm surgido modificações na proposta de Lineu. As "Regras" (ou "Códigos") sobre a nomenclatura animal e vegetal foram adotadas em 1901 (revistas em 1961). A taxonomia de Lineu foram acrescentadas mais duas categorias inclusivas: a familia (entre a ordem e o genêro) e

o

filo (entre a classe e o reino), assim como subdivisões dentro de

um

taxon. A necessidade de se criar um

maior número de taxon e subdivi~ões prov6m do fato dos cientistas trabalharem de modo a integrar todas as espécies dentro de

um

quadro formal, considerando o universal e não campos restritos.

Além dos critkrios definidos por Lineu, a bio

-

sistem6tica contemporânea acrescenta novos fatores a serem considerados para fins de classificação cientifica: a evolução biológica e genktica são consideradas aspectos essenciais para se classificar uma espécie.

(19)

Esquema Piramidal da Claseificação Sistemhtica

Assim, em resumo, o arranjo sistemático de Lineu lembra uma pirâmide cujo vértice est6 associado 8 categoria ou taxon Reino e a base 8 categoria espécie. 0 espaço contido entre o vertice e a base 6 constituido pelos taxa gênero, ordem e classe. No caso da classificação cientifica atualmente empregada, entre os taxa gênero e ordem estti a familia

e

entre os taxa classe e

reino está o filo.

3 - Os objetivos da pesquisa

Meu trabalho junto aos Xikrin fez

-

me chegar à conclusão de que existem traços comuns entre os principias da classificação cientifica e os da etnoclassificação. Trata

-

se de conclusão, alibs, a que ti3m chegado outros pesquisadores contemporâneoe. Esta constatação constitui um dos pressupostos teóricos fundamentais presentes nesta dissertação. No primeiro capitulo de minha tese procurei demonstrar, para o caso Xikrin, a existência de m a cla~sificsção indígena do mundo animal,

(20)

denominada por Descola (1986: 102) de expllcita e ideal, isto 6,

umti clessifice~ãa aue recorta o universo em categorias morfolbgicas, independente de qualquer utilizaçbo pr6tica.

Um outro pres~uposto, de igual relevlincia diz respeito elaboração cultural diferenciada, que é feita por grupos sociais específicos a partir destes princípios de ordenação da percepção que os seres humanos têm da natureza e que são universalmente encontrados. Assim, ao lado da etnoclassificação Xikrin da avifauna da região do rio Catetb, no ParA, a

dissertação dedica

-

se também ao espaço cultural de elaboração e atribuição de significados especificas aos elementos presentes na etnoclassificação. Foi possivel chegar, atrav6s do sistema Xikrin de classificação da avifauna. a compreensão de aspectos relevantes de sua cosmologia, xamanismo e ritual, como se ver6 na segunda parte desta dissertação.

Para a captação do sistema de etnoclassificação Kayapó- Xikrin, baseio

-

me em trabalhos realizados no campo da Antropologia Cognitiva e outros, cujos resultados serviram de orientação te6rica para esta dissertação. Discuto a seguir, as principais contribuições neste sentido.

(21)
(22)

Capitulo

I

-

Abordagens Teõricas: uma avaliac80 da bibliografia especializada

1

-

Antropologia Cógnitiva e Etnoclaeeificac8Io

A antropologia cognitiva, etnosemântica ou etnociência desenvolveu

-

se há muitos anos. Estes estudos iniciaram

-

se na decada de 50 e tinham como objetivo principal entender a cultura atravt5e dos grincipios organizatdrios do comportamento humano e mostrar que a cultura não 6 um fenomeno material mas sim produto de organizaç6es comitivas dos fenomenos materiais. (Tylor, 1969:

3). No inicio, 08 trabalhos foram desenvolvidos principalmente

com as classificac6es de cores, plantas e sistemas de parentesco.

LRvi

-

Strausa (1962), atrav6s dos inúmeros trabalhos citados em sua obra, argumenta que as classificações não são somente pragmáticas- Existe, ao contrbri0, uma necessidade intelectual e universal, na mente humana, de ordenar, de estruturar o "caos". A facilidade em ordenar a natureza estaria relacionada ao fato dela própria ser ordenada.(Simpson, citado por Lévi Strauss, 1962: 22 1.

Outros trabalhos têm como preocupação mostrar, valorizar

e

interpretar o conhecimento indigena sobre seu meio. Estes trabalhos podem ser encontrados no volume da

SUMA

Etnoldgica Brasileira dedicado 8 Etnobiologia (1986) ou no Primeiro Col6quio de Etnosoologia ( 1973 )

.

(23)

de Brent Berlin, Breedlove e Raven (1969, 1973, 1974) foram extremamente importante8 para o desenvolvimento da etnociência. Seus trabalhos contrastam com 08 semânticos na medida em que

procuram princípios universais classificat6rios (ou taxonamicos).

08 autores percebem, em sua6 pesquisa8, uma nomenclatura bin&ria, ou seja, a nomenclatura de uma etnoespecie 6 um termo composto, sendo que o primeiro termo determina o etnogênero e o segundo a etnoespécie, semelhante & nomenclatura bin&ria de Lineu. Vdrios erros foram cometidos por zoólogos e botânicos na identificação, nomenclatura e classificação de plantas e animais, portanto Dennler (citado por Lévi

-

Strauss, 1969: 61) coloca muito bem que vários erros poderiam ter sido evitados oe os antigos viajantes tivessem confiado nas taxonomias indigenas.

