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Acordam, em conferência, na 2.ª Secção Criminal (4.ª Secção Judicial) do Tribunal da Relação do Porto.

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 4746/09.0TAMTS.P1 Relator: MOISÉS SILVA

Sessão: 06 Junho 2012

Número: RP201206064746/09.0TAMTS.P1 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: REC PENAL Decisão: PROVIDO

CONSTITUIÇÃO DE ASSISTENTE NOTIFICAÇÃO

IRREGULARIDADE CASO JULGADO

Sumário

I - A falta de notificação do despacho de indeferimento do pedido de

constituição como assistente constitui irregularidade que, tempestivamente arguida, determina a invalidade do ato.

II - Apesar de a sentença ter transitado em julgado relativamente ao Mº Pº e arguido, na parte que tem a ver com os eventuais interesses do requerente, não transitou em julgado, pelo que a irregularidade não está sanada, devendo praticar-se os atos necessários à realização do direito deste.

Texto Integral

Processo n.º 4746/09.0TAMTS.P1

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção Criminal (4.ª Secção Judicial) do Tribunal da Relação do Porto.

I - RELATÓRIO

1. No processo acima identificado do 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos foi proferido de fls. 237 a 241, em 12.12.2011, o seguinte

despacho, que se transcreve:

Por requerimento de 31 de outubro de 2011 (fls. 217 e ss.) veio o Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, em síntese, alegar e requerer o seguinte:

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Notificada da dedução da acusação imputando ao arguido B… a prática de um crime de procuradoria ilícita, o Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados apresentou, em 01.02.2010, requerimento para constituição como assistente (fls. 94) e requerimento a acompanhar a acusação pública deduzida pelo Ministério Público, no qual formula pedido de indemnização civil (fls. 97).

Os autos foram remetidos ao Juiz de Instrução Criminal (JIC), que indeferiu o pedido de constituição de assistente.

Desde então, o Conselho Distrital não foi notificado da prática de qualquer ato no processo, nem sequer do referido despacho do JIC (que, por lapso, foi

notificado ao mandatário da assistente C…).

Posto isto, alega que viu negado o seu direito ao recurso dessa decisão, sendo que a falta de tal notificação constitui irregularidade que afecta a validade dos atos processuais posteriores, nos termos do disposto no artigo 123.º do Código de Processo Penal.

Alega ainda que o pedido de indemnização civil que deduziu não foi recebido, aquando da prolação do despacho previsto no artigo 311.º do Código de

Processo Penal, o que também constitui uma irregularidade.

Invoca ainda a nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea b) do Código de Processo Civil, em virtude de não ter sido notificado, na qualidade de

demandante civil, do despacho que designou data para realização da

audiência de discussão e julgamento, pelo que a mesma foi realizado sem a sua presença.

Invoca finalmente a nulidade da sentença proferida, por omissão de pronúncia relativamente ao pedido de indemnização civil formulado, conforme o disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal.

Conclui ainda estar em tempo para arguir todos os referidos vícios, posto que, pese embora o processo esteja já arquivado, só agora o requerente tomou conhecimento dos mesmos, atenta a omissão total de notificação ao

requerente de quaisquer atos praticados no processo desde que este apresentou os requerimentos de 01.02.2010.

O Ministério Público pronunciou-se nos termos constantes de fls. 226 a 231, concluindo no sentido de, pese embora se verifiquem, efetivamente, os erros apontados pelo Requerente, o trânsito em julgado obsta a que se extraiam deles outras consequências, nomeadamente a anulação do processado a partir da decisão que indeferiu o pedido de constituição de assistente formulado pelo requerente que erradamente foi efetuado a interveniente diverso, pelo que o tribunal está impedido de proceder à anulação do processado.

O arguido B… pronunciou-se a fls. 236, subscrevendo a promoção do Ministério Público.

*

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Cumpre apreciar e decidir.

