• Nenhum resultado encontrado

Educadores surdos : reflexões sobre a formação e a prática docente

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Educadores surdos : reflexões sobre a formação e a prática docente"

Copied!
141
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DANIELE SILVA ROCHA

EDUCADORES SURDOS:

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A

PRÁTICA DOCENTE

CAMPINAS

2017

(2)

DANIELE SILVA ROCHA

EDUCADORES SURDOS:

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A

PRÁTICA DOCENTE

Dissertação de Mestrado

apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestra em Educação, na área de concentração de Educação.

Orientadora: Prof.ª Dra. Lilian Cristine Ribeiro Nascimento

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA DANIELE SILVA ROCHA, E ORIENTADA PELA Prof.ª DRA. LILIAN CRISTINE RIBEIRO NASCIMENTO.

CAMPINAS 2017

(3)
(4)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

EDUCADORES SURDOS:

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A

PRÁTICA DOCENTE

Autora: Daniele Silva Rocha

COMISSÃO JULGADORA:

Orientadora Prof.ª Dr.ª Lilian Cristine Ribeiro Nascimento.

Prof.ª Dr.ª Aryane Santos Nogueira.

Prof.ª Dr.ª Terezinha de Jesus Machado Maher.

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

(5)

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à pessoa eu que amo muito e sempre está presente em todos os momentos de minha vida. Minha avó Mafalda Beraldi da Rocha, pessoa que sempre acreditou e acredita em mim, que me enche de conforto de muito amor. Minha eterna gratidão à pessoa maravilhosa.

Aos meus pais, Célia Silva e Márcio Rocha, pela educação que me deram para minha vida e apoio nos meus estudos, sempre me apoiaram e confiaram no meu potencial. Nunca permitiram que eu me acomodasse.

(6)

AGRADECIMENTOS

A Deus, pela sua presença constante na minha vida, por sempre me amparar nas dificuldades e por todas graças concedidas.

À querida Prof.ª Dra. Lilian Nascimento, por ter me acolhido, por sua confiança em meu trabalho, pelas necessárias e valiosas contribuições para a pesquisa e por ampliar e enriquecer o meu olhar sobre o mundo.

Ao meu irmão, Pedro Rocha, pela inspiração.

Ao meu avô paterno, Boris Rocha, pelo seu exemplo de honestidade e caráter, uma pessoa integra a qual admiro muito.

À família paterna e materna, pelo acolhimento e carinho de sempre: Andressa, Camila, Cecília, Celise, Késsia, Kellen, Leda, Lucia, Luís, Jaime, José, Rafael, Jorge Matheos, Selma (in memória), Telma e Yara.

Ao meu amado, Leonardo Volf, que entrou há pouco tempo em minha vida, mas me preenche de alegria e orgulho. Obrigada pela compreensão, pelas trocas de sexta para sábado, por ser a minha paz nas horas de desespero e cansaço, por ser quem faz meu sorriso mais aberto, meus dias mais coloridos, minha vida mais feliz!

À Carmem Zulueta, que faz parte da família Rocha, pela ajuda e acolhimento.

À Prof.ª Dra. Aryane Santos Nogueira, pela amizade, pelas risadas garantidas, estudos, reflexões e conversas de sempre.

À Prof.ª Dra. Heloísa Lins, pelas contribuições na participação da banca de qualificação.

Às Prof.ª Dra. Teca Maher, Prof.ª Dra. Aryane Nogueira, por aceitarem em participar da banca de qualificação e da defesa.

À Prof.ª Dra. Regina Souza, pelas conversas filosóficas que contribuiu para a reflexão da minha pesquisa.

À Jaqueline Araújo, pela revisão do abstract graças à ajuda da Prof.ª Dra. Lilian. Obrigada.

Aos intérpretes Lilian Ferreira e Diego Assis por emprestar as suas vozes, pela paciência e acompanhar sempre nas interpretações durante o tempo do mestrado.

Às fonoaudiólogas, Prof.ª Dra. Tereza Rossi e Prof.ª Dra. Priscila Amorim, pela amizade e carinho de sempre.

Aos profissionais do CEPRE, em especialmente, Prof. Dra. Ivani Silva e Prof. Dra. Zilda Gesueli pelo aprendizado e conhecimento.

À Luciana Rosa, amiga querida de longa data, pela amizade sincera.

Ao Guilherme Nichols, além de amigo querido, um modelo de referência acadêmica e que me “empurrou” para o mestrado. Gratidão.

(7)

À Olívia Rall, por acolher-me de forma tão amiga, pela convivência afável comigo nos tempos da UNESP, de quem guardo amizade e respeito.

Aos amigos da UNESP, Bárbara Melo, Clarisse Zan, Elaine Rezende, Glauciele Edygio, Jaquelini Santos, Priscila Caetano, Roberta Amaral, Victor Hugo Cassetari, pelas ótimas histórias vividas, pela convivência e risadas garantidas ao longo da graduação.