Para Paul Kay uma caracteristica importante das taxonomias é que e l a e possuem contraste8 diretos e indiretos nos varíos níveis qu= â6 c~iz=Ecrz. >E eccrdc c n m esta concevcão. o

autor formulou (Kay, 1969: 78

- 90)

o seguinte esquema de categorias onde:

1)

X

e

Y

estão incluídos em A B, P e Q estão incluídos em

X

(24)

R e S estão incluidos em Y

ou seja: trata

-

se de casos onde há Contraste de Inclusão

2) Se dois elementos estão diretamente incluidos em um mesmo taxon, então pertencem B mesma categoria de contraste.

E

o caso do par ( X , Y) em relacão a A. Neste caso, est6

-

se diante de uma relação de Contraste Direto. O par (R, S) não está incluido neste caso pois estão em contraste terminal como veremos mais adiante.

3) As relações entre

P

e R,

P

e S,

8

e R,

Q

e S, são definidas como de Contraste Indireto. Os elementos estão em contraste

indireto quando não estão na mesma categoria mas as categorias que os incluem estão em contraste direto. Assim os pares

(P,

R),

(p, s), (Q, R) e (Q, S) estão em contraste indireto atraves dos taxa

X

e Y.

4 ) Quando ocorre contraste dentro da Última partição possivel da taxonomia, está - se diante de um Contraste Terminal. Isto podendo ocorrer entre elementos de categorias de contraste direto ou indireto.

Podemos notar que este esquema é semelhante ao esquema piramidal de Lineu, no que tange aos critérios fundamentais

de sua organização interna, ou seja, categorias inclusivas e

hierbrquicas. Segundo Taylor (1977: 123):

"Elas são hier6rquicas no sentido de que, enquanto nos niveis mais baixos se encontram as categorias mais especificas, na medida em que se sobe na sequência de niveis da classificação, encontram

-

se categorias cada vez mais genericas e inclusivas."

B r i i n e Kây (1969>, em ;ura trabalho sobre 8

(25)

das cores, desenvolvem um esquema sobre as sequ&ncias inclusivas na nomenclatur3 de cores em diferentes sociedades. Para os autores, se uma cultura possuir uma só categoria para as cores, ela vai contrastar o branco e o preto. Se a cultura tiver duas categorias, irá contrastar o branco, o preto e o vermelho. Para os autores, a percepção das cores tem fundamento neurofisiológico, ou seja, distância dos bastonetes responsáveis pela percepção das cores.

Berlin, Breedlove e Raven (1974) e Berlin (f977), formularam hipóteses universais sobre a SistemAtica ou Taxonomia. Estes autores procuraram trabalhar com diferentes sociedades, mostrando que há elaborações culturais diferenciadas mas que

existem, por outro lado, semelhanças entre os sisten~as classificatórios (denominadas por eles de taxon ) .

Com estes estudos, os autores formularam os seguintes princípioa sobre a etnoclassif icação:

1

-

Todas as culturas identificam semelhanças e

diferenças entre organismos naturais. Estas "descontinuidades" são agrupadas em taxa.

2 - Os "folk taxa" ou categorias etnobiológicas não ultrapassam o número de cinco que, das mais inclusivas as mais específicas, são as seguintes:

a) Unique Beginner: categoria inicial ou reino

ex: plantas e animais. Para os autores, a maioria das culturas não discrimina este nivel através da terminologia.

(26)

ex: aves, peixes, erva.

C) Generic form: categoria genérica

ex: gavião, tucano, onça, macaco, feijão. d) Specific form: categoria especifica

ex: gavi8o

-

real, onça preta, papagaio verdadeiro, feijão

-

roxo.

e) Varietal form: categoria subespecifica ex: feijão

-

roxo comum.

Este nivel 6 dificilmente encontrado.

As categorias descritas são hier6rquicas e os taxa de qualquer nivel são mutuamente exclusivos. A categoria supra

-

generica contém

um

número reduzido de agrupamentos, marcados por termos simples. Cada agrupamento engloba um certo número de categorias denominadas genericas.

O

número de categorias genéricas é elevado e os termos constituem quase sempre a base sobre a qual se formam as taxonomias. Este pode ser, em muitos casos, o último nivel taxonômico. Categoria especifica e aub

-

especificas existem quando dois ou mais membros destas categorias contrastam entre si. Estes membros serão sempre marcados por termos secundários.

Estes mesmos autores (Berlin, Breelove e Raven, 1969:

60

-

6 6 ) , em um artigo aobre taxonomias de folk e classificacão

biol6gica. mostram que exietem diferenças nas correspondências entre as categorias folk e as categorias cientificas. Ele6 encontraram tres tipoe de correspondência: 1

-

Subdiferencia~ão, quando Uma è t f i ü c ã t ê a ~ ~ i & e ~ g l o h ~ duas OU 8 categorias

(27)

cientificas; 2 - Correapond8ncia

um

a um, quando uma categoria folk corresponde diretamente a uma categoria cientifica; 3 -

Superdiferenciação, quando várias categorias folk estão contidas em uma categoria cientifica. A explicação encontrada por eles para estas diferenças está baseada na utilização dos elementos na vida prática das sociedades onde têm vigência ou nos aspectos culturalmente significativos. Por exemplo, na categoria Superdiferenciação esta0 as plantas mais utilizadas pelos Tzeltal

( Tenejapa, México) e isto explicaria a razão de uma classificação tão especifica. Na categoria Subdiferenciação estão as plantas culturalmente não representativas para os membros desta sociedade.

