APLICAÇÃO D A LEI N O T E M P O
E U R I C O C R U Z N E T O D
A lei, c o m o fonte formal d o direito, se projeta n o espaço e n o tempo, s e n d o a primeira dimensão relativa a o Estado q u e exerce sua soberania e a s e g u n d a limitada pelos termos inicial e final d a n o r m a jurídica.
Q u a n d o se refere à dim e n s ã o temporal se usa a locução eficácia d a lei no t e m p o pois a n o r m a q u a s e s e m p r e é eficaz até q u e seja derrogada porquanto se tornando antiquada s o b r e v é m outra q u e a revoga.
Todavia por v e z e s s u c e d e q u e a lei antiga cria relações jurídicas cuja p e r m a n ê n c i a s e impõe, surgindo o conflito sobre a aplicabilidade d e c a d a qual d o s sistemas, c a b e n d o a o legislador fixar se tais situa
ções d e v a m ser regidas pela lei n o v a o u m e s m o o desfazimento c o m p l e to c o m a aplicação retroativa d a no v a norma.
Para solucionar tais conflitos se deve recorrer aos princípios da irre- troatividade das Leis e do respeito a o Direito Adquirido, d e v e n d o o jurista n o e x a m e d a diferença entre Direito Adquirido e Expectativa de Direito, nas no ç õ e s dos Direitos d e Aquisição C o m p l e x a e no binômio Direito Adquiri
do e O r d e m Pública.
É, pois, indispensável o estabelecimento d e parâmetros e d e u m cri
tério técnico para propiciar aos juristas o e x a m e d a matéria d e forma cien
tífica.
N o Direito pátrio inexiste u m a ciência a respeito d e te m a tão palpitan
te, m a s há possibilidade d e q u e se r e ú n a m critérios doutrinários para diri
mir a s dúvidas, s e n d o necessário q u e se atinja a o estágio almejado para evitar a perpetuação de dúvidas q u e i m p e ç a m a estabilidade nas relações jurídicas c o m reflexos na p a z social.
O jurista Limongi França, que estudou profundamente a matéria, e n tende q u e se torna necessário estabelecer u m a estrutura doutrinária sobre a matéria c o m base n a própria doutrina nacional, associada às nossas tra-
(•) Juiz Vice-Presidente d o T R T da 15* Região e Prolessor d e Direito d o Trabalho d a P U C — Campinas.
dições e as peculiaridades próprias d o nosso país i m p õ e m soluções pró
prias e n ã o alienígenas, porquanto s o m e n t e as primeiras p o d e m conduzir à segurança e estabilidade jurídica interveniente.
A irretroatividade das Leis e o Direito Adquirido nos sistemas estran
geiros de v e ser e x a m i n a d a tendo e m vista q u e o Direito Arcaico, o Direito Romano e o Direito Intermédio são as raízes do Direito Luso-Brasileiro e t a m b é m face à influência m ú t u a das diversas doutrinas estrangeiras e formas d e legislação, q u e fizeram o direito estrangeiro ser aceito entre nós a p o n to de se integrar a nosso direito n o q u e tange a o t e m a sob ex a m e .
A importância d a fase embrionária é fundamental pois o instituto do direito adquirido constou d o Direito Mesopotâmico (3.000 a.C.), nos Direi
tos Hindu, Hebraico, Chinês, Grego, no Direito R o m a n o e m todas suas fa
ses, no Direito Intermédio e nos Códigos Medievais.
A fase científica d o Direito Adquirido se iniciou c o m a E xegese e a Es cola Histórica porquanto a o longo d o s milênios s e delineou o desenvolvi
m e n t o d o estado d e fato até se alcançar o estado d e direito e, conseqüen- temente, a fixação d o s limites temporais d a lei antiga e m relação à lei n o v a e a n o ç ã o d e q u e e m princípio a n o r m a antecedente e m princípio n ã o p o d e ser derrogada por u m n o v o sistema.
