Interação entre a Profundidade Óptica do Aerossol e a Fração de
Cobertura de Nuvens na Amazônia utilizando dados obtidos com
o MODIS
Vinícius Roggério da Rocha¹, Marcia Akemi Yamasoe²
¹ Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas, Univ. de São Paulo, viniroger@model.iag.usp.br ¹ Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas, Univ. de São Paulo, akemi@model.iag.usp.br
ABSTRACT: The relationship between aerosols and clouds is one of the largest sources of
uncertainty in estimating the anthropogenic radiative forcing causing global climate change. Particles emitted by biomass burning in the Amazon during the dry season can modify cloud properties and change the surface and atmospheric radiative balance. Koren et al. (2008) showed that the changes in cloud properties occur through radiative and microphysical processes, so cloud cover fraction (CF) increases for low aerosol optical depth (AOD), as the microphysical effect product, and CF decreases with the increase of AOD for higher values of AOD, as radiative effect. We analyzed products derived from observations of MODIS sensor on board Terra and Aqua satellites, with information about aerosols and clouds, between the years 2002 and 2008. Some considerations were made, based on Koren et al. (2008) study: the values of CF and AOD were sorted as function of AOD and averages were calculated for each 50 samples, for each sector; we also considered only AOD values between 0 and 0.8, in order to avoid erroneous classification of aerosols and clouds schemes of high values of AOD; the cases were restricted to low clouds through the cloud top pressure. For all the years, the influence of microphysical effects was observed during the dry season, but the radiative effect was less clearly observed in some years. The same relationships were observed in data obtained from the TERRA and AQUA satellites, but the magnitude of CF during the afternoon (AQUA) is higher.
Palavras-chave: Aerossóis, Nuvens, Amazônia, Sensoriamento Remoto. 1 – INTRODUÇÃO
Os aerossóis interagem com a radiação solar e afetam o clima de modo direto (balanço radiativo) e indireto (como núcleos de condensação) [Koren et al., 2008]. Os efeitos diretos dos aerossóis no clima envolvem espalhamento de radiação, que reflete parte da radiação solar de volta ao espaço, assim como absorção, que resulta em aquecimento da camada atmosférica que contém os aerossóis e resfriamento das camadas inferiores devido à extinção do fluxo solar. Quanto aos efeitos indiretos, esses podem ser classificados como 1° efeito indireto, cujo aumento do número de núcleos de condensação de nuvens (NCN) implica em um maior número de gotículas [Albrecht, 1989], do conteúdo de água e do albedo da nuvem [Twomey, 1977], e 2° efeito indireto, que se refere às alterações induzidas pelas mudanças nas propriedades das nuvens, como supressão de chuva fraca [Rosenfeld, 1999], aumento da altura da nuvem [Pincus e Barker, 1994, Andreae et al., 2004] e do seu tempo de vida [Albrecht, 1989]. Ainda existem efeitos indiretos em nuvens na fase gelo e o efeito semi-direto, no qual o aquecimento da camada por aerossóis absorvedores induzem à redução de nebulosidade e da refletividade das nuvens [Kaufman e Nakajima, 1993]. Todos esses fatores alteram o balanço radiativo e faz com que o sistema meteorológico restabeleça um novo ponto de equilíbrio, que pode se caracterizar em aquecimento ou resfriamento.
A relação entre a fração de cobertura de nuvens (CFM) em função da profundidade óptica do aerossol foi embasada teoricamente e modelada algebricamente por Koren et al. (2008). Esse estudo verificou, através de produtos derivados por sensores a bordo de satélites
sobre a região amazônica, que a fração de cobertura de nuvens cresceu em condições de baixa AOD (menor que 0,2-0,3) e diminuiu com a AOD para valores maiores desta variável, considerando-se medições realizadas no ano de 2005. Estudos de Yu et al. (2007) observaram um aumento da CFM e decréscimo do raio efetivo com o aumento da AOD para o ano de 2003, que possuía uma atmosfera mais úmida e menos estável. Porém, para o ano de 2002, considerado um ano mais seco, houve diminuição da CFM com o aumento da AOD. As diferenças entre os estudos podem estar relacionadas às diferenças metodológicas de seleção e análise dos dados e também aos anos escolhidos para análise, que possuem diferentes condições meteorológicas.
A Bacia Amazônica, de modo geral, possui sua estação chuvosa entre os meses de novembro e março e estação seca entre maio e setembro, sendo os meses de abril e outubro estações de transição [Fisch, 1998]. Sob condições naturais, a concentração de NCN na Bacia Amazônica é quase tão baixa como em regiões oceânicas [Roberts et al., 2001]. A queima de biomassa durante as estações seca e de transição é uma grande fonte de partículas de aerossóis para a atmosfera.
O presente trabalho buscou analisar a relação entre a CFM e a AOD modelada por Koren et al. (2008) para outros anos além dos verificados pelo já citado trabalho, utilizando metodologia semelhante.
2 - MATERIAL E MÉTODOS
Esse estudo utiliza o produto diário de nível 3 com informações sobre nuvens e aerossóis obtidas através do sensor MODIS (Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer), a bordo dos satélites Aqua e Terra, entre os anos de 2002 e 2008. São baseados nos produtos de nível 2 de aerossol, nuvens e perfil atmosférico e possuem resolução de 1° x 1°. Em cada arquivo diário, os produtos são apresentados em termos de estatística básica (média, desvio padrão, valores máximos e mínimos) [Hubanks, 2008, King et al., 2003] e disponibilizados em arquivos HDF (Hierarchical Data Format).
Os dados utilizados estão limitados pelas latitudes 5°N e 16°S e pelas longitudes 75°W e 46°W, porém foram eliminados os pontos de grade sobre a Cordilheira dos Andes, Oceano Atlântico e a região de fronteira entre Roraima e Venezuela, que possui um período de seca diferenciado. Foram construídos gráficos da fração de cobertura de nuvens (CFM) em função da profundidade óptica do aerossol (AOD), cujos pontos representam cada ponto de grade. Também foram impostas restrições aos valores de AOD em menores que 0,8, com o objetivo de eliminar possíveis classificações errôneas entre nuvem e aerossol em regimes de alta AOD, e aos valores de pressão do topo de nuvem (CTP, entre 1000 e 800 hPa), visando separar nuvens quentes de nuvens com fase gelo. Os valores de CFM foram ordenados em função de AOD e calculadas médias a cada 50 amostras, conforme realizado em trabalho de Koren et al. (2008). Outra metodologia foi realizada, separando-se as amostras em intervalos (bins), de largura 0,01 para AOD menor que 0,3 e de largura 0,1 para valores maiores. Ambas as metodologias constituem-se de organização dos valores em grupos ordenados pelo valor médio da variável independente (no caso, a AOD), porém a primeira metodologia mantém o número de amostras constantes por grupo, enquanto que a segunda (por bins) mantém constante a largura do intervalo.
3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
Observando-se os gráficos, o padrão encontrado para todos os anos apresentou um aumento da CFM com um acréscimo de AOD até um máximo por volta de AOD igual a 0,2-0,3, que representa o efeito microfísico, e diminuição da CFM com o acréscimo de AOD após esse máximo, em alguns anos de forma menos pronunciada, que representa o efeito radiativo. Os efeitos aparecem quando utilizados valores obtidos durante a estação seca (fig. 3.1).
Fig. 3.1: Fração de cobertura de nuvens em função da profundidade óptica do aerossol para os anos de 2002 a 2008 do satélite Terra (pontos representam conjuntos de 50 amostras).
Fig. 3.2: Fração de cobertura de nuvens em função da profundidade óptica do aerossol separada em intervalos de largura 0,01 para AOD menor que 0,3 e de largura 0,1 para valores maiores, para os anos de 2002 a 2008 dos satélites Terra (esquerda) e Aqua (direita). As análises discutidas até aqui foram realizadas com os dados obtidos a partir dos satélites Terra e Aqua, sendo seus resultados similares (fig. 3.2). A exceção se dá pela magnitude da CFM ser maior nos dados obtidos com o Aqua, devido ao fato da sua passagem pela região amazônica ocorrer no período da tarde, quando as nuvens estão mais desenvolvidas. Conseqüentemente, as posições relativas dos picos das curvas de cada ano foram ligeiramente deslocadas para menores valores de AOD e maiores valores de CFM.
4 – CONCLUSÕES
Ao ordenar-se os valores de AOD e calcular médias a cada 50 amostras ou separando-se os dados em intervalos, o comportamento médio revela os efeitos microfísico e radiativo previstos por Koren et al. (2008), porém em alguns anos o efeito radiativo revela-se menos evidente. Analisou-se com dados obtidos durante a estação seca, restritos a nuvens baixas, dos satélites Terra e Aqua, este, porém, com valores de CFM de maior magnitude.
Como perspectiva futura, pretende-se: aplicar restrições para separar os diferentes cenários com diferentes condições de formação de nuvens, como diferentes condições de disponibilidade de vapor d’água e de estabilidade atmosférica; verificar possíveis classificações errôneas entre aerossóis e nuvens; analisar a existência e influência de sistemas meteorológicos de mesoescala e de escala sinótica.
5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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