Às companheiras de estudo do mestrado e do grupo GES (Grupo de Estudos Surdos), Daniela Cury, Geilda Fonseca, Mirian Santos, Elaine Fernandes e Ellen Oliveira.

À Thais Marin, funcionária da Faculdade de Educação (FE), pela ajuda com a Plataforma Brasil. Sem você, não teria conseguido.

Ao Departamento de Informática da FE pela elaboração do questionário online para a realização da minha pesquisa.

Às escolas Cravo, Girassol e Tulipa, pela disponibilidade para a realização da pesquisa.

Aos participantes que responderam o questionário para o andamento da pesquisa e aos profissionais que permitiram que eu observasse seu trabalho.

A todas as pessoas que direta ou indiretamente, contribuíram para o andamento e a realização deste estudo.

(8)

RESUMO

EDUCADORES SURDOS: REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A PRÁTICA DOCENTE

Esta pesquisa teve como objetivo compreender o perfil do profissional educador surdo e sua função no ambiente educacional, destacando sua formação técnica pedagógica, e refletir sobre sua atuação na formação dos alunos surdos. Essa pesquisa foi realizado com método de cunho qualitativo e quantitativo que teve como objeto de análise um questionário on line realizado com educadores surdos e também observações em sala de aula. Os dados das respostas aos questionários foram quantificados e, posteriormente, discutidos e analisados. Para descrever e refletir sobre observações em sala de aula em que atuam educadores surdos, realizou-se uma análise interpretativista baseada nos seguintes critérios: metodologia utilizada; didática; comprometimento com o ensino; uso de materiais adaptados e conhecimento. As análises tiveram como embasamento as perspectivas histórico-cultural (Vygotsky) e a teoria enunciativo-discursiva (Bakhtin). Os resultados encontraram uma consonância entre as respostas dos questionários e as observações em sala de aula. Pode-se concluir que, ainda hoje, ocorre uma desvalorização do profissional surdo no ambiente educacional, sendo que este, na maioria das vezes, é contratado na educação básica como instrutor, mesmo tendo formação superior, o que lhes cerceia a autonomia como docente.

(9)

ABSTRACT

DEAF EDUCATORS: REFLECTIONS ABOUT FORMATION AND TEACHING PRACTICES

The present research aims at understanding the profile of the deaf educator as well as his role in the educational environment highlighting his technical academic formation, not to mention dwelling on how his job reflects on the formation of the deaf students. The objects of analysis of such research, being qualitative as it is, were classroom observations and an online questionnaire for which the respondents were the aforementioned deaf educators. The data produced by the answers to the questionnaire were quantified and, later on, discussed and analyzed. To describe and reflect upon the classroom observations in which deaf educators work, an interpretative analysis was made based on the following criteria: methodology applied; teaching practice; commitment to teaching; use of adapted materials and knowledge. The analyses were based on the historical-cultural perspective (Vygotsky) and on the enunciative-discursive perspective (Bakhtin). The answers to the questionnaires and the classroom observations proved to be in harmony. Thus, we may conclude that, still today, the deaf professional is devalued in the educational environment and in most cases is hired for the primary education level of schooling as an instructor even having superior formation which, by the way, curbs his authority as an educator.

(10)

LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Tirinha de Carlos Ruas 66

LISTA DE TABELAS

Tabela 01 - Formação de instrutor de trânsito 29

Tabela 02 - Curso de instrutor de armamento e tiro 30

Tabela 03 - Instrutor de mergulho livre 30

Tabela 04 - Instrutor de voo 31

Tabela 05 - Mapeamento de levantamento de produções técnicas 50

Tabela 06 – Editais 58

Tabela 07 - Descrição dos locais da pesquisa de observação 72

LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 01 - Idade dos participantes 74 Gráfico 02 - Alunos matriculados na educação superior com surdez, deficiência auditiva, pessoas com deficiências no Brasil. 75 Gráfico 03 – Estados de residência 76 Gráfico 04 – Idade em que aprendeu Libras 76 Gráfico 05 – Local em que aprendeu Libras 78 Gráfico 06 – Local em que aprendeu Libras (< 9 anos) 79 Gráfico 07 – Local em que aprendeu Libras (> 9 anos) 79 Gráfico 08 – Tipo de escola em que estudou na educação básica 80

(11)

Gráfico 10 – Cargo 82

Gráfico 11 – Cargo de professor 83

Gráfico 12 – Cargo de instrutor 84

Gráfico 13 – Cargo de professor e instrutor 84

Gráfico 14 – Curso de formação em nível superior 85

Gráfico 15 – Escolha da profissão

Gráfico 16 - Facilidade de vaga no mercado de trabalho Gráfico 17 – Valorização da profissão