N o Direito R o m a n o h á perfeita definição n o Princípio da Irretroativi
d a d e das Leis, o n d e se estabelecem q u e nos negotia finita n ã o h á s e fa
lar e m retroatividade e no Código de Justiniano t a m b é m houve tentativa de criação d e u m sistema, surgindo no Direito Medieval a noção d e efeito ime
diato e, n a m e s m a fase c o m o Direito Canônico e os Pós-Glosadores veio a n o ç ã o d o Jus Ouaesitum.
Esta última idéia s e desenvolveu nos séculos XVI a XVIII e propiciou o surgimento d a fase científica no século seguinte, d e início c o m a C o n s o lidação d o Direito Adquirido c o m o Doutrina Clássica, ap ó s c o m o a tenta
tiva d e alterações por critérios mais completos e, por último o retorno à D o u trina Clássica q u e finalmente a c a b o u prevalecendo.
A maioria d a s Constituições a p e n a s adotava o princípio d a irretroa
tividade e m matéria penal, sendo exceção a Constituição Americana, a p e sar d e escaparem à regra algumas legislações substantivas c o m o a d a C o s ta Rica e d a N o r u e g a e, t a m b é m , a Lei M a g n a Portuguesa d e 29.4.1826 e, tendo o Código Espanhol d e 1988 fixado q u e as leis n ã o teriam efeito re
troativo caso n ã o houvesse disposição e m contrário, foi e n o r m e a influên
cia deste diploma legal nos sistemas hispano-americanos.
Merlin foi u m dos juristas cuja obra exerceu grande influência no sé culo XIX, inclusive no Direito Brasileiro (Projeto Felício dos Santos) e sua doutrina, e m linhas gerais, fixou o seguinte:
I. o princípio geral é d e q u e as leis n ã o p o d e m retroagir.
II. h á casos e m q u e p o d e m retroagir:
a) qu a n d o revigoram leis preexistentes (efeito repristinatório ex
presso);
b) q u a n d o considerações d e o r d e m política levam o legislador a retroagir e m matéria de direito privado;
c) q u a n d o o legislador dispõe expressamente n o sentido d a re
troatividade.
A regra, todavia, é a d e q u e a lei n ã o po d e retroagir e, deste m o d o c a b e definir o q u e é retroatividade.
A retroatividade ocorre nas seguintes hipóteses:
1) quando a lei atinge o passado e o altera-,
2) quando tal mutação constitua prejuízo direto às pessoas, sujeitas à tutela da relação jurídica sob a égide da lei antiga. Tal prejuízo só ocor
re quando da supressão de direitos adquiridos.
Merlin define direito adquirido c o m o “aqueles que entraram no nos
so patrimônio, que dele fazem parte, e que não podem ser tirados por aque
le de quem o obtivemos".
Pontua o autor q u e os direitos distinguem-se das faculdades-, estas podendo ser conferidas pela lei o u pelos indivíduos. Q u a n d o estas já tenham sido exercidas e o seu objeto já tenha sido incorporado a patrimônio indi
vidual.
A d u z q u e "o legislador não constata quando confere uma faculdade, permite, mas não se obriga; conserva, pois, sempre, o direito de retirar a per- missãd'. T a m b é m define a expectativa d e direito c o m o a “esperança, ad
vinda de um fato passado ou de um estado atual de coisas, de gozar de um direito lorsqu’ il s’ ouvrira".
Classifica Merlin du a s formas de expectativa, a primeira oriunda da vontade individual o u de u m a lei revogável e a s e g u n d a exemplificada p e lo resultado d e u m contrato o u de testamento cujo autor já morreu, fixan
d o o entendimento q u e nestes casos está fora do alcance d e leis posterio
res, ainda q u e d e p e n d a d e condição.
