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Relatório de Estágio Profissional "Narrativas de uma estudante  estagiária: experiências e ilações para o ser professor"

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Academic year: 2021

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Narrativas de uma estudante estagiária:

experiências e ilações para o ser professor

Relatório de Estágio Profissional

Relatório de Estágio apresentado com vista à obtenção do 2º ciclo em Educação Física nos Ensinos Básico e Secundário, da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, ao abrigo do Decreto-Lei nº 74/2006, de 24 de março, na redação dada pelo Decreto-Lei nº 65/2018 de 16 de agosto.

Orientadora: Professora Doutora Paula Maria Fazendeiro Batista

Beatriz de Noronha Ferreira Porto, setembro de 2019

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Ficha de catalogação

Ferreira, B. (2019). Narrativas de uma estudante estagiária: experiências e ilações para o ser professor. Relatório de Estágio Profissional. Porto: B. Ferreira. Relatório de Estágio Profissional para a obtenção do grau de Mestre em Ensino de Educação Física nos Ensinos Básico e Secundário, apresentado à Faculdade de Desporto da Universidade do Porto

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III

Agradecimentos

Aos meus pais, pelo apoio incondicional e por contribuírem para aquilo que sou hoje (o bom e o mau). Por me amarem desde sempre e para sempre.

Aos meus avós, por sempre me incentivarem a ser uma melhor pessoa, por todos os mimos e recortes de papel.

À minha família, por nunca terem duvidado de mim.

Ao João, por ser a pessoa fantástica que é, e por me fazer ambicionar ser melhor. Pelos telefonemas de madrugada, as lágrimas e dúvidas desvanecidas. Por ser a minha ancora.

Aos meus amigos da licenciatura, pelos momentos incríveis que passamos e pelos momentos menos bons que nos levantámos juntos. Por tudo aquilo que passámos, sempre.

Aos meus amigos de mestrado, por não me terem deixado sozinha, terem feito deste percurso, um percurso mais feliz, recheado de histórias para lembrar.

Ao meu grupo de amigos “de fora”, por me ter acompanhado sempre. Pela amizade, pelo carinho, conselhos e palavras.

À professora Paula Batista, pela paciência, disponibilidade, abertura e pela confiança que demonstrou.

À professora cooperante, Catarina Cachapuz, pela amizade, amabilidade, força e constantes palavras de conforto, mesmo nos momentos em que duvidada de mim.

A todos os professores e auxiliares da escola cooperante, por terem sido prestáveis, dedicados, preocupados e por me terem mostrado o que era uma escola de excelência. Pelos ensinamentos, “conversas ao café”, por todo o apoio, sem esperarem nada em troca.

Em especial, à minha turma, aos meus meninos, por terem feito de mim uma professora cheia de orgulho. Pela forma como me receberam, e por terem

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IV duvidado de mim. Porque essa dúvida, fez com que quisesse crescer, quisesse vos mostrar que era capaz. Pela confiança mais tarde que demonstraram, e pela saudade que deixaram.

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V

Índice

Agradecimentos ... III Índice de Tabelas ... VII Índice de Gráficos ... VIII Índice de Quadros ... X Índice de Figuras ... XII Índice de Anexos ... XIV Resumo ... XVI Abstract ... XIX

Introdução ... 1

1.Enquadramento Pessoal ... 5

1.1. Me, Myself and I ... 7

1.2. “Expect the Unexpected” ... 11

2. Enquadramento Profissional ... 15

2.1. O que é o Estágio Profissional? ... 17

2.2. Acerca da legitimação da Educação Física ... 18

2.3. Acerca de uma conceção de Educação Física ... 22

2.4. Aprender em Educação Física... 24

2.5. A escola como instituição ... 26

2.6. Desafios da Escola no séc. XXI ... 28

2.7. Desafios do Professor no Séc. XXI ... 30

2.8. Contexto escolar ... 33

2.8.1. A minha escola ... 33

2.8.2. O Departamento de Expressões ... 37

2.8.3. O Grupo de Educação Física ... 38

2.8.4. O núcleo de estágio ... 39

2.8.5. O meu 7ºano: um verdadeiro desafio ... 41

2.8.6. O 10º ano de escolaridade: um osso duro de roer ... 44

2.8.7. O 6º ano de escolaridade: motivar, motivar e motivar ... 45

2.8.8. O 2º ano de escolaridade: os pequeninos irrequietos ... 47

3. A prática de ensino ... 51

3.1. Os medos iniciais ... 53

3.2. Palavra de ordem: planear ... 53

3.3. Antes de começar (a sério) um olhar sobre… ... 54

3.3.1. … o Programa de Educação Física ... 54

3.3.2. … as Aprendizagens Essenciais (AE) e Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória (PA) ... 56

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VI

3.4. O ensino das diferentes modalidades ... 60

3.4.1. O jogo de Andebol: a segurança e a motivação ... 60

3.4.2. A Ginástica Rítmica: o trabalho em projeto ... 64

3.4.3. O Atletismo: o verdadeiro trabalho por estações ... 67

3.4.4. Ginástica de Aparelhos e Ténis de mesa: a simbiose entre 2 mundos 69 3.4.5. Orientação: encontra-me se puderes ... 72

4.Ser professor para além das aulas ... 75

4.1. Direção de turma ... 77

4.1.1. Reunião com os pais ... 77

4.1.2. Reuniões do conselho de turma ... 78

4.1.3. Desporto Escolar – “a minha força” ... 79

4.1.4. Atividades desportivas promotoras de exercício físico ... 82

5. Desenvolvimento Profissional ... 87 5.1. Formação pessoal ... 89 6. Estudo de Investigação ... 93 6.1. Introdução ... 95 6.2. Enquadramento teórico ... 96 6.3. Objetivos ... 101 6.4. Metodologia ... 102 7. Um até já… ... 115 8. Referências Bibliográficas ... 119 9. Anexos ... 125

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VII

Índice de Tabelas

Tabela 1 - Resultados da Prova 1 - Equilíbrio ... 105

Tabela 2 - Resultados da Prova 2 - Salto para um plano superior ... 106

Tabela 3 - Resultados da Prova 3 - Rolar o arco ... 106

Tabela 4 - Resultados da Prova 4 – Saltar à corda ... 107

Tabela 5 - Resultados da Prova 5 - Rolamento à frente ... 107

Tabela 6 - Resultados da Prova 7 – Toques de sustentação com raquete ... 108

Tabela 7 - Resultados da Prova 9 – Condução de bola... 108

Tabela 8 - Resultados da Prova 10 – Passe e receção da bola ... 109

Tabela 9 - Resultados da Prova 11 – Jogo das “Tocas” ... 109

Tabela 10 - Resultados M ABC-2 ... 110

Tabela 11 - Correlação entre Resultado Padrão Total e as Provas de Aferição ... 111

Tabela 12 - Correlação entre RPT Destreza Manual e Provas de Aferição ... 111

Tabela 13 - Correlação entre RPT Atirar e Agarrar e Provas de Aferição ... 112

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IX

Índice de Gráficos

Gráfico 1 - Modalidades que os alunos praticam regularmente ... 43 Gráfico 2 – Modalidades que os alunos gostariam de experimentar ………. 43 Gráfico 3 - Fase sensível de desenvolvimento……….………..…………...…99

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XI

Índice de Quadros

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XIII

Índice de Figuras

Figura 1 - Características estruturais do ME………...……….…63

Figura 2 - Ficha de avaliação diagnóstica de Ginástica Rítmica... 65

Figura 3 - Ficha de Avaliação de Atletismo... 68

Figura 4 - Ficha de tarefa de Trave...70

Figura 5 – Atividades realizadas pelo Grupo de EF………..………….……….82

Figura 6 - Atividades do Desporto Escolar... 83

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XV

Índice de Anexos

Anexo 1 - Bateria de Testes M ABC-2: banda de idade 2 ... 127

Anexo 2 - Bateria de Testes M ABC-2: banda de idade 2 (cont.) ... 128

Anexo 3 - Tarefa 1 e 2 das provas de aferição ... 129

Anexo 4 - Tarefa 3 e 4 das provas de aferição ... 130

Anexo 5 - Tarefa 5 e 6 das provas de aferição ... 13131

Anexo 6 - Tarefa 7 e 8 das provas de aferição ... 132

Anexo 7 - Tarefa 9 e 10 das provas de aferição ... 133

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XVII

Resumo

O estágio profissional é o momento culminante da formação inicial do professor, representando o choque entre a teoria (o que foi aprendido nos anos de formação) e a prática (o contexto real). Este choque inicial retrata a dificuldade de se ser professor e a imprevisibilidade que o estudante-estagiário enfrenta na imersão dos contornos da profissão, nos mais diversos domínios. O presente documento espelha a vivência do estágio de uma jovem cujo sonho é ser professora. As vicissitudes, as alegrias, as frustrações, os ensinamentos, as lágrimas e as promessas feitas durante um ano intenso de exercício da profissão docente, materializam o experienciado pela estudante estagiária. Este foi um ano rico em aprendizagem, em que a comunicação, a partilha e a união assumiram um papel central. O estágio foi realizado numa escola, da região do grande Porto, num núcleo de estágio constituído por três estudantes-estagiários, sob a orientação da professora cooperante, que nos incentivou a ser criativos e fazer as coisas de forma diferente, centralizando, sempre que possível, o processo de ensino-aprendizagem no aluno. Os trabalhos multidisciplinares, as autoavaliações diagnósticas, os trabalhos em projeto e o processo de autorregulação da aprendizagem por parte dos alunos, foram os marcos do processo de preparação e realização do ensino. As experiências com outras turmas, o desporto escolar e diversas atividades desportivas, também são reportadas. É ainda apresentado um estudo de investigação no contexto do 1º ciclo do ensino básico que visou analisar a literacia motora dos alunos.

PALAVRAS-CHAVE: EDUCAÇÃO FÍSICA, ESTÁGIO PROFISSIONAL, PROFESSOR, ALUNO, SER DIFERENTE

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XIX

Abstract

The school placement is the crowning moment of the initial teacher education, representing the clash between theory (what was learned in the formative years) and practice (the real context). This initial shock portrays the difficulty of being a teacher and the unpredictability that the preservice teacher face in the immersion of the profession's contours, in several domains. This document reflects the practicum experience of a young woman whose dream is to be a teacher. The difficulties, the joys, the frustrations, the teachings, the tears and the promises made during an intense year of teaching profession practice, materialize the experience lived by the preservice teacher. This was a year rich in learning, in which communication; sharing and unity took the center stage. The school placement was carried out at a school in Porto region, within a group of three preservice teachers, under the guidance of the cooperating teacher, who encouraged us to be creative and to do things differently, centralizing, whenever possible, the teaching-learning process in the students. Multidisciplinary work, self-diagnostic assessments, project work and the learning self-regulation process by the students were the milestones of the teaching preparation and realization process. Experiences with other classes, school sports and the participation in sports activities are also reported. It is also presented a research study in the context of the 1st cycle of basic education that aimed to analyze the motor literacy of the students.

KEY-WORDS: PHYSICAL EDUCATION, PRACTICUM TRAINNING,

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Lista de abreviaturas

A_A – Atirar e agarrar

AE – Aprendizagens Essenciais

CONFAP – Confederação Nacional das Associações de Pais DE – Desporto Escolar

DM – Destreza Manual DP – Desvio-padrão DT – Diretor de Turma EE – Estudante-estagiário

EEFM – Expressão e Educação Física e Motora EF – Educação Física

EP - Estágio Profissional Eq - Equilíbrio

EVT – Educação Visual e Tecnológica

FADEUP – Faculdade de Desporto da Universidade do Porto FIFA – Federação Internacional de Futebol

M ABC-2 – Movement Assessment Battery for Children (second edition) MED – Modelo de Educação Desportiva

MID – Modelo de Instrução Direta NE – Núcleo de Estágio

PA - Perfil do Aluno à saída da escolaridade obrigatória PNEF – Programa Nacional de Educação Física PTT – Professor Titular da Turma

RPT – Resultado padrão total

SPSS – Statistical Package for the Social Sciences UEFA - Union of European Football Associations

UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

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3 Este documento foi elaborado no âmbito da unidade curricular: Estágio Profissional, pertence ao 2º ciclo de estudos em Ensino de Educação Física nos Ensinos Básico e Secundário, na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP).

Este documento espelha a minha jornada enquanto professora neste ano letivo, jornada essa rica e recheada de verdadeiros momentos de aprendizagem, quer a nível pessoal, social e profissional. Momentos que me fizeram duvidar se seria capaz de combater a minha “sensibilidade aguda - sensibilite”, momentos que me fizeram questionar sobre o porquê de estar ali, se seria o local certo para mim, momentos que me fizeram refletir sobre as minhas conceções e pensamentos.

Em relação à organização do relatório, optou-se por acrescentar algo. Há segredos e segredos… há aqueles que são só nossos… que não devem ser sabidos por outrem… tentamos afastar logo o pensamento porque alguém pode saber, perceber, adivinhar… porém também há aqueles que é impossível não partilhar… que queremos contar a toda a gente… e são esses que quero partilhar… quero que me conheçam… quero que saibam o que é para mim ser (professor) … ou pelo menos como eu quero ser… quero que percebam o que retirei de cada capítulo. O segredo ou o ensinamento que cada capítulo deu para me tornar melhor professora, para construir uma identidade profissional. Todavia espero que não me considerem arrogante… porque cada um tem os seus métodos, o seu estilo, a sua forma de ver e encarar as situações… na realidade, cada um tem… os seus segredos… por isso acompanhem-me nesta viagem.

O documento está estruturado em 6 capítulos: o primeiro denominado de “Enquadramento Pessoal, retrata uma autoscopia relativa às minhas vivências pessoais e desportivas e o que esperava do estágio. O segundo capítulo “Enquadramento Profissional” apresenta alguns temas contemporâneos à escola e mostra um pouco do contexto escolar onde estive inserida, abordando as várias experiências com as turmas. O terceiro “A prática de ensino” narra todo o processo de ensino-aprendizagem desde a planificação até à avaliação focado nas diferentes modalidades. O quarto capítulo “Ser professora para além das aulas” expressa as atividades de participação com a comunidade

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4 educativa, como as reuniões, as visitas de estudo, as atividades desportivas e o desporto escolar. O capítulo cinco: “Desenvolvimento Profissional” manifesta a importância de alterar algumas práticas de ensino. Inclui ainda, o estudo de investigação que foi realizado no âmbito das aulas com o segundo ano. Por último, o capítulo seis “Um até já…” espelha as promessas que faço aos meus passados e futuros alunos.

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1.1. Me, Myself and I

O meu nome é Beatriz de Noronha Ferreira e tenho 23 anos. Nasci no dia 16 de janeiro de 1996, na cidade do Porto. A minha ligação ao desporto começou com apenas 3 anos, quando fui para o ballet. Era o que as minhas amigas praticavam e eu fui por “arrasto”. E ali fiquei… 16 anos. Ao mesmo tempo, fui ter aulas de natação, porque “todos os meninos devem saber nadar!”. Eu gostava da água, mas verdade seja dita não era pelas aulas, era por ser diferente. Abandonei a natação quando a missão de “saber nadar” estava cumprida.

No decurso do 3º ano foi crescendo um carinho especial pelo futebol. Hoje em dia, “culpo” os meus pais e o meu padrinho. Mas ainda bem que geraram em mim este “bichinho”, pois o carinho, foi tornando-se curiosidade, que passou para gosto e hoje em dia, é uma paixão. Cheguei a praticar futebol num clube, porém foi uma brevíssima passagem, pois na altura tinha muitas atividades (conservatório de música, ballet e catequese) ao mesmo tempo. Assim, o futebol acabou por ficar para trás.

Até entrar para a faculdade apenas andei em duas instituições de ensino: o Externato Despertar até ao 4º ano e mais tarde, o Colégio Nossa Senhora da Paz do 5º ao 12º ano. Acredito que esta estabilidade e que os bons profissionais de Educação Física me ajudaram a encontrar o meu caminho no desporto. Nas aulas e recreios, “jogar com os rapazes” era uma opção, bem como a participação assídua nos torneios de ténis de mesa e matraquilhos e adorava (mesmo não ganhando)! Comparando com outros miúdos, a verdade é que não tive muitas experiências desportivas (algo que hoje em dia, defendo bastante). Admito isso, e acho que foi um erro da minha parte. A verdade é que tinha outros interesses como a música e a catequese e, por isso, andei 3 anos no Conservatório, (na realidade são 18 anos envolvida com a música: piano e coro) e 16 anos na catequese.

Sou pessoa de resmungar, de me queixar, de desanimar, e precisar de incentivo, mas não sou pessoa de desistir. Ao longo do percurso, a música era, e ainda é, o meu refúgio (“desaparecer por momentos”, todos precisamos, por

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8 vezes, de um modo de fugir, torna-nos mais sãos), ensinando-me a ter a calma necessária para enfrentar algumas situações e, de certo modo, a saber lidar com o fracasso. Não obstante esta aprendizagem, o último ano no conservatório foi um ano bastante complicado porque já não tinha prazer em tocar piano, e essa desmotivação fez com que duvidasse mais de mim.

Já o ballet ajudou-me na construção de relações de amizade e no conhecimento dos meus limites - até onde conseguia ir e até onde queria ir. Dezasseis anos são muitos anos e vi muitas colegas a desistirem, outras a entrar… e este vai e vem fez-me querer avançar sempre um pouco mais, lutar por algo mais, tentar chegar mais longe.

Noutro polo, a catequese ajudou-me a compreender um pouco mais o mundo, as pessoas, as verdades e as mentiras. Acreditar em algo, seja o que for, fez-me uma pessoa mais paciente, mais afetiva e até mais compreensiva.

No 9ºano realizámos os Testes Vocacionais para aferir qual seria a melhor área para seguir no futuro. Vou ser franca: não tinha ideia nenhuma do que queria seguir. Estava um bocado cética, mas também ansiosa com o que poderia sair dali. Os testes mostraram duas opções com resultados destacáveis: a Música e o Desporto. Hmm… Música… Desporto… Os resultados “acenderam” qualquer coisa cá dentro. Mediante todo o meu percurso até àquele momento, a decisão a tomar não estava clara. Estava muito dividida entre as duas opções pois ambas as áreas eram do meu interesse. O que mais me afligia era tomar uma decisão que mais tarde me viesse a arrepender. Só queria que alguém me ajudasse, afinal somos influenciados pelas opiniões dos outros…

O ser humano e a sociedade interrelacionam-se e de alguma forma condicionam-se comportamentalmente. Esse condicionamento provoca alterações e transformações nos dois sistemas vivos (Milheiro, 2012). Não é possível assumir os dois como entidades que (sobre)vivem separadas, na medida em que fazem parte um do outro, pois não podem viver um sem o outro. De acordo com Morin (1991), o imprinting cultural é uma marca imposta ao humano por uma determinada cultura e cada um apresenta um imprinting diferente pois resulta das vivências pessoais. Assim, pode-se assumir que cada

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9 um de nós se apresenta com especificidades únicas e intransmissíveis, na medida em que duas pessoas numa mesma cultura, podem ser diferentes entre si. Desta noção surge uma outra: socialização latente ou socialização antecipatória. Segundo Merton e Maillet (1970), este tipo de socialização assume-se como a adoção de atitudes e valores de um grupo ao qual não se pertence, tendo como objetivos facilitar a entrada nesse mesmo grupo e apressar o processo de ajustamento depois de se tornar membro. Outros autores defendem que é uma socialização que prepara o indivíduo para uma vida profissional ativa. No entanto, esta socialização latente desenvolve-se através de um continuum existencial, ou seja, ainda em idades muito precoces, através da família e mais tarde amigos e professores, até à entrada na vida profissional.

Esta socialização permitiu-me tomar esta decisão tão importante. A influência dos meus pais (até certo ponto como positiva), a ida para o ballet porque as amiguinhas também iam e o “empurrar” para a natação porque respeitava as normas da sociedade foram fazendo crescer qualquer coisa em mim. Mas nem toda a socialização é positiva. O ceticismo da minha mãe em apostar numa via como a educação, ainda por cima em educação física. Educação, uma via tão descreditada por todos, educação física nem “contava para nota”, a falta de empregabilidade e a constante mudança de lugar eram fortes razões para pensar duas, três e quatro vezes. O tentar mudar de ideias, a imposição de dúvidas fizeram-me hesitar muitas vezes. Seria a opção certa para mim, seria eu capaz de aguentar?

Todavia, tomada a decisão de entrar, tive que ir treinar, e o último ano de secundário foi um ano de treino intenso. Tinha que mostrar que era mesmo aquilo que queria. Voltei às aulas de Natação, treinei para Atletismo e participei nas aulas de preparação de ginástica dinamizadas por alunos da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP). O tempo passou, a decisão não mudou (penso que a minha mãe tinha esperança que por algum motivo a minha decisão se alterasse, porém não teve muita sorte!) e o dia chegou! ENTREI! Parecia que tinha conquistado o mundo! Que sensação!

Quando entrei na faculdade de desporto a minha ideia era ser professora. Eu sabia que queria trabalhar com crianças. Já tinha tido

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10 experiências e tinha adorado. Participei em campos de férias como monitora e foi incrível. Estagiei com idosos e doentes oncológicos no 3º ano da licenciatura e foi das melhores experiências da minha vida. Por isso, era mesmo o trabalho com o outro que queria, pelo que a escolha do mestrado em ensino era inevitável.

Gosto do ideal de que uma pessoa pode mudar o mundo! Dirão que é inocente e ingénuo da minha parte. E se calhar… é mesmo! Mas essa hipótese fascina-me! Julgo que devemos pensar assim! Uma pessoa pode fazer a diferença. E eu quero ajudar a construir essa diferença. Não quero ser a diferença, quero ajudar a que outros possam criar diferença. O professor é a base. Todos tivemos professores bons, maus, que criavam, outros reproduziam, que fascinavam, que irritavam… Porque todos fomos alunos. E fomos influenciados de uma maneira ou de outra. E o desporto é capaz de nos dar tanto: o sacrifício, a superação, a cooperação, o fair-play, a humildade, a comunicação, nunca desistir são palavras de ordem no mundo do desporto. E, provavelmente, esta transmissão de valores é a melhor contribuição da educação física/desporto para a formação de crianças e jovens (e até mesmo adultos).

Todavia, eu sei que o mundo não é todo cor-de-rosa. E ainda não sei muito bem como transmitir isto tudo. E por isso, o primeiro passo que realizei no início do estágio foi fazer uma introspeção, para procurar perceber do que era capaz e o que ainda tinha que aprender. Primeiro, considero-me uma pessoa de relação. Gosto de me relacionar com as pessoas, de criar ligações. E com os meus alunos não poderia ser diferente. Não queria que fosse diferente. Porque a relação é capaz de aproximar as pessoas, de as motivar, de as encorajar, de fazer mudar. Quando demos aulas na escola no primeiro ano de mestrado, uma das minhas maiores desilusões foi o facto de não ter conseguido estabelecer uma relação/ligação com os miúdos e isso deixou-me frustrada (as aulas foram poucas e os alunos faltavam). O processo de ensino-aprendizagem não flui, parece que não existe evolução. A minha pouca “experiência” diz-me que ter essa relação melhora a aprendizagem. Todas as aulas que dei, quer a grandes ou pequenos, foi assim que atuei. E os resultados foram positivos!

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11 No início do ano e através de um processo autorreflexivo, destaquei os 3 principais óbices que poderiam pôr em causa a minha competência enquanto professora. Primeiro, e se calhar o mais incapacitante, era o medo de errar. Faz-me parecer fraca. Como se tivesse falhado, perdido. E não suporto perder. Contudo o erro faz parte. E queria aprender a errar e a saber lidar com isso. Queria saber lidar com a frustração, com este pensamento de fraqueza.

Outras das minhas dificuldades é ser sensível. Sou um “coração mole”. E isso por vezes, pode-me fazer ser/parecer injusta. Porque ser sensível é o que permite o contacto humano, as emoções, os sentimentos, os choros, a interação, a relação. E isso eu não queria perder, mas também sabia que tinha que me saber controlar nesse aspeto. Teria que, em algumas situações, ser mais fria, menos “íntima”, esconder um pouco mais de mim.

Por último, tinha a necessidade de me “fazer entender” perante os alunos, ou seja, não era um problema de falta de comunicação, mas sim conseguir focá-los nos aspetos que eu queria. Fazer com que me ouvissem desde o início ao fim. Mas mais do que isso, (e isso talvez se desenvolva com a experiência) era saber quando dar feedbacks, qual seria o momento oportuno ou até antever alguns comportamentos desviantes dos alunos.

1.2. “Expect the Unexpected”

O primeiro ano de mestrado alicerçou-me de algumas competências no campo da docência e da pedagogia que certamente seriam úteis durante a prática em contexto real. Essas competências estão dispersas por áreas diferentes: o saber trabalhar em equipa e a capacidade de adaptação e de resolução de problemas. Estas habilidades estão mais relacionadas com a prática, mas não nos podemos esquecer das capacidades antes da própria prática e por isso aptidões no planeamento, organização e criatividade dos exercícios, assim como o saber teórico e tecnológico fazem sempre parte do quotidiano do professor.

Esperava que o estágio me trouxesse muito. O estágio é uma ponte para a vida de professor. É o fim e o início. É o fim da formação inicial e o início da

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12 vida como professor. É um estado constante de exaltação e depressão (não quero que seja de outra forma). É o primeiro contacto com uma turma. Uma turma que eu posso dizer: “É minha!”. Uma turma que me vai tratar por “stôra”. E vou gostar de ouvir isso! Porque é diferente. Porque sentimos um sentimento de presença, e principalmente, de pertença. Ter que conhecer os miúdos, ir a reuniões, relacionar com outros professores, partilhar conhecimentos, interagir com os encarregados de educação.

Desta forma, a minha expectativa inicial baseava-se na possibilidade de vivenciar diferentes experiências. Porque todos são diferentes, os métodos diferentes, as práticas diferentes, os contextos diferentes. Porque dar é receber! E quanto mais der de mim à escola, à comunidade escolar, ao professor cooperante, aos alunos, mais todos os agentes de socialização poderão retribuir. E assim o mundo evoluiu, o mundo (escolar) muda…

Esperava também que houvesse oportunidades para tentar suprimir ou ultrapassar as dificuldades supramencionadas, principalmente o medo de errar. A professora cooperante disse num dos primeiros dias “O erro é a alavanca do conhecimento”. A frase ficou-me na memória. Fazia sentido e queria abraçar a ideia, pois acreditava que me tornava melhor. Face a esta ideia, esperava aprender com os erros. Porém, não podíamos cair no erro de pensar que “errar é humano” como uma desculpa para erros sucessivos e frequentes, pois “corrigir também o é”. O que importa é que através da reflexão possamos corrigir e, eventualmente, aprender. Um professor reflexivo é um professor que admite os pontos fortes, assume os pontos fracos e altera a sua forma de pensar (quando confrontado com o erro ou diferentes pontos de vista).

Esperava poder compreender um pouco mais o universo de ser professora (principalmente por se tratar de um contexto real, com alunos reais), nos aspetos do trabalho em equipa com diferentes pessoas (com diferentes vivências pessoais e profissionais), da adequação da comunicação a uma situação específica e na capacidade de cativar um aluno (ou professor) para algo.

Em relação ao núcleo de estágio, esperava poder contar com eles para o que fosse preciso. Partilhar experiências e conceções, trabalho de grupo,

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13 companheirismo, desabafos e confissões. Todos temos percursos diferentes e áreas diferentes e isso será (sempre) uma mais valia.

Relativamente à professora cooperante, julgava que teria certamente um papel preponderante. Esperava que me criticasse, corrigisse, que mê desse o máximo de feedback possível. Que partilhasse as suas experiências, dê-se conselhos, que fosse um membro ativo durante o nosso processo de aprendizagem. Que servisse de exemplo, nas suas práticas, e conquistas. No que diz respeito à professora orientadora, esperava um feedback das aulas assistidas assim como de todos os trabalhos pedidos ao longo do ano, de modo a poder ir melhorando.

Em suma, e utilizando a superstição utilizada nos casamentos “novo, velho, emprestado e azul”, se virmos bem, não deixa de ser o início de uma nova fase, pelo que desejava que fosse um confronto entre o novo (alterar o que não se faz bem) e o velho (reaproveitar o que se faz bem), juntamente com o empréstimo (partilha) de algumas ideias e experiências. O azul assumiremos sempre como a felicidade e assim desejava que fosse algo prazeroso para todos (estudantes estagiários, professora cooperante e orientadora, professores da escola cooperante e os alunos).

ENSINAMENTO

“Somos o que fazemos, mas somos sobretudo o que fazemos para mudarmos o que somos”

Eduardo Galeano

Esta frase espelha a importância do “fazer para mudar”. Para se reinventar. Para se transformar. Somos claramente, produto de um passado, mas também de um presente e de um futuro. De um futuro, onde deve haver espaço para mudar. O professor deve repensar as suas práticas. As suas formas de ver, para poder melhorar enquanto pessoa e profissional.

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2.1. O que é o Estágio Profissional?

O estágio em contexto real de ensino é considerado na literatura como uma das componentes mais importantes nos processos de formação inicial de professores (Chepyator-Thomson & Liu, 2003; Fan Tang*, 2004; Hill & Brodin, 2004; O’Sullivan, 2003).

O estágio profissional é a última etapa da formação inicial de qualquer professor. É a ponte para o mundo real. É um momento de intensa formação, de constante (re)construção, de saber liderar e organizar o processo de ensino-aprendizagem e de permanente contacto com o contexto real. É neste momento que a teoria aprendida se vai aliar à prática e ao contexto e dotar o professor de competências. Este procedimento é visto como um “choque com a realidade” (Veenman, 1984). É o culminar de um processo longo e cheio de pequenas experiências.

Stones e Straker (2006) referem que graças à simbiose entre o ambiente profissional e a partilha com profissionais experientes, as aprendizagens profissionais são adquiridas mais facilmente. A relação com os profissionais experientes deve ser aproveitar por ambas as partes: os mais novos para poderem perceber melhor o funcionamento burocrático de uma escola, acompanharem diferentes métodos de ensino, beberem um pouco daquilo que é o contexto real, enquanto os mais experientes devem tentar conhecer novos modelos, renovar até algumas práticas e aprender renovadas correntes de pensamento. Esta ligação entre estudantes-estagiários (EE) e professores experientes deve ter por base a partilha e a comunicação.

O EE não se deve preocupar apenas com a aquisição de conhecimentos e competências pessoais, pois o estágio é o momento certo para refletir criticamente sobre alguns assuntos - “Como motivar? Que modelo usar? Ser mais diretiva ou amiga? Como encontrar esse equilíbrio? Como proceder em situações de bullying?” - estando num estado de permanente questionamento. Wittrock e Association (1986) defendem que o ensino não é apenas da responsabilidade do professor, mas também deve envolver o formando num processo ativo de saber. Essa aprendizagem tem que ser um processo de

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18 construção, desconstrução e reconstrução de novos conhecimentos e práticas (Batista, 2011).

O estágio é também um instrumento capacitador e dotador de ferramentas que auxiliem a desenvolver a experiência refletida e com significado, sempre com vista ao futuro do professor (Batista & Queirós, 2015).

O estágio profissional permite que cada professor crie uma imagem representativa do que é a escola, e mais significativo do que isso, do que deve ser a escola, pois a realidade de cada um é pessoal, subjetiva e singular. Esta imagem pode (e deve) ser alterada ao longo do tempo de carreira profissional pois as variáveis envolventes também se alteram. O contexto escolar, os colegas docentes, os alunos, as práticas, as mentalidades, os saberes, as aprendizagens, as exigências da sociedade, tudo isto é mutável… e a imagem deve acompanhar sempre essa instabilidade.

Com a aproximação ao contexto real, apreende-se a “trilogia do saber”: a aquisição de um saber, de um saber fazer e de um saber refletir sobre os erros das ações pedagógicas no quotidiano profissional (Barros, 2012).

Braga (2001) acredita que uma formação adequada dos professores é responsável pelo sucesso das novas gerações, sendo necessário que seja uma experiência prazerosa e não traumatizante. Sendo assim, nós professores, somos responsáveis por moldar e desenvolver as gerações de amanhã. Mudar, portanto, o mundo. Fazer com que sejam tudo aquilo que foram, são e podem vir a ser.

2.2. Acerca da legitimação da Educação Física

É incrível pensar como a Educação Física (EF) tem que “exibir” constantemente o seu valor educativo e justificar o seu lugar no currículo. Esse mesmo currículo que tem a Educação Física como uma das duas únicas disciplinas que acompanham os alunos desde o princípio até ao fim do seu percurso escolar obrigatório (1º até ao 12ºano). Era, portanto, razoável julgar, que a Educação Física estando tão presente, não estivesse tão afastada dos alunos. Na realidade, não é só nos alunos que se identifica essa distância,

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19 também está presente no corpo docente, na escola, nos encarregados de educação e nos órgãos de gestão. A designação de áreas “fortes” ou “sérias” em detrimento das “fracas”, provoca logo à partida uma separação que foi feita por “alguém”. A Educação Física tem resistido enquanto, de alguma forma, for uma “moleta” para as outras disciplinas, no que concerne ao ensino e aprendizagem (Renson, 2006). Basicamente, enquanto for conveniente para as outras disciplinas, como bom português diria: “até dar jeito”. Mas… porquê? Não é de todo complicado chegar à conclusão que as disciplinas ditas “mais fracas” são aquelas que estão mais relacionadas com o corpo como a Educação Física, com as artes como a Educação Visual e Tecnológica (EVT) e até mesmo com a cultura como a Música. Então, a primeira pergunta a colocar é: E porquê? Sim, porquê? O que está a Educação Física, o EVT e a Música a fazer mal? Todavia, se são precisas razões para legitimar a Educação Física no currículo, então a Educação Física é bem capaz de se defender.

Primeiro, é a única disciplina no currículo que visa a corporalidade de uma forma muito própria, isto é, que cria nos miúdos a noção de imagem e esquema corporal, a noção do seu próprio corpo, a noção de consciencialização do eu. Numa sociedade, cada vez mais orientada para o preconceito e a discriminação, para o bonito e o feio, para o magro e o gordo, para o branco e o preto (digamos que são tudo características que podem ser julgadas a “olho nu”, ou seja, sem qualquer tipo de necessidade de interação ou relação pessoal), é importante os alunos terem a noção de quem realmente são (perceberem por eles próprios e não por aquilo que os outros pensam ou dizem que é), aceitarem-se e trabalharam para atingirem o melhor de si, com tudo aquilo que têm (o bom e menos bom), pois faz parte de quem são. E existe melhor disciplina que não a Educação Física para proporcionar isso? Por favor, digam-me!

É preciso, (na realidade deveria ser quase uma obrigação) que as disciplinas acompanhem um pouco a evolução da sociedade. Pois, é nesta sociedade que os alunos vivem, interagem, comunicam, “se fazem”. E com esta ideia, surge o segundo argumento de legitimação: o combate à obesidade infantil e o sedentarismo (em função da questão da saúde). Contudo, temos que ser realistas na análise que se faz dos números e a responsabilidade que

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20 colocamos nos “ombros” da Educação Física. Não é com apenas 150 minutos por semana (na maior parte das vezes, até menos) que será possível que os valores exorbitantes que são apresentados hoje em dia, sejam “combatidos”. Sejamos realistas: não é possível! Se querem resultados, tem que haver mais tempo de prática. Se virmos bem, o principal objetivo da Educação Física é criar o gosto pela atividade física ou por uma modalidade específica, é dar-lhes oportunidades para experimentar: novas modalidades, padrões motores diferentes, aparelhos distintos. E a partir daqui fazer com que pratiquem regularmente alguma “modalidade”, pois somente nas aulas isso é completamente impossível. Por isso, por favor, não culpem (totalmente) a Educação Física.

Em terceiro lugar surge um argumento de bastante relevância: o desenvolvimento das capacidades cognitivas e a aquisição das capacidades comportamentais. Mas vamos por partes: as capacidades cognitivas são habilidades que são aprendidas em diferentes graus e que se desenvolvem ao longo do crescimento do indivíduo. Com a atividade física, capacidades como a atenção, a coordenação, a perceção, a linguagem e a memória (a curto prazo, contextual, visual…) são “ampliadas”. Mas também o raciocínio, a lógica, a tomada de decisão e resolução de problemas vão sendo aprimoradas. Por sua vez, as capacidades comportamentais, designadas por soft skills são conquistadas a partir do autoconhecimento, que leva a uma compreensão e domínio sobre as suas capacidades e oportunidades de melhoria. Com um jogo de futebol (e num simples recreio) qualquer um é confrontado com habilidades como a liderança, a cooperação, o saber trabalhar em equipa, a comunicação efetiva, a capacidade de negociação e a relação interpessoal e isso é trabalhado em Educação Física.

O quarto argumento e talvez seja aquele que é menos “valorizado” é a cultura desportiva. Isto é, o desporto como fonte de valores, quer sejam desportivos quer sejam sociais. A verdade é que a sociedade atravessa uma forte crise de valores e por isso é fundamental desenvolver valores na escola. Valores como a ambição, a aventura, a paixão, a persistência, a entreajuda, o fair-play, a competição (na sua abordagem mais positiva, relacionada com a superação) fazem todos parte do dicionário desportivo, quer seja em

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21 competição, reabilitação ou recreação. O respeito pelo outro, a tolerância, saber lidar com a vitória e a derrota são de tal forma contemporâneos no desporto que existem várias campanhas de combate ao racismo e discriminação no mundo do desporto e por parte de várias organizações desportivas, como a UEFA, a FIFA e outras.

Como quinto argumento surge uma antítese. O stress que a EF provoca nos meninos vs o rendimento escolar. Por um lado, e “Nas palavras do Presidente da CONFAP, esta é uma medida (EF deixar de contar para a média de acesso para o Ensino Secundário) extremamente positiva, porquanto vai retirar stress desnecessário aos meninos!” (Batista, 2012). Por outro lado, estudos mostram que alunos que praticam exercício físico apresentam melhor rendimento escolar. Vamos ver se entendi, se querem que se alivie o stress aos meninos, então penso que “os meninos” iriam preferir que não existissem exames, era provavelmente uma medida mais eficaz para reduzir o stress. Portanto, em que ficamos? Assim estamos a adotar “um processo em que os meninos não tenham que enfrentar stress, não tenham que se esforçar, se superar, se empenhar, se deparar com o insucesso.” (Batista, 2012). Estamos a criar futuros médicos, engenheiros, arquitetos, polícias, professores que não serão capazes de lidar com nada. O desporto também é isso. É saber lidar com as adversidades, saber lidar com a frustração, saber lidar com a derrota (aqui estão representados novamente os valores).

A escola deve ser por isso um local de dualidade: onde a superação, a confiança, o esforço, o trabalho em equipa, a vitória, o respeito, a tolerância, a experiência e prática, a ética e moral devem reinar, mas também a frustração, a derrota, o insucesso, o stress (até porque ele vai aparecer no futuro) devem estar presentes, pois só assim conseguimos preparar as crianças e jovens para o presente e para o futuro.

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2.3. Acerca de uma conceção de Educação Física

A Educação Física tem muitos poderes. Existem várias conceções acerca do que é ou deve ser a EF. De entre as veiculadas pela literatura, realço quatro: (1) A Psicomotora, que acredita que a EF tem poder para formar integralmente o aluno, nos processos cognitivos, afetivos e psicomotores (Le Boulch, 1987; Soares, 1996); (2) A Construtivista, que defende a construção do conhecimento a partir das interações da pessoa com o mundo. Esta proposta tem em consideração o passado conhecedor da criança (Freire, 2002); (3) A Crítica, que questiona as atitudes fora do contexto da EF na escola, e quer propiciar a inserção da transformação nesse contexto (Bracht, 1992; Soares et al., 1992); e (4) A Desenvolvimentista, que alega que a habilidade motora é um meio de excelência para que as pessoas se adaptem. Assim, o foco deve estar nas condições para atingir um certo grau de comportamento motor (Manoel et al., 1988).

No âmbito das Unidades Curriculares de Desenvolvimento Curricular e Profissionalidade Pedagógica foram pedidos alguns trabalhos para desconstruir os dogmas que trazíamos do tempo de aluno e apercebi-me que a situação está melhor do que na altura em que saí da escola. Já admite ter paridade com as outras disciplinas, pois já conta para a média de secundário e tem provas de aferição, contudo não quer dizer que não seja ainda negligenciada por alguns. Se nós negligenciamos, porque não o farão os alunos e encarregados de educação? Que argumentos temos nós para pedir, exigir, o que quer que seja? Nem nós acreditamos no nosso trabalho. Nem nós lutamos por ele, e ele é nosso. Porque fariam os outros isso?

Capel e Whitehead (2012) defendem que a EF é vista como divertimento, não existindo um verdadeiro significado na educação. Os outros professores tendem a acreditar que a Educação Física é um espaço de lazer para os alunos, é um “intervalo sério da educação (das áreas disciplinares cognitivas) (Batista & Queirós, 2015).

Atualmente, com quase um ano “nas costas”, depois de aulas, reuniões, leitura de documentos, atividades… admito que as minhas crenças foram “alteradas”, no sentido que agora tenho uma visão mais “real

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23 e profunda” do que é a Educação Física na escola. Estando presente em todos os ciclos de ensino, a EF é um meio de transformação social e de sensibilização para algumas questões sobre o mundo. Envolver os alunos em projetos ou através de alguma modalidade fazem com que a EF seja uma fonte de cultura humanística. Também percebi que a EF é um meio para reforço de outras aprendizagens (em orientação falamos de escalas, rosa dos ventos…), porque sendo multidisciplinar, a associação a outras disciplinas, torna-se bastante benéfico para o aluno. Com a introdução das Aprendizagens Essenciais e do “Perfil do aluno à saída da escolaridade obrigatória”, ficou inevitavelmente visível que a Educação Física tem um potencial enorme. No entanto, para mim, após a primeira reunião intercalar foi gritante o que deve ser a Educação Física. Deve ser focada no aluno. Deve servir para o ajudar. Deve ser apoio. Um espaço em que o indivíduo se sinta bem. Um lugar onde se possa superar e conseguir alcançar sucesso. Não tem que ser o mesmo para todos. Enquanto professora de EF acredito que devemos conseguir ajudar os nossos alunos. É ingénuo da minha parte achar que vou conseguir provocar alguma coisa em todos os alunos ou ajudá-los em tudo o que está mal, mas acredito que devemos ter um papel ativo na “vida” deles. Devemos estar especialmente atentos e procurar soluções que possam ajudar e não complicar.

Crum (1993) defende que a Educação Física deve estar alicerçada em 3 princípios fundamentais: a aquisição de condição física, a corporalidade consciente e a formação pessoal, cultural e social. Tudo isto faz sentido se considerarmos o desporto como um fenómeno cultural social e biologicamente intrínseco a cada um de nós. É preciso viver o desporto de forma a se sentir.

Uma outra conceção foi “construída” durante as aulas de Profissionalidade Pedagógica. A professora pedia para escrevermos pequenos textos e após a revisão desses pequenos momentos de devaneio, posso afirmar que aquele em que não alterava nada foi o que redigi no dia 4 de outubro de 2017, em que o tema foi “Que razões me levaram a escolher ser professor?

“É uma pergunta pertinente, pois com certeza não será pelas mesmas razões que a maioria escolhe qualquer profissão. Um salário baixo, a

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24

estabilidade inexistente e o reconhecimento (social) que desapareceu são a realidade da nossa profissão… por isso… realmente que razões me levaram a escolher ser professora? Sempre gostei de estar com crianças, tomar conta delas e brincar com elas. Algo muito importante para mim é o contacto humano, algo que se está a perder cada vez mais. De seguida, julgo que o professor é alguém que pode e deve mudar mentalidades, alguém capaz de incutir valores (numa sociedade que atravessa uma grave crise de valores), mudar pensamentos, moldar pessoas, mudar o mundo um bocadinho de cada vez, pois ser um exemplo, ser um líder é algo fascinante.”

Esta é a conceção que não mudou. O professor de Educação Física tem a capacidade de poder ser muito mais.

2.4. Aprender em Educação Física

A escola deve-se preocupar fundamentalmente com o aqui e o agora ou com o futuro? O que realmente importa na aprendizagem dos alunos? O que deve fazer a escola? A Educação Física e o desporto em si (intra e interescolar) devem dar experiências que tenham significado, que sejam alegres e prazerosas para os alunos (Crum, 2017). Para podermos construir um futuro mais rico, temos que formar crianças para o futuro e não para o passado. Aprender para o futuro, através do presente, não esquecendo o passado. De facto, como enunciam Fullan & Hargreaves (2001, p. 28) “existe um sentimento crescente da necessidade de uma mudança fundamental no ensino, no currículo e na liderança educacional, em todos os níveis do sistema educativo.”

Então, como aprendem? E o que aprendem os alunos? Futebol, Basquetebol, Atletismo, Ginástica? E o resto? Existem algumas teorias de aprendizagem como a construtivista, a ecológica, behaviorista, a situada e a sociocultural. Vamo-nos focar nas duas últimas, pois penso que são aquelas que melhor transmitem o que devemos esperar da Educação Física.

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25 A teoria da aprendizagem situada remete para que os alunos se envolvam na sua própria aprendizagem, de forma a terem uma participação ativa (Kirk et al., 2000; MacPhail et al., 2008). Estes autores defendem que existem três patamares de situacionalidade: a interativa, a social e a cultural. Nestas três dimensões, as palavras de ordem são relação e aluno. A dimensão interativa mostra uma relação entre o ambiente e o aluno. A social releva as relações entre os todos os atores da escola: alunos, professores, funcionários… e a cultural evidencia os recursos culturais que cada aluno traz para o contexto em que está inserido.

Uma teoria mais recente, mas baseada na teoria anterior é a teoria de aprendizagem sociocultural (Quennerstedt et al., 2014). Esta teoria caracteriza-se por 3 elementos principais: individual, social e institucional. Estes três atores têm uma relação contínua entre os professores, alunos e a cultura da instituição.

Estas duas teorias mostram-nos duas conclusões vitais. Primeira, a aprendizagem deve-se alicerçar na compreensão, comunicação e interação. Segundo, o sentimento de pertença e envolvimento são cruciais para a aprendizagem (Lave & Wenger, 1991), pois é situada num contexto social e cultural. Por isso, quantos mais os alunos participarem, quanto mais derem a sua opinião e quanto mais essa opinião for tida em conta, mais eles vão querer aprender. Assim, o professor deve servir de ponte entre o aluno e o seu autoconhecimento. Dar-lhes “liberdade” para descobrir coisas novas, para procurar coisas novas, para fazer coisas novas. Porque isso também é Educação Física.

As primeiras referem-se a todo o comportamento motor do movimento, ou seja, habilidade para saltar, dançar, fazer uma finta, ultrapassar um adversário. A segunda tem haver com os valores que o desporto deve incutir, sejam individuais ou coletivos, como aceitar a derrota e a vitória, a superação, a tolerância, o respeito. O conhecimento prático advém de colocar tudo aquilo que aprenderam na prática, seja uma situação desportiva, seja uma situação do quotidiano. Tudo é conhecimento prático. A capacidade reflexiva pode também ser utilizada no dia-a-dia: pensar, repensar e voltar a repensar. Melhorar os comportamentos, pensamentos, formas de agir e ações. Faz-nos crescer a todos um pouco mais. Por fim, as competências afetivas desportivas

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26 e sociais são importantes. No caso das habilidades desportivas é significativo, os alunos terem laços afetivos positivos com o desporto. Em relação às sociais, estas interações tornam-nos mais humanos. E esta humanidade faz falta hoje em dia. Todavia, todas estas diferentes competências não são inatas, não surgem naturalmente (Crum, 2017). Para se apre(e)nder é necessário uma aprendizagem estruturada. E os professores têm que perceber que a sua prioridade deve ser ajudar os alunos aprender (Locke et al., 1984).

2.5. A escola como instituição

Ao longo dos anos, a escola tem vindo a alterar as suas técnicas de ensino, metodologias práticas, materiais, visão dos professores e alunos. Acompanhando esta mudança (da sociedade), o seu papel, a sua ideologia e a sua missão também têm sofrido alterações.

E que escola é esta que temos hoje? Ramos (2012) defende a ideia de que a escola é um lugar de aprendizagem, onde se adquire o saber especializado, a ciência. O mesmo autor acredita que é através da escola que o saber espontâneo passa a ser reconhecido como saber especializado.

As instituições escolares têm um papel ativo no desenvolvimento do indivíduo. A escola deve assumir esta preocupação na formação de cada aluno, pois é aqui que se estabelecem relações sociais e de afeto, é aqui que se adquire conhecimento, é aqui que se aprende a ser cultura. Esta ideia permite associar o que Oliveira et al. (2013) defendem que tudo aquilo que o aluno vivencia, “promove mudanças na sua perceção do mundo, a ponto de criar nele a consciência da necessidade de transformar no seu entorno”.

A escola tem que ambicionar ser mais. É no dar e receber que a escola deve se basear. Para receber dos alunos, as suas experiências, interesses, motivações e relações deve também dar um pouco de si. E para isso, procurar um sistema que permita incluir todos os alunos, ou seja, um ensino personalizado que se preocupe com cada aluno, aluno esse capaz de reagir em situações reais, um ensino que acompanha as mudanças sociais e culturais (Almeida, 2017).

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27 pessoais e interpessoais, influenciada interna e externamente, consoante os membros que a integram, o meio onde está inserida e a sua cultura interna.

A UNESCO apresentou um relatório denominado por “Educação para o Século XXI (Delors et al., 1996). Nele reforça-se a ideia de que a escola deve ser um cumpridor ativo dos “4 pilares do conhecimento” – aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. A educação não pode ser vista como um processo com apenas 12 anos (escolaridade obrigatória), mas sim como uma vivência global, que se prolonga num

continuum durante toda a vida. Esta experiência influencia o sujeito a nível

cognitivo e prático, enquanto indivíduo apenas e membro de uma sociedade. Segundo Berger & Luckmann (1974, p. 87), “A sociedade é um produto humano. O homem é um produto social”. A escola, no seu processo educativo, deve colaborar na conscientização do indivíduo como pessoa e membro de uma sociedade (Gelati, 2009). A educação é hoje unanimemente considerada um dos principais veículos de socialização e de promoção do desenvolvimento individual. Azevedo (2010) destaca o papel que a escola tem dentro de uma sociedade, pois ao desenvolver o homem na sua individualidade, também o faz pensando num coletivo. Este pensamento promove mudanças desejáveis e estáveis nos indivíduos; mudanças que favoreçam o desenvolvimento integral do Homem e da própria sociedade (Carvalho, 2006).

Cada escola tem a sua própria cultura, que distingue cada organização das restantes e agrega os seus membros em torno de uma identidade partilhada, facilitando a adesão aos objetivos da mesma (Bilhim, 2004). Esta cultura perpetua-se e reproduz-se através da socialização.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos é uma carta de princípios que estabelece os direitos humanos básicos. O artigo 26º defende que educação é um direito (para todos). E isso deve ser visto em todas as sociedades. Assegurar a formação das nossas crianças, adolescentes, jovens deve ser uma prioridade dos governos. Essa formação tendo em vista as dificuldades de cada aluno permite aprendizagens completas e enriquecedoras que potenciem as virtudes de cada um. Para desempenhar o papel de “elevador social” a escola deve (re)pensar as suas práticas de forma a permitir

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28 que todos os alunos tenham as mesmas oportunidades de aprender e alcançar o sucesso.

2.6. Desafios da Escola no séc. XXI

A escola do séc. XXI enfrenta desafios que há 20, 30 ou 40 anos nem imaginava que teria que combater. O aluno é o cerne da escola, a sua maior preocupação. E tudo o que é feito deve ser em favor do aluno (e não só). Desta forma, hoje em dia, os professores só conhecem dois tipos de alunos: o aluno-problema e o aluno diferente (Aquino, 2007) Estes “dois alunos” caracterizam-se pela indisciplina e pelo baixo rendimento escolar que em conjunto com a não-mudança de práticas e a falta de cumprimento do professor fazem com que o aluno se desinteresse pela escola.

Nóvoa (2009) alerta para uma das principais críticas que, atualmente, se coloca à escola: a incapacidade de promover o valor da aprendizagem e fazer com que todos os alunos tenham, realmente, sucesso. De facto, um dos desafios que a escola enfrenta é o insucesso escolar e conseguinte abandono precoce (Quaresma, 2011). Este abandono não acontece nos mesmos moldes de antigamente devido à escolaridade obrigatória até ao 12º ano, que promove uma sociedade mais culta. Contudo, quando o insucesso escolar é grande existem alternativas ao ensino comum, como os cursos profissionais. Estas alternativas criam um problema consequente que é a segmentação social na escola através dessas escolhas (Leite, 2011).

Outro desafio deve-se à interculturalidade presente nas escolas, pois opiniões, motivações, vivências fazem com que cada um de nós tenha a sua própria cultura. Apesar de cada um “ser”, a relação com o próximo pode moldar-nos. A nossa identidade caracteriza-se pela sua plasticidade, mutabilidade, algo que lhe é inerente. Essa identidade está presente todos os dias, no modo como falamos, vestimos, andamos, no que ouvimos, como vemos o mundo, basicamente, no modo como somos. Todavia, este desafio tem duas perspetivas. Por um lado, esta diversidade cultural pode ser algo bastante positivo porque o contacto com outras culturas permite-nos aprender,

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29 conhecer, abrir os nossos horizontes, experienciar costumes e hábitos distintos. Por outro lado, esta diferença nem sempre é bem aceite. Um

entreposto cultural é um posto dinâmico entre culturas que constantemente se

confrontam no mesmo espaço e tempo (Torres, 2008). A escola é esse entreposto cultural, culturas diferentes no mesmo espaço e tempo, que têm que confraternizar (ou não). E quando “o não” impera, aí temos um problema. Cada vez mais é regular notícias de situações em que a discriminação e o preconceito estiveram presentes, não só na escola, mas na sociedade em si, no desporto até. E é na escola que se deve atuar em primeira instância. E como o podemos fazer? Não é uma receita, é um conselho. Devemos incutir nas crianças, a ideia de consciência para a cidadania, ou seja, perceber que existe um eu e um outro e que através dos afetos e da solidariedade (Gómez, 2008), esses dois “estranhos” podem coabitar o mesmo espaço sem conflitos.

Quando abordamos a “Educação Inclusiva”, referimo-nos a uma escola para todos, mesmo todos. Segundo Leite (2011), esse percurso escolar deve refletir verdadeiramente um desenvolvimento académico e pessoal, pois não podemos ficar apenas pelo papel. A escola enquanto local de preparação para o futuro deve fornecer ferramentas para os alunos atuarem em situações reais. Sejam alunos “normais” ou portadores de alguma deficiência, brancos ou pretos, pobres ou ricos, altos ou baixos. Se o objetivo é uma escola em que todos estão frequentemente em contacto, então todos devem ter acesso a oportunidades, vivências e instrumentos que os permitam e ajudem a alcançar algo mais. Sejam eles quem forem.

Os últimos dois desafios estão relacionados na medida em que se influenciam um ao outro. É preciso melhorar a imagem da escola pública (Leite, 2011) e é necessário estimular, (vamos apelidar) o “combate aos vintes”. A escola pública é vista como local de insegurança e rebeldia, com falta de apoios financeiros e carência de oportunidades. Com esta visão tão denegrida, a escola pública necessita de condições para não ser uma escolha apenas devido aos recursos económicos dos encarregados de educação. Num país livre (e ideal), cada um deveria poder escolher o que considera ser melhor para si. Assim, entre a escola pública e a privada o discurso para caracterizar as duas não pode ser tão díspar. Há que mostrar que na escola pública também

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30 existem boas práticas e profissionais competentes e preocupados que farão o seu trabalho em prol dos seus alunos. O caso do “combate aos vintes” é algo mais difícil de enfrentar, pois abrange mais setores: encarregados de educação, alunos, pais, professores, direção, governos. O facto de “o menino ser aluno de 20 no secundário”, não é garantia de que terá uma vida facilitada no futuro. E todos devem perceber isso. Não é apenas o resultado que conta, o processo e as aprendizagens devem ser valorizadas desde o início do percurso escolar. As escolas vivem para os rankings, os alunos vivem para as notas e os pais só querem um 20. Esta obsessão provoca nos alunos stress, descontrolo emocional e, muitas vezes desinteresse total devido ao fracasso dos resultados. É preciso combater esta overdose de pressão a que os alunos estão sujeitos.

2.7. Desafios do Professor no Séc. XXI

Se antes a escola era apenas um lugar de aprendizagem, hoje em dia é muito mais que isso. E se antes o professor era um mero transmissor de informação, atualmente, o professor é psicólogo, educador, orientador, supervisor, intermediador, líder, gerente de emoções, entre outras. Compartilhar conhecimento já não é função única. O professor tem que se preocupar com o desenvolvimento do aluno nas suas diferentes formas, estimular a criação de relações saudáveis com o outro, gerir e ajudar a superar frustrações e fracassos. Com todas estas “novas” funções, o professor do século XXI tem o trabalho mais dificultado. Novos desafios e problemas é preciso enfrentar pois “O mundo não é, o mundo está sendo… (Freire, 1996) e a escola deve acompanhar essas mudanças.

Um dos desafios é o processo de desvalorização que a profissão enfrenta (Hagemeyer, 2004). Desconsiderado por governantes, encarregados de educação e alunos, “ser professor” enfrenta uma crise sem precedentes, nestas últimas décadas. Esta desvalorização não afeta só os professores, mas também os alunos. Como? Porque os professores sentem que não é reconhecida a sua importância e podem acabar por desistir. Então, o que fazer para valorizar a docência? O ano passado realizou-se em Edimburgo a 7ª

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31 Cimeira Internacional da Profissão Docente. Foi apresentado o relatório Internacional da Educação que de forma breve considera que “os professores necessitam de um efetivo apoio dos governos ao seu trabalho, do reconhecimento da sua importância social e da satisfação de condições que confiram mais qualidade ao exercício da sua profissão.” Aqui está a receita! Agora é só seguir! Falar é fácil! Mas efetivamente a valorização deve começar nos cargos mais altos. O apoio dos governos faz com que haja uma forma diferente de ver a docência por parte dos governados. Auxílio não tem que ser necessariamente dinheiro. Apoio pode ser os outros dois aspetos mencionados acima: reconhecimento social e condições de trabalho. Reduzir o número de alunos por grupo, aumentar o número de docentes, e redução de precariedade e de oscilações no desenvolvimento profissional, formações apoiadas diversificadas, melhorar a ajuda aos professores que trabalham em contextos problemáticos e de isolamento. Os professores também têm que lidar com baixa autoestima, instabilidade emocional e sentimento de fracasso. E todas estas medidas dão melhores condições à profissão e ao professor, todas elas são uma forma de reconhecer a importância deste ator social numa sociedade tão “desgastada”.

A relação entre professor-aluno é algo que deve ser cultivado desde o início. E porquê? Somos seres relacionais. John Donne (séc. XVII) escreveu “Nenhum homem é uma ilha”, ou seja, precisamos uns dos outros para sobreviver individual e coletivamente, e por isso a ajuda mútua é essencial para a vida. Existimos em constante relação com o mundo, com as pessoas que nos envolvem e a forma como nos relacionamos afeta proporcionalmente a qualidade da nossa vida, não só para o bem como para o mal. Desta forma, esta relação deve ser construída todas as aulas, pois uma relação saudável contribuiu positivamente no processo de ensino-aprendizagem. Esta ligação, pode até, às vezes, contribuir para combater a falta de afeto e de preocupação que alguns alunos sentem e assim resolver alguns problemas de atitude, porque por vezes, esses comportamentos desviantes são apenas uma forma de chamar atenção. Mas mais do que se relacionar com o professor é relacionar-se com o outro. O trabalho em rede é fundamental em qualquer lado, é uma das competências básicas para qualquer trabalho. Fomentar a

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