Universidade de São Paulo Segundo Semestre de 2015
FEA-RP PPGE
Comissão Coordenadora de Programa (CCP)
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO
∙ Esta é uma prova com três partes, Microeconomia, Macroeconomia e Econometria. ∙ Todas as questões são obrigatórias.
∙ A duração da prova é de 4h. Organizem o seu tempo de acordo.
∙ Vocês podem responder às questões fora da ordem. Somente lembrem-se de escrever clara-mente qual questão vocês estão respondendo.
∙ Vocês podem responder questões a lápis. ∙ Vocês podem usar calculadora
∙ Celular não pode ser utilizado durante a prova e deve ficar dentro da mochila. ∙ Este caderno de perguntas deve ser devolvido juntamente com a folha de respostas ∙ A compreensão da prova é parte da mesma.
∙ Portanto, não serão respondidas dúvidas durante a prova. ∙ BOA SORTE!
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
I- Microeconomia
1) Imagine que uma firma empreendedora considera investir em um instante inicial $2000 em um projeto de pesquisa que resultaria na criação de um novo bem. Se ela conjectura que função demanda anual pelo bem seria dada por 𝑞(𝑝) = 100−𝑝 , o custo marginal de produção seria constante e igual a $60 e não existem custos fixos para a produção do bem (além da pesquisa original), pede-se:
i. Explique qual é o tipo de retorno de escala para a produção anual do bem;
ii. Calcule o preço unitário cobrado pela firma e a quantidade produzida que maximizaria seu lucro em cada ano que a firma detivesse o monopólio do bem;
iii. Se não houver preferência temporal nessa economia, quantos anos deveria demorar para que rivais entrassem no mercado (ou por quanto tempo deveria ser a vigência mínima da patente pelo bem) para que a firma considere vantajoso investir no projeto e atuar como monopolista?
iv. Qual seria a perda de eficiência estática por ano associada ao monopólio?
2) Considere uma economia de trocas com dois indivíduos, A e B, cujas funções utilidade, definida sobre dois bens (X e Y), são do tipo Cobb-Douglas. O agente A gasta sempre 25% de sua renda com o bem X e B gasta 75% da sua com o mesmo bem. A dotação de A é representada por 𝑤𝐴(𝑋𝐴, 𝑌𝐴) = (30, 5). Existem na economia quarenta unidades de X e
vinte unidades de Y. Considere ainda que o preço do bem Y é normalizado em uma unidade monetária. Pede-se:
i. Encontre as expressões para as demandas brutas dos dois bens por parte dos dois agentes; ii. Calcule o preço relativo P de equilíbrio dessa economia;
iii. Verifique se a alocação igualitária é eficiente em termos paretianos.
iv. Se tomarmos as transformações 𝑉𝑖 = 𝑙𝑛𝑈𝑖(𝑋𝑖, 𝑌𝑖) , 𝑠𝑒𝑛𝑑𝑜 𝑖 = 𝐴, 𝐵 , definida no
interior da Caixa de Edgeworth, encontre a alocação que maximiza a função de bem-estar utilitarista (sem pesos que privilegiem A ou B).
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
II- Macroeconomia
1) Considere a seguinte curva de Phillips de curto prazo:
𝜋 = 𝜋𝑒− 𝑎 (𝑢 − 𝑢𝑁)
em que 𝜋 é a inflação, 𝜋𝑒 é a inflação esperada, 𝑢 é a taxa de desemprego, 𝑢𝑁 é a taxa de
desemprego natural, e 𝑎 é uma constante positiva (𝑎 > 0). O desemprego natural é aquele que ocorre quando o produto é igual ao produto natural, 𝑌𝑁. O produto natural é também
chamado de produto potencial. Responda aos itens a seguir:
i. Este modelo – equação (II1) – expressa um trade-off de curto prazo entre inflação e desemprego? Explique sua resposta.
ii. Apresente ao menos uma justificativa teórica para a existência de uma curva de Phillips de curto prazo como a equação (II1). Explique sua resposta
iii. Este modelo – equação (II1) – é compatível com um aumento simultâneo da inflação e do desemprego? Explique sua resposta, demonstando seu argumento matematicamente. iv. Este modelo – equação (II1) – é compatível com uma desinflação sem custo? Em outras
palavras, neste modelo a taxa de sacrifício pode ser nula? Explique sua resposta. GABARITO:
a) Sim. Há uma relação negativa entre inflação e desemprego.