Existem, no entanto, criticas ao modelo "hierárquico" de Berlin: Hunn (1982) coloca sue as classificações só podem ser entendidas através da abordagem utilitarista. O autor acredita que o esquema taxonõmico não explica a razão pela qual uma esp6cie é classificada numa certa categoria. Esta estrutura funciona, de certa forma como o sistema de parentesco através do qual se percebem certas relacões entre diferentes indivíduos. O

sistema hierárquico e o fato de certas categorias não serem nominadas nos leva, sem dúvida, a procurar as razões na utilizacão ou representação que uma dada sociedade tem para que uma certa categoria seja exceção da regra.

Se existem semelhanças, os autores, no entanto, não deixam de perceber as diferenças conceituais, ciência do concreto de Lévi

-

Strauss.

(28)

"La regle politique, que Levi

-

Strauss 6tend a l'humanitk tout entikre, c'est de pouvoir être pareil tout en restant différent; du pareil au même, i1 y a différence, sans quoi le risque mortel, l'indiffkrence, n'est pas loin, qui détruit les cultures" (Clkment, 1974).

No Brasil, os trabalhos pioneiros em etnociência, relevantes para esta dissertação e comentados a seguir, foram os realizados com sociedades indígenas por Garcia (1979) em relação

classificação das plantas medicinais dos Guarani de Amambai; por Carneiro (1973) referente a classificação das plantas pelos Kuikúro; e por J e n s e n (1988) sobre a classificacão das aves em quatro sociedades indigenas, Wayãmpi, Sateré - Maué, Urubu -

Kaapor e Apalai.

Seguindo a linha de pensamento de Berlin, Wilson Galhego Garcia realizou um trabalho entre os Kayov6 intitulado O

domínio das plantas medicinais entre os KayovA de Amambai: Problemática das relações entre nomenclatura e classificação.

(1979). O autor, ao trabalhar com as plantas medicinais, verificou a existência de agrupamentos hierhrquicou, constatando, porem, que a nomenclatura não reflete a classificação taxonômica das plantas, entre os Kayová. Pergunto - me se isto não estaria relacionado ao fato de o autor trabalhar com uma categoria essencialmente pragmática (plantas medicinais). Por outro lado, o fato de trabalhar com esta categoria permitiu - lhe unia análise semântica dos termos, captando os significados culturalmente atribuidos as plantas. Revelou assim, as relações entre vegetal e

animal colocando porém, que a nomenclatura não reflete a classificação taxon6mica das plantas, entre os Kayová. Revelou -

(29)

se assim, ae relações pela intersecçgo de duas "categorias focais", isto é, uma esp6cie 6 classificada ora em uma categoria, ora em outra. Neste último caso, parece ser

um

aspecto morfol6gico que conduz B ambiguidade; isto pode ser percebido

quando o autor diz (1979: 32 ) :

"Por que h6 categorias fronteiricas entre ka'a

-

ervas e todas as outras yura

-

Arvores...?. Porque todas as planta6 pertencentes 8s categorias supragenkricas, possuiam um traço comum que as aproxima de ka'a. Nos dados obtidos, esse traço comum evidenciou

-

se como sendo

um

caule herbáceo fr6gil e ramificado."

Outro trabalho relevante 6 o de Robert

L.

Carneiro (1973) sobre o uso do solo e classificacão da floresta entre 08

Kuikúro. Neste artigo, o autor mostra que os Kuikúro são excelentes taxonomistas, não tendo somente uma visão utilitarista de seu meio. Ele nos apresenta um método de pesquisa eficaz para a obtenção da identificacão indigena da8 esp6cies floristicas. O

autor fez um monitoramento do invent6rio da flora da região a ser estudada, ou seja, ele escolheu uma drea floristicmente expressiva e dela retirou exemplares que foram apresentados aos

informantes. Todas as esp6cies contidas na drea foram

identificadas taxonomicamente, focalizando - se também o uso que os indios fazem das plantas, principalmente das Arvores.

Seguindo uma metodologia quantitativa e qualitativa, assim como fez Carneiro entre 08 Kuikúro, Allen J e n ~ e n (1988)

realizou a identificação e classificação das ave8 pelos Wayãmpi, Urubu

-

Kaapor, Sateré

-

Mau4 e Apalai. O m6todo empregado pelo

(30)

prop6sito era o de identificar os sistemas de classificação, o papel da adaptaçao ecolbgica, a cultura e a linguagem na evoluçao destes sistemas.

O autor conclui, através de seu trabalho, que os principio6 de classificação são os mesmos que os formulados por Berlin. O autor reflete sobre a possibilidade do ambiente poder influir no sistema de classificação. Para ele, existe um aspecto adaptativo ecol6gic0, onde humanos e aves competem por frutas silvestres: questiona - se até que ponto isto não influencia a

classificação indlgena da avifauna. Por outro lado, o autor considera que a organização social dos Wayãmpi está presente na formação do sistema classificat6rio das aves. Segundo ele, todos os grupos têm o conceito de chefe entre as aves, espécie padrão, equivalente ao conceito de chefe encontrado na organização social. Estes grupos organizariam as aves em torno de um chefe, assim como ocorre entre os humanos.

Seu trabalho e importante no que tange ao sistema de classificação indigena. Ele prova que os indios possuem uma classificação taxonômica elaborada, com termos bintírios. No entanto, o autor reduz seu dados à competitividade e adaptação ecológica.

Ainda com respeito a trabalhos em etnociência nas sociedades indigenas, caberia aqui tratar daquele realizado entre o grupo Kayap6 - Gorotire por Darell Posey. Para o autor ( 1 9 8 6 ) ,

a etnobiologia é essencialmente o estudo do conhecimento e das conceituações desenvolvidas por quaiquer socieaaàe a respeito d a

(31)

biologia. Em outras palavras, 6 o estudo do papel da natureza no sistema de crenças e de adaptação do homem a determinados ambientes. Neste sentido, a etnobiologia relaciona - se com a ecologia humana, mas enfatiza as categorias e conceitos cognitivos utilizados pelos povos em estudo.

O autor distancia - se da ecologia humana, pois não utiliza métodos quantitativos com intenção de provar as limitações ecol6gicas -- calorias e proteinas -- nem tampouco trata de inibidores da evolução das eociedades ao trabalhar com

os zoneamentos ecológicos. Ele procura o papel que o ambiente desempenha ao determinar a maneira como o homem organiza o seu mundo. Mundo humano organizado a partir da observação do mundo natural.

O caso extremo deste tipo de relação estA em seu trabalho (1986), denominado "Etnoentomologia de tribos indigenas da Amazônia", onde o autor relaciona a colmeia de uma vespa ao modelo "natural" do universo Kayapó. Segundo o autor (idem: 270):

"Todos os especialistas em abelhas, entre os Gorotire - Kayapó, são xamãs.

E

é natural que assim seja, uma vez que foram eles, isto é , os xamãs antigos, que conceberam o modelo natural da organização social desses lndios. Ele se baseia na observação da ordenação social dos himenopteros."

Este tipo de relação, tamb6m 6 formulada em um artigo denominado "O conhecimento entomológico Kayapó: etnometodologia e sistema cultural" (1981: l19), onde o autor diz: "As formigas são mais semelhantes aos homens do que mesmo as vespas porque andam e

(32)

caçam no chão".

Assim sendo, o autor reduz o fato dos Gorotire classificarem, identificarem e perceberem o mundo A necessidade dos homens de encontrar modelos biol6gicos para sua pr6pria estrutura e organização sociais. Para o autor existe uma mera racionalização da observação e adaptaçgo ecol6gica.

Nesse artigo, o autor coloca ainda que (idem: 113):

"Os Kayapó dividem o mundo em quatro categorias: 1 -

coisas que se movem e crescem, 2 - coisas que crescem mas não se movem, 3 - coisas que nem se movem nem crescem e 4

-

homem -- um ser que é

relacionado com todos os animais, mas 6 sui generis e mais poderoso que a maioria dos animais devido a sua organizaç€io social".

Primeiro, seria interessante saber quais as espécies incluldas nestas categorias tão gen4ricas. O autor fala de correspondência direta entre ordens e famílias científicas e a nomenclatura no nível genérico indígena. Neste contexto, sem que o autor apresente as categorias hierárquicas e taxonômicas, fica difícil para o leitor, e principalmente para a própria análise de Posey, comprovar a existência de categorias em diferentes níveis hierárquicos entre os Gorotire.

Em segundo lugar, o homem não é uni ser mais poderoso que a maioria dos animais devido a sua organização social. Ele é

parte integrante do cosmo reafirmando constantemente as relacões entre o mundo animal e os humanos. Para Seeger (1981), existe sempre o perigo do "social" se tornar "natural", e é por isto que os Suyá enfatizam a transformação do natural em social e a

(33)

proteção dos perigos advindos do animal. Sendo assim, exiete m a constante reintrodução da natureza através dos cantos de cul>a, ceriiiiônias e canções, estabelecendo uma constante reciprocidade entre os humanos e o mundo natural. A natureza é reintroduzida através de símbolos e metáforas no mundo cultural, com objetivos de trazer poder e significado a vida social.

Relativamente as sociedades não - indigenas, encontrei o trabalho de Tulio Maranhão (1975) referente a classificação dos peixes eni una comunidade de pescadores em Icarai, Ceará. Para o

autor, a antropologia cognitiva não trata apenas de analises classificatórias de conjuntos de objetou naturais, nem do estudo da ciência folk, nem de análises semânticas culturalmente condicionadas, mas sim, de tudo isso e mais um pouco: a própria maneira de pensar culturalmente. Em seu trabalho de campo, o autor conclui que os pescadores de Icarai não classificam seus peixes taxonomicamente, embora se possa construir um modelo ãnalitico, de tipo taxonomico, dos peixes. 0s pescadoree identificam - nos pela forma, cor e tegumento. Os processos conceituais, e não só perceptivos, entram na identificação, assim como uma classificação gastronômica e comercial dos peixes. Esta classificação , porém, pode ser independente, produzindo uin novo arranjo classificat6rio. O autor tem coino objetivo principal mostrar as interligações dos diferentes domínios.

Estes trabalhos no campo da etnociência são importantes não só para mostrar o conhecimento que as diferentes sociedades possuem de seu mundo natural, mas também na busca da

(34)

universalidade ou da predisposição universal de se classificar n

mundo natural.

A nieu ver, toda pesquisa deve levar ein consideração dois pontos essenciais: o primeiro se refere a metodologia da pesquisa; o segundo & análise dos dados.