A violação ou inobservância das disposições da lei do processo só determina a nulidade do ato quando esta for expressamente cominada na lei. Nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o ato ilegal é irregular (artigo 118.º do

Código de Processo Penal).

Seguindo de perto SIMAS SANTOS E LEAL-HENRIQUES (in Código de Processo Penal Anotado, Vol. I, Rei dos Livros, 3.ª Edição, 2008, p. 731), diremos que os vícios dos atos processuais podem assumir três graus:

1) Vício mínimo: mera irregularidade;

2) Vício intermédio: nulidade, que pode ser absoluta ou insanável e relativa ou sanável;

3) Vício máximo: inexistência jurídica.

A arguição das nulidades sanáveis tem de ser feita de acordo com o disposto no nº 3 do referido artigo 120.º, variando o prazo em que tal deve suceder em função do facto originário da nulidade processual. Se não for cumprido o prazo legalmente estipulado, a nulidade considera-se sanada.

A declaração da nulidade insanável pode ter lugar em qualquer fase do procedimento, mas apenas enquanto a decisão final não transita em julgado.

Efetivamente, a nulidade absoluta não pode ser declarada após a formação do caso julgado da decisão final que, neste aspecto, actua como meio de sanação (GERMANO MARQUES DA SILVA – Curso de Processo Penal, Vol. II, Editorial Verbo, 2008, p. 93; vd., também neste sentido, o Acórdão do Tribunal

Constitucional n.º 146/2001, de 28.03.2001, citado na promoção do Ministério Público).

Assim, apenas a inexistência do ato impede de modo irremediável a produção dos efeitos próprios do ato perfeito, ou seja, a inexistência é insanável, mesmo ocorrendo caso julgado (cfr. GERMANO MARQUES DA SILVA – Ob. Cit., p.

106).

Compulsados os autos, constatámos que, efetivamente, o Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados não foi notificado do despacho proferido pelo JIC que indeferiu o seu pedido de constituição de assistente (tendo sido, por lapso, notificado desse despacho o mandatário da assistente já constituída).

Desde então, nunca o Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados foi considerado nestes autos.

Assim, o tribunal não se pronunciou relativamente à admissibilidade do pedido cível que deduziu.

Foi agendada e realizada a audiência de discussão e julgamento, para a qual o demandante não foi convocado.

Foi proferida sentença absolvendo o arguido da prática do crime de

procuradoria ilícita – acusação do Ministério Público – e condenando-o pela

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prática de um crime de injúria – acusação particular, acompanhada pelo Ministério Público – (fls. 175 e ss.).

Notificados os intervenientes processuais convocados para o julgamento da sentença proferida – com exclusão do Recorrente, portanto –, não foi

apresentado qualquer recurso.

Por despacho de 10.05.2011 (fls. 200) foi declarada extinta, pelo cumprimento, a pena de multa em que o arguido foi condenado.

Cumpridos os vistos legais, o processo foi arquivado.

Face ao exposto, dúvidas não temos de que foram cometidas as invocadas irregularidades e nulidades. Dúvidas também não nos suscitam a oportunidade da sua alegação.

O cerne da questão reside, porém, no facto de ter sido proferida uma sentença, notificada ao arguido – principal afetado com a decisão – e ao Ministério Público – titular da ação penal e garante da legalidade –, da qual nenhum destes recorreu. Ou seja, será que se verifica caso julgado e,

consequentemente, conforme o supra exposto, se devem considerar sanados os vícios verificados?

A nossa resposta é afirmativa. Entendemos que podemos afirmar, no presente caso, que ocorreu trânsito em julgado da decisão, uma vez que tiveram

intervenção ao longo de todo o processo, conformando-se com a decisão proferida, quer o arguido quer o Ministério Público, sendo que este defendeu também os interesses do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados dada a natureza pública do crime de procuradoria ilícita.

Não temos dúvidas que este entendimento não é o mais favorável aos interesses do

Requerente, na medida em que não permite ao Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados exercer direitos que, efetivamente, a lei lhe atribui.