𝜕𝜋
𝜕𝑢 = −𝑎 < 0
b) Apresentamos três justificativas distintas para a curva de Phillips de curto prazo, embora a questão demande apenas uma.
i. Salários Rígidos. Devido a contratos de longo prazo entre trabalhadores e empresas, que fixam salários nominais por vários períodos, os salários nominais ajustam-se lentamente, sendo rígidos no curto prazo. Assim, as empresas e os trabalhadores definem o salário nominal antecipadamente com base no nível de preço esperado, 𝑃𝑒 (inflação esperada,
𝜋𝑒). Se, por exemplo, 𝑃 < 𝑃𝑒 (𝜋 < 𝜋𝑒) então a receita da firma cai, mas o custo da
mão-de-obra não, o que reduz o lucro da firma, gerando demissão. Assim, a inflação é menor do que a esperada, e o desemprego aumenta. Ocorre o oposto se 𝑃 > 𝑃𝑒
(𝜋 > 𝜋𝑒).
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
ii. Custos de Menu. Neste caso, as empresas escolhem os preços com base no preço esper-ado, pois os preços ficam fixos por um determinado período. Isso ocorre em virtude dos custos de menu, isto é, os custos de reajuste de preços, que incluem o custo de imprimir novos menus e catálogos, o tempo necessário para alterar etiquetas de preços, o custo de decidir o preço novo. Mais uma vez, podem ocorrer eventos inesperados que fazem
𝑃 ser diferente de 𝑃𝑒. Por exemplo, suponha que ocorra uma contração inesperada da
economia que reduzirá 𝑃 no longo prazo. Enquanto algumas empresas ajustam seus preços no curto prazo para baixo, outras não, devido aos custos de menu. As empre-sas que mantém o preço (alto) vendem menos, o que leva esempre-sas empreempre-sas a reduzir a produção e o emprego. Este movimento se traduz em aumento do desemprego.
iii. Percepções Equivocadas. As empresas podem confundir as mudanças em 𝑃 com as mudanças no preço relativo dos produtos que vendem. Por exemplo, se 𝑃 sobe acima de 𝑃𝑒, uma empresa vê o seu aumento de preço antes de perceber que todos os preços estão subindo. A empresa pode acreditar que seu preço relativo está subindo, e pode aumentar a produção e o emprego. Assim, um aumento em 𝑃 (aumento na inflação, 𝜋) pode causar um aumento na produção (queda no desemprego, 𝑢).
c) Sim. Um aumento em 𝜋𝑒 e/ou 𝑢𝑁, deslocam a curva de Phillips para cima piorando o
trade-off de curto prazo e, neste caso, tanto a inflação quanto o desemprego aumentam. Note que 𝜋 = 𝜋𝑒+ 𝑎𝑢𝑁 − 𝑎𝑢 Δ𝜋 = Δ𝜋𝑒+ 𝑎Δ𝑢𝑁 − 𝑎Δ𝑢 Suponha que Δ𝑢 > 0. Se Δ𝜋𝑒+ 𝑎Δ𝑢𝑁 𝑎 > Δ𝑢 então, Δ𝜋 > 0.
d) Sim. Caso os agentes tenham expectativas racionais, um anúncio crível da autoridade monetária de que combaterá a inflação leva a redução da inflação esperada, 𝜋𝑒, o que reduz a inflação, mesmo com o desemprego, 𝑢, inalterado.
2) A abordagem padrão em modelos de crescimento de uma economia de um só setor é de progresso tecnológico poupador de trabalho. Dessa forma, suponha que existam dois fatores
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
de produção, capital (K) e trabalho (L), além da tecnologia (A), e que a função de produção tenha a forma de uma Cobb-Douglas (tempo contínuo):
𝑌 (𝑡) = 𝐾 (𝑡)𝛼[𝐴 (𝑡) 𝐿 (𝑡)]1−𝛼
E que a equação de movimento de capita seja dada por ˙
𝐾 (𝑡) = 𝑠𝑌 (𝑡) − 𝛿
onde 𝑠 é a taxa de poupança (economia fechada) e 𝛿 é a taxa de depreciação do capital. Assuma que A cresce a uma taxa constante igual a 𝑔 e L cresce a uma taxa constante igual a
𝑛.
i. Mostre que a economia converge para o estado estacionário e encontre as taxas de cresci-mento de Y e K nesse estado.
ii. Como uma redução da taxa de desconto afeta o nível do produto e sua taxa de cresci-mento no estado estacionário? Explique.
iii. No caso dos modelos de crescimento endógeno, qual o efeito de uma redução na taxa de desconto na taxa de crescimento do produto? Explique.