A metodologia empregada no trabalho de etnobiologia e

essencial. Teinos que ter em mente que não devemos tratar os levantamentos sobre identificação e classificação de espécies de modo etnocêntrico, mas a metodologia cientifica é útil na obtenção de dados. Um trabalho sistemático, quantitativo e qualitativo, igual para todos os informantes, fornecerá subsídios para a análise das etnoclassificações. As inúmeras informações utilitaristas (alimentação, representação, ornamentos . . . ) que nos são fornecidas devem constar para uma posterior análise. Se não conseguirmos atingir esta diferenciação, sobre o que é uma "classificação de arranjo" e uma " classificação codificante",

nos termos de Taylor que comentarei a seguir, ficaremos sempre no nivel comparativo dos símbolos, e das representações. Não podereiiios as~irii af irniar se os princípios classif icatórioz são

universais ou de que modo são percebidas e agrupadas as

descontinuidades, oferecidas pela diversidade natural, pelas inúmeras sociedades.

Do ponto de vista analitico seria interessante explicar melhor, assim como fez

K.

Taylor ( 1 9 7 7 ) em seu trabalho

intitülâdo "Sistemas de classificação e a ciência do concret,~", que podem existir dois tipos de classificação: a clasuifica~Zici, de

(35)

arranJo e a codificante. A "claseificacão de arranJo" tem por finalidade agrupar e distinguir, rotulando atrav6s de significado primário, categorias que resultam de uma classificacão de primeira ordem, de um dominio que não foi ainda previamente classificado.

A

"classificacão codificante" 6 aquela que envolve a associacão de dois dominios anteriormente aut6nomo8, sendo cada um já o objeto de uma "classificacão de arranjo", num processo de significacão secundário, metafórico, simbólico.

Neste sentido, um grande avanco para a teoria e a

metodologia a serem empregadas nos estudos da etnociéncia está na contribui~ão do trabalho intitulado "La Nature Domestique: Symbole et praxis dane 1'6cologie des Achuar" (1986), de Philippe Descola. O autor mostra que existem tree sistemas taxonômicos na etnobotânica Achuar: 1 - um sistema de categorias explicitas e ideais, que recorta o universo vegetal em classes morfológicas, independentemente de qualquer utilização prAtica; 2 - um sistema explicito e pragmático, que agrupa em uma categoria nomeada vários elementos diferentee, mas cuja utilizacão é a mesma; 3 -

um sistema de categorias implicitas e latentes. Esta categoria não é nomeada

.

Ela e estruturada por uma finalidade utilitarista ou simbólica.

A 8

questoes levantadas pelo autor contribuem para melhor entendermos as claseificacões, pois demonstram um aspecto metodologicamente importante. Não devemos confundir o si~tema taxonômico agrupado morfologicamente com o sistema pragmático, representativo ou utilitarista. Os dois são passiveis de análises

(36)

independentes. O autor trabalha com os trgs sistemas e, através de uma análise conjunta, capta a interface entre cultura e natureza. Este trabalho nos mostra também que o conhecimento indígena não visa somente ao utilitarismo, como foi colocado pela antropologia ecológica, nem visa somente às representações, como

é colocado pela antropologia simb6lica. Supera, assim, as visões mais estreitas daquelas abordagens, permitindo urna compreensão mais precisa da complexidade das classificações indígenas.

E com estas idéias em mente que farei, no capitulo seguinte, uma primeira aproximação do material etnográfico em que

se baseia esta dissertação, tratando das categorias mais ainplãs com que os Xikrin pensam o mundo animal. Antes, porém, cabem algumas considerações sobre a literatura antropológica especializada referente aos Kayapó.

2 - Os estudos sobre a sociedade e a cultura Kayap6

Não pretendo analisar ou discutir os trabalhos realizados até hoje entre os Kayapo. Farei somente um apanhado das pesquisas e identificarei as questões que elas evidenciam.

Na bibliografia etnológica temos duas monografias essenciais que descrevem e analisam a sociedade e a cultura Kayapó de modo abrangente, sendo referência obrigatória para o estudo de qualquer subgrupo Kayapó: uma sobre os Gorotire (Turner, 1965) e a outra sobre os Xikrin (Vidal, 1 9 7 7 ) . Estes dois autores descrevem de forma detalhada estas sociedades enfatizando a organização social, o sistema de categorias de

(37)

idade (Vidal, 1976, 1977) ou o sistema de metades (Turner, 1966), as relações de parentesco, de amizade formal, papéis cerimoniais, as oposições entre centro/periferia, homem/mulher, natureza/cultura. Ambos realizam uma analise sobre as relações entre nominadores e nominados, transmissão de prerrogativas assim como a organização social através de um estudo de rituais de imposição de nomes. Este Último tema também foi pesquisado por Verswijver (1982) entre os Kayapó - Mskrãngoti.

Bamberger (1967) aborda a cla~sificação do u n i v e r f i o e

do mundo animal entre os Kayapó - Gorotire. A autora realiza principalmente uma classificação pragmática do mundo animal no nível da comestibilidade e dos tabus alimentares. Na classificação do universo, ela percebe um modelo espacial concêntrico, composto pela floresta e o campo, espaço a - social; pela área que circunda a aldeia, espaço interinedi~irio; pela aldeia em circulo onde as casas, na periferia, se definem como espaço fracamente social; e pelo centro da aldeia, com ã casa dos

homens, espaço fortemente social.

A

mulher em seu trabalho é

vista como um ser humano menos socializado. Este modelo é

compartilhado também por Turner ( 1966, 1979).

Todos estes autores consideram em seus trabalhos que o conceito de descendhcia matrilinear (Nimendaju, 1940 e 1946) era inadequado para definir o parentesco nestas sociedades.