Porém, não podemos esquecer a necessidade de ponderação dos direitos do arguido e da própria comunidade à segurança e certeza jurídicas. No campo jurídico, a solução passa, muitas vezes, pela harmonização de interesses/

direitos inconciliáveis, devendo optar-se pela solução que importe a menor restrição possível a cada um deles. No presente caso, o interesse do

Requerente em intervir nos presentes autos não se pode sobrepor ao facto de ter sido realizado o julgamento e proferida uma sentença com participação do arguido e do Ministério Público que estes e a comunidade confiaram ter

resolvido definitivamente a apreciação acerca da natureza criminal dos factos imputados ao arguido, posto não ter sido interposto qualquer recurso.

Pelo exposto, concluímos que nos presentes autos foi proferida sentença já transitada em julgado que sanou as irregularidades e nulidades invocadas pelo Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados.

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Notifique (fim de transcrição).

2. Daquele despacho veio interpor recurso, a fls. 245 e ss. o Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, com os fundamentos constantes das

motivações de fls. 248 a 258 e conclusões de fls. 258 a 262, que aqui se transcrevem:

1.ª O despacho recorrido violou os arts. 20.º da CRP; 111.º n.º 1 al. c) e 2, 113.º, n.º 1, als. a), b) e c) e n.º 9, 118.º, 120.º, n.º 2, al. b) e n.º 3, al. b), 123.º, 311.º, 313.º, 331.º n.º 1, 399.º, 400.º, 411.º n.º 1, al. a), todos do CPP;

677.º do CPC aplicável ex vi art. 4.º do CPP; e 7.º, n.ºs 2 e 3 da Lei nº 49/2004, de 24 de Agosto, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que anule todo o processado desde a decisão de indeferimento da constituição de

Assistente do Recorrente, com as legais consequências daí decorrentes.

Porquanto:

2.ª Verificam-se nos autos os seguintes vícios:

a) a irregularidade decorrente da falta de notificação do despacho de

indeferimento da constituição de assistente ao aqui Recorrente (art. 111.º n.º 1, al. c), 113.º n.º 1, als. a), b) e c) e n.º 9, 118.º e 123.º do CPP);

b) a irregularidade decorrente da falta de recepção pelo Meritíssimo Juíz do pedido de indemnização civil formulado pelo Recorrente (art.ºs 123.º e 311.º do CPP);

c) a nulidade decorrente da falta de notificação ao Recorrente do despacho que designou a data de audiência de julgamento e de todos os actos judiciais posteriores, incluindo a sentença, o que motivou a falta de comparência do Recorrente na audiência (art.ºs 120.º n.º 2, al. b), 313.º, n.º 2 e 331.º, n.º 1, in fine do CPP); e

d) a nulidade decorrente da omissão de pronúncia da sentença quanto ao pedido de indemnização civil formulado pelo Recorrente, (art. 379.º n.º 1, al.

c) CPP).

3.ª O despacho em crise assenta em dois pressupostos errados: o trânsito em julgado da decisão de indeferimento da constituição de assistente pelo

Recorrente e da sentença proferida a final; e a natureza pública do crime de procuradoria ilícita.

4.ª Nem a decisão de indeferimento da constituição de assistente pelo Recorrente, nem a sentença proferida nos autos transitaram em julgado porque não foram notificadas ao aqui Recorrente (art. 677.º do CPC ex vi art.

4.º do CPP; Ac. STJ de 06.09.2006, Proc. nº 06P1555, disponível em www.dgsi.pt).

5.ª O Recorrente apresentou o requerimento de constituição de assistente, requerendo a respectiva isenção de pagamento de taxa de justiça (art. 4.º, n.º

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1, al. g) RCP), acompanhou a acusação pública e apresentou pedido de indemnização civil, mas, desde o dia 04.02.2010, não foi notificado do que quer que fosse nos autos, nem mesmo do despacho que indeferiu a

constituição de assistente com o fundamento de que a Ordem dos Advogados não era Ofendida, condenando-a em custas (2 UCs).