Resposta:
i. Considerando a equação em unidades efetivas de trabalho:
𝑦 (𝑡) = 𝑘 (𝑡)𝛼(1)
e a equação de depreciação efetiva do capital: ˙𝑘 (𝑡) = 𝑠𝑦 (𝑡) − (𝑔 + 𝑛 + 𝑑) 𝑘 (2)
No estado estacionário ˙𝑘 (𝑡) = 0, então: sy (𝑡) = (𝑔 + 𝑛 + 𝑑) 𝑘 (3)
O lado direito da equação (2) é positivo à esquerda de ˙𝑘 (𝑡) = 0 e negativo à direita do mesmo ponto. Dessa forma, a economia tende ao estado estacionário (ver que o primeiro termo do lado direito da equação (2) cresce a taxas decrescentes com 𝑘 (𝑡), enquanto o segundo termo cresce a uma taxa constante). Substituindo (1) em (3):
𝑘* =(︁𝑔+𝑛+𝛿𝑆 )︁ 1 (1−𝛼) (4) Substituindo (4) em (1): 𝑦* =(︁𝑔+𝑛+𝛿𝑆 )︁ 𝛼 (1−𝛼) (5) Dividindo (4) por (5): 𝑘* 𝑦* = 𝐾 𝑌 = 𝑆 𝑔+𝑛+𝛿 (6) 7
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
Dessa forma, a relação capital produto é constante, no estado estacionário. Como ˙𝑘 (𝑡) = 0, no estado estacionário e 𝑘 = AL𝐾:
˙𝑘 𝑘 = ˙ 𝐾 𝐾 − (︁𝐴˙ 𝐴 + ˙ 𝐿 𝐿 )︁ = 𝐾𝐾˙ − (𝑔 + 𝑛) (7) então: ˙ 𝐾 𝐾 = 𝑔 + 𝑛 (8) Pela equação (6): ˙ 𝑌 𝑌 = 𝑔 + 𝑛 (9)
i. Uma redução da taxa de desconto eleva a taxa de poupança (𝑠), o que eleva o produto, no estado estacionário, como pode ser visto pela equação (5). No entanto, o produto em unidades efetivas de trabalho é constante no novo estado estacionário, ou seja, uma elevação na taxa de poupança eleva o produto, em unidades efetivas de trabalho, mas não a sua taxa de crescimento.
ii. Nos modelos de crescimento endógeno, uma redução na taxa de desconto leva a uma maior alocação de recursos para o setor de P&D, o que eleva a taxa de crescimento do produto de forma permanente.
III- Econometria
1) O modelo abaixo de probabilidade linear foi estimado. A variável dependente é “pea”, var-iável binária que admite valor 1 caso o indivíduo participe da força de trabalho e 0 caso contrário.
As variáveis independentes incluídas no modelo seguem descritas: homem = variável binária que assume valor 1 caso a pessoa seja homem;
idade e idade2 = idade da pessoa e idade ao quadrado da pessoa, respectivamente;
branco = variável binária que assume valor 1 se as pessoas são de raça / cor de pele igual a branco ou amarelo (pardos + negros formam a categoria de referência);
educa = anos de escolaridade completos do indivíduo;
dregiao1, dregiao2, dregiao4 e dregiao5 = são variáveis binárias que identificam, respectivamente, as regiões norte, nordeste, sul e centro-oeste do país (sudeste é a categoria de referência);
metrop = variável que assume valor 1 se a pessoa mora em região metropolitana; urbana = variável que assume valor 1 se a pessoa mora na área urbana;
homem_urbana = interação entre as variáveis binárias homem e urbana. 8
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
∙ Interprete os coeficientes associados às dummies para as regiões do país.
∙ Comente se existe alguma diferença de gênero no modelo estimado? Detalhe sua re-sposta.