87 90 91

Gráfico 18 – Melhoria na educação de surdos 93

Gráfico 19 – Diferença de professor e instrutor 95

Gráfico 20 – Contratado como instrutor 97

LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Prefeitura Municipal de Barueri/SP 55

Quadro 02 – Prefeitura Municipal de Petrópolis/RJ 56

Quadro 03 – Prefeitura Municipal de Santo Ângelo/RS 56

Quadro 04 – Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul/SP Quadro 05 – Prefeitura Municipal de São Paulo/SP

Quadro 06 – Prefeitura Municipal de Vitória/ES

56 57 57 Quadro 07 – Perguntas relevantes para a análise do questionário 71 Quadro 08 – Sujeitos da pesquisa de observação em sala de aula 102 Quadro 09 – Trecho de diálogo entre professor e aluno 104

(12)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 13

CAPÍTULO I – O papel e a formação do professor e instrutor surdo ... 23

CAPÍTULO II – Professor e instrutor surdo: revendo os conceitos...

36 2.1 Compreendendo a formação docente do sujeito surdo... 37

CAPÍTULO III – Contribuições teóricas para a reflexão sobre profissão

do educador surdo ... 52

CAPÍTULO IV – Método de pesquisa ... 68

CAPÍTULO V – Análise dos questionários: o que dizem os educadores surdos

sobre sua formação e atuação ... 73

CAPÍTULO VI – Análise das observações: o que é possível afirmar sobre as

práticas dos educadores surdos em sala de aula ... 99

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 117

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 123

ANEXOS ... 133

(13)

INTRODUÇÃO

Pensar na formação do profissional surdo, objeto de estudo da pesquisa, é pensar também na minha própria história de vida e relatar um pouco das minhas vivências com esse profissional. Lembro-me dos tempos em que eu ia ao Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação (CEPRE)1, pertencente à Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), o qual frequentei por dez anos (dos dois aos doze anos de idade). No CEPRE, eu sempre procurava pela instrutora surda. O que esta figura representava em minha vida?

Minha mãe participou do curso de Língua Brasileira de Sinais (Libras) nessa instituição (CEPRE) com o intuito de aprender essa língua, uma das partes do programa que os pais deveriam participar, enquanto os filhos eram atendidos na instituição, que naquela época adotava a abordagem comunicação total2. Quando eu tinha dúvidas, além da minha mãe, eu sempre procurava a instrutora surda3, pois com ela minha compreensão se realizava qualitativamente. Vygotsky (1998) define que a relação entre sujeitos é de suma importância, já que a aprendizagem ocorre na mediação do sujeito com o outro. Para que o sujeito tenha o desenvolvimento do pensamento, é necessária sua inserção na cultura, através dos grupos sociais e da linguagem. Portanto, o desenvolvimento da linguagem ocorre no meio social e o significado das palavras é que permite uma representação da realidade no pensamento. Cito um exemplo: quando pedia à minha mãe para explicar porque a palavra manga estava escrita numa parte de um casaco, porque ela escreveu errado? Ela afirmou que manga tinha dois significados parte de uma peça de vestuário, como casaco, blusa; mas, também significava fruta. Fiquei confusa, era tamanha a minha incompreensão, eu olhava: “MANGA” – As mesmas letras e com significados tão diferentes? Minhas indagações e insatisfação continuavam, principalmente porque minha mãe me explicava com os recursos que ela tinha: o bimodalismo, usando a fala e os sinais ao mesmo tempo. Era essa a forma defendida pela abordagem da Comunicação Total, na época.

1 O Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação (CEPRE) também atende às pessoas com deficiência

visual. Para mais informações: http://www.fcm.unicamp.br/fcm/centro-de-estudos-e-pesquisas-em-reabilitacao-cepre.

2

Comunicação Total, método adotado após o fracasso de oralismo, começou a ser desenvolvido em meados de 1960. A abordagem consistia no uso de sinais, fala, leitura labial, apontamento, uso de figuras, ou seja, uso simultâneo de fala com os sinais (LACERDA, 1998).

3

Denomino a profissional surda que trabalhava no CEPRE de instrutora, porque, na época ela não tinha formação acadêmica em nível de graduação e até hoje a nomenclatura é adotada nesta instituição.

(14)

Quando a instrutora surda me explicou sobre os dois significados da palavra, a real comunicação se fez, pude compreender claramente. Hoje reflito sobre a importância da língua de sinais como compreensão e inserção no mundo em que vivemos.

Com a minha mãe algo que eu não compreendia ou não conhecia, ela fazia à maneira dela, usando seu próprio discurso de ouvinte; por outro lado, quando eu perguntava algo à instrutora surda, ela citava vários exemplos e ainda acrescentava outros, próprios da comunidade surda4. A identificação pessoal vai além da língua de sinais, é a essência e a sutileza da comunicação, assim como define Vygotsky (1998), é a inclusão das relações entre as pessoas que garante a aprendizagem, ou seja, a construção da linguagem ocorre quando a criança tiver exposição a uma língua natural, o que permitirá a realização de trocas comunicativas, vivenciando situações do seu meio (GOLDFELD, 1997; GESUELI, 2003).