Posteriormente, Verswi jver ( 1983 ) evidenciou a existência de matrilinhagens vinculadas a segmentos residenciais. Desta mesma perspectiva, Lea (1986) reinterpreta a organização

(38)

s o c i a l Kayap6 e s u a p e s q u i s a tem como f o c o p r i n c i p a l o s i s t e m a d e b e n s s i m b ó l i c o s , e n g l o b a n d o nomes e p r e r r o g a t i v a s . A a u t o r a i n t r o d u z o c o n c e i t o d e " C a s a " ( L 6 v i - S t r a u s s , 1 9 8 6 ) na a n ã l i s e d a s o c i e d a d e Kayapó e r e t o m a a d i s c u s s ã o s o b r e a q u e s t ã o d a d e s c e n d ê n c i a m a t r i l i n e a r e n t r e o s Kayapõ, s u g e r i n d o e u a v a l i d a d e . Devemos a i n d a c i t a r o t r a b a l h o d e V e r s w i j v e r ( 1 9 7 8 ) e que f i c a à margem d e minha d i s s e r t a ç ã o p e l o s e u tema. O a u t o r e n f a t i z a a h i s t ó r i a d o s g r u p o s Kayapó - M E k r ã n g o t i , e s t u d a n d o a d i n â m i c a d o s g r u p o s l o c a i s , s u a s c i s õ e s e r e a g r u p a i n e n t o s . T a n t o T u r n e r ( 1 9 8 0 ) como V i d a 1 ( 1 9 7 8 , 1 9 8 6 ) escrevem a r t i g o s i m p o r t a n t e s s o b r e o s i g n i f i c a d o d a o r n a m e n t a ç ã o c o r p o r a l . T u r n e r p o s s u i a i n d a d o i s a r t i g o s r e l e v a n t e s : no p r i m e i r o ( 1 9 8 0 ) , o a u t o r a b o r d a o p r o b l e m a d a e s t r u t u r a do m i t o e s u a r e l a ç ã o com a e s t r u t u r a d a s o c i e d a d e , m o s t r a n d o que o m i t o deve s e r e n t e n d i d o no c o n t e x t o s o c i a l e n ã o " h o r s - c o n t e x t e " ; no eegundo ( 1 9 8 7 1 , o a u t o r r e t o m a a q u e s t ã o d a "humanidade" na s o c i e d a d e Kayapó, o r e s s u r g i m e n t o do xamanismo, a i n t e r - r e l a ç ã o e n t r e c o n s c i ê n c i a m i t o l ó g i c a , h i s t 6 r i c a e a ç ã o , t r a n s f o ~ > m a ç ã o s o c i a l no c o n t e x t o d a s i t u a ç ã o a t u a l d e s t a s s o c i e d a d e s p e r a n t e a s o c i e d a d e e n v o l v e n t e . Temos a i n d a a o b r a d e ~ a d r e Caron ( 1 9 7 1 ) s o b r e 08 í n d i o s X i k r i n , e s c r i t a s o b forma d e d i á r i o , r e g i s t r o de s u a a t u a ç ã o m i s s i o n á r i a , no p e r i o d o d e 1964 a 1 9 7 0 , e a o b r a do m i s s i o n á r i o a u s t r i a c o Anton Lukesch ( 1 9 7 6 ) s o b r e o s m i t o s e o mundo d o s Kayapó - G o r o t i r e e Kubenkrãkein. N a v e r s ã o alemã d e s t a

(39)

ú l t i m a o b r a , constam t o d o s o s m i t o s , em l l n g u a Kayap6, que o

a u t o r r e c o l h e u n o s a n o s de 1954 a 1958 n e s t a s d u a s a l d e i a s .

V á r i o s d e s t e s t r a b a l h o s

--

e o u t r o s r e l a t i v o s a o u t r o s grupos Jê

--

s ã o r e f e r i d o s ao longo d e s t a d i s s e r t a ç ã o , sempre que a s informações ou i n t e r p r e t a ç õ e s que trazem i n c i d i r e m s o b r e temas t r a t a d o s a q u i e t i v e r e m i n t e r e s s e comparativo.

(40)

Capítulo I 1 - A classificação Xikrin do mundo animal

1 - A categoria inicial e suas subdivisões

Os índios Kayapó- Xikrin dividem o mundo animal em três grandes categorias iniciais, linguisticamente nomeadas: Mru, Tep e Ak que, a grosso modo, corresponderiam aos animais terrestres, aos peixes e as aves.

Contrastando com estas categorias estão os minerais e as plantas, não definidas linguisticamente na categoria inicial, mas sim nas categorias supragenéricas e genéricas. Isto ocorre

tainb6m entre os Kayová (Gãrcia, 1979 ) , os Achuar (Descola, 1986)

e os Teltzal (Brent Berlin, 1974). Contrastam também com estas categorias os humanos, divididos em dois grandes grupos, os Msbengokré (autodenominação dos Kayap6) e os Kuben (outros grupos 6tnicos).

Nos trabalhos de Berlin e colaboradores, é dito que a

maioria dos povos não possuem a categoria inicial, isto é, não fazem distinção, marcada linguisticamente, entre o reino animal e o reino vegetal.

Em inúmeros trabalhos que retratam a classificação do reino vegetal, de povos diversos, percebe - se que não existe, assim como entre os Xikrin, um termo que englobe todas as plantas em uma categoria inicial. No caso do reino animal, não concordo com o fato de não existir esta categoria na classificação Xikrin. Muito pelo contrário: ela existe de forma menos abrangente em

(41)

relação a classificação cientifica. No caso do trabalho de Jensen (1986) não consigo entender o motivo pelo qual o termo "wyra" (aves) foi classificado na categoria supragenérica (etnoclasse). Acredito que o autor pretendia enfatizar uma correspondência direta entre esta etnocategoria e a categoria científica (aves). Para concluirmos, porém, que ela não deva ser considerada uma categoria inicial devemos procurar os contrastes percebidos como existentes no mundo animal e as correspondentes divisões

linguísticas mais abrangentes dentro de cada cultura.