∙ Qual o efeito marginal de um ano a mais de estudo sobre a probabilidade de fazer parte da PEA?
∙ Qual o valor da idade que maximiza a probabilidade de o indivíduo fazer parte da PEA? (Observações: responda, aproximadamente, sem nenhuma casa decimal; a idade média da população para a qual o modelo acima foi estimado é de 38 anos).
∙ O que representa a estatística F(12,309602)?
∙ Em termos de modelagem, cite alguns dos problemas em se trabalhar com o modelo de probabilidade linear.
GABARITO: a) Interprete os coeficientes associados às dummies para as regiões do país. Resp: De acordo com o modelo estimado, a probabilidade de participação na PEA é: 1,9 pontos percentuais menor na região norte comparativamente à região sudeste (referência); 1,1 pontos percentuais menor na região nordeste comparativamente à região sudeste; 2,5 pontos percentu-ais maior na região sul comparativamente à região sudeste; e, por fim, não foram observadas diferenças de probabilidade de participação entre a região centro-oeste e a sudeste (P-valor de 0,522).
b) Comente se existe alguma diferença de gênero no modelo estimado? Detalhe sua resposta.
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
Resp: Há uma dummy para gênero identificando os homens; e também uma interação dessa mesma dummy com a dummy ‘urbana’ que identifica os moradores da área urbana.
Sendo assim, o coeficiente associado à dummy ‘homem’ capta a diferença de participação entre homens e mulheres na área rural, no caso 29 pontos percentuais a favor dos homens. E, a soma dos coeficientes associados às dummies ‘homem’ e ‘homem_urbana’ capta a diferença de participação entre homens e mulheres na área urbana, no caso 19 pontos percentuais (0,29 – 0,10).
Sendo assim, homens participam mais da força de trabalho do que as mulheres. Interessante comentar o ‘significado’ de mais dois coeficientes:
- o coeficiente associado à dummy ‘urbana’ capta a diferença de participação entre as mulheres moradoras da área urbana e as moradoras da área rural, indicando uma menor participação na área urbana;
- o coeficiente associado à interação (homem_urbana) capta a diferença de duas outras difer-enças:
{Participação dos homens na área urbana - Participação dos homens na área rural}=A {Participação das mulheres na área urbana - Participação das mulheres na área rural}=B Coeficiente da interação = A – B
Se calcularmos cada um desses valores podemos observar que a taxa de participação é sempre menor na área urbana relativamente à área rural. Essa diferença é -3pp para as mulheres; e de -13pp para os homens. Sendo assim, a diferença das diferenças é de -10pp.
c) Qual o efeito marginal de um ano a mais de estudo sobre a probabilidade de fazer parte da PEA?
Resp: De acordo com o modelo estimado, um ano a mais de estudo aumenta em 2,2 pontos percentuais as chances de participar da PEA.
d) Qual o valor da idade que maximiza a probabilidade de o indivíduo fazer parte da PEA? (Observações: responda, aproximadamente, sem nenhuma casa decimal; a idade média da pop-ulação para a qual o modelo acima foi estimado é de 38 anos).
Resp: Podemos escrever p(pea=1) = 0,05*idade – 0,00056*idade2+ demais variáveis.
Mantendo todas as demais variáveis constantes, o valor da idade que maximiza a expressão acima é: 0,05 – 2*0,00056*idade = 0; idade = 45 anos, aproximadamente.
PROVA DE CONTEÚDO ESPECÍFICO - GABARITO
e) O que representa a estatística F(12,309602)?
A estatística F testa a significância conjunta de todas as variáveis inseridas no modelo, isto é, a hipótese nula do teste é que 𝛽1 = 0, 𝛽2 = 0 · · · 𝛽12 = 0 – são 12 variáveis incluídas no modelo.
Conforme atesta o valor da estatística, a hipótese nula é rejeitada.
f) Em termos de modelagem, cite alguns dos problemas em se trabalhar com o modelo de prob-abilidade linear.
Resp: Seguem descritos alguns dos problemas: - Ausência de normalidade dos termos de erro; - Heterocedasticidade dos resíduos;
- Impossibilidade de satisfazer 0 <= E[Yi|Xi] <=1;
- R2como medida de ajustamento do modelo é questionável.