6.ª É indubitável que: 1) no caso assistia ao Recorrente o direito de

constituição de assistente por decorrer expressamente da letra da lei que o procedimento criminal pela prática de crimes de procuradoria ilícita depende de queixa e que a Ordem dos Advogados é titular do referido direito de queixa, tendo, por isso, legitimidade para se constituir assistente (art. 68.º, n.º 1, al.

b) do CPP e do art. 7.º n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto); e 2) a decisão de indeferimento da constituição de assistente é recorrível (arts. 399.º e 400.º do CPP).

7.ª O prazo de interposição do recurso da decisão de indeferimento da

constituição de assistente é de 20 dias “e conta-se: a) a partir da notificação da decisão” (art.ºs 411.º n.º 1, al. a) do CPP). Sucede que, até à data, o

Recorrente ainda não foi notificado de tal decisão. Consequentemente, ainda não decorreu tal prazo e a decisão ainda não transitou em julgado.

8.ª É inconstitucional, por violação do princípio do acesso ao direito previsto no art. 20.º da CRP, a interpretação do art. 677.º do CPC aplicável ex vi art. 4.º do CPP segundo a qual as decisões que não são notificadas às partes a quem afectam transitam em julgado independentemente de não lhes terem sido notificadas, bastando a notificação ao Ministério Público e ao Arguido, interpretação subjacente ao despacho em crise e que viola os mais

elementares princípios do Estado de Direito, denegando-se justiça às partes processuais, neste caso, à própria Ordem dos Advogados.

9.ª A omissão processual de falta de notificação ao Recorrente do despacho que indeferiu a constituição de assistente integra uma irregularidade que afecta a validade de todo os actos processuais posteriores (art. 123.º do CPP e princípio da taxatividade das nulidades contido no artigo 118.º do CPP) por ter impossibilitado o Recorrente de exercer o seu direito de recurso, ainda

tempestivo, e intervir nos autos como assistente. (Ac. TRP 31.05.2006, Proc 0641155), cuja arguição é actualmente tempestiva porque o Recorrente nunca interveio nos autos, não foi notificado de tal despacho, nem foi notificado para intervir em qualquer outro acto até à data.

10.ª O despacho de indeferimento da constituição de assistente não transitou em julgado por falta de notificação ao respectivo Requerente, aqui recorrente, o que redunda na tempestividade e eficácia da invocação da respectiva

irregularidade, que afecta a validade de todo os actos processuais posteriores (art. 123.º do CPP), nomeadamente da audiência de julgamento e da sentença.

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11.ª A sentença também não transitou em julgado por falta de notificação ao aqui Recorrente (arts. 399.º, 400.º, 411.º n.º 1, al. a) do CPP) e, com o devido respeito, é um absurdo jurídico que se considere transitada em julgado uma sentença que não foi notificado a uma qualquer parte processual a quem assiste o direito de recurso, direito que assim ficaria precludido decorrido os prazos legais a contar da notificação às demais partes. Nem mesmo a certeza e segurança jurídicas justificariam tal denegação da justiça.

12.ª Nenhuma das supra invocadas irregularidades e nulidades se encontra sanada à data, uma vez que por falta de notificação do aqui Recorrente, nem o despacho de indeferimento da constituição de assistente, nem a sentença transitaram em julgado, nem os demais actos recorríveis não notificados ao aqui Recorrente.

13.ª É manifestamente errado que o crime de procuradoria ilícita seja um crime de natureza pública (cf. penúltimo parágrafo, in fine, da penúltima página do despacho recorrido). O crime de procuradoria ilícita depende de queixa, logo, tem natureza semi-pública (art.º 7.º n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto).