Parece-me que o CEPRE, além de uma escola de vida, era meu palco de comunicação, pois parte das pessoas conversavam (e conversam) por meio de Libras e havia respeito às singularidades das pessoas surdas. Na escola, não havia professor surdo e nem professora ouvinte que soubesse a língua de sinais e, por isso, eu sempre recorria à minha mãe e aos profissionais do CEPRE. Nesse período, fui aprendendo com várias pessoas e me apropriando, porque ali havia um ambiente bilíngue, inclusive as fonoaudiólogas com quem eu fazia as sessões eram bilíngues, utilizavam a fala e a língua de sinais simultaneamente, o que facilitava a comunicação e o entendimento. O ambiente rico que eu vivenciei naqueles tempos era um ambiente de interação com todos no CEPRE. Não foi na escola que essa interação aconteceu.

Tenho memória fotográfica de certas situações, por exemplo, conversas em Libras. Lembro-me dos amigos conversando em Libras, lembro-me de certos discursos. A presença do instrutor faz diferença na vida da criança surda. O papel do professor surdo fazia falta em minha vida escolar, pois o CEPRE não era uma escola e sim uma instituição clínica, mas que, a partir do conhecimento que tenho hoje do que é uma escola bilíngue, esse ambiente me parecia muito com o que hoje entendo como uma escola bilíngue. Eu podia conversar com qualquer profissional que sabia a língua de sinais e com as crianças surdas. É através desta interação com outros que a criança

4 Entende-se que se refere ao grupo de pessoas ouvintes e surdos, sejam elas, intérprete de Libras,

professores, pesquisadores, pais de filhos surdos, entre outros que participam à militância em favor da cultura surda. Segundo Padden (2000), "uma comunidade surda pode incluir pessoas que não são próprias surdas, mas que apoiam ativamente os objetivos da comunidade e trabalham em conjunto com as pessoas surdas para os alcançar" PADDEN (2000, p. 5).

(15)

constrói significados e valores. Além desses ambientes “bilíngues”, lembro-me também das broncas dos tios ou das tias, nesses momentos eles sempre chamavam minha prima para dar explicações, porque esta sabia a língua de sinais, nossa comunicação era baseada em gestos caseiros (a maioria dos sinais inventados por nós), o que tornava uma comunicação parcialmente interativa. Mesmo o CEPRE não sendo uma instituição de ensino escolar, as experiências que vivenciei lá me fazem compreender a falta que faz o professor surdo em sala de aula nas escolas brasileiras.

No CEPRE, eu aprendi a língua de sinais, descobri a minha língua, comuniquei-me com amigos surdos na nossa língua, construí minha história e fiz diferença em minha vida e de minha mãe. A ideia do projeto de mestrado se deu devido a essa experiência que relatei, ou seja, minha vivência com o instrutor surdo na época em que eu frequentava o CEPRE. Já como adulta, pude refletir sobre essa experiência da infância e adolescência e compreender a importância do contato da criança surda com o adulto surdo. Essas lembranças também se entrelaçaram à minha própria experiência profissional como instrutora da Agência para a formação profissional da Unicamp, antiga AFPU e atualmente Educorp5, durante quatro anos ensinando Libras aos funcionários públicos da Unicamp e, atualmente, ensinando Libras e Língua Portuguesa para crianças e adolescentes surdos em uma instituição. Tanto minha experiência no CEPRE quando criança como minha experiência profissional me levaram a compreender, principalmente, a importância da presença e da ação do professor surdo em determinadas situações voltadas ao desenvolvimento da criança e a relação com ela. Estas questões são perpassadas por elementos nem sempre facilmente percebidos e compreendidos pelas escolas inclusivas e ainda mais por famílias ouvintes com filhos surdos. Assim, é importante sistematizar esses elementos e analisar a relação e os modos de interação professor-aluno. Uma convicção ratificada por essa experiência de pesquisa foi reconhecer a importância da presença do profissional surdo na vida da criança surda tomando como referência a criança e os elementos significativos de seus ambientes.

Vygotsky (1998) afirma que a formação ocorre numa relação dialética entre o sujeito e a sociedade a seu redor, ou seja, o homem modifica o ambiente e o ambiente modifica o homem, é essa interação que cada pessoa estabelece com determinado ambiente que promove seu desenvolvimento e sua inserção na cultura. Posso afirmar,

(16)

então, que constitui a minha identidade, adquiri a minha língua, minha história no CEPRE.

