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2⁰ Simpósio Internacional de História das Religiões XV Simpósio Nacional de História das Religiões ABHR 2016

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2⁰ Simpósio Internacional de História das Religiões XV Simpósio Nacional de História das Religiões

ABHR 2016

O fiel empreendedor, testemunha e ferramenta de marketing:

uma análise do discurso acerca dos congressos empresariais da IURD1

Sarita dos Santos Carvalho2

1. Introdução

Entre as igrejas neopentecostais do Brasil, a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) é a que mais cresceu desde sua fundação, em 1977, pelo Bispo Edir Macedo. Além de seu crescimento poder ser atribuído a um processo de difusão de novas religiões, ocorrido no final do século XX, talvez no processo de reencantamento do mundo com a chegada (ou o fim) do milênio, incontestavelmente a IURD soube usar do discurso (principalmente midiático) para atrair novos fiéis, usando de recursos radiofônicos, impressos, virtuais e televisivos – inclusive ocupando o lugar da primeira igreja brasileira a receber concessão de um canal de televisão, a TV Record – para se tornar a potência religiosa evangélica que é hoje.

Em trabalho de pesquisa para o Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, estudamos a eficiência da IURD como empreendedora religiosa, pautando-nos nos estudos de Leonildo Silveira Campos (1997), em seu livro Teatro Templo e Mercado, em comparação às técnicas

1Título de Pesquisa para o Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Ciências da Religião na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (SP), sob orientação do Prof. Dr. Breno Martins Campos; bolsa de financiamento CAPES.

2 Bacharel em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas-Unicamp; Bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Publicidade e Propaganda pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (SP) e discente do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Ciências da Religião na mesma Universidade, com bolsa de financiamento CAPES.

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de propaganda e marketing, elucidadas na obra de Brown (1965), Técnicas de Persuasão.

Para o estudo, separamos uma das programações da IURD que nos fornecesse elementos com os quais fosse possível uma análise que nos levasse à comprovação da eficiência do discurso da igreja na difusão das ideias e na manutenção da obra, bem como das próprias programações.

2. Congresso para o Sucesso: discurso de ideias ou ideias de discurso

Dentre os diversos programas da IURD estão os Congressos para o Sucesso. São encontros realizados às segundas-feiras no Templo de Salomão, sede atual da igreja em São Paulo, nos quais são realizadas palestras (ou sermões) específicos para aqueles que estão em busca de ascensão profissional, empreendedorismo, novas oportunidades no mercado de trabalho, para aqueles que anseiam por prosperidade financeira por meio do mercado de negócios. Nos Congressos para o Sucesso há um grande apelo para que o participante relacione uma vida plena de sucesso com seu envolvimento na Igreja Universal, sua dedicação profissional atrelada à sua participação como membro fiel da IURD – uma relação de fidelidade e prosperidade justificada pela Teologia da Prosperidade, que é a base teológica desta igreja.

Dentro deste “apelo” pela fidelidade, verificamos a presença de um discurso religioso marcante, no qual o sujeito religioso do discurso (o ministro, ou o bispo) toma a palavra como o representante de Deus, revelando, assim, a verdade instituída pela igreja e estabelecendo o degrau hierárquico entre a divindade e o sujeito fiel (aquele que deve ouvir, aceitar e acreditar na voz superior desta hierarquia). A incontestabilidade desta relação de hierarquia discursiva historicamente estabelecida, da voz divina sobre o fiel, dá legitimidade ao bispo e a tudo aquilo que ele sugere.

Da mesma forma, aquele fiel que seguiu as orientações do sujeito religioso e obteve êxito passa a exprimir uma voz de maior autoridade em relação àquele fiel que ainda não experimentou sucesso. Assim, o testemunho do fiel empresário de sucesso passa a uma posição que poderíamos chamar de intermediária entre a voz representativa da divindade

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(voz do bispo) e do sujeito fiel, encontrando-se, então, numa categoria privilegiada devido à sua experiência religiosa.

Desta forma, encontramos nos relatos de testemunhos dos fiéis dos Congressos para o Sucesso um peso de credibilidade que consideramos essencial como evidência de eficiência do programa, o que nos leva a pensar se os testemunhos são apenas uma parte litúrgica do programa (como ocorre nas liturgias pentecostais, o momento do testemunho fiel) ou se são realmente meios de propaganda e marketing religioso, propulsores indispensáveis para o sucesso do programa.

3. Objetivo

A possibilidade de participar de uma vida próspera, com a aprovação de Deus, podendo experimentar do Reino de Deus no hoje, nesta era, é a promessa que perpassa o discurso pós-milenista da IURD, pelo qual todo aquele que está sob a autoridade de Deus já deve e pode assumir os privilégios do Reino pleno, numa visão de escatologia do presente. O tempo da redenção é hoje, para aquele que se sabe escolhido, separado por Deus, para viver a plenitude da graça eternamente – assim, desde agora e para sempre. Os privilégios, então, para os salvos não estariam apenas em um paraíso distante e perdido, mas no aqui e agora, para que o fiel possa gozar de todos os bens e serviços desta terra da melhor forma possível.

Qual, então, é o efeito dos discursos do sujeito religioso e do sujeito fiel empreendedor sobre o público ouvinte ou, numa linguagem mercadológica, sobre o público alvo do Congresso para o Sucesso em relação a essa visão escatológica do presente? Pensamos que a influência da fala do fiel de sucesso funciona como mola propulsora para que novos fiéis se aproximem do evento, a fim de experimentar a veracidade da fala do outro de forma prática.

Objetivamos, com esta pesquisa, encontrar na fala, no discurso dos testemunhos fiéis empreendedores elementos que revelem essa intenção de influenciar o ouvinte a seguir seus passos, provar e testar a eficiência da fidelidade à IURD. Na possibilidade de encontrar esses elementos no discurso, poder-se-á fazer a relação entre igreja e mercado, sociedade e economia, no que se refere a uma relação de produção e consumo de bens e serviços que é

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parte de uma economia neoliberal difundida entre os países capitalistas e em desenvolvimento, como é o caso do Brasil.

4. A análise do discurso como método

Segundo Cruz e Mori (2011), em Teologia e Ciências da Religião, a religião é uma manifestação antropológica e histórica que pode e deve sujeitar-se aos métodos de pesquisa crítica. Assim, nos métodos da Análise do Discurso Linguístico (AD) encontramos condições favoráveis ao desenvolvimento desta pesquisa, já que a AD procura na materialidade linguística e histórica as interpretações possíveis para determinados conteúdos discursivos.

Entendemos que a AD procura o efeito de sentido na materialidade linguística e histórica, possibilitando ao analista sair da posição de leitor de conteúdos para a posição de compreender o funcionamento discursivo. Assim, podemos dizer que o sentido do discurso não existe em si, mas é determinado pelas posições ideológicas no jogo das palavras que são proferidas. A posição do fiel empreendedor, em seu discurso, interfere diretamente naquilo que é dito e silenciado (e este silenciado pode conter elementos reveladores sobre a ideologia dos Congressos iurdianos e as relações econômicas que por ele perpassam). A formação discursiva, portanto, é aquilo que, numa posição ideológica dada em uma conjuntura sócio-histórica dada, determina o que pode e deve ser dito (ORLANDI, 2003).

Para a pesquisa, analisamos os programas do Congresso para o Sucesso e estabelecemos um recorte material ainda mais objetivo dentro deste universo, que são os testemunhos dos empresários participantes destes congressos (testemunhos disponíveis no canal Youtube, no site da Universal, Folha Universal, CNT e TV Record). Para a análise, os textos dos testemunhos devem passar por um processo de dessintagmatização linguística, pela construção de famílias parafrásticas, das relações entre o dito e o não-dito, a fim de revelar a formação discursiva que domina os textos e, por meio delas, atingir a formação ideológica que os constitui.

Para ressaltar elementos que compõem a estrutura televisiva e midiática da igreja como fundamentalmente constitutivos da propaganda e do marketing, importa-nos avaliar e

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discutir o quanto o envolvimento com as técnicas de propaganda e marketing têm sido importantes para a difusão dos programas da IURD, bem como o quanto os programas são a própria ferramenta de marketing, a alavanca que promove o crescimento e manutenção dos programas e das ideias neles difundidas.

5. Discurso: o quê, para quem?

Através da análise do discurso dos testemunhos e da utilização que é feita deles pela IURD entendemos que há mais que elementos de comprovação de efeito positivo de uma experiência de vida. Relatar o que foi vivenciado, promovendo uma identificação da testemunha com o ouvinte, por meio da exposição das condições sociais – os mesmos tipos de dificuldades, os mesmos desejos, as mesmas tragédias (comuns a boa parte dos brasileiros desejosos de ascensão social) – estabelecendo uma relação de semelhança entre eles, é um elemento constitutivo para aceitação do sistema que é imposto como condição para a fidelização do crente iurdiano.

Assim, entendemos que o testemunho eficiente funciona como meio de convencimento para o comprometimento do sujeito leigo aos projetos da IURD, já que o testemunho é a prova cabal da probabilidade de sucesso de qualquer que se empenhe e se submeta ao mesmo projeto. Percebe-se que há grande efeito de persuasão na fala das testemunhas, talvez maior que da fala dos ministros palestrantes dos Congressos, porque, afinal, é a testemunha aquela pessoa comum – não a representante divina –, antes portadora dos mesmos problemas e ansiedades que, agora, representa a esperança de mudança de vida. Elementos da persuasão (BROWN, 1965, pp. 28,29), como a repetição de fatos, afirmações, apelo à autoridade divina, são recorrentes nestes testemunhos, a fim de reforçar ou gerar no outro a necessidade de se ligar e fazer parte do sistema.

O outro, que ainda não seja participante do sistema do Congresso iurdiano, está, assim, em desvantagem. A conversão do indivíduo e o convencimento se dá com base em um conflito mental e num sentimento de inadequação, “primeiramente de um sentimento de desagrado consigo mesmo” (BROWN, 1965, p. 212), que o impulsiona a copiar o modelo

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que ouve e adequar-se ao seu sistema para passar a fazer parte de uma comunidade de prestígio.

Assim, neste processo de convencimento e conversão, faz-se presente a voz da divindade (seja pelo sujeito religioso, seja pelo sujeito fiel empreendedor), na qual, enfim, se reconhece a fórmula do convencimento, da prosperidade e da salvação, uma voz divina que faz promessas cujas realizações nunca são postas em dúvida. Que peso, então, se pode encontrar nestes discursos que afirmam o sucesso e dos quais não se pode duvidar por serem eles a voz reconhecida da própria divindade?

Havemos, porém, de pensar nos casos em que não há sucesso – e não devem ser poucos –, mas que não são revelados nos mesmos processos midiáticos de antes. Os motivos? Primeiramente porque não é agradável ao ser humano divulgar seus fracassos, ainda mais quando, psicologicamente, estão atrelados a uma ideia construída de ineficiência do próprio envolvido – isto porque o discurso iurdiano da prosperidade põe nas mãos do fiel a responsabilidade de fazer todos os sacrifícios necessários e exigidos para, então, conseguir que Deus faça a parte dele. O fracasso, então, nunca seria culpa da divindade, mas dupla falência do (in)fiel – em não ter cumprido com sua parte e, por consequência, não ter alcançado o sucesso.

6. Com tantos (in)sucessos, para onde vamos?

Apesar da pouca revelação dos casos de insucessos iurdianos e das causas perdidas que, certamente, ocorrem não pela infidelidade das pessoas, mas por situações econômicas externas que fogem ao controle social, para onde caminhará essa religiosidade frustrada e desencantada com promessas e divindades mágicas?

Verificamos dois extremos conceituais nesta análise de sucessos e insucessos iurdianos: aqueles que, seguindo as regras e conseguindo ascensão social e econômica, fundem-se a uma vida de consumo e adequam-se ao sistema neoliberal, assimilando e assumindo como divina bênção o estado em que vivem; outros, porém, frustram-se com os insucessos, com as promessas religiosas, com a instituição igreja e com a sociedade, sem

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encontrar, por vezes, perspectiva de recolocação social e resgate de sua condição psicológica saudável para permanecer no sistema economicamente produtivo e (porque não) real da economia de mercado.

Surgem discussões acerca da responsabilidade do discurso religioso, pelo fato de que podem produzir, a longo prazo, comunidades de desencantados e desacreditados, frustrados com instituições e, ainda, rejeitados por aqueles que se encaixam ao sistema. Entendemos que o sistema iurdiano de incentivo ao empreendedorismo é alinhado ao sistema neoliberal, do qual não se espera um cuidado e preocupação com as minorias sociais, mas a continuidade da exploração de mão de obra em função do acúmulo de capital e geração de lucro para a minoria empreendedora.

Assim, entendemos que a religiosidade não se afasta de outros âmbitos sociais.

Estamos um passo além da secularização da religião, pois que esta já é parte na globalidade da vida econômica. Interessa à sociedade conhecer, questionar e avaliar as causas e efeitos, consequências muitas vezes irreversíveis de tamanhos projetos de incentivo ao sistema econômico exploratório como este que verificamos em certos discursos. Assim, importa-nos buscar e revelar aquilo que tem sido interpretado como divino (uma palavra divina) sendo apenas, mas não menor e menos eficiente, a palavra do homem, da instituição, da ideologia, do discurso religioso-econômico que sustenta uma potência.

Referências

BRONW, J.A.C. Técnicas de Persuasão. Da propaganda à lavagem Cerebral. Tradução de Octavio Alves Velho. Rio de Janeiro : Zahar, 1965.

CAMPOS, Leonildo Silveira. Teatro, templo e mercado. Organização e marketing de um empreendimento neopentecostal. Petrópolis : Vozes, 1997.

CRUZ, Eduardo Rodrigues da; MORI, Geraldo de. Teologia e Ciências da Religião. São Paulo : Paulinas, 2011.

ORLANDI, Eni P. Análise do Discurso, princípios e procedimentos. Campinas : Pontes Editores, 2003.

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