Termos em que se requer aos Venerandos Juízes DESEMBARGADORES se dignem Julgar o presente recurso procedente por provado, E

CONSEQUENTEMENTE, revogar o despacho ora recorrido e substituí-lo por outro que anule todo o processado desde a decisão de indeferimento da constituição de Assistente do Recorrente, com as legais consequências daí decorrentes (fim de transcrição).

3. Os demais sujeitos processuais foram notificados e o Ministério Público veio responder de fls. 269 a 274 e concluiu que foram cometidas as irregularidades e nulidades alegadas pelo recorrente, mas estão sanadas pelo trânsito em julgado da sentença, tendo o arguido já sido sentenciado e cumprido a pena em que foi condenado, pelo que o despacho deve ser mantido.

O arguido veio responder de forma concordante com o alegado pelo Ministério Público.

Os demais sujeitos processuais nada disseram.

4. Neste tribunal, o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser provido parcialmente o recurso e ordenado à primeira instância que proceda à notificação do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos

Advogados do despacho que lhe indeferiu a constituição como assistente.

Após, de duas uma: se não houver recurso do despacho que indeferiu a

constituição como assistente, o vício fica sanado; havendo recurso, haverá que aguardar pela decisão sobre tal matéria para se saber o destino a dar aos

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autos: se for procedente, anulação do processado com repetição do disposto no art.º 311.º do CPP, admissão do pedido cível e repetição do julgamento, se o recurso for julgado improcedente, ficará também o processo sanado, sem

anulação e repetição de qualquer ato.

5. Cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2 do CPP, não houve resposta.

6. Efetuado o exame preliminar foi considerado não haver razões para a rejeição do recurso, o qual foi admitido.

7. Cumpridos os vistos, em conferência, cumpre conhecer e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

A) O âmbito dos recursos encontra-se delimitado em função das questões sumariadas pelos recorrentes nas conclusões, extraídas da respetiva

motivação, sem prejuízo, no entanto, das questões que sejam de conhecimento oficioso, como se extrai do disposto nos art.ºs 403.º, 412.º n.º 1 e 410.º n.ºs 2 e 3 do Código de Processo Penal, sendo certo que no caso dos autos não

vislumbramos qualquer outra questão que deva ser conhecida oficiosamente.

Face às conclusões contidas no recurso interposto pelo recorrente Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados (doravante CDPOA), existem várias questões a decidir.

Todavia, em nosso entender, existe um grau de precedência quanto ao conhecimento de cada uma delas.

Assim faremos, começando por conhecer da alegada irregularidade da omissão de notificação do recorrente da decisão judicial que indeferiu o seu pedido de constituição de assistente. Esta omissão é que poderá ter

desencadeado todos os demais vícios invocados.

B) Apreciação

Devemos esclarecer que, neste recurso, não está em causa a apreciação do mérito do despacho de fls. 130 e 131, que decidiu indeferir o pedido de constituição como assistente do CDPOA, mas apenas a questão do vício

consistente na não notificação de tal despacho, face à motivação e conclusões ora apresentadas e despacho recorrido, pelo que não podemos pronunciarmo- nos sobre o mérito de tal decisão, qual seja a de saber se o ora recorrente tem legitimidade para se constituir assistente, uma vez que estaríamos a decidir

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uma questão que não foi apreciada no despacho recorrido, não nos foi colocada e não é de conhecimento oficioso.

Os sujeitos processuais que se pronunciaram sobre esta matéria estão de

acordo que o CDPOA não foi notificado do despacho que lhe indeferiu o pedido de constituição como assistente.

De igual modo, todos estão de acordo que foram omitidas as notificações até ao arquivamento destes autos e que o recorrente não compareceu a qualquer ato processual em virtude de não ter sido notificado.

O art.º 68.º n.º 1 alínea a) do CPP prescreve que podem constituir-se como assistentes no processo penal, além das pessoas e entidades a quem leis especiais conferirem esse direito, os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a

incriminação, desde que maiores de 16 anos.

Não está aqui em causa decidir se o ora recorrente se integra na previsão da norma que acabamos de citar (ou outra), mas dizer somente que qualquer pessoa que entenda que reúne os pressupostos para se constituir assistente no processo penal, pode requerê-lo ao tribunal, o qual, após ter dado a

possibilidade de se pronunciarem ao Ministério Público e ao arguido, tem de decidir por despacho, que é logo notificado àqueles (art.º 68.º n.º 4 do CPP), pela forma prescrita no art.º 109.º, sobretudo n.º 9, do CPP.

A decisão de indeferimento da constituição como assistente é recorrível (art.ºs 69.º n.º 2 alínea c) e 401.º n.º 1 alínea b) do CPP[1].

Resulta dos autos que o recorrente não foi notificado do despacho de

indeferimento do seu pedido de constituição como assistente. A lei não prevê esta omissão como uma nulidade, pelo que, face ao princípio da tipicidade que governa este tipo de vícios, estamos perante uma irregularidade, a arguir no próprio ato, ou se a este não tiver assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado.

No caso dos autos, o recorrente veio arguir a irregularidade no momento em que dela tomou conhecimento, pois nunca foi notificado de qualquer ato processual após o seu pedido de constituição como assistente ter sido indeferido (art.º 123.º do CPP).

Diz-se no despacho recorrido que a sentença já transitou em julgado, pelo que a irregularidade está sanada.

Salvo o devido respeito, tal não pode ocorrer, pelo menos se for admitida a constituição como assistente do CDPOA. O assistente tem um variado e amplo leque de atribuições, entre elas a de recorrer das decisões que o afetem, mesmo que o Ministério Público não o tenha feito (art.º 69.º do CPP), isto quanto à parte criminal. No caso dos autos, o recorrente formulou ainda um

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pedido cível sobre o qual não foi proferido despacho de admissão nem foi apreciado na sentença.

Destarte, o despacho de indeferimento de constituição como assistente e a sentença proferida, pelo menos na parte que tem a ver com os eventuais interesses do recorrente, não transitou em julgado[2], pelo que a

irregularidade arguida não se mostra sanada.

Face ao ora decidido, como referimos supra e refere também o Exmo. Sr.

Procurador-Geral Adjunto nesta relação, a apreciação das demais questões depende de saber se ao recorrente é concedido o estatuto de assistente, nomeadamente da atitude que este vier a tomar em relação ao despacho que lhe indeferiu tal qualidade e do sentido da decisão que vier a ser proferida em recurso, caso o haja.

Só após a definição do estatuto processual do recorrente é que pode ser dito o direito sobre as demais questões que coloca, pelo que fica prejudicado o seu conhecimento.

Nesta conformidade, procede o recurso quanto à irregularidade consistente na omissão de notificação do despacho que lhe indeferiu a constituição como assistente, devendo o tribunal de primeira instância notificar o Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados de tal despacho e praticar os atos necessários, conforme o que daí resultar.

III – DECISÃO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam, em conferência, os Juízes da 2.ª Secção Criminal desta Relação em conceder provimento ao recurso interposto pelo Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados em relação à irregularidade consistente na omissão de notificação do despacho que lhe indeferiu o pedido de constituição como assistente, ordenar que o tribunal de primeira instância notifique o recorrente de tal despacho, devendo praticar-se os atos necessários, conforme o que daí resultar, ficando

prejudicado o conhecimento das demais questões colocadas no recurso.

Sem custas.

Notifique.

Porto, 06 de junho de 2012.

(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator – art.º 94.º, n.º 2 do CPP).

Moisés Pereira da Silva

Maria Dolores da Silva e Sousa ______________

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[1] Neste sentido: Albuquerque, Paulo Pinto, Comentário do Código de Processo Penal, 3.ª edição, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2009, pp.

214 e 1024 a 1026.

[2] Neste sentido: Ac. do Plenário do STJ, de 06.09.2006, processo n.º 06P1555, www.dgsi.pt.

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