Apesar de algumas condições desfavoráveis na minha vida escolar, considero-me privilegiada por ter oportunidade de ter contato com uma instrutora surda. Ao sair do CEPRE, eu me recordo muito bem, senti um vazio, porque a partir daquele momento comecei a conviver, quase que exclusivamente, com pessoas ouvintes. Todos da minha família são ouvintes, estudei a vida toda em escola com ouvintes. Eu sentia que algo faltava, uma “estranha no ninho”. Era um desconforto, percebia que eu estava decorando tudo o que os professores diziam, mas como poderia me comunicar oralmente? Não compreendia os conceitos. Minha situação era de uma aluna que copiava da lousa sem entender. Essa atitude não foi ou é exclusividade minha, Fernandes (2006) comenta:

Com muita clareza e propriedade, Góes e Tartuci (2002, p.114) nos revelam em suas pesquisas acerca da inclusão na escola regular, as situações excludentes a que são submetidas crianças e adolescentes surdos, simulando o papel de aprendiz e reproduzindo os rituais escolares para ocupar o lugar de aluno em sala de aula: “copiar da lousa, copiar do colega, copiar de seu próprio caderno – o aluno surdo aprende e acaba por fortalecer este tipo de estratégia: copiar para se manter vivo no ambiente” (FERNANDES, 2006, p. 3).

Inevitavelmente, eu comparava minha experiência na escola com as vivenciadas no CEPRE. O CEPRE, embora fosse um programa de reabilitação e de apoio à escolaridade, era um espaço para aprender, refletir, pensar, questionar e interagir com os colegas. Meu histórico na escola regular, em que predominavam a oralização e a cultura ouvinte, suscitou em mim o desejo para desenvolver essa pesquisa com o intuito de realizar uma reflexão sobre a importância de se ter um profissional surdo nas escolas onde há alunos surdos. Quem explicava e repassava as disciplinas da escola era minha mãe e o meu irmão, eles sabiam a língua de sinais, eles eram, para mim, a imagem de um professor “surdo”. A experiência no CEPRE e o auxílio que eu tinha de minha mãe e meu irmão que usavam comigo a língua de sinais foram confirmando a importância de um professor surdo e da Libras para uma educação de qualidade e o desenvolvimento da identidade.

Durante o período de convivência com diversas pessoas, algumas inquietações foram geradas: que aspectos de minhas experiências de vida influenciaram e influenciam essas relações e também a escolha do tema da dissertação do mestrado?

(17)

Quais minhas percepções sobre as diferenças de significação do discurso na minha relação com minha mãe e na minha relação com a professora surda? Como se dá e como deveria ser a formação do instrutor e do professor surdo? Qual a importância do papel do professor surdo na sala de aula no processo educacional de crianças e jovens surdos? Junto a essas inquietações e da minha formação como pedagoga, constatei que a maioria dos professores surdos formados no ensino superior continua sendo contratada como instrutor nas escolas brasileiras, o que me mobilizou para algumas questões que direcionaram os caminhos percorridos para geração dos registros e a análise empreendida na pesquisa: Quais são as práticas que constituem a atuação profissional dos profissionais surdos nos contextos escolares? São práticas constituídas de elementos próprios de uma prática de docência? Quais as percepções que os próprios profissionais surdos têm de sua formação e de sua atuação no contexto educacional? O que faz com que as instituições educacionais continuem a contratar o educador surdo com o título de instrutor?

A relação da formação do professor surdo e o mercado de trabalho foram se constituindo como objeto de pesquisa. A base teórica que utilizo nessa pesquisa foi a sócio histórico cultural, com destaque a Vygotsky (1998) e a teoria da enunciação de Bakhtin (1999). Segundo os autores, a criança precisa construir o seu conhecimento na inter-relação com os outros e com o meio em que está inserida. Vygotsky enfatiza o quanto a experiência sociocultural influencia a criança e afirma que a construção do conhecimento ocorre a partir de um grande e importante processo de interação. Ele frisa que além da importância da socialização no processo de construção do conhecimento, o professor como mediador tem um importante papel na construção do próprio sujeito e em suas ações. Essa mediação passa necessariamente pela língua.

No estudo de Vygotsky apresento dois aspectos sobre o desenvolvimento: cultural e natural. Segundo o autor, “o crescimento intelectual da criança depende de seu domínio dos meios sociais do pensamento, isto é, da linguagem” (VYGOTSKY, 1998, p. 63). O ser humano tem sua capacidade de expressar-se por meio da linguagem, e principalmente por uma língua, que tem sua relação com as gerações repassadas construindo assim sua cultura, os valores, sua história. Seguindo a mesma lógica de Vygotsky (1998), para Bakhtin (1999), outro pesquisador russo, a relação do ser humano se dá com a influência da linguagem na constituição da subjetividade. Segundo o autor, o ser humano não nasce pronto para desenvolver a sua linguagem, ele passa a fazer parte de um contexto social, como ele afirma: “não se nasce organismo biológico

(18)

abstrato, mas se nasce camponês ou aristocrata, proletário ou burguês”. (BAKHTIN, 1988, p. 36). Poderíamos ampliar essa expressão: “não se nasce organismo biológico, mas se nasce brasileiro, americano ou japonês; surdo ou ouvinte; homem ou mulher; branco, negro ou indígena...”; e tantas outras possibilidades culturais quanto o número de grupos humanos existentes no mundo. Esses dois pensadores deram a importância ao estudo da linguagem e no estudo das realidades (relações) humanas, motivo pelo qual são tão adequados à fundamentação teórica de uma pesquisa que pretende analisar as relações educacionais com a presença do educador surdo.

No século XXI, houve grandes avanços na política educacional para surdos, no Brasil, isso se deu graças ao reconhecimento da Lei Federal n° 10.436 de 2002 e do Decreto n° 5.626 de 2005 que regulamenta esta lei. Com isso, a política tem se preocupado com a formação de profissionais que trabalham com o ensino de Libras como primeira língua e português como segunda língua para surdos. Isso porque o surdo precisa apropriar-se da Libras, que se baseia na pista visual e espacial e é considerada sua língua natural6. De acordo com Gesser (2006), a Libras é a língua natural dos surdos brasileiros e, como tal, poderá ser aprendida pelo surdo nas interações que estabelece com a comunidade surda e por qualquer pessoa ouvinte interessada através de cursos específicos.

A Libras possui todos os elementos classificatórios identificáveis e componentes gramaticais de uma língua e demanda de prática para seu aprendizado como qualquer outra língua. Foi na década de 60 que a Língua de Sinais foi estudada e analisada por linguistas de forma sistemática, passando então a ocupar um status de língua, como afirma o autor “a língua de sinais dos surdos têm estrutura e função semelhante às demais línguas” (STOKOE, 1960, p. 3). Os estudos constataram que a Língua de Sinais é uma língua viva e autônoma. Como já mencionado, foi ela, então, reconhecida pelo Governo Federal Brasileiro que, em 2002, assinou uma lei que definiu a Libras como meio legal de comunicação e expressão da comunidade surda.

O reconhecimento da Libras como língua pela comunidade surda relaciona-se diretamente com a questão da educação inclusiva bilíngue do aluno com surdez. Isto porque os sistemas educacionais têm por base a política educacional inclusiva

6

Sobre a língua natural, segundo Caporali (2005), “quando a criança ouvinte desde seu nascimento é exposta à língua oral, dessa forma é fornecida para ela a oportunidade de adquirir uma língua natural, a qual irá permitir realizar trocas comunicativas, vivenciar situações do seu meio e, assim, possuir uma língua efetiva e constituir sua linguagem. Para a criança surda deveria ser dada a mesma oportunidade, de adquirir uma língua própria para constituir sua linguagem”. (CAPORALI et al, 2005, p. 587)

(19)

implementada no país a partir de 1990, segundo a qual as escolas devem se organizar de forma a garantir condições de acessibilidade curricular para todos os alunos, oferecendo uma educação de qualidade, inclusive para os que apresentam necessidades educacionais especiais, entre eles os alunos com surdez. Especificamente no caso do aluno surdo, Fernandes (2006) relata que a educação escolar bilíngue propicia o ensino e/ou ampliação da Libras como primeira língua e o português escrito, como segunda língua. Porém, sabe-se que ainda se faz necessário a efetivação de uma educação bilíngue de qualidade no território brasileiro. Há, ainda, a necessidade de mais pesquisas sobre esse tema a fim de que lancemos luz a esse modelo educacional com o intuito de consolidá-lo no Brasil.

A educação bilíngue almejada para grupos minoritários (alunos índios, imigrantes, de fronteira) nos últimos anos ressalta a importância de propiciar a esses grupos de alunos uma escolarização que lhes permita ter acesso dentro do ambiente escolar à sua primeira língua (MAHER, 2007). Como parte também de um grupo minoritário, para o aluno surdo é importante o acesso à Libras ao mesmo tempo que ele aprende o português, sua segunda língua. Uma das maneiras para que isso se efetive é a condição de que o profissional que lida com esse grupo de pessoas seja o profissional surdo.

A importância da figura do professor devido ao seu papel mediador com o como defende Martins (2010)

[...] O professor surdo é alguém que transforma os alunos surdos e que também é transformado pela L2, porque se o professor surdo contribui para o desenvolvimento e a transformação da criança surda, ele também é o mediador da bagagem cultural e conhecimentos de sua formação que estão presentes na sua segunda língua, por isso [...] também é transformado ou influenciado pelas marcas da língua portuguesa durante a sua formação e história. (MARTINS, 2010, p. 67).

Além de contribuir para o desenvolvimento linguístico da criança surda, o professor surdo tem um importante papel no seu desenvolvimento psíquico, através da afetividade constituída nessa relação.

O Decreto n° 5.262 de 2005, que regulamenta a Lei Federal nº 10.436/2002 e o art. 18º da Lei nº 10.098/2000, institui que a formação do professor deve ser oferecida, preferencialmente, ao profissional surdo, como explicitado nos artigos 4º, 5º e 6º

(20)

Art. 4º: A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação superior deve ser realizada em nível superior, em curso de graduação de licenciatura plena em Letras: Libras ou em Letras: Libras/Língua

Portuguesa como segunda língua.

Art. 5º: A formação de docentes para o ensino de Libras na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental deve ser realizada em curso de Pedagogia ou curso normal superior, em que Libras e Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de instrução,

viabilizando a formação bilíngue.

Art. 6º: A formação de instrutor de Libras, em nível médio, deve ser realizada por meio de: I - cursos de educação profissional; II - cursos de formação continuada promovidos por instituições de ensino superior; e III - cursos de formação continuada promovidos por instituições credenciadas por secretarias de educação. (BRASIL, 2005, p. 12)

Com este ecreto a contratação de professores surdos deve ser priorizada, o que significa oferecer oportunidades no mercado de trabalho a esse profissional levando em consideração a situação de desvantagem social, política e econômica, em relação aos ouvintes. Como o campo de trabalho para professor surdo ainda é restrito, faz-se importante a conscientização da prioridade para o profissional surdo já prevista em lei para que a sociedade possa, inclusive, vê-lo com outros olhos.

O argumento sobre a necessidade de inserção do professor surdo na escola é destacado nas palavras de Lunardi (1998):

A presença do professor surdo na escola representa muito mais que modelo de linguagem e identidade: ele é um articulador do senso de cidadania que se estabelece num processo de relação social. Essa relação acontece entre professores surdos e alunos surdos, porque essa troca social de conhecimentos se reproduz através da língua de sinais (LUNARDI, 1998, p.85).

Assim, surgem algumas questões: qual é o espaço para professor surdo dentro da carreira reservado pelo Decreto n° 5.626 de 2005 que define o profissional preferencialmente surdo? Porque ainda não se vê o respeito ao decreto e, por consequência, ao profissional surdo?

É muito comum que as diretrizes operacionais das redes públicas de ensino confundam e tratem do assunto indiscriminadamente, deixando de fora os profissionais surdos dos dois papéis que a ele são possíveis: Instrutor ou Professor. Silveira e Rezende (2008) questionam sobre a função do profissional surdo

(21)

Quão inferior o surdo se apresenta no contexto profissional, já que no ambiente educacional foram observadas várias distorções, na nossa avaliação. Historicamente, fomos chamados para sermos o "dicionário ambulante" (de Libras) de muitos professores na escola e, na maior parte, os ditos "professores especialistas” [...] apenas orientavam os alunos a trabalharem com o sinal dado pelos surdos. Por que o surdo não pode desempenhar este importante papel de professor e não de mero instrutor - palavra com menor status profissional? Por que ele não pode explicar os conteúdos curriculares, como já acontece em várias escolas? Nesse último caso, os surdos já trabalharam com informações importantes apresentadas pela disciplina e mesmo assim não foram considerados, agraciados com o título de "professores" pelos docentes. Sempre os surdos foram considerados tecnicamente como instrutores, mas na verdade, atuavam como professores, apesar de poucos possuírem licenciatura. (SILVEIRA e REZENDE, 2008, p. 66).

Segundo Faria (2011), é necessário olhar atentamente a relação discriminatória do uso do termo Instrutor de Libras, comumente utilizado para o profissional surdo que atua nas escolas de educação básica, mesmo quando este tem formação pedagógica e funções similares às de um docente.

A principal base para formação do profissional da educação é a docência, com ela se envolve o processo de ensino-aprendizagem. Sobre isso, Farias (2011) descreve que a presença de um professor surdo dará ao processo de aquisição da linguagem da criança surda, em essência, um processo ensino-aprendizagem da Libras em contexto, imbuído de uma cultura linguística, de uma gramática própria e uma estrutura de construção de conhecimento peculiar.

Diante da realidade acima exposta, o objetivo geral dessa pesquisa é compreender o perfil do profissional educador surdo e a sua função no ambiente educacional, destacando sua formação técnica pedagógica e refletir sobre os reflexos de sua atuação na formação dos alunos surdos.

A estrutura da dissertação traz uma organização do trabalho em cinco capítulos. No primeiro capítulo, foi discutido sobre a formação do professor e instrutor surdo e relacionado com outras áreas.

O levantamento bibliográfico sobre os conceitos de instrutor e professor surdo para a análise e discussão dos termos encontrados em artigos, teses, dissertações e entre outros será discutido no segundo capítulo.

Para o terceiro capitulo, foi feita a discussão teórica referente à formação docente do profissional surdo.

(22)

O capítulo quatro descreve o método da pesquisa.

Os capítulos seguintes, cinco e seis, trazem os resultados e as análises da pesquisa de campo, realizadas, uma a partir de um questionário e outra, a partir da observação em sala de aula. Esses resultados são discutidos nas considerações finais.

Esta pesquisa se propõe a dar visibilidade à atuação de profissionais surdos, à sua formação e à relevância da presença desse profissional para os alunos surdos, compreendendo sua inserção em diferentes espaços educacionais.

(23)

CAPÍTULO I

O PAPEL E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR E INSTRUTOR

SURDO

O propósito do capítulo é apresentar concepções sobre a formação do professor e instrutor surdo ancorado na legislação vigente. A retomada da legislação é de suma importância, uma vez que existem tendências de diferentes épocas que se mantém na perspectiva atual, principalmente em relação ao vínculo empregatício, visto que muitos profissionais surdos, mesmo sendo docentes formados e qualificados, são contratados como instrutores.

Pretende-se percorrer, primeiramente, as legislações da esfera educacional, relacionando-as com a formação do profissional surdo. Irei analisar também o “Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue – Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa”7 do Ministério da Educação (MEC), elaborada por um GT (Grupo de Trabalho) composto por pesquisadores surdos e ouvintes.

A legislação educacional, com suas diretrizes e normas, direciona a organização e o funcionamento de vários órgãos e instituições responsáveis pela educação. Em 2005, entrou em vigência o Decreto nº 5.626 de 2005, que regulamenta a Lei nº 10.436 de 2002 dispondo sobre a Libras e o artigo 18º da Lei nº 10.098 de 2000. Este decreto é composto por nove capítulos, sendo que um deles tem uma parte específica sobre a formação do professor e instrutor de Libras. Este decreto aborda, ainda, a formação do docente de Libras, principalmente sobre a formação docente para o ensino de língua, diferenciando as funções dos profissionais formados em Pedagogia e dos formados em Letras Libras.

A língua de sinais, como qualquer outra língua, possui estrutura gramatical própria com níveis linguísticos como fonológico, morfológico, sintático, semântico e pragmático (FERREIRA BRITO, 1995). A Libras é utilizada pela comunidade surda, que se comunicam por meio desta língua. Há outros surdos que usam exclusivamente a língua oral ou as duas línguas, dependendo da situação comunicacional.

Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um

(24)

sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. (BRASIL, 2002).

A oficialização da Libras na Lei n° 10.436 de 2002 tem sua regulamentação no Decreto n° 5.626 de 2005, o qual define diretrizes para a divulgação e propagação desse sistema linguístico. Para tal, define-se que os sistemas educacionais federal, estadual e municipal devem incluir o ensino de Libras, sob garantia da lei, nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério nos níveis médio e superior, prevista no artigo 4º

O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente (BRASIL, 2002).

Por conta da legislação vigente do ensino de Libras, o Decreto nº 5.626 de 2005 a Libras deve ser incluída nos sistemas de ensino para dar identidade, excelência e legitimidade aos cursos que se propõem a formar docentes na área da educação de surdos.

A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (BRASIL, 2005).

Há orientação de que o ensino de Libras deva ser incluído nos sistemas de ensino, com prazo e percentuais mínimos para inclusão da Libras na grade curricular dos cursos. O decreto estabeleceu o prazo limite em 22 de dezembro de 2015, após a criação deste decreto de dez anos. Como prevê no artigo nono, que diz os prazos e percentuais mínimos para cumprir:

A partir da publicação deste Decreto, as instituições de ensino médio que oferecem cursos de formação para o magistério na modalidade normal e as instituições de educação superior que oferecem cursos de Fonoaudiologia ou de formação de professores devem incluir Libras como disciplina curricular, nos seguintes prazos e percentuais

(25)

mínimos: I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da instituição; II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da instituição; III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da instituição; e IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da instituição (BRASIL, 2005).

Sendo que o processo de inclusão do ensino de Libras na disciplina curricular deve ser, segundo o parágrafo único do artigo nono:

O processo de inclusão da Libras como disciplina curricular deve iniciar-se nos cursos de Educação Especial, Fonoaudiologia, Pedagogia e Letras, ampliando-se progressivamente para as demais licenciaturas (BRASIL, 2005).

Desde a promulgação daquele decreto, as discussões sobre a inclusão de ensino de Libras como disciplina curricular se intensificaram, as instituições de Ensino Superior tiveram que se adequar à legislação federal, porém a discussão da questão do perfil do profissional de Libras para o ensino dessa disciplina não está esclarecida e muito menos a formação do profissional habilitado para os diferentes níveis de ensino.

Uma reflexão se faz necessária: a inserção da disciplina de Libras nos cursos de Pedagogia e outras licenciaturas poderiam ser compreendidas como uma forma de suprir a necessidade do profissional surdo na educação de crianças e jovens surdos? Em uma pesquisa de Nascimento e Sofiato (2016), os graduados de pedagogia que tiveram a disciplina de Libras em sua formação disseram não se sