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Rotinas de produção no Jornal de Notícias: Uma observação do Grande Porto e do Online

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Academic year: 2021

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MESTRADO EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO RAMO DE ESTUDOS DE MEDIA E JORNALISMO

Relatório de estágio

Rotinas de produção no Jornal de

Notícias:

Uma observação do Grande Porto e do Online

Ana Sofia Rocha Ferreira

M

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Ana Sofia Rocha Ferreira

Relatório de estágio

Rotinas de produção no Jornal de Notícias:

Uma observação do Grande Porto e do Online

Relatório realizado no âmbito do Mestrado em Ciências da Comunicação – Ramo Estudos de Média e Jornalismo, orientada pelo Professor Doutor Helder Bastos

Faculdade de Letras da Universidade do Porto

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Relatório de estágio

Rotinas de produção no Jornal de Notícias:

Uma observação do Grande Porto e do Online

Ana Sofia Rocha Ferreira

Relatório realizado no âmbito do Mestrado em Ciências da Comunicação – Ramo Estudos de Média e Jornalismo, orientada pelo Professor Doutor Helder Bastos

Membros do Júri

Professor Doutor Ana Isabel Crispim Mendes Reis Faculdade de Letras - Universidade do Porto

Professor Doutor Helena Laura Dias de Lima Faculdade de Letras - Universidade do Porto

Professor Doutor Helder Manuel Ferreira Bastos Faculdade de Letras - Universidade do Porto

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6 Sumário Declaração de honra ... 8 Agradecimentos ... 9 Resumo ... 10 Abstract ... 11 Introdução ... 12

Capítulo 1. Relatório de estágio ... 15

1.1. Objetivos do estágio ... 16

1.2. Um olhar pelos números ... 16

1.3. Um Mundo de aprendizagem ... 17

1.3.1. Rotinas e hábitos ... 17

1.3.2. Setembro: desafio inicial ... 19

1.3.3. Outubro: longe, mas perto ... 22

1.3.4. Novembro: (des)encontro com a humanidade ... 25

1.3.5. Dezembro: a contagem final ... 26

1.4. O Mundo do avesso ... 27

Capítulo 2. As rotinas de produção – Enquadramento teórico ... 29

2.1. O que são as rotinas? ... 29

2.2. Rotinas de produção jornalística... 31

2.2.1. Rotinas no jornalismo impresso ... 32

2.2.2. Rotinas no ciberjornalismo ... 35

2.3. Jornalistas e ciberjornalistas ... 42

Capítulo 3. Estudo empírico: Grande Porto vs. Online – estudo de caso ... 44

33.1. Visão geral ... 44

3.2. Método ... 44

3.2.1. Participantes ... 45

3.2.2. Procedimento ... 45

Observação ... 46

Inquéritos por questionário ... 48

3.4. Resultados ... 49

3.4.1. Observação participante ... 49

3.4.2. Inquéritos por questionário ... 52

Questionário 1 ... 52

Questionário 2 ... 53

Questionário 3 ... 55

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7 4.1. Interpretações e descobertas ... 59 4.2. Vantagens e limitações ... 60 Considerações finais ... 62 Referências bibliográficas ... 64 Anexos ... 68 Anexo 1 ... 68 Anexo 2 ... 69 Anexo 3 ... 70 Anexo 4 ... 71 Anexo 5 ... 72 Anexo 6 ... 73 Anexo 7 ... 75 Anexo 8 ... 76 Anexo 9 ... 77 Anexo 10 ... 79 Anexo 11 ... 80 Anexo 12 ... 81

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Declaração de honra

Declaro que o presente relatório é de minha autoria e não foi utilizado previamente noutro curso ou unidade curricular, desta ou de outra instituição. As referências a outros autores (afirmações, ideias, pensamentos) respeitam escrupulosamente as regras da atribuição, e encontram-se devidamente indicadas no texto e nas referências bibliográficas, de acordo com as normas de referenciação. Tenho consciência de que a prática de plágio e autoplágio constitui um ilícito académico.

[Porto, 12 de setembro de 2018]

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Agradecimentos

Aos meus pais e à minha família por me terem dado toda a liberdade para escrever a minha história. Encerra-se agora mais um capítulo.

À minha irmã e cunhado pela incansável paciência e por toda a confiança que em mim depositaram.

Ao Professor Doutor Helder Bastos por ter acreditado no meu trabalho e por me ter orientado quando as dúvidas eram mais do que as certezas.

À Ivete Carneiro, ao Alfredo Maia e ao Emanuel Carneiro por tudo o que me ensinaram. Não existem palavras suficientes para descrever o quão grata estou por ter conhecido estas três pessoas maravilhosas que fizeram do meu estágio um dos períodos mais enriquecedores da minha vida.

À Sandra Oliveira por me ter acompanhado nesta viagem com uma amizade inigualável.

Ao Filipe Falcão por estar a meu lado, por não me ter deixado desistir e por tudo o que me ensinou.

À Ana Cardoso, à Rafaela Gesta e ao Nuno Joanaz de Melo por todo o apoio, por toda a força e por todos ensinamentos nesta jornada académica, mas, fundamentalmente, pela amizade.

À Tuna Feminina da Faculdade de Letras da Universidade do Porto por orientar o meu caminho com a nossa bela música.

A todos aqueles que marcaram estes anos de faculdade e que levarei para a vida. Um eterno obrigada.

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Resumo

São já 130 os anos de história que acompanham o Jornal de Notícias (JN). De uma redação repleta de jornalista munidos de lápis e papel na mão a uma redação inundada por teclados e ecrãs, este jornal, fundado a 2 de junho de 1888, atravessou gerações e enfrentou diversos períodos de mudança que transformaram tanto as suas instalações como as próprias metodologias de trabalho. Apesar das incertezas associadas, este jornal lançou-se no desconhecido e arriscou no campo da Internet, sendo o primeiro diário português a lançar uma edição online. Uma inovação que, sem dúvida, alterou o processo de produção jornalística e redefiniu várias das tarefas desempenhadas pelo profissional, tais como a relação com as fontes ou mesmo a verificação e o tratamento da informação. Perante tais transformações, e depois de um período de estágio curricular de quatro meses no JN, onde também eu me confrontei com esta realidade, surgiu a ideia de estudar os hábitos e as rotinas dos jornalistas e da redação no estatuto de observadora participante, através de um estudo etnográfico. Este trabalho visou analisar e comparar duas secções do JN – a secção Grande Porto e a secção Online –, com o objetivo de compreender as principais diferenças existentes entre elas, quer a nível dos profissionais e as suas rotinas e hábitos, quer a nível organizacional. Chegamos à conclusão de que as rotinas de produção se assemelham na sua totalidade, mas que se distanciam bastante no que toca a particularidades como o sedentarismo, o acrescento de funções e os constrangimentos.

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Abstract

There are already 130 years of history that accompany the Jornal de Notícias (JN). From an editorial office full of journalists with pencils and paper to a newsroom flooded by keyboards and screens, this newspaper, founded on June 2nd, 1888, went through generations and faced several periods of change that modified both its facilities and its own methodologies. Despite the uncertainties associated, JN launched itself into the unknown and risked in the field of the internet, being the first Portuguese newspaper to launch an online edition. An innovation that undoubtedly altered the journalistic production process and redefined several of the tasks performed by the professional, such as the relationship with the sources or even the verification and processing of the information. Faced with these changes, and after a four-month internship in the JN, where I also faced these changes, the idea of studying the habits and routines of the journalists and of the editorial office in non-participating observer status through of an ethnographic study came up. This work aimed to analyze and compare two sections of the JN - - the Grande Porto section and the Online section -, in order to understand the main differences between them, both at the level of professionals and their routines and habits, and at the organizational level. We concluded that the routines of production resemble each other in their entirety, but that they are far apart in terms of particularities such as sedentarism, the augment of functions and constraints.

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Introdução

Este relatório, desenvolvido no âmbito do 2º Ciclo de Estudos em Ciências da Comunicação com especialização em estudos de Média e Jornalismo, terá como principais objetivos explorar e conhecer o conceito de rotinas aplicadas ao campo jornalístico e, por conseguinte, conhecer e identificar as rotinas de produção jornalística afetas às secções Grande Porto e Online do Jornal de Notícias (JN) e perceber como é que funcionam e porque é que funcionam de determinada maneira.

O que são rotinas de produção? A questão é lançada por diversos autores que têm vindo, ao longo dos anos, a especular e teorizar sobre o que são ou o que devem ser. Da forma como influenciam o processo noticioso e o profissional, até à forma como as notícias chegam ao público, diversas são as opiniões que se têm formulado. Ainda mais depois do aparecimento da Internet. No início dos anos 90, a Internet entrou nas redações e ergueu um punhado de dúvidas e de incertezas. A única certeza era a mudança. Nas palavras de Pavlik (2001), surgia uma nova forma de jornalismo cujas qualidades distintivas incluíam “(…) ubiquitous news, global information access, instantaneous reporting, interactivity, multimedia content, and extreme content customization”, (p. xi). Se uns viam esta ferramenta como o futuro do jornalismo, outros especulavam sobre a mudança mais negativa. Não podemos, então, afirmar que há um consenso em relação a este tema. Talvez o problema resida na escassa literatura ou nos escassos estudos de campo existentes sobre o assunto. Desde a compreensão das rotinas de produção como um padrão de comportamento, como regras ou mesmo como disposições coletivas, inúmeras têm sido as considerações atribuídas pelos teóricos ao conceito. Também as mesmas têm sido classificadas quanto ao seu papel na redação e quanto às suas características (Jerónimo, 2015, p. 39).

Compreendemos que as opiniões que têm vindo a surgir ao longo dos anos sobre este tema têm sido heterogéneas e, por vezes, divergentes. Sabendo que o aparecimento da Internet e, consecutivamente, o aparecimento de uma nova forma de jornalismo – o ciberjornalismo – modificou a forma de trabalho dos jornalistas e das redações decidimos, neste relatório, fazer um estudo comparativo entre duas secções do JN: o Grande Porto e o Online. O objetivo é compreender as rotinas de produção das mesmas secções e a forma como influem nos processos de trabalho e nos profissionais. Mas como podemos, então, estudar algo que tem, ao longos dos anos, mudado tantas vezes de forma? Ou seja, como podemos teorizar algo que depende tanto dos seus atores como as rotinas de produção?

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Segundo Nelson Traquina (2004, p. 11), “não é possível compreender as notícias sem compreender a cultura dos profissionais”. Assim mesmo, para melhor compreender as diferenças dentro da redação, quer entre os profissionais quer entre os seus métodos de trabalho, optamos por observar duas secções (Online e Grande Porto), não pretendendo classificar como melhor ou pior uma ou outra, mas sim destacar as principais diferenças entre ambas. Posto isto, na tentativa de conhecer este fenómeno da profissão, surgiram as seguintes perguntas de investigação com as respetivas hipóteses:

• P1: Quais são as principais rotinas de produção dos jornalistas da secção do Grande Porto e do Online na redação do JN?

H1: As rotinas de produção dos jornalistas da secção do Grande Porto e do Online do JN não se distanciarão das rotinas do jornalismo tradicional, tais como apurar, recolher e compilar informação, havendo uma maior estruturação das mesmas na secção do Grande Porto. Porém, sobretudo no Online, predominará o sedentarismo com os jornalistas a saírem pouco para o exterior.

• P2: Quais são as principais diferenças entre as rotinas de produção da secção Grande Porto e da secção Online?

H2: As principais diferenças entre a secção do Grande Porto e a secção Online serão o acrescento de funções. Ambas as secções seguem o modelo tradicional das rotinas de produção, havendo uma maior unissonância o que toca às rotinas do Grande Porto. Contudo, além das funções intrínsecas a todas as secções, aos jornalistas do Online caberá também publicar, atualizar, e editar os trabalhos (não só os textos escritos por eles próprios, mas também por outros colegas).

• P3: Quais os principais constrangimentos que os jornalistas têm de enfrentar no seu dia a dia?

H3: a) O tempo será um dos maiores constrangimentos para os jornalistas da secção Online.

b) O espaço disponível para escrever textos será um dos principais constrangimentos sentidos pelos jornalistas da secção Grande Porto.

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Como supracitado, para responder às questões foi adotado o método de pesquisa etnográfica, assumindo o papel de observador participante, de modo a obter uma perspetiva mais próxima da realidade vivenciada pelos jornalistas. Como apoio à observação, recorremos à triangulação de métodos, por forma a eliminar as possíveis fraquezas de um estudo etnográfico, recorrendo a inquéritos que permitiram a recolha de dados quantitativos em relação ao universo demográfico de ambas as secções, bem como a inquéritos por questionário dirigidos às equipas constituintes.

Este relatório estrutura-se em quatro grandes capítulos, que se dividem em subcapítulos. No primeiro, descrevemos, não detalhadamente o período de estágio de quatro meses realizado no JN, bem como os objetivos inicialmente traçados.

O segundo capítulo diz respeito à revisão literária que suporta o estudo realizado neste projeto. Aqui, divididos por subcapítulos, discutiremos os conceitos de rotinas aplicadas a nível organizacional, o conceito de rotinas aplicadas ao jornalismo e ao ciberjornalismo e, por fim, traçaremos o perfil dos jornalistas de ambos os estilos jornalísticos.

O terceiro capítulo terá como objetivo descrever a metodologia do estudo. Aqui serão apresentados os participantes no estudo de caso bem como os procedimentos utilizados na recolha de dados. Serão também apresentados os resultados dos diferentes métodos de investigação.

No quarto capítulo, apresentaremos a análise dos dados que recolhemos e a respetiva discussão. Apresentaremos inclusive as nossas interpretações e descobertas tal como as vantagens e limitações deste estudo de caso.

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Capítulo 1. Relatório de estágio

Colocar quatro meses de trabalho num relatório não é algo que se realize com facilidade. Desde o primeiro dia em que me sentei na secretária que me foi atribuída no JN, até ao último dia de estágio, foram várias as peças que produzi. A ideia de que as empresas usavam os estagiários para “tirar fotocópias e cafés” foi rapidamente dissipada por todo o trabalho que a minha orientadora e a restante equipa me confiaram. Sem dúvida que não esperava a confiança que depositaram em mim, nem tão pouco esperava ter tanta liberdade. Este relatório tem como base o estágio curricular realizado no âmbito do Mestrado de Ciências da Comunicação da Faculdade de Letras da Universidade do Porto que decorreu na secção Mundo do JN. O período de estágio teve início no dia 4 de setembro de 2017 e findou no dia 30 de dezembro de 2017.

Construir um relatório detalhado com base em todos os trabalhos que me foram designados culminaria num relatório massudo e cansativo. Por isso mesmo, este relatório terá como objetivo principal expor uma reflexão sobre a minha passagem pelo JN, não pretendendo descrever cronologicamente e detalhadamente o período de estágio. Ao invés, far-se-ão algumas considerações sobre o trabalho e as atividades que realizei enquanto estagiária da secção Mundo. Deste modo, optei por fazer um levantamento das peças e dos projetos propostos durante o período de estágio e que considero terem sido os mais relevantes no meu processo de aprendizagem, dividindo este relatório por meses. A par disto, irei também descrever os momentos que me levaram a parar para pensar no tema que apresentei como estudo de caso.

Ao longo desta exposição retratar-se-ão todos os processos de aprendizagem que foram transmitidos, do mesmo modo que se refletirá acerca dos trabalhos que mais me exigiram e que me fizeram apaixonar por esta profissão. Irei mencionar, inclusive, momentos vividos dentro da redação que importam lembrar por me terem feito perceber que ser jornalista é muito mais do que escrever “uns textos”: é ter garra, é perceber qual é o caminho, é não ter receio de falar e agarrar os temas sem receios, é ter sentido de humor, é ter os olhos virados para o mundo… É uma infinidade de coisas que nunca teria imaginado sem esta temporada no JN, onde senti como se já me conhecessem há anos e nem por ser estagiária deixaram de tecer críticas ou elogios ao meu trabalho que, sem sombra de dúvida, me ajudaram a crescer.

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setembro outubro novembro dezembro

Núm er o d e n otíc ias Mesesdo ano Notícias Breves 1.1. Objetivos do estágio

A minha presença no JN foi guiada, essencialmente, pelos seguintes objetivos: • Conhecer e ganhar familiaridade com o ambiente jornalístico, mais

concretamente, com a secção que me foi atribuída;

• Explorar e identificar as rotinas de produção, hábitos e preocupações da secção Mundo;

• Ser capaz de responder a todos os desafios lançados pela equipa de estágio; • Desenvolver e aumentar as minhas capacidades jornalísticas.

1.2. Um olhar pelos números

Difícil será classificar quantitativamente qualquer trabalho que não se reja somente por números. Por detrás de tudo o que produzi, estão quatro meses de contínua e indescritível aprendizagem. Contudo, não posso descartar a importância dos valores, entendendo-os como uma representação empírica de todo o trabalho.

Entre breves, notícias de abertura de secção, especiais e textos escritos para a plataforma online, não existiu um dia em que a Ivete Carneiro, a orientadora que me foi designada no jornal, ou os outros dois elementos da equipa – Alfredo Maia e Emanuel Carneiro – não me dessem um tema para trabalhar. Em certos dias, quase não me era possível sair da secretária. Todavia, ainda que o trabalho fosse muito, não senti nunca que tinha mais trabalho do que aquele que era capaz de fazer.

Gráfico 1. Número de unidades de texto produzidas para o jornal impresso entre setembro e dezembro de 2017

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Em números crus, foram cerca de 136 as unidades de texto que escrevi para a edição em papel da secção Mundo, bem como para a edição Online. Ainda que seja importante elaborar numericamente uma mostra de tudo o que fiz durante o período de estágio, importa lembrar que a minha formação – que foi gradualmente evoluindo ao longo dos quatro meses – foi mais além do que esta pequena quantificação e que graças a todo o trabalho que me foi dado e todos os desafios lançados, posso hoje afirmar que alcancei, neste estágio, um enorme nível de aprendizagem.

1.3. Um Mundo de aprendizagem

Todos saberão que um currículo repleto de atividades, workshops, cursos e estágios impressiona qualquer um. Ao olhar para o meu, a única coisa que me ocorria no consciente era: “eu só sei escrever, como é que eu vou fazer isto?”. Porém, houve quem tivesse mais confiança em mim do que eu própria. Um pouco talvez graças à versatilidade da profissão, ou graças a tudo o que um jornalista precisa de saber para além das técnicas de escrita jornalística. Desta forma – de currículo vazio e a duvidar de mim mesma – entrei no JN preparada para aprender tudo o que fosse possível. E o contrário não aconteceu. Ensinaram-me tudo o que sabiam e deram-me todo o trabalho que lhes era permitido para que pudesse sempre converter a aprendizagem teórica em prática. A minha inexperiência no ramo em nada se refletiu nas minhas atividades ou no crédito que me foi dado por quem me orientava. Acima de tudo, devo ressalvar que, mais importante do que a quantidade de artigos produzidos durante todo o estágio, é o conhecimento que desse processo resultou.

Acreditando que se aprende através da experiência, propus-me sempre a trabalhar sem receio de falhar. O primeiro mês – setembro – foi onde mais dificuldades e frustrações enfrentei. Não estar familiarizada com as rotinas e com os métodos de produção da equipa foram as principais barreiras com as quais me deparei. Contudo, do meu lado esteve sempre a minha orientadora que nunca hesitou em corrigir-me de forma a ajudar-me a ultrapassar estas adversidades.

1.3.1. Rotinas e hábitos

Diariamente, chegava à redação por volta das 14h/14:30h. Nunca me foi imposta uma hora de chegada, mas como todos os homens são criaturas de hábitos, eu não fugi à regra. A hora de saída dependia sempre do trabalho. Só quando terminasse tudo o que me tinham dado para fazer é que fechava o computador e abandonava o escritório.

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“Passar os olhos pelo analógico” – ensinou-me o Maia – era indispensável. Por isso mesmo, antes de me sentar na cadeira, corria todas as secretárias à minha volta para pedir emprestado os jornais do dia. Sentia ali, não só o apego ao tradicional, como um quê de competição. Não era um dia normal se não pegássemos no jornal e não comentássemos entre equipa de secção: “este jornal deu esta notícia e nós não”.

Na secção Mundo, deparei-me com temas díspares. Do oriente ao ocidente, da europa ao canto mais recôndito do mundo. Se fosse notícia e tivesse relevância, a nossa secção dedicava-se à sua análise. A equipa de trabalho era constituída por três jornalistas e cada um tinha as suas rotinas próprias de consulta de informação. Além disso, como é natural, todos têm temas nos quais se sentem mais confortáveis ou que conhecem melhor. Por este motivo, a Ivete estava sempre aberta a sugestões, por entender que a participação de todos enriquece a secção.

Relativamente à forma de execução dos trabalhos, esta era constante: a editora selecionava os temas mais relevantes do dia, dividia-os pela equipa (eu incluída) e desenhava a página estipulando o espaço que cada peça teria. Nem sempre o desenho inicial se mantinha. Ou porque não havia informação suficiente para redigir uma peça tão grande ou porque o desenrolar do dia trazia mais informação e, por isso, o espaço tinha de ser maior. Apesar da seleção da editora, os temas para o dia não eram restritos.

Como primeira missão, todos os membros da equipa sugeriram que começasse o dia a fazer uma lista com as dez notícias que, na minha opinião, mereciam destaque ou lugar na secção. Esta foi uma tarefa que inicialmente não compreendi por a entender como desnecessária. Claro que, no final da primeira semana, percebi que sem aquela lista não me conseguiria orientar. Ao fim de um mês, já era capaz de fazer a minha lista coincidir com a da editora da secção ou dos restantes membros. Este era um afazer enraizado em todos e que tinha como objetivo ensinar-me a ser capaz de analisar o dia, perceber o que era notícia e o que não era; perceber a linha de conteúdos do JN e compreender que temas interessariam mais ao público-alvo do jornal. Depois de interiorizar o sistema de listagem para organização de pensamentos e para definir prioridades de notícia, o segundo passo de aprendizagem prendeu-se com ser capaz de, em poucas palavras, dizer muito. A isto chama-se redigir breves.

Como acima referi, o desenho da página podia sempre ser alterado. Porém, o espaço não. Regra geral, a secção era confinada a duas ou três páginas (quatro em dias de sorte) e muitos assuntos tinham de ser comprimidos nuns módicos 300 carateres. Com esta fatalidade de encurtar informação, aprendi a ser sucinta e direta. Escrevi cerca de 48

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breves. Não esquecendo algumas “orelhas” de páginas ou caixas de texto que, por vezes, se escreviam na hora do fecho da página e que, pela pressão do tempo, eram escritas diretamente no programa de edição do jornal e por isso mesmo ficaram por registar. Todos os dias escrevi uma breve, do primeiro ao último mês. Às vezes, tornava-se numa tarefa divertida para a equipa por ser um grande desafio quer criar um texto tão pequeno quer criar títulos de duas ou três palavras que contassem tudo. Cumpriu-se, desta maneira, mais um objetivo de discência, indispensável para a minha formação.

A terceira tarefa prendeu-se com assimilar e dominar a técnica de utilizar um discurso fluído, não repetitivo e que fosse de fácil compreensão para o leitor. Uma vez que se tratavam de temas que eventualmente poderiam não ser conhecidos pela maioria dos leitores, surgia a necessidade acrescida de tornar o texto claro e organizado. Pode parecer uma capacidade básica para quem sabe escrever, mas nem sempre era fácil. Além disso, o rigor da escrita nunca podia ser deixado de lado. A correria de fechar as páginas, de atualizar a informação até ao último minuto ou de haver só duas pessoas a construir a secção inteira para o dia seguinte nunca foram uma desculpa para o descuido. Era preferível atrasar o fecho a escrever um texto à pressa que não correspondesse aos padrões de todos os que trabalhavam no Mundo. Mais uma vez, aprendi que o jornalismo deve ser feito como rigor, independentemente das barreiras impostas.

Olhando para trás, posso dizer que estas foram as principais tarefas e os ensinamentos básicos que guiaram todo o meu estágio e que me permitiram estar sempre tanto na mesma linha de pensamento como no mesmo ritmo de trabalho que a equipa, não podendo esquecer todos os momentos em que fui corrigida pela equipa enquanto os meus textos eram revistos, todos os conselhos que aqui não consigo descrever, mas que fizeram toda a diferença no meu percurso. Desde estar com o Maia, mais de uma hora, a rever um texto porque ele tinha toda a paciência do mundo para me ensinar, até aprender a fazer títulos com o Emanuel que dizia que os meus “eram um escândalo”. Tudo isso foi fundamental para me fazer chegar ao fim do estágio e dizer “não podia sair daqui mais feliz. Vou de bagagem cheia”.

1.3.2. Setembro: desafio inicial

Neste primeiro mês, onde tudo era assustadoramente complicado, foram-me propostos vários trabalhos que desafiaram toda a minha prática e conhecimento. Os momentos que irei contar neste tópico levaram-me a sair da monotonia de navegar na

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Internet para recolher e cruzar fontes de informação, tal como, ocasionalmente, estabelecer contacto telefónico com fontes de órgãos oficiais.

Importa perceber este primeiro mês por ter sido aquele que me levou a reconhecer, a perceber e a interiorizar todas as rotinas da secção. Rotinas essas que, segundo Jerónimo (2015), são “consideradas como os comportamentos com os quais os jornalistas estão familiarizados e dos quais resultam as notícias” (p.41). Foi também o mês que, a todo o momento, me fez questionar a posição dos jornalistas no século XXI e consequentemente a evolução da profissão. Foram-se levantando questões que se prendiam com: como fazer um bom trabalho através apenas de novas tecnologias?; será esta uma secção tão sedentária como se diz?; será que fiz a escolha certa ou não terei oportunidade de aprender o suficiente numa secção que parece tão presa à secretária?.

Desta forma, um dos primeiros projetos lançados pela Ivete foi um trabalho sobre os Dreamers1 e, consequentemente, a comunidade de portugueses que faziam parte deste projeto. Com o título “Dreamers portugueses receiam perseguição”, a peça foi publicada a 9 de setembro (cf. anexo 1). O que inicialmente começou por ser uma notícia simples, passou a ser uma reportagem. Após alguma pesquisa descobrimos que havia um Centro de Apoio ao imigrante fundado por uma portuguesa, também emigrante. Lançamo-nos à descoberta de contactos e, um dia depois, consegui contactá-la pessoalmente. Com um fuso horário de menos 5 horas – o centro estava sediado em New Bedford, nos EUA –, tentar conciliar as horas para uma entrevista telefónica foi complicado. Mais difícil foi tentar estabelecer contacto com uma das fontes oficiais do governo: o secretário de estado das comunidades ou o seu assessor (que nunca atendia o telefone). Posso dizer que esta foi uma situação que se repetiu durante todo o tempo de estágio. Apenas por uma vez consegui que o assessor do secretário de estado me prestasse declarações.

Além das barreiras físicas que me impediam de estar em contacto direto com o acontecimento, escrever esta notícia necessitava ainda compreender a situação política norte-americana do momento. Desenvolver esta peça que retratava a situação delicada em que se encontravam os emigrantes nos EUA, no caso particular os portugueses que lá residiam, implicou fazer um trabalho mais aprofundado, na medida em que tive de estudar

1Dream act é o acrónimo para Development, Relief, and Education for Alien Minors Act, que se traduz como "Lei de Desenvolvimento, Alívio e Educação para Menores Estrangeiros”. Esta foi uma proposta legislativa dos Estados Unidos da América que impediria a deportação de jovens que foram levados aos EUA ainda crianças, estes passaram a ser chamados de DREAMers.

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não só o caso individual dos emigrantes como toda a situação em que estas comunidades estavam envolvidas.

Vi aqui nascer, verdadeiramente, a curiosidade de sair da redação para estar em contacto direto com todos os factos que estava a noticiar. Ler e presenciar nunca é a mesma coisa. Senti a necessidade e a vontade de estar no terreno para compreender a história que estava a relatar.

Não considerando que o trabalho tivesse menos valor por não ser seguido com a proximidade que se seguem os eventos/acontecimentos que ocorrem no nosso país, senti que fazia falta conhecer todas as “personagens” da situação. Sem dúvida que enriquecia a notícia ter o relato de alguém que estivesse a passar pela situação. Contudo, em todos os contactos que fiz, não houve uma pessoa que concordasse em falar comigo. Não sabendo se com uma abordagem pessoal as coisas não seriam diferentes, fiz o melhor trabalho possível e entreguei ao leitor toda a informação que tinha adquirido.

No jornalismo permanece, ainda hoje, “una función principal de informar, de la que derivan directamente otras dos: la acción intrínseca de comunicar la interpretación que construye de la realidad, y la labor de integración y mediación con la sociedad al difundir informaciones, interpretaciones y opiniones.” (Sánchez-García; Campos-Domínguez; Berrocal-Gonzalo, 2015, p. 196). Na secção Mundo, estas funções eram cumpridas com muito cuidado uma vez que não tínhamos todas as peças para a construção concreta do real: faltava-nos sair da redação e viver as situações. Ter olhos no local. Apenas podíamos contar com os olhos de outrem.

Esta foi uma realidade com a qual me confrontei pela altura do sismo no México, onde me surgiram dois momentos de notícia: uma reportagem e uma história. Para a reportagem bastou fazer umas chamadas para poder dar ao leitor toda a informação que necessitavam. O Nuno e o Marco (cf. anexo 2) que partiram para o México em missão de salvamento foram bastante acessíveis e relataram algumas missões feitas noutros países e deixaram as suas notas de esperança. Por sua vez, o segundo momento de notícia surgiu enquanto fazia uma das tarefas da minha rotina diária. Enquanto percorria todos os jornais espanhóis e hispano-americanos para atualizar a informação sobre o desastre que tinha devastado a capital do México, deparei-me com a história de uma cidade completamente arrasada pelos efeitos do sismo. Poucas paredes restavam, o medo estava instalado e a

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incerteza era a única certeza do povo de Jojutla2. Aqui, tive de relatar toda a situação através do que os olhos de outros jornalistas viam.

Segundo a perspectiva de Saiz-Echezarreta e Galletero-Campos (2017), “(…) la convergencia tecnológica incide en nuestra forma de contar la realidad, de aproximar versiones del mundo, espacios, valores comunes y compartidos. Sin embargo no estamos ante algo nuevo, estamos aprendiendo a remediar, a traducir aquello que tenemos encomendado como tarea de la profesión periodística a los nuevos entornos y herramientas” (p. 126). A verdade é que, efetivamente, a tecnologia incide cada vez mais nos afazeres diários de um jornalista, mas nem sempre é suficiente como instrumento de trabalho.

Se no primeiro momento de notícia me senti próxima e com todas as ferramentas para escrever o meu texto, já no segundo senti verdadeiramente a necessidade de viver o que estava a escrever. Senti que devia percorrer o terreno e ver com os meus próprios olhos tudo o que não estava a ser visto pelos média mundiais. Aqui senti, de novo, a necessidade de cumprir um requisito que não era possível na secção Mundo. Se nos artigos supramencionados, os relatos dos intermediários da história bastaram para redigir o texto, neste percebi que é necessário sair da redação: uma função essencial para ser jornalista.

1.3.3. Outubro: longe, mas perto

Ainda que vinculada à secção Mundo, durante o estágio assumiu-se também a oportunidade de produzir trabalhos que foram publicados na secção Online do jornal. Olhando para os meses de estágio como períodos de aprendizagem, posso dizer que outubro foi o período em que aprendi outro tipo de escrita, bem como outro tipo de estrutura, uma vez que foi o mês em que escrevi (ou melhor, reescrevi) peças para serem publicadas na plataforma online. Todas elas tiveram espaço em ambos os formatos do JN. Porém, tinham sempre de ser alteradas porque, apesar de serem poucas, existem características vincadas que distinguem o texto produzido para a versão impressa e para a versão online.

Um dos principais objetivos das notícias publicadas na plataforma online era prender o leitor ao texto. Dado que este é um participante mais instantâneo do que aquele que compra o jornal com o objetivo principal de o ler, é fundamental manter o interesse

2 Disponível em URL:

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para que a peça seja lida até ao fim. Assim, aprendi a escrever de forma mais compacta e concisa. Apesar de o espaço não ser um problema na Internet, pela razão acima referida, os textos não podiam ser demasiado longos. Aprendi a criar o equilíbrio entre cativar o leitor e a minha escrita, o que constituiu um ótimo exercício para compreender as mudanças que têm vindo a surgir no jornalismo.

Aprender a escrever uma efeméride foi outra das oportunidades que tive no mês de outubro. Um outro tipo de texto jornalístico que me levou para fora das rotinas. Esta peça sobre Mata Hari3, foi publicada nos dois formatos. Planeada para o dia 15 de outubro por ser o dia do centenário da sua morte, escrevê-la foi uma tarefa que me foi dada no fim de setembro. Durante duas semanas, pesquisei sobre esta agente dupla que parecia saída de um romance histórico. Escrevi e apaguei. Voltei a escrever e a recear estar a fugir demasiado para a minha veia de romancista. Eventualmente, depois de me ver sem solução, despi-me de receios e abordei a minha orientadora que me deu toda a liberdade para seguir esse caminho, fazendo-me compreender que um jornalista não escreve só notícias e que este formato era a oportunidade perfeita para florear e usar metáforas para embelezar o texto e para lhe dar um cunho mais pessoal.

Não posso deixar de lado uma das reportagens mais entusiasmantes que escrevi: “Oposição a Maduro candidata a prémio” (cf. anexo 3), também publicada online com o título: “Oposição a Maduro vence prémio Sakharov”4. Tudo começou com mais um dia na redação. Enquanto todos trabalhávamos nas tarefas que faziam parte do nosso dia-a-dia, recebemos um email com um comunicado (com um abaixo-assinado em anexo), que dava a conhecer a prisão arbitrária de um professor de Filosofia na Venezuela. Lado a lado nesta luta estavam diversos académicos, quer de universidades venezuelanas, brasileiras, espanholas ou portuguesas.

Estando diretamente ligada à Faculdade de Letras, prontamente apontei à Ivete a facilidade que tinha em entrar em contacto com o um dos nomes da lista, o presidente da Sociedade Portuguesa de Filosofia. “Queres ficar com este trabalho?” foi uma pergunta puramente retórica. A Ivete já sabia que sim.

Na manhã seguinte, não perdi um segundo e liguei o computador para enviar emails a todos os contactos disponíveis na página da FLUP e a procurar contactos para chegar a

3 Disponível em URL:

https://www.jn.pt/mundo/interior/a-agente-dupla-que-hipnotizou-a-europa-8845041.html

4 Disponível em URL:

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outros subscritores deste abaixo-assinado. As respostas não foram imediatas e não foram positivas no imediato. Quando tentei falar com o Professor José Meirinhos, percebi que não havia grande disponibilidade. Não por não querer falar, mas por saber que não seria a pessoa mais apropriada para falar sobre o assunto. Num breve email, respondeu a algumas das perguntas que lhe tinha dirigido e prontificou-se a indicar-me o contacto de um outro professor que estava mais dentro do assunto.

Surgiu o contacto do professor Adelino Cardoso, da Universidade Nova de Lisboa, que se disponibilizou a falar abertamente sobre o assunto. Da conversa que durou cerca de 18 minutos, surgiram diversos temas e diversas opiniões, não só sobre o momento que estava a viver a comunidade académica na Venezuela como também sobre a situação política e económica do país. Tinha já bastante material com o qual podia construir a minha notícia. Porém, a ambição levou-me a contactos bem mais próximos. Se em alguns casos, a distância e a impessoalidade de uma chamada tornaram a minha notícia mais vazia, neste foi vital.

Através de alguns emails trocados com a responsável pelo movimento de libertação dos presos políticos, consegui chegar a um dos académicos que tinha acabado de ser libertado. E o pensamento de haver uma hipótese de chegar ao professor gerou em mim um nervosismo incontrolável. “Será possível? Será que vai atender? Será que vai responder a todas as minhas perguntas?”. Os pensamentos invadiram-me e com eles as dezenas de perguntas que tinha para lhe fazer.

Claro que tudo teve de ser mantido em anonimato, uma vez que a pessoa em questão estava proibida de falar com os meios de comunicação, mas o relato verídico e detalhado, na primeira pessoa, dos meses que viveu na prisão, das condições, do país foram fundamentais para o conteúdo e para a construção da peça. Não sabendo o que fazer com o pedido de anonimato, falei com a Ivete, para me orientar na construção da peça.

Foi, sem dúvida, a peça que realizou enquanto jornalista. Apesar de todos os obstáculos que são inerentes à secção, a insistência e a procura levaram-me à fonte primária de informação. Consegui, pela primeira vez, chegar perto do acontecimento, ainda que através das novas tecnologias, que nem sempre são más. Neste caso, foram a única forma de dar ao leitor diferentes perspetivas do que estava a acontecer.

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1.3.4. Novembro: (des)encontro com a humanidade

Novembro foi um mês calmo. Não por ter tido pouco trabalho, mas por ter sido quase tudo dentro da rotina natural. Contudo, foi o mês em que saí pela primeira vez da redação para fazer uma entrevista que foi publicada com o título “Os julgamentos da corrupção far-se-ão nas urnas em 2018” (cf. anexo 4). Foi aqui, também, que percebi que, por vezes, levamos tão a sério o sermos objetivos e profissionais, que nos esquecemos de pensar enquanto indivíduo nos temas que trabalhamos.

A mais ou menos sete meses das eleições no Brasil, Ricardo Taboaço, líder de um partido recente – partido NOVO – que tinha dado cartas em 2016, conseguindo eleger vereadores para quatro das cinco câmaras às quais tinha apresentado candidatos, passava por Portugal. Devo confessar que poder entrevistá-lo fora da redação foi a concretização de um momento pelo qual tinha esperado três meses e que achava que não iria chegar. Por saber que seria fundamental para a minha formação e por saber que, naquela secção, provavelmente seria a minha única oportunidade, a Ivete decidiu entregar-me este trabalho.

Dirigi-me até às caves de vinho do porto, em Gaia, onde Ricardo se encontrava à minha espera. Durante a viagem de táxi, revi todas as perguntas que lhe deveria fazer e receei que a ansiedade me calasse. Mas o Ricardo, com o seu espírito tipicamente brasileiro e de rosto sorridente, deixou-me logo à vontade.

A entrevista foi longa. Para todas as minha perguntas, o Ricardo tinha respostas longas. Algumas improvisadas, outras que já lhe saíam mais naturalmente dado que, como político, já estava, certamente, habituado a ser entrevistado. Ocasiões houve em que dispersava e levava-me com ele, mas logo depois dava conta e trazia-o de volta ao assunto principal. A ser sincera, não foi, de todo, o tema mais cativante com que trabalhei, mas foi o tema que permitiu rematar a minha formação com o parâmetro que faltava.

Mais dentro da normalidade, desenvolvi um trabalho sobre a crise humanitária no Iémen que me tocou bastante. Uma das particularidades de trabalhar na secção Mundo é a de estar em contacto com realidades muito diferentes da que vivemos em Portugal. Como cidadã informada e interessada, vou sabendo, melhor ou pior, do que se passa dentro do nosso país que já pouco me choca por sermos um país civilizado, democrático, sem grandes crises políticas ou sociais. Porém, olhar para a organização (ou desorganização) de países como o Iémen, no Médio Oriente, não é algo que se faça de ânimo leve.

Considerada à data a pior crise humanitária do mundo, conduzida por um conjunto de conflitos internos de caráter sectário, político e religioso quase desde o início do século,

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a tensão no Iémen aumentava à medida que o bloqueio punha em risco a vida de milhares de habitantes. Não só das agências chegava esta informação como chegavam também imagens chocantes, principalmente aquelas que retratavam tão graficamente o estado em que se encontravam as crianças, o elo mais frágil no meio do conflito.

Um dos temas que me foi atribuído logo no início do estágio e que fui sempre acompanhando ao longo dos meses foi a crise étnica em Myanmar, um país do sul da Ásia que, tal como o Iémen, vivia momentos de grande tensão. Ainda que a crise em Myanmar não recuasse tanto no tempo como o conflito Iemenita, milhares de vidas estavam em perigo, outras tantas a morrer no meio de uma discórdia em que nem sequer tinham uma palavra a dizer.

Contudo, foi a crise no Iémen (cf. anexo 5) que me fez parar e colocar os pés na terra. Fez-me pensar para além do texto e perceber que, com a prática, desligamos o nosso lado humano. Percebi que ao escrever todas estas peças sobre temas tão delicados, me afastei do sentimento e tornei-me a algo semelhante a um robot. Muitas vezes ouvia-se: “Se só há feridos ainda não é notícia. Se houver mortes, aí sim, damos prioridade”. Nas palavras de Nelson Traquina, “onde há morte há jornalistas” (2004, p.108). Bem sei que, se nos deixarmos afetar por tudo o que noticiamos, a nossa saúde mental fica destabilizada, mas por outro lado, não podemos perder a compaixão, a solidariedade e a tristeza senão deixamos de ser pessoas.

Desta forma, o mês de novembro foi um mês de muitas emoções: umas boas, por ter tido a possibilidade de melhorar as minhas capacidades e cumprir o desejo de sair da redação, outras não tão boas, por ter percebido que muitas vezes, inconscientemente, nos tornamos máquinas de escrever e somos indiferentes ao que estamos a relatar.

1.3.5. Dezembro: a contagem final

Neste último mês de estágio – que encerraria a minha breve passagem pelo JN – a produção de trabalhos foi significativamente menor. Em parte, por ter sido época natalícia e pelos feriados do mês me terem roubado dias de trabalho no jornal e, por outro lado, por ter desenvolvido a peça mais extensa de todo o estágio que implicou estar ausente da redação mais tempo 5 (cf. anexo 6).

5 Disponível em URL:

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O desafio de propor um tema para fazer um trabalho produzido única e exclusivamente por mim, tinha já sido lançado em novembro, porém, nada parecia alimentar o meu espírito. Quando no início de dezembro se tornaram públicas duras críticas feitas ao Facebook por um ex-diretor executivo do mesmo, vi uma oportunidade de fazer uma peça diferente que poderia também agradar a um público mais jovem. Com a ajuda da Ivete, que me disse que a peça iria ser publicada no dia 25 de dezembro, elaborei um plano de trabalho e comecei a pensar em quem poderia entrevistar.

De acordo com Felisbela Lopes (2016), “em contexto de retenção de despesas, há que trabalhar mais rápido e com menos custos. Isso origina uma diminuição de contactos com as fontes” (p.72). Neste caso concreto, e para contrariar a ideia da mesma autora de que “(…) perante a impossibilidade de ouvir todos aqueles que interessam, os jornalistas refugiam-se nas versões das elites do poder. Que se repetem invariavelmente em todos os média noticiosos.”, o objetivo era ter uma peça concisa e justa com diferentes perspetivas sobre o tema.

Achei que seria interessante confrontar a opinião de especialistas de diferentes áreas. Desta forma, optei por escolher um professor da área das ciências da comunicação, Helder Bastos, um da área da sociologia, o professor João Teixeira Lopes, ambos docentes da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e Fábio Malini, professor e investigador na área das ciências de dados, redes sociais e comunicação política. Dar ao leitor um leque de opiniões díspares sobre o tema era fundamental, ainda mais por se tratar de um tema tão polémico que tem gerado imensa discussão no seio da sociedade como o das redes sociais e a sua influência.

Foi fascinante produzir este trabalho, realizar as entrevistas – que me deram, uma última vez, a oportunidade de deixar o sedentarismo da redação e sair –, analisar toda a informação, escolher o que mais importava e finalmente compactar tudo num texto que agarrasse o leitor. Sentir que, chegava ao fim com “chave de ouro”, como a equipa me disse e, mormente, sentir que chegava ao fim da minha formação no JN, com todos os objetivos que tinha traçado no início, cumpridos.

1.4. O Mundo do avesso

Não poderia fechar este relatório sem relembrar alguns dos momentos que me mostraram a paixão e a dedicação que toda a equipa tem pela secção e que me ensinaram a ter garra e a lutar por aquilo em que acredito.

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A falta de espaço era uma constante para nós (Mundo). Todos os dias a Ivete barafustava por só termos duas ou três páginas e nunca se resignava ao que lhe era dado. Quanto mais não fosse, lá conseguia que tirassem uma publicidade do espaço que já era pouco. E vinha vermelha e suava, mas conseguia vencer a dela e fazer ver que a secção – que eu considero que é um pouco marginalizada – tivesse um pouco mais de acuidade.

Outro dos momentos que deixava o Mundo em reboliço era a falta de compreensão pelos temas que tratávamos. Olhos leigos vinham falar deste ou daquele assunto que até “era engraçado” sermos nós a dar. E lá voltava a editora para a “guerra” para lutar pelo bom senso das pessoas e pelo bem da secção.

Em pleno dezembro estava a terminar uma peça sobre os EUA, quando o Alfredo Maia me pediu que visse uma história sobre um indivíduo que tinha ganho o cabaz de natal em Espanha e que agora tinha uma dívida enorme (cf. anexo 7). Conhecendo o Maia como conhecia àquela altura, percebi que o pedido não vinha dele e claro, também eu com o meu espírito contestatário, lhe disse que aquilo não fazia sentido. Que era muito mais importante o que estava a escrever inicialmente. Ainda mais depois de perceber que a história remontava a 2014.

Obviamente que pouco me adiantou reclamar. Fiz o que me mandaram, em tom contrariado, mas mantendo sempre o profissionalismo, e esperei pelo dia seguinte. Pouco passava das 14h quando a Ivete chegou à redação e a primeira coisa que disse foi: “abri o jornal e o que vi deu-me vontade de chorar”. E todos sentíamos o mesmo, mas nem sempre ganhávamos as batalhas.

Estagiar na secção Mundo foi, sem dúvida, andar num carrossel de emoções. Aprendi, sobretudo, a lidar com pessoas, que sabem valorizar o trabalho uns dos outros, que se dedicam de corpo e alma à sua profissão e que, acima de tudo, não deixam que a monotonia os vença. Virar do avesso, lutar, reinventar e fazer melhor, posso dizer, é o lema que levo destes quatro meses.

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Capítulo 2. As rotinas de produção – Enquadramento teórico

O objetivo geral deste relatório é explorar e compreender as rotinas de produção executadas pelos jornalistas. Concretamente, procurámos conhecer e identificar as rotinas, de modo a percebermos o que fazem os jornalistas e como fazem, quer sejam os processos de produção dos jornalistas que trabalham, maioritariamente, quer para o jornal impresso, quer dos que trabalham para o jornal online.

Nos últimos anos, as redações têm sofrido diversas alterações. Com o surgimento da Internet, o ambiente digital tomou conta das salas de trabalho e introduziu novas rotinas produtivas nas redações, alterando muitas das formas de trabalho já existentes. Este foi um ponto de viragem nos média noticiosos do fim dos anos 90 e principalmente no século XXI que deu origem a um “novo” tipo de jornalismo. “Os jornais têm vindo a adequar os seus conteúdos e formatos aos desafios tecnológicos, bem como às várias exigências do mercado, modificando práticas anteriormente instituídas” (Ribeiro & Resende, 2017, pp.139-140). Essencial será, portanto, perceber o conceito de rotinas. Em primeiro lugar, perceber como funcionam a nível organizacional e posteriormente como funcionam quando aplicadas ao universo dos média noticiosos, no caso concreto deste trabalho, às rotinas de produção.

Neste projeto iremos reputar como rotinas produtivas os padrões de comportamento que guiam o jornalista dentro da redação. Primeiramente, analisaremos as rotinas como conceito geral considerando-as, do ponto de vista organizacional, como um padrão repetitivo de atividade. Entendendo que, de empresa para empresa, os métodos de trabalho variam bem como a sua organização interna é necessário, numa primeira fase, revisitar algumas das teorias organizacionais que tiveram grande impacto nas rotinas jornalísticas e só depois reduzir o espectro do trabalho. Posteriormente, restringiremos o nosso campo de estudo para o campo jornalístico e os seus atores, falando de rotinas como possível habilidade individual.

2.1. O que são as rotinas?

Vários têm sido os autores a explorar este tema bem como a dimensão da sua influência no jornalismo. Contudo, apesar da diversidade de estudos existentes, parece continuar a não haver um entendimento concreto. Talvez porque, na sua maioria, os estudos que empregam o termo não explicitam o conceito, outros fazem-no de maneira tão abrangente que se torna difícil identificar o que está a ser analisado (Milagres, 2011,

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p.164). Há quem considere ainda que a literatura tem sido pouco esclarecedora devido à falta de pesquisas empíricas que validem as suas características e papéis (ibid). Em relação aos estudos sobre rotinas de produção, Domingo (2006) assevera: “the most direct precedent was the gatekeeper theory, formulated by David M. White in 1950, an oversimplification of journalists’ tasks that nonetheless was really useful to conceptualize the selection process that news undergo” (p.147). Outra premissa que tem pairado sobre os estudos do processo de produção jornalística é que este vai para além da análise dos processos de seleção de conteúdo noticioso. Debrucemo-nos, para já, nas teorias organizacionais.

De acordo com Sidney Winter (2000), uma rotina de alto nível (ou uma coleção de rotinas) equipara-se a uma capacidade organizacional, na medida em que confere à gestão de uma organização um conjunto de opções de decisão para produzir saídas significativas de um tipo específico (p.983). O mesmo autor argumenta que as rotinas podem ser observadas como uma atividade repetitiva que se consubstancia no interior de uma organização e que decorre fundamentalmente da mobilização e da expressão de competências individuais (Nelson & Winter, 1982 citado em Corazza & Fracalanza, 2009, p.129). Por sua vez, Rosiléia Milagres (2011) propõe uma visão sobre o conceito dividido em três grupos teóricos que entendem as rotinas como: 1) um padrão de comportamento que diz respeito à teoria supracitada de Winter; 2) regras ou procedimentos operacionais que se configuram como regras de decisão com o objetivo de minimizar a necessidade de preverem eventos futuros incertos; 3) disposições coletivas que levam os agentes a praticarem comportamentos adquiridos ou adotados previamente (pp.164-165).

Verdadeiramente, acreditamos que estas definições de rotina acima apresentadas, respetivamente, por Nelson & Winter (1982), Kogut & Zander (1994) e Zollo & Winter (2000), são indissociáveis. Segundo Nelson e Winter (1982), “[routines] are a persistent feature of the organism and determine its possible behavior”, apesar do comportamento ser também, em boa verdade, determinado pelo ambiente. São igualmente “heritable in the sense that tomorrow's organisms generated from today's (…) have many of the same characteristics” (p.14). As rotinas podem funcionar dentro de uma empresa com todas estas características, complementando-se umas às outras. Os padrões de comportamento são, de certo modo, regras invisíveis que são adquiridas a partir do momento em que o agente da ação se adapta ao ambiente em que está inserido e ajudam quer a empresa quer o agente a reduzir os imprevistos, a dividir trabalhos e tarefas e a lidar melhor com a pressão de qualquer acontecimento não programado. Assim sendo, as rotinas oferecem, não só,

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estrutura às empresas como também “sequência e uniformidade, exercendo, portanto, papel de coordenação” (Becker, 2005; Dosi; Nelson; Winter, 2000 citados em Milagres, 2011). Outro dos pontos fundamentais das rotinas é que estas permitem minimizar conflitos, ou seja, intercedem como métodos apaziguadores, mantendo a harmonia organizacional. Como afirmam Nelson & Winter (1982): “[the] fear of breaking the truce is, in general, a powerful force tending to hold organizations on the path of relatively inflexible routine” (p.112).

Neste relatório, serão consideradas rotinas, os padrões de comportamento regulares que guiam a atividade dentro de uma empresa e que permitem executar as tarefas uniformemente. São caracterizadas pela capacidade de serem repetidas, mas também pela sua flexibilidade em serem adaptáveis ao ambiente, já que podem variar de empresa para empresa, ou de grupo de trabalho para grupo de trabalho. Milagres (2011) é congruente com esta perspetiva, considerando que “as rotinas, portanto, podem ser dinâmicas, dependendo do tipo de atividades às quais estão conectadas” (p.171).

2.2. Rotinas de produção jornalística

Centremo-nos agora no objetivo principal deste relatório: perceber o que os jornalistas fazem durante o seu dia a dia de trabalho e como é que o fazem. Para isso é necessário focarmo-nos nas rotinas produtivas do jornalismo. Aplicadas às salas de redação e aos jornalistas, podemos considerar que as rotinas funcionam como estruturas de comportamento regrado e previsível que conduzem a esquemas repetitivos de atividade (Corazza e Fracalanza, 2004). Na ótica sociológica do newsmaking, “the reality is a social construction mediated by processes that can be identified and analyzed” (Domingo, 2006, p.148). Assim, a intenção será tentar identificar e analisar os métodos utilizados pelos jornalistas na construção de notícias. “Research on newsmaking identifies work organization in the newsroom as the main factor determining content of the media” (Domingo, 2006, p.149)

A redação é tomada como o espaço de trabalho onde se assimilam todas as rotinas inerentes à cultura da profissão, mas ao mesmo tempo é um espaço repleto de barreiras às quais os profissionais têm de dar resposta. Considere-se a proposta de Pamela Shoemaker (1996):

Given finite organizational resources and an infinite supply of potential raw material, routines are practical responses to the needs of media organizations and

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workers. The job of these media organizations is to deliver, within time and space limitations, the most acceptable product to the consumer in the most efficient manner (pp.103-104).

As rotinas são, assim mesmo, uma resposta natural ao ambiente que se vive dentro da redação e a maior “muleta” de trabalho para os jornalistas. São também caracterizadas “pela experimentação, o que faz com que as tarefas sejam executadas de maneira progressivamente melhor e mais rápida, propiciando a geração constante de novas oportunidades de operação” (Corazza & Fracalanza, 2009, p.130). Este é um ponto fundamental na produção de notícias dentro das redações tradicionais, mais ainda nas redações marcadas pelo digital, onde as noções de tempo e espaço são constantemente desafiadas (consultar subcapítulo 2.3).

Recuperando a tese de Shoemaker, entendemos que as rotinas são as linhas essenciais que guiam as empresas jornalísticas. Estas mesmas regem-se por uma estrutura temporal pouco flexível, isto é, por uma estrutura que funciona em contrarrelógio e, por essa razão, é necessário que as rotinas sejam seguidas. Arriscamo-nos mesmo a dizer que o fator tempo é o maior desafio imposto ao trabalho dos jornalistas. Para o sociólogo Philip Schlesinger, “as empresas jornalísticas são como uma “máquina do tempo” que funciona diariamente marcada pelas horas de fecho” (citado em Traquina, 2004, p. 78). Deste modo, mais do que cumprir as tarefas diárias do “dia noticioso”, os jornalistas têm de estar preparados para o inesperado. Uma das características do jornalismo é a imprevisibilidade dos eventos a ser noticiados o que faz das rotinas, não rotinas. Isto significa que é impossível rotinizar algo que não se pode prever, mas, ao mesmo tempo, podem ser criadas estratégias e táticas para lidar com este tipo de eventos.

2.2.1. Rotinas no jornalismo impresso

Nas redações, as rotinas estendem-se ao possível. Criam os seus próprios ritmos de trabalho, uma agenda de cobertura noticiosa onde estão programados eventos futuros e, aquando o inesperado, os jornalistas estão já munidos de competências para gerir os cenários de emergência. Observamos, portanto, que rotinas permitem criar um método de trabalho conciso e, como afirma Traquina (1998), “asseguram ao jornalista, sob a pressão do tempo, um fluxo constante e seguro de notícias e uma rápida transformação do acontecimento em notícia, isto é, permitem ao jornalista que “controle” o seu trabalho” (citado em Sousa, 1999). Não poderemos, deste modo, descartar que as notícias são

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influenciadas pela forma como o profissional desempenha o seu trabalho e pelas suas rotinas, não considerando, contudo, que sejam definidas. São sim “os comportamentos com os quais os jornalistas estão familiarizados e dos quais resultam as notícias” (Jerónimo, 2015, p. 41). Fundamentalmente, dentro das redações, as rotinas centram-se na procura e captação da informação, na seleção e na apresentação. É aqui que se aprofunda a questão das rotinas de produção jornalística.

Até agora, já comparamos e elaboramos considerações sobre as rotinas enquanto conceito mais amplo e enquanto conceito dentro do ambiente jornalístico. Já sabemos que as rotinas que regem as salas de redação são fundamentais para o bom funcionamento da mesma por isso é necessário, a partir daqui, refletir sobre outro tipo de rotinas mais específicas do campo jornalístico. A construção noticiosa tem como principal agente o jornalista e, portanto, todo o processo de decisão que dará origem às notícias vai desde o momento em que o jornalista “contacta pela primeira vez com determinada informação, até à publicação da notícia” (Jerónimo, 2015, p.41). Estas são as “fases principais da produção quotidiana” e que se estendem as todos os órgãos de comunicação, sendo também as fases que “mais incidem na qualidade da informação” (Wolf, 1992, p.193).

A produção noticiosa é marcada por uma sequência de procedimentos bastante rígida, com diversos níveis que se articulam entre si. Certamente, haverá uma quantidade inumerável de tarefas que os jornalistas executam involuntariamente. Porém, há rotinas que são incontornáveis na produção de notícias, sendo essas, os processos de decisão que determinarão o produto final. Pamela Shoemaker e Tim Vos (cit. dos Santos & Neto, 2013) igualam as rotinas de produção à teoria do gatekeeping, descrevendo este processo como “processo de seleção e transformação de vários pequenos pedaços de informação na quantidade limitada de mensagens que chegam às pessoas diariamente” (p.108), reforçando que para ser transformada em notícia, a informação passa por diversos profissionais (dependendo da hierarquia da empresa jornalística). Noutro prisma, Wolf (1992) considera que as rotinas de produção jornalística se dividem em três fases: a recolha, a seleção e a apresentação. São estas fases de produção, articuladas com as rotinas organizacionais, que permitem construir uma notícia coesa e coerente. “Na lógica do newsmaking a seleção das fontes e o trabalho de apuração, redação e circulação da notícia constituem elementos determinantes da operação de produção informativa” (Junior & Antonioli, 2016, p.49).

De acordo com Wolf (1992), “a fase de recolha de materiais noticiáveis é influenciada pela necessidade de se ter um fluxo constante e seguro de notícias, de modo a conseguir-se sempre executar o produto exigido” (p.195). Assim mesmo, observamos que

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este primeiro período é o mais importante das rotinas produtivas uma vez que é neste que o jornalista entra em contacto com toda a informação disponível e tem, por sua vez, de decidir que informação será notícia ou não, dando forma às páginas do dia seguinte. Esta é também uma fase que incluí não só o jornalista como também editores de secção, chegando, nalguns casos, aos diretores do jornal, que dão às escolhas do jornalista o aval final. Todavia, não devemos deixar de salientar a forma negativa como as rotinas podem influenciar a produção jornalística. Consideremos os canais de recolha de informação. Estes são fundamentais nesta fase de recolha. São eles agências noticiosas, fontes oficiais, fontes cultivadas pelo próprio profissional, entre outros e funcionam como próprias ferramentas de recolha de informação e tornando-se, em muitas redações, o instrumento padrão. Não podemos deixar de salientar que se o jornalista se prender a elas e não cultivar o seu próprio trabalho, põe em risco a qualidade do produto final. Este primeiro momento dos processos de decisão pode assim, tornar-se perigoso. “(…) the external suppliers of content—sources who control the information given to the media. They either facilitate or constrain the flow of information” (Shoemaker & Reese, 2014, p. 164). Pode observar-se, em muitos casos, que os jornalistas incorrem no erro de depender destes canais, incluindo-os na sua rotina. Ao depender dincluindo-os canais como incluindo-os acima citadincluindo-os para recolher o material necessário, o jornalista não parte altruistamente em busca de material noticioso. Ao invés, recolhe material já trabalhado por outros. Isto é, recolhe material de canais rotinizados.

“Os estudos de newsmaking salientam que uma das causas da já citada fragmentação (…) na informação de massas reside nos procedimentos rotineiros de recolha de materiais de onde se vão extrair as notícias. Na enorme maioria dos casos, trata-se de material produzido em outro local, que a redação se limita a receber e a reestruturar…” (Wolf, 1992, p.194).

Este é um dos fatores mais dissonantes do jornalismo moderno. É um jornalismo que, na sua fase de recolha de material, não depende de si mesmo, mas sim de outrem. Uma dependência que poderá afetar o produto final – as notícias. Falamos da rotinização na relação dos jornalistas com as fontes nesta fase de recolha.

De acordo com Nelson Traquina (2002), quando a relação entre jornalistas e fontes se torna “parte da mesma 'rotina' de uma forma regular, podem estabelecer uma interdependência” (p.120). Interdependência essa que pode afetar o produto final, na medida em que condiciona o jornalista. Este acaba por cair num comodismo exacerbado e faz da sua rotina de produção a consulta dos mesmos canais de informação, quer sejam

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agências de notícias, quer sejam de fontes, desafiando a linha ténue da qualidade da informação que chegará ao leitor. Podemos considerar que este é um problema que está, uma vez mais, relacionado com o tempo já que a necessidade de ter um “fluxo constante e seguro de notícias” leva a que se “privilegie os canais de recolha e as fontes (de informação)” (Wolf, p.195). Esta interdependência nas rotinas de produção dá força à afirmação de Traquina. O autor defende a ideia de que a notícia não é um simples espelho da realidade. Pode sim dizer-se que a notícia é influenciada por um conjunto de fatores externos e internos aqui mesmo, na primeira fase de produção. Fase essa, conclui-se, que influencia as seguintes, a de seleção e a de apresentação. “Devido à complexidade e subjetividade dos fatos, os jornalistas são induzidos pelas rotinas, que assimilam, para fazerem um recorte desses mesmos fatos. Elas são, por isso, mais frequentemente um reflexo do meio jornalístico do que a realidade descrita” (Moretzsohn, 2002 citado em Jerónimo, 2015, p.42).

Conclui-se ainda que, também os processos de produção de material noticioso, de construção da notícia, estão interligados às rotinas de produção e são, sem dúvida profundamente influenciados por elas. Falar em rotinas de produção não é só falar nas estruturas invisíveis que tão beneficamente guiam o trabalho do jornalista do início ao fim do dia, é falar também nos malefícios de ficar preso a estas rotinas e de estendê-las para todo o trabalho, criando, mesmo sem se aperceber, uma relação de dependência, quer seja de canais de informação, quer seja da forma como escreve, quer seja da forma como pensa.

2.2.2. Rotinas no ciberjornalismo

A introdução da Internet nas redações foi uma das maiores alterações do ambiente jornalístico do último século. Para Bastos, Lima, Moutinho e Reis (2013), “como inovação tecnológica [a Internet] influenciou a profissão a diversos níveis, provocando transformações no fluxo das notícias, no quotidiano dos jornalistas e na responsabilidade profissional” (p.12). Já para Zamith (2011), com a chegada da Internet à imprensa, a rádio e a televisão perceberam que tinham em mãos “uma forma adicional de chegar às suas audiências e de, eventualmente, conquistar novos públicos e novas receitas” (p.19). A par das primeiras descobertas, previsões e dúvidas, surgiu também a necessidade de se criar uma nomenclatura que desse significado a este “novo” jornalismo (Jerónimo, 2015, p.22). Ainda que o conceito base do “novo” fosse o mesmo que o do “velho”, foi necessária a criação de uma nova definição que distinguisse o jornalismo tradicional do jornalismo

Referências

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