Tal entendimento doutrinário m e r e c e críticas quanto ao conceito d e expectativa de direito eis que alinha paralelamente situações on d e o direi
to adquirido s e manifesta c o m as e m q u e ocorre m e r a expectativa.
A obra d e G a b b a
A p ó s o trabalho d e grandes juristas italianos, sobretudo a obra de Pa- cificio Mazzoni, o ponto alto das doutrinas se d e u c o m a obra d e G a b b a
“Teoria delia Retroativitá delle Leggi" (1® volume e m 1891; 2® e m 1897 e 3®
e m 1898).
N o primeiro volume ( Prolegomeni ) se encontram as linhas f u n d a m e n tais, resultado d e estudos d e Direito R o m a n o , Direito Canônico e Direito Comparado, se sedimentando a doutrina e m que "as leis não devem retroa- gii" e q u e "a razão e o verdadeiro limite da retroatividade das leis consis
tem unicamente no respeito ao Direito Adqulridd'.
A s dificuldades q u e o autor encontra para erigir a teoria s ã o a c o m plexidade dos institutos jurfdicos e a indeterminação do significado d e m u i tas expressões técnicas.
Gabba concorda e m q u e a teoria sobre a matéria não pode apresen
tar princípios absolutos, m a s q u e se deve buscar a fixação d e princípios g e rais d e aplicação aos casos concretos, variáveis de acordo c o m as circuns
tâncias eventuais.
Ensina o autor q u e os direitos adquiridos q u e quaisquer espécies de leis novas d e v e m respeitar, s e situam n o amplo espectro d a ciência jurídi
ca, n ã o s e circunscrevendo à qualquer área do direito.
A p ó s criticar os autores mais eminentes, se e m b a s a na seguinte con- ceituação d e Savigny.
"Direito adquirido é todo direito fundado n u m fato jurídico realizado, m a s q u e ainda s e faz valer".
S e g u e o raciocínio contrapondo tal definição às "faculdades abstra
tas" e às m e r a s “expectativas", esclarecendo q u e a noção de direitos a d quiridos n ã o abrange aqueles c o n s u m a d o s m a s "aqueles direitos que fo
ram adquiridos, mas não foram ainda efetuados ou consumados".
S e u próprio conceito é o q u e s e segue:
“É adquirido todo direito que — a) é conseqüência d e u m fato idôneo a produzi-lo, e m virtude da lei do t e m p o no qual o fato foi consumado, e m bora a ocasião d e fazê-lo valer n ã o tenha s e apresentado antes d a atua
ç ã o d e u m a lei n o v a sobre o m e s m o ; e q u e — b) nos te r m o s d a lei sob cujo império d e entabulou o fato d o qual se origina, entrou imediatamen
te a fazer parte do patrimônio d e q u e m o adquiriu".
Assinala q u e a expressão fato abrange fatos e relações jurídicas, que s e referiu a fato consumado pois se a origem (do fato) "não seja tão per
feita c o m o quereria a lei do tempo, esta lei n ã o po d e ter u m a eficácia que a lei posterior de v a respeitar" e q u e q u a n d o fala e m fazer parte d o patri
mónio procurou aclarar q u e o direito adquirido não s e confunde c o m "as me
ras possibilidades o u abstratas faculdades jurídicas, nem as simples expec
tativas".
S u a análise d o direito adquirido gira e m torno d e três noções:
1) d e direito concreto o u subjetivo;
2) d e direito c o m o elemento do patrimônio;
3) d o s fatos aquisitivos.
A primeira idéia se explica n o seguinte:
A afirmação d a existência d e u m direito pressupõe a existência de um fato (direito subjetivo) e d e uma lei (direito objetivo) q u e d o fato faça pro
vir u m direito.
S e m o fato, portanto, a lei constitui m e r a possibilidade, s e n d o certo q u e o direito concreto de v e se fundamentar n a lei vigente.
Quanto à segunda idéia d e que o direito é elemento d o patrimônio, d e ve haver distinção entre os q u e não têm caráter patrimonial, c o m o a tute
la e a menoridade, q u e representam m e r a possibilidade.