A sociedade ocidental contrasta o reino animal (humanos incluidos) ao reino vegetal e mineral. No caso dos Xikrin, a categoria inicial não aparece do mesmo modo que as categorias iniciais cientificas, mas sim com uni maior número de divisõee e contrastes, como vimos acima.

Esta divisão 6 importante pois as diferentes categorias iniciais estão interligadas a diferentes dominios do universo Xikrin: terra (puka), céu (koikwa) e &gua (ng0). B a n ~ b e r g e r (1967:

131), em seu trabalho entre os Gorotire, refere - se a isto da

seguinte forma: " The elenients earth (pfika), sky (kBykwa), ãnd

the water (ngô) are inhabited by nien and aniinals (piika), birds and epirits (khykwa) ãnd fish (ngô)".

Os termos empregados na identificação dos animais pelos Xikrin são sempre nomes próprios, o que não ocorre no caso dos vegetais, cujos nomes podem estar relacionados ã uma

característica animal ou possuírem a nomenclatura do animal acrescentando - se o termo pTcijB íremédioj. (A análise d a

(42)

concepcão d a 8 d o e n c a s e n t r e o s X i k r i n s e r 6 f e i t a em o u t r o momento d e s t a d i s a e r t a ~ ã o ) . Por exemplo, o termo wakon

-

kane- p I d j &

(rem6dio d e q u a t i ) n o s l e v a a p r o c u r a r o s i g n i f i c a d o d a d o e n ç a , s u a origem, s u a c a u s a e s e u s e f e i t o s n a concepcão X i k r i n , a s s i m como o f i z e r a m G a r c i a ( 1 9 7 9 ) e Conklin ( 1 9 5 4 ) . A l l n g u a , como bem o c o l o c a Rui Coelho (19891, i n f l e t e o e a b e r em c e r t a s d i r e ~ õ e s .

A c a t e g o r i a i n i c i a l

mru

e n g l o b a o s c r u s t á c e o s , o s i n s e t o s , o s a n f i b i o s , o8 r k p t e i s e o s mamiferos. Tep 6 a

denominacão dada a c a t e g o r i a i n i c i a l p e i x e s e 8k 6 a denominacão p a r a a c a t e g o r i a i n i c i a l a v e s .

E s t a s

t r e s

c a t e g o r i a s a n i m a i s s&o i d e n t i c a s A s

c a t e g o r i a s a n i m a i s e n c o n t r a d a s e n t r e o s G o r o t i r e - Kayap6 p o r Bamberger ( 1967: 132 ) :

"The g e n e r a l kayap6 term f o r a n i m a l is mru, which on one l e v e l of c o n t r a s t means t h e e n t i r e f a u n a , b u t on a n o t h e r l e v e l is f r e q u e n t l y c o n t r a s t e d w i t h p e o p l e ( k u b e n ) , f i s h ( t e p ) and b i r d s

( e ) ,

and means mammal, l a n d a n i m a l , l a r g e game a n i m a l , and c a r n i v o r e . The meaning o f mru must be d e f i n e d i n c o n t e x t . Within t h e c a t e g o r y o f mru t h e r e a r e r e s i d u a l c l a s s e s o f o t h e r c r e a t u r e s , r e p t i l e s , amphibians, c r u s t a c e a n s , i n s e c t s , wich a r e a l s o

Hwu

,

b u t f o r which t h e r e a r e no philum

d e s i g n a t i o n e " .

Segundo Posey ( 1 9 8 1 ) , o s G o r o t i r e d i f e r e n c i a m o s mru

( a n i m a i s com c a r n e e sem c a r a p a c a ) d o s maja ( a n i m a i s com c a r a p a ç a e sem c a r n e ) , d i f e r e n c a e s t a nlio e n c o n t r a d a e n t r e o8 X i k r i n .

No u n i v e r s o a n i m a l , t r a t a d o a q u i e s p e c i f i c a m e n t e , a denominação mru s i g n i f i c a t a n t o a c a t e g o r i a que e n g l o b a t u d o que n ã o 6 p e i x e ou a v e , como também tem o s i g n i f i c a d o e s p e c i f i c o d e

(43)

caça. Esta distincão 6 necess6ria para não considerarmos a existhcia de mia claasiffcação ~ragnltitice ~ o m e n t e , como Q fez

Bamberger (1967). Ao contrhrio, como este trabalho procura demonstrar, h6 uma claeeificacão taxonamica independente da classificacão pragmática. Assim, a claseificaç&o pragmática expressa pelos termos mel e kakrit, envolve um certo número de animais das categorias mru e tep, como veremos mais adiante. Vida1 (19771, apesar de tratar somente da classificação pragmática, observa em nota de rodap6 o seguinte (idem: 81):

"Tradicionalmente, 08 Xikrin não comiam ave de

espkcie alguma. Por isso estas nEio obedecem a

classificaç€ío mei (bom) e kakrit (comum)."

Tratando

-

se da categoria inicial mru, observamos que a nomenclatura evidencia agrupamentos, categorias supragenkricas e categorias genéricas. Existem categoria8 nominais que servem de base ou prefixo para vbrias espécies semelhantes entre si. Assim, por exemplo, o termo wewe define as borboletas e mariposas

(taxon

supragenérico) dando sequência a denominação wewenóti, contraatando com a espécie denominada wewengrãngrã (taxon eepecifico). O termo 8 designa as aranhas e a denominação &ti, a aranha caranguejeira. O prefixo rob define aa onças: robmó. robkrore e robtuk são denominações especificas. Na categoria dos rob estão incluidos os cachorros e excluidos os felinos de pequeno porte, denominados mreti.

Esse mesmo tipo de agrupamento foi encontrado entre os Achuar (Descola, 1986) e os Gorotire (Bamberger, 1967). Para Descole (1986: 109!, e explicação estaria na inversgo dos pares

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animais articulados pelo eixo natureza - cultura:

"Dans un cas, le jaguar sauvage ezt socinli:;á en chien domestique sul-naturel, le couple ainsi foz-mé constituant la matrice d'où sont derivés les yawa félides, tandis que, dans l'autre cas, le chien domestique est converti en chien sauvage, ce dernier devenant emblematique des yawa non f6lides. "

Para Bamberger (1967: 1431, que trabalha também com dados Kayapó, a explicação esta na agressividade dos animais e no fato de serem carnívoros: "The dog and the jaguar share with man the characteristics of carnivorous hunters, but the one is man-s house pet and hunting companion, the other man's competition and greatest enemy " . Concordo plenamente com a autora, pois, para os Xikrin, os cães devem ser agressivos e bons caçadores como as onças e é por isto que são escarificados.

O kaprã engloba todas as especies de jabuti e serve de prefixo para denominações especificas tais como kaprãkangrãngrãti, kaprãme i, kaprãpoktire, kaprãkobiken, kaprãkrãibe e kaprãkrãtoi. Os três Últimos termos referem - se as diferentes fases de crescimento da espécie kaprãpoktire. Neste caso, destaca - se o fato de somente ser comestível para os msnõrõnu, jovens iniciados, de sexo masculino, o kaprãkrãtoi, o que explicaria a necessidade de se diferenciar linguisticamente as fases do crescimento.

O termo kukoi é o prefixo que define a categoria "primatas" como, por exemplo,kukoika6kr6 e kukoikrut. diferencia

-

se neste caso o guariba, denominado Kubut. Este último não é cnmestivel e m a carne, se consumida pela categoria de idade

(45)

m s n õ r õ n u , c a u s a o que o s i n d i o s denominam d e ibã ( t r a d u z i d o , p e l o s X i k r i n , como l o u c o ) . O p r c f i x o t o n t d e f i n e a c a t e g n r i a " t a t u " , como no c a s o e s p e c i f i c o d e t o n t n g r i r e e t o n t i . O t e r m o A p i e t i d i f e r e n c i a e s t a e s p é c i e d a s d e m a i s , a p e s a r d o s X i k r i n a i d e n t i f i c a r e m como um t a t u . E s t a e s p é c i e e s t á r e l a c i o n a d a a uma s o c i e d a d e c e r i m o n i a l ; OS i n t e g r a n t e s d e s t a s o c i e d a d e não s e ã l i n l e n t a m d e s t a e s p é c i e d u r a n t e o r i t u a l a p i e t i m g r e r e m e i ( r i t u a l d e nominação e i n i c i a ç ã o ) . E x i s t e m também e s p é c i e s nomeadas l i n g u i s t i c a m e n t e e n ã o agi-upadas em c a t e g o r i a s s u p r a g e n é r i c ã s . N e s t e c a s o e s t ã o o s a n i m a i s d e p o r t e médio e g r a n d e , p a r a o s q u a i s p r e v a l e c e a c l a s s i f i c a ç ã o p r a g m A t i c a e e x p l í c i t a ( a l i m e n t a ç ã o ) , q u e o s e n g l o b a . E o c a s o do k u k r u t ( a n t a ) , n h i a d j u ( v e a d o ) , p à t ( t a n a n d u á - b a n d e i r a ) , wakon ( q u a t i ) , d j o t

- t i

( p a p a - m e l ) , mru ê t i ( a r i r a n h a ) , n g r a ( p a c a ) , n g r o i ( o u r i ç o ) , kunum ( c a p i v a r a ) , k u k e i r e ( c o t i a ) , k a i ( c o e l h o ) , angr8 ( q u e i x a d a ) e a n g r u r e ( c a i t i t u ) , e n t r e o u t r o s .

Devemos lembra^> q u e a s e s p é c i e s nEío a g ~ m p a d a s n a c l a s s i f i c a c ã o t a x o n õ m i c a , d i f e r e n c i a d a s somente ã r i i v e l d a taxonoinia t e r m i n a l o u e s p e c i f i c a , n ã o possuem d i v e r s i d a d e s na r e g i ã o . E s s e é o c a s o , p o r e x e m p l o , d o s C e r v i d e o s d e n o i i ~ i n a d o s n h i a d j u . O s X i k r i n lembram q u e e x i s t e o m o r e ( v e a d o - campei1-o), c o n s i d e r a d o p a r e n t e do n h i a d j u , d e c a r n e a p r e c i a d a p o r e l e s , mas não e x i s t e n t e n a r e g i ã o do C a t e t é . Ao caçar um n h i a d j u , o s X i k r i n e n t o a m o c a n t o do m o r e . E s t a l e m b r a n ç a se r e m o n t a a o p a s s a d o , a o s campos onde a n t i g a m e n t e h a b i t a v a ~ i i .

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