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ANÁLISE HISTÓRICA DO ENSINO DE MATEMÁTICA NA BAHIA ( )

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Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Comunicação Científica 1

ANÁLISE HISTÓRICA DO ENSINO DE MATEMÁTICA NA BAHIA (1942-1976)

Diogo Franco Rios Universidade Federal do Recôncavo da Bahia riosdf@hotmail.com Eliene Barbosa Lima Universidade Estadual de Santa Cruz

elienebarbosalima@gmail.com Inês Angélica Freire Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia inafreire@gmail.com Irani Parolin Santana Universidade Federal da Bahia/Universidade Estadual de Feira de Santana iranips@gmail.com Janice Cássia Lando Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia janicelando@hotmail.com Januária Bertani Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia bertani.januaria@gmail.com

Resumo: Este trabalho faz uma análise dos processos de difusão, recepção, apropriação, institucionalização e profissionalização docente circunscrito na produção de uma nova matemática escolar, matemática moderna, em instituições educacionais baianas, principalmente, num período que se inicia em 1942, quando foi implantado o curso de matemática da Faculdade de Filosofia da Bahia, e vai até 1976, quando foram encerradas as atividades da Escola de Aplicação da Universidade da Bahia.

Palavras-chave: História da Educação; História da Educação Matemática; Bahia.

A produção de estudos a respeito da história da educação no Brasil não se constitui como uma iniciativa recente, porém, nos últimos anos, houve um aumento considerável do número de trabalhos a respeito do tema. A Revista Brasileira de História publicou (VIDAL; FARIA FILHO, 2003) um artigo que narra os caminhos trilhados pela história da educação no país, desde suas primeiras iniciativas, ainda no século XVIII, alcançando até a atualidade, traçando uma análise das vertentes assumidas por essa historiografia.

Dentre as vertentes que o referido trabalho estabelece, destaca-se a produção

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acadêmica de 1940 a 1970, que descreve o início dos primeiros programas de pós- graduação em educação, que suscitaram, na década de 1980, a criação de vários grupos de trabalho que tratam da história da educação, como foram os casos do GT História da Educação, criado no âmbito da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPed), e do Grupo de Estudos e Pesquisas “História, Sociedade e Educação no Brasil”, na Universidade Estadual de Campinas (Histedbr) (VIDAL; FARIA FILHO, 2003). Nesse artigo Vidal e Faria Filho (2003) destaca ainda a criação, em 1999, da Sociedade Brasileira de História da Educação e da Revista Brasileira de História da Educação. Para Falcon

Tais iniciativas denotam não apenas o interesse por um campo de pesquisa específico – o da história da educação –, mas têm também como conseqüência uma preocupação dos pesquisadores com os seus pressupostos teórico-metodológicos e, ainda, a sua inserção nas perspectivas propriamente historiográficas. (FALCON, 2006, p. 332).

Além dos grupos de pesquisa citados acima, cabe destacar a existência de outros grupos que realizam trabalhos relacionados especificamente com a história do ensino da matemática

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e, de pesquisadores que o fazem durante suas pesquisas nos programas de mestrado e doutorado espalhados pelo país. Dentre esses trabalhos, os temas parecem estar mais voltados para períodos recentes da história do ensino dessa ciência e, mais especificamente, tem crescido o número de investigações interessadas no processo de apropriação e institucionalização de padrões modernos no ensino da matemática no país, durante o século XX.

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Sobre as tentativas de institucionalização das formas de praticar e representar a matemática – denominadas de matemática moderna – por grupos formados principalmente por matemáticos ligados a instituições de ensino superior, associados em um movimento

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Atualmente existem no cadastro corrente do CNPq cinquenta e sete grupos de pesquisa localizados a partir do comando história da educação matemática.

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Veja: BORGES, R.A.S. A Matemática Moderna no Brasil (2005); BÚRIGO, E. Z. Movimento da matemática moderna no Brasil (1989); D’AMBRÓSIO, B. S. The Dynamics and consequences of the modern mathematics reform movement for Brazilian mathematics education (1987); DIAS, André L.

Mattedi. Engenheiros, mulheres, matemáticos: Interesses e disputas na profissionalização da matemática na Bahia (1896-1968) (2002). LIMA, Eliene B. Dos infinitésimos aos limites: a contribuição de Omar Catunda para a modernização da análise matemática no Brasil (2006); MATOS, José Manuel, VALENTE, W. R.

(org.). A matemática moderna nas escolas do Brasil e de Portugal: primeiros estudos (2007); REVISTA

DIÁLOGO EDUCACIONAL (2006); SOARES, F. S.; DASSIE, B. A.; ROCHA, J. L. Ensino de

Matemática no século XX – da Reforma Francisco Campos à Matemática Moderna (2004).

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de secundarização dessa matemática moderna, os poucos trabalhos publicados no Brasil sobre esse movimento se limitaram apenas ao estudo do ideário modernizador ou à descrição das memórias dos seus protagonistas. Configura-se ainda, portanto, em uma lacuna historiográfica, que segundo Wagner Valente, ainda "precisa ser preenchida"

(VALENTE, 2006, p.32).

O processo de institucionalização da matemática inicializado no séc. XIX, que chamaremos de matemática moderna, foi consolidado e desenvolvido ao longo do século XX. Tal processo de institucionalização deu-se com uma série de transformações, mudanças, inovações que afetaram de maneira geral todos os aspectos constitutivos da matemática, desde a sua organização profissional, até os seus fundamentos epistemológicos e metodológicos, passando pela estruturação das suas subáreas de conhecimento, com significativas repercussões nos resultados da produção do conhecimento matemático. Em suma, surge um novo padrão de exercício matemático, profissionalizado, com dedicação em tempo integral à pesquisa e ao ensino da matemática, desenvolvido em lugar específico – as universidades, diferente do que era praticado na educação de engenheiros militares e civis na École Polytechnique em Paris, criada em 1795. (LIMA, 2006)

Acerca da lacuna historiográfica apontada por Valente pode-se afirmar a pertinência de pesquisas que se proponham a analisar historicamente as relações entre institucionalização e apropriação da matemática moderna nas práticas de ensino/aprendizagem nas escolas brasileiras onde houve a tentativa de implantar os padrões de ensino orientados no referido movimento.

Com o intuito de atendimento dessa demanda apontada é que o Grupo de Pesquisa em História das Ciências no Brasil com ênfase na Bahia

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tem analisado historicamente os processos de difusão, recepção, apropriação, institucionalização e profissionalização docente no âmbito da produção de uma nova matemática escolar, matemática moderna, em instituições educacionais baianas, num período que se inicia em 1942, quando foi implantado o curso de matemática da Faculdade de Filosofia da Bahia, indo até 1976, quando foram encerradas as atividades da Escola de Aplicação da Universidade da Bahia.

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Líder do grupo, o professor Dr. André Luis Mattedi Dias, vem realizando pesquisas e orientações acerca da

história das ciências no Brasil em nível de mestrado e doutorado no âmbito do Programa de Pós-Graduação

em Ensino, Filosofia e História das Ciências (UFBA/UEFS).

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Tal análise não poderia se realizar sem uma aproximação com outros campos da história, questionando as fronteiras já bem estabelecidas entre seus domínios, de modo que passaram também a ser de interesse do historiador profissional – e não apenas dos especialistas disciplinares – a história das ciências, a história cultural, história da educação, dentre outros (BARROS, 2004; CHARTIER, 1990; FALCON, 2006; PESTRE, 1996).

Assim, os diversos trabalhos que vêm sendo realizados pelos componentes desse grupo, se inserem nessa pluralidade e variedade de temas, uma vez que se situam em uma fronteira comum entre a história cultural (cultura escolar como objeto histórico), da história das ciências (da matemática) e da história da educação (história das disciplinas escolares) (CHERVEL, 1990; JULIA, 2001; FARIA FILHO et al, 2004). Além disso, esses trabalhos suscitam o entendimento dos modos como o conhecimento científico relaciona-se com as práticas de seu ensino e, portanto, seu processo de difusão e apropriação pela sociedade, se inserindo no bojo do que Dominique Pestre descreve como “novas questões”

para a pesquisa em história das ciências, num diálogo possível entre a nova história social e cultural das ciências e a história cultural (PESTRE, 1996).

Matemática moderna no ensino secundário

Após a Segunda Guerra Mundial e no decorrer dos anos 50, em países europeus e americanos, em especial nos Estados Unidos, desenvolveu-se a idéia da necessidade de uma reforma no ensino de Matemática, ocorrendo inúmeras iniciativas e realizações com o objetivo de “modificar os currículos do ensino da Matemática visando a actualização dos temas matemáticos ensinados, bem como a introdução de novas reorganizações curriculares e de novos métodos de ensino”

(GUIMARÃES, 2007, p.21)

. Este autor faz referência

especial a duas realizações: um inquérito realizado pela Organização Européia de

Cooperação Econômica (OECE) sobre a situação do ensino de matemática nos seus países

membros e uma sessão de trabalho para discutir os resultados desta investigação que se

realizou no final de 1959, no Cercle Culturel de Royaumont, em Asnières-sur-Oise,

França. Segundo Guimarães (2007), esta reunião que ficou conhecida como o Seminário de

Royaumont, foi a realização mais emblemática de todo a reforma e a Sessão de trabalho

realizada em Dubrovnik, Iugoslávia, tendo por meta a construção de um programa

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curricular mínimo para o ensino secundário norteado pelas discussões lá realizadas. Este movimento reformador recebeu o nome de Movimento da Matemática Moderna (MMM).

A proposta de reforma concebida no Seminário de Royaumont foi influenciada por idéias estruturalistas, em especial da Matemática e da Psicologia. Em relação à Matemática, a concepção estruturalista esteve presente mediante as idéias bourbakistas

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e na Psicologia, a concepção estruturalista foi influenciada pelo trabalho de Jean Piaget.

Esta concepção estruturalista da Matemática viria a influenciar marcantemente a proposta desenvolvida em Royaumont e posteriormente especificada em Dubrovnik, a qual tinha como principais idéias:

[...] a ênfase na unidade da matemática (a idéia da “fusão”

Aritmética/Álgebra e da “síntese” Álgebra/Geometria, a integração da Trigonometria em outros tópicos curriculares); a importância dada à Álgebra e à Geometria vectorial, bem como às estruturas matemáticas; a orientação axiomática do ensino, isto é, a organização do currículo tendo como última meta o estudo axiomático da Matemática; a preocupação com o rigor e com a linguagem e simbologia matemáticas.

(GUIMARÃES, 2007, p. 13)

De acordo com Thom (apud SOARES, 2001, p.45), no princípio o MMM teve dois objetivos principais: “a renovação pedagógica do ensino de Matemática e a modernização dos programas”. Essa modernização, para Soares (2001, p.46), se daria por meio da introdução de alguns temas no currículo do ensino secundário: “[...] teoria dos conjuntos;

conceitos de grupo, anel e corpo; espaços vetoriais; matrizes; álgebra de Boole; noções de cálculo diferencial e integral e estatística [...]”. Sendo que, a noção de conjunto, talvez tenha sido o conceito central da reforma, ou pelo menos, aquele que tenha recebido maior ênfase e ao qual o tenha ficado mais associado, além de defenderem uma abordagem dedutiva da Matemática aliada a uma maior precisão na linguagem utilizada.

Outra característica desse movimento refere-se às críticas em relação à Geometria apresentada por Euclides. Defendia-se uma reestruturação no seu ensino e a inclusão no currículo de outras abordagens diferentes da euclidiana, explorando as noções de espaço vetorial e da álgebra linear.

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Grupo de matemáticos, na maioria franceses, que trabalhou em conjunto sob o pseudônimo Nicolas

Bourbaki.

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Tomando por base a delineação da matemática moderna e da inserção dessa matemática no ensino secundário, isto é, o MMM, e os pressupostos teórico-metodológicos que nos últimos anos vem permeando a historiografia, o Grupo de História das Ciências no Brasil com ênfase na Bahia vem construindo uma história do ensino da matemática na Bahia, conforme veremos os subitens a seguir.

A formação do professor de matemática na Faculdade de Filosofia da Bahia

A implantação da Faculdade de Filosofia da Bahia (FF), na década de 1940, que tinha a função de formar professores para o ensino secundário, constituiu-se em um dos principais elementos no processo de profissionalização docente, tendo-se entre os cursos de licenciatura, o Curso de Matemática. Até aquele momento, não existiam profissionais com formação específica em matemática, àqueles que trabalhavam eram geralmente leigos ou profissionais de outras áreas de conhecimento, como os engenheiros (DIAS, 2002).

Portanto, a constituição de uma instituição de ensino superior para a formação de professores de matemática foi um passo importante nesse processo.

Nesta perspectiva a FF fomentou uma ressignificação da atividade docente e com isto a (re)estruturação de um grupo profissional, estando em jogo tentativas de construção e de afirmação da identidade profissional, em meio às contradições, às ambiguidades, às diversas práticas e representações da profissão e às múltiplas e multifacetadas experiências docentes que os professores, individualmente, (re)elaboraram e vivenciaram.

Na Bahia, de 1943 a 1945 só havia o Bacharelado em Matemática, começando, em 1946, o processo de formação docente que envolvia em um primeiro momento o bacharelado, com duração de três anos e, posteriormente, para obtenção do título de licenciado, impunha-se mais um ano de estudos para complementação da formação, a partir do chamado “Curso de Didática”, conforme a citação a seguir:

O Curso de Didática é subseqüente ao de Bacharel feito em 3 anos. Nesse

quarto ano de estudo, o Bacharel recebe uma formação pedagógica

capacitando-o para o magistério secundário. E sendo a preparação de

professores para o ensino secundário, uma das finalidades precípuas da

Faculdade, é óbvia a invocação de qualquer outro motivo, além da natural

necessidade da complementação da formação do diplomado que findo

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esse curso recebe um outro grau, o de Licenciado. (FACULDADE DE FILOSOFIA [Universidade Federal da Bahia]. [Documento de Reconhecimento do Curso de Didática, 1947, p.18])

A profissionalização docente, nesse período, na FF era alicerçada no âmbito da matemática, por meio da disciplina de Didática Especial da Matemática, que compunha a estrutura curricular do Curso de Didática. Essa disciplina se proponha a contribuir com a produção dos saberes pedagógico/didático/curricular.

Do ponto de vista formal, o Curso de Matemática oferecido pela FF seguia o modelo estabelecido na e pela Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi) em obediência ao Decreto 1190 de 04/04/1939. Mas, as práticas docentes e a formação acadêmica propiciavam outro curso, criando uma disparidade entre o estabelecido e o realizado.

Segundo Ramakrishna B. dos Santos (apud DIAS, 2002, p.12), formado na primeira turma do curso de matemática da FF, "nosso curso foi de uma matemática do século XIX, uma matemática clássica". Para Martha Maria de Souza Dantas, "tanto o curso de bacharelado, quanto o de licenciatura, eram fracos àquela época. Ao terminá-los, eu não me sentia devidamente preparada para enfrentar o ensino de Geometria no Curso de Colégio" (apud DIAS, 2002, p.12). Arlete Cerqueira Lima, formada na FF em 1955, lembrou que

[...] o curso de Matemática era melancólico: carecia de fundamentação teórica, o Cálculo Integral se restringia a uma variável, as Funções Analíticas paravam no estudo dos números complexos, a Geometria Algébrica era o estudo das Cônicas e a Geometria Diferencial também. A Álgebra Moderna era a clássica. Não havia absolutamente nada de Matemática Moderna, nem mesmo a Teoria dos Conjuntos; não havia Estatística no currículo. (CERQUEIRA LIMA, 1985, p.41)

As diferenças encontradas por Arlete Cerqueira Lima entre o curso da FF e o curso da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Paulo (FFCL), onde realizou dois estágios com bolsa do CNPq, em 1957 e 1959, expressavam exatamente as diferenças dos respectivos projetos institucionais. O primeiro, inspirado nas idéias pedagógicas e políticas de Isaías Alves

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, reivindicava um novo tipo de profissionalização para o professor

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Forte articulador da implantação da Faculdade de Filosofia da Bahia, sendo o primeiro diretor.

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secundário, aí incluído o professor de matemática, mas orientava, declaradamente, tal profissionalização para a continuidade dos tradicionais valores culturais nacionais, compondo seu quadro docente prioritariamente por baianos. O segundo projeto, da FFCL, inspirado em idéias liberais, propunha uma inserção da cultura letrada e acadêmica nacional norteadas pelos padrões científicos internacionais.

Em suma, os assuntos faziam parte nominalmente dos programas das disciplinas do Curso de Matemática da FF, mas na prática não eram lecionados, somente começando a ser trabalhados depois da fundação do Instituto de Matemática e Física (IMF) em 1960, outro momento importante para a institucionalização de novos padrões matemáticos.

Mesmo com certa resistência dos antigos professores formadores, no decorrer dos anos, ocorreu à inclusão de várias disciplinas que abordavam a Matemática Moderna, tais como álgebra linear, álgebra moderna, teoria dos conjuntos e topologia. Foi um processo lento e demarcado por estudos realizados pelos próprios professores formadores.

O IMF, a partir de 1964, além de contribuir para formação docente dos graduandos em matemática oferecia também cursos, seminários orientações para os professores em serviço no ensino secundário de matemática. A partir de 1965, ampliam-se essas ações que estavam sendo desenvolvidas pelo IMF com a criação de um novo espaço de formação docente, o Centro de Ensino de Ciências da Bahia (CECIBA), (FREIRE, 2009).

Modernização do ensino da matemática na Bahia: CECIBA e a Escola de Aplicação

O Ministério da Educação e Cultura, reconhecendo a situação desfavorável do ensino secundário frente às novas metas mundiais para a educação - a incorporação de novos conhecimentos e experiências em áreas estratégicas, isto é, renovação do ensino secundário de ciências - criou, entre os anos de 1964 e 1965, seis Centros de Ensino de Ciências em diferentes regiões do Brasil.

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Em finais de 1965 foi implantado, na Universidade Federal da Bahia (UFBa), o CECIBA. Sua estrutura conformava as áreas de Física, Química, Biologia e Matemática (FREIRE, 2009). No âmbito da matemática as atividades foram coordenadas, durante os

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Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco.

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quatro anos de existência do CECIBA por Martha Maria de Souza Dantas, que compôs sua equipe por professores de matemática da UFBa, oriundos da FF e/ou do IMF.

A implantação do CECIBA propiciou, a esse grupo, a possibilidade de continuação e ampliação de suas ações iniciadas no IMF. Um dos principais projetos desenvolvidos pela equipe de matemática foi intitulado: Desenvolvimento de um currículo de Matemática Moderna para o curso ginasial, que estava em consonância com os princípios delineados em âmbito internacional pelo MMM, consistindo na construção de um programa curricular, no qual foram propostos novos conteúdos e novas abordagens para serem colocados em prática por professores e alunos em caráter experimental. Para tanto, a equipe produziu e publicou livros didáticos, que viabilizassem esses programas. Tais livros didáticos foram intitulados de Matemática Moderna. (FREIRE, 2009).

Esse projeto foi desenvolvido em classes experimentais de diversas escolas secundárias na cidade de Salvador, das quais destacamos a Escola de Aplicação

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, que fora criada com a função de servir à prática docente e aos estágios dos licenciandos da FF e de campo de experimentação pedagógica para a Faculdade

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. De acordo com Dantas (2002), as experiências realizadas nessa escola a partir de 1966, tiveram êxito. Pois, segundo seu entendimento, os professores que fizeram parte da experiência estavam bem preparados e os alunos que dela participaram tinham condições de suportá-la.

O êxito obtido na implantação do MMM na Escola de Aplicação analisado por Dantas (2002), pode ser relacionado o papel da escola como um campo de experimentação pedagógica. Segundo Leda Jesuíno dos Santos

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, em 1963, já fazia parte da prática dos professores que atuavam na escola a utilização de “[...] novas técnicas e métodos de ensino, ensejando, dessa maneira, uma progressiva e constante revitalização das atividades escolares.” (SANTOS, apud BARROS, 1975, p. 39). E, no âmbito da Matemática, para Thales de Azevedo

,

“[...] o ensino secundário alcançou, no Colégio de Aplicação, uma

7

A Escola de Aplicação foi implantada em 1949 e até 1968 pertenceu a FF da Universidade da Bahia. Com a reforma universitária que reestruturou a UFBa e instituiu a Faculdade de Educação, a Escola passou a ser dirigida pelo curso de Pedagogia, vinculado à FACED . Em razão da mudança da Faculdade de Educação para o Vale do Canela, a Escola de Aplicação ficou sendo denominada como Centro Pedagógico Reitor Miguel Calmon até 1976, quando foi extinta por decisão da Reitoria da UFBa. (NUNES, 2007).

8

Regimento da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Bahia, 1957 Art. 228, p. 78. In:

BARROS, Zilma Gomes Parente. Redefinição Conceitual dos Colégios de Aplicação. Salvador, 1975.p. 21.

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Diretora do Colégio de Aplicação no período de 1958 a 1964.

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qualidade inegável; ali iniciou-se a modernização do ensino da matemática [...]

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.

As experiências de modernização do ensino de matemática não ficaram restritas à Salvador. Indícios apontam para tentativas de implantação de práticas modernizadoras do ensino de matemática também no interior da Bahia, como apresentado a seguir.

MMM no interior da Bahia

De posse dos documentos que se encontram sob a guarda do Museu Pedagógico Casa Padre Palmeira da Universidade Estadual Sudoeste da Bahia-UESB na cidade de Vitória da Conquista, especificamente dos diários de classe do Colégio Batista Conquistense, situado no município de Vitória da Conquista e do Ginásio Monsenhor Trabuco na cidade de Tanquinho e, constatando-se vestígios de conteúdos sugeridos pelo MMM nesses diários, surgiram alguns questionamentos em torno da circulação de idéias que contribuíram com a institucionalização das práticas modernizadoras do ensino de matemática nas escolas secundárias no interior do Estado. Visando responder tais questionamentos fizemos entrevistas com professores que vivenciaram o processo de mudanças no ensino de matemática nessas escolas, no período entre 1960 e 1970.

No Colégio Batista Conquistense foi realizado um levantamento e análise dos diários de classe de quatro séries escolares, referentes a atuação do professor Eron Sardinha nos anos de 1966 a 1970, nos quais foram encontrados registros referentes aos conteúdos sugeridos pela MMM, especificamente no ano de 1968, em uma turma da segunda série ginasial. Os conteúdos eram: números racionais relativos, igualdade, equação do primeiro grau e conjunto universo.

Em entrevista, o professor Eron Sardinha afirmou que quando começou a ensinar não tinha conhecimento sobre a matemática moderna e seu primeiro contato com essa matemática foi por meio de um livro do professor Scipione Di Pierro Neto Matemática para Escola Moderna

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. “[...] comprei o livro de matemática da sexta série [equivale a

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ESCOLA DE APLICAÇÃO [Universidade Federal da Bahia]. [Ofício nº 527 expedido em 23/04/1966 por Thales de Azevedo]. Salvador. Arquivo Escola de Aplicação. FACED-UFBA.

11

DI PIERRO NETO, Scipione. Matemática para a Escola Moderna. Curso Ginasial. Vol. 3. 2ª série. São

Paulo: Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas, 1967.

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segunda série ginasial] [...] o livro falava de uma coisa sobre conjuntos que eu não conhecia’’. (SARDINHA, 2008)

Já nos diários, da primeira série ginasial, do Ginásio Monsenhor Trabuco, encontramos registros dos seguintes conteúdos: introdução noções de conjuntos, equivalência, igualdade e subconjuntos. Nesse caso, a professora Luzia Rosaide de Freitas declarou ter participado do curso de Aperfeiçoamento em Matemática Moderna, realizado em janeiro de 1964, oferecido pela Secretaria da Educação em Salvador, referente à parte didática. “[...] era um curso super intensivo, esse curso foi ministrado pelo superintendente da educação em Salvador, Dorgival Rebouças... a parte didática e Ramakrishna... a parte de matematica[...]”. (FREITAS, 2009)

Luiza Rosaide de Freitas registra ainda a surpresa que teve com a nova metodologia: o “[...] curso era justamente o ingresso da Matemática Moderna, completamente diferente do que eu havia estudado, foi nessa década que entrava com o conceito de conjuntos, que então era novidade, que era matemática sem parecer que era matemática [...]”. (FREITAS, 2009)

Na medida em que se inicia a análise desses materiais, tem-se a indicação que a narrativa a respeito do MMM possui lacunas, principalmente no que diz respeito à formação de professores e suas práticas pedagógicas dentro desse movimento. Esse processo histórico ainda está sendo construído.

Considerações finais

As pesquisas realizadas até o momento indicam que o ensino da Matemática Moderna na Bahia, foi sendo apropriado por várias culturas escolares, perpassando, portanto, vários espaços educacionais da capital baiana até o interior do Estado. A interpretação das apropriações, representações e práticas, permitiu esboçar a forma como a escola e a sociedade local, estavam se constituindo diante das mudanças.

Tais mudanças eram trazidas, de certa forma, pelos professores que tinham como

projeto profissional a implementação de uma “outra matemática”, a Matemática Moderna,

nas instituições escolares. Nesse período, na Bahia, constituiu-se um grupo de professores

que buscaram desenvolver estudos, pesquisas e produções de propostas curriculares e de

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materiais didáticos. Para possibilitar tal projeto profissional esse grupo trabalhou em vários espaços escolares diferenciados tanto no ensino secundário como no superior – FF, IMF, CECIBA, Escola de Aplicação e escolas das redes pública e privada de Salvador. Essas ações foram expandidas para o interior da Bahia devido à circulação de idéias. No entanto, aqui salientamos apenas duas escolas do interior da Bahia.

Com a utilização da análise da história regional, fundamentado na análise documental e a historia oral, o Grupo de Pesquisa em História das Ciências no Brasil com ênfase na Bahia está contribuindo com a construção de uma história do ensino de matemática no século XX no estado da Bahia.

Referências

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BÚRIGO, Elizabete Zardo. Movimento da matemática moderna no Brasil: estudo da ação e do pensamento de educadores matemáticos nos anos 60. 1989. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1989.

CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro:

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Referências

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