N o q u e tange à terceira idéia, dos fatos aquisitivos, d e v e m observar os seguintes requisitos:
1) q u e sejam completos;
2
) q u e t e n h a m sido implementados e m t e m p o idôneo;
3) q u e o agente tenha capacidade prevista legalmente;
4) q u e a s formalidades legais te n h a m sido observadas, sob p e n a de nulidade.
O s fatos aquisitivos p o d e m ser simples, ou seja, quando se c o n s u m a m instantaneamente, s e m sucessividade e complexos, c o m o o usucapião que pressupõe a prática d e vários atos dentro de u m lapso temporal, o u no c a s o d a sucessão testamentária quando h á o testamento de u m lado e a acei
tação d o herdeiro d e outro e, finalmente, q u a n d o a o ato d e v a se incorpo
rar evento cuja verificação está fora d o poder d o pretenso detentor, c o m o as transmissões unilaterais s o b condição.
C a b e indagar dentro deste contexto se a lei n o v a se projeta à s par
tes ainda inatingidas pelo fato aquisitivo complexo, advertindo Gabba não ser possível fixar critério absoluto pois a p e n a s c o m alguns casos o direi
to e m decurso se verifica, ficando a c o n s u m a ç ã o sujeita à presença o u não d e característica idônea, entendido c o m o tal q u e o fato n ã o verificado se ja infalível, q u e o q u e falta para aperfeiçoar a transmissão n ã o d e p e n d a d e q u e m tenha o interesse contrariado pelo fato e que a aquisição q u e se trans
m u d e e m c omplementação d o fato tenha a sua raiz e m u m direito anterior
m e n t e adquirido.
Afora tais situações, o que se t e m é u m a m e r a expectativa d e direito.
N o final d e sua obra Gabba e xamina a extensão d o direito adquirido s o b os ângulos d o s efeitos e conseqüências, as formas e m o d o s d e e x e c u ç ã o e d e garantias d o m e s m o e a duração no tempo.
C a b e aqui pontuar aspecto de s u m a importância prática representa
da por decisão d o S T F (ADIn 694-1-DF Acórdão, Se s s ã o Plenária 6.10.93) q u e julgou inconstitucional ato administrativo d e Tribunal c o n c e d e n d o rea
juste n o percentual de 2 6 , 0 5 % referente a o m ê s d e fevereiro d e 1989. O E x
celso Pretório s e b a s e o u n a inexistência d e direito adquirido.
Esta decisão é consoante a teoria de Gabba eis q u e o direito foi n e ga d o e m virtude de não implementada a condição subordinada ao lapso tem
poral. O direito e m questão n ã o se consumou, porque a Lei n. 7.730/89 foi promulgada antes do início de fevereiro d e 1989, atualizando as parcelas a este correspondentes, n ã o se p o d e n d o cogitar d e retroação.
Tal decisão, e m b o r a n ã o seja atinente a trabalhadores regidos pela C L T e sim funcionários públicos, passou a ser adotada nos conflitos envol
v e n d o os trabalhadores regidos por este diploma legal.
E m razão dos reiterados pronunciamentos d o Egrégio S u p r e m o Tri
bunal Federal, no sentido d a inexistência de direito adquirido, adveio o can
celamento d o E. 317 d o Tribunal Superior do Trabalho, através d a Resolu
ç ã o 37/94, publicada no D J U d e 25.11.94, n ã o h a v e n d o m a i s falar-se e m direito adquirido a o reajuste ( U R P d e fev./89), mas, tão-somente e m expec
tativa d o m e s m o .
A ob r a d e Paul Roubler
S u a doutrina foi exposta e m várias obras, s e n d o as principais “Dis
tinction d e l'Effet Rétroactiv et de Effet Immédiat d e la Loi", d a “R e v u e Tri
mestrielle", d e 1928, na obra "Le Conflit des Lois dans les T e m p s ”, publi
ca d a e m 1929 e 1933 e revista e a u m entada e m 1960 sob o título "Le Droit Transitoire” e finalmente n o trabalho "Droits Subjectifs” e "Situation Juri
dique”, d e 1963.
Roubier t a m b é m elaborou o Anteprojeto sobre o Conflito d e Leis no Tempo, apresentado à Com i s s ã o d e Reforma d o Código Civil d a França, e m
1949.
S u a teoria s e e m b a s a nos seguintes princípios:
1. " A ba s e fundamental d a ciência d o conflito das leis no t e m p o é a distinção entre o efeito retroativo e o efeito imediato d a lei."
2. “O efeito retroativo é a aplicação no passado; o efeito é imediato, a aplicação n o presente... S e a lei pretende aplicar-se a fatos realizados ela é retroativa; se pretende aplicar-se a situações e m curso é preciso e s tabelecer u m a separação entre a s partes anteriores e a data d a m u d a n ç a d a legislação que n ã o poderiam ser atingidas s e m retroatividade, e as par
tes posteriores, para as quais a iei nova, se lhes deve aplicar, n ã o terá ja
mais senão efeito imediato; enfim, à face dos fatos futuros é claro q u e a lei n ã o pode, jamais, ser retroativa."
3. " E m certas matérias, c o m o nos contratos e m curso, a regra é a s o brevivência d a lei antiga."
4. " O intérprete só po d e conceder efeito retroativo face à lei expres
sa. E m caso d a existência d e u m decreto concedendo efeito retroativo, de-
verá ser anulado por violação d e lei (art. 2® d o Código Civil Francês). S e tal espécie d e n o r m a previr a aplicação imediata, o c o m a n d o d e v e preva
lecer.”
5. “Para distinguir efeito retroativo d o efeito imediato deve ser enten
dida a noção d e situação jurídica (por exemplo, de proprietário, d e c o m p r a dor, d e herdeiro, etc....) q u e n ã o s e realizam de imediato, m a s se d e s e n volvem no tempo. Deste m o d o a lei po d e atingir partes anteriores (efeito re
troativo) o u partes posteriores (efeito imediato).
A situação jurídica t e m a fase dinâmica, q u e corresponde à etapa de constituição (ou extinção) ou a estática, último estágio e m q u e os efeitos s e produzem."
6. A lei p o d e objetivar a regulação d e condições de constituição (ou extinção) e, assim sendo, s e m retroatividade n ã o p o d e m apreciar a eficá
cia d e fato pretérito.
7. Q u a n d o se tratar d e lei objetivando a fixação n o presente dos efei
tos d e u m a situação jurídica, a situação anterior é regida pela lei antiga.
O Direito Brasileiro
O princípio d a irretroatividade está contido no art. 6® d o Decreto-lei n. 4.657, d e 4.9.1942, q u e dispõe: “A lei e m vigor terá efeito imediato e g e ral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.”
N a obra “Teoria Geral do Direito Civil”, d e Clóvis Bevilacqua, revis
ta e atualizada por Caio Mário da Silva Pereira (Editora Francisco Alves, 2*
ed.) se encontra e m nosso entendimento ensinamento claro sobre o tema, q u e procuraremos resumir.
Certo q u e a partir do m o m e n t o e m q u e a lei no v a se torna obrigató
ria surge o conflito c o m as que anteriormente regulavam a matéria e, a prin
cípio, a n ã o retroatividade e as regras do direito intertemporal apresentam a solução.
N ã o se afirma q u e a lei nova terá c o m o ponto d e referência ape n a s o s fatos futuros, m a s q u e os efeitos jurídicos derivantes d a lei anterior fi
c a m assegurados aos detentores dos direitos; porém, os atos reguladores d e situações semelhantes passarão a ter u m a nova forma d e tutela pela no
v a o r d e m jurídica.
N a vida social h á necessidade d e regras de verdadeira política jurí
dica e, deste m o d o , se de v e preservar o direito existente até o ponto e m q u e não constitua óbice às m u d a n ç a s culturais d a sociedade, que a nova lei pretende estabelecer.
Daí o princípio d a n ã o retroatividade estar contido na Constituição,
s e n d o ainda melhor explicitado n o citado art. 3® d o Código Civil e, a con-
seqüância deste sistema legislativo é q u e qualquer n o r m a d e caráter F e
deral, Estadual o u Municipal está sujeita a o c o m a n d o d a lei substantiva.
O direito adquirido se incorpora a o patrimônio individual e a não re
troatividade consiste e m princípio d e proteção.
A s s i m s e n d o d e v e m ser fixadas a l g u m a s regras, a saber:
a) O s direitos já realizados o u q u e estejam e m vias d e se c o n s u m a r mediante determinado prazo, são insuscetíveis d e alteração lesiva por n o v a lei;
b) É inviável q u e o arbítrio d e terceiro t o m e insubstistente o direito rea
lizado o u dependentes de prazo cujas condições preconizaram a inaltera
bilidade;
c) O s direitos adquiridos são vantagens individuais e n ã o p o d e m ser extintos m e s m o q u a n d o decorrentes d e supressão d a s condições e s s e n ciais e m q u e se c o n s u m a r a m . Exemplo: o servidor público que faz jus aos se u s vencimentos, m e s m o q u e alterado o u extinto o cargo q u e ocupava;
d) A s leis relativas a o estado e à capacidade pessoais, aplicam-se d e imediato a o s detentores das condições literalmente previstas, lhe c e d e n d o passo o direito anterior.
(Exemplo: se houver alteração quanto à responsabilidade penal d o m e nor, a lei no v a dirimindo a faixa etária se aplica de imediato).
C a b e comentar que e m se tratando d e o r d e m pública, a lei n o v a d e ve prevalecer, apesar de direitos dos detentores das condições previstas n a n o r m a revogada.
e) A s leis q u e extinguem instituições t ê m eficácia imediata.
O m e s m o comentário anterior c a b e c o m relação a este princípio.
f) "As condições d e validade, as formas d o s atos e os meios de pro
va dos atos jurídicos d e v e m ser apreciados d e acordo c o m a lei e m vigor, n o t e m p o e m q u e elas se realizaram" (obra citada, pág. 28);
g) A s leis políticas, as de jurisdição, de competência e regras proces
suais t ê m aplicação imediata, ainda q u e os atos te n h a m se iniciado n a vi
gência d a lei antiga, eis que estabeleceu no v a o r d e m jurídica. Todavia, há possibilidade d e flexibilização mediante disposições transitórias a critério d o legislador, q u e po d e atenuar seus efeitos;
h) E m s e tratando d e leis penais as atenuações se evidenciam, ha v e n d o p e n a s mais brandas nas leis novas ou até m e s m o disposições no sentido d e inventar atos q u e até então e r a m puníveis e deixaram de sê-lo (art. 3 S d o Có d i g o Penal).
O princípio d a irretroatividade d a lei é ligado à proteção constitucio
nal d o direito adquirido, d o ato jurídico perfeito e da coisa julgada e, d e s
te m o d o o próprio legislador fica subordinado a tal restrição. Todavia,
este postulado de v e ser consoante a questão d a aplicação imediata da lei,
vez q u e o aspecto formal a ser examinado é a consonância entre estes dois
princípios.
Várias teorias versaram sobre o tema; porém, conforme ressalta Dé- lio Maranhão n a obra ‘‘Instituições do Direito do Trabalho", a mais difundi
d a é a d o direito adquirido q u e p o d e ser resumida nos seguintes termos:
“Se uma controvérsia recai sobre um direito adquirido ao tempo da lei antiga, a lei nova não se aplica; se tiver como objeto um fato que sob o im
pério da lei anterior que constitua simples faculdade ou mera expectativa a ela se aplica a lei vigente."
O s juristas c h a m a m a atenção sobre a incerteza d a expressão “direi
to adquiridd', afirmando o jurista citado que a m e s m a é substancialmente tautológica, ou seja, vfcio d e linguagem q u e consiste e m dizer por formas diversas a m e s m a coisa.
Filadelfo de Azevedo fala e m “hipertrofia d o direito adquirido", o u s e ja, crescimento exagerado d a conceituação e aplicação.
N o e x a m e das regras que se referem a o direito adquirido s e verifica dicotomia entre o § 2® do art. 6® d a Lei de Introdução a o Código Civil, que considera adquiridos não s omente o direito q u e p o d e ser exercido por seu titular ou a l g u é m por ele c o m o os q u e t e n h a m "tempo fixado ou condição preestabelecida inalterável a arbítrio d e outrem", o q u e contradiz o art.
118do Có d i g o Civil q u e estabelece o seguinte:
"Subordinando-se a eficácia do ato e a condição suspensiva, enquan
to esta não se verificar, não se terá adquirido o direito a que ele visa."
Coviello, n a obra “Doctrine general dei derecho civil", tradução m e xicana, 1938, pág. 110, conclui q u e a n o r m a legal n ã o p o d e obrigar antes d e existir e por isso é lógico e justo q u e n ã o estenda sua eficácia aos fa
tos ocorridos antes d e s u a vigência.
Todavia, n a prática, a retroatividade existe pois há a possibilidade de a lei nova desconhecer as conseqüências já realizadas do fato ocorrido, des
truindo benefícios já c o n s u m a d o s e obstaculizando as consequências fu
turas d e u m fato con s u m a d o .
Fala o art. 6® d a Lei d e Introdução que são inatingíveis “as situações jurídicas definitivamente constituídas e a execução d o ato jurídico perfeito".
Para exemplificar a importância da questão no direito d o trabalho, o e xemplo mais evidente são as leis q u e criam os diversos planos e conômi
cos e q u e limitavam a concessão d e reajustes salariais q u a n d o já existiam situações preexistentes estabelecidas tanto protegidas pelo direito adquiri
d o (leis salariais determinando a observância dos índices de inflação inciden
tes sobre o s salários) c o m o cláusulas normativas decorrentes d e dissídios, acordos ou convenções estabelecendo observância das variações quantita
tivas futuras, estas exteriorizadas sob a forma d e ato jurídico perfeito.
Nesta questão t a m b é m cabe análises à aplicação d a cláusula rebus sic stantibus, sintetizada n a teoria d a imprevisão, n o sentido d e q u e eventos alheios à vontade das partes interessadas p o d e m instituir no v a o r d e m jurí
dica, derrogando as conquistas anteriores conforme c o m e n t a m o s no item d),
h á autores q u e d e f e n d e m q u e e m se tratando da o r d e m pública a lei nova prevalecer. N o tocante a princípio constitucional é certo q u e p o d e revogar direito adquirido se houver disposição expressa.
Aplicação imediata das leis de proteção ao trabalho
A s leis de proteção a o trabalho t ê m aplicação imediata pois ensejan
d o a m u t a ç ã o de institutos jurídicos as pactuações pretéritas p e r d e m sua b a s e eis q u e o legislador visa regular a situação d o s trabalhadores c o m o tais e n ã o c o m o contratantes. Tal explicação é válida n o sentido de se d e terminar sobre a diferença das n o r m a s d e direito civil e do trabalho, pois enquanto q u e as primeiras visam a proteção das condições contratuais e s tipuladas, as segundas objetivam primacialmente resguardar os direitos do trabalhador e m razão d a s u a hipossuficiência diante d a estrutura e c o n ô m i ca d o s meios de produção.
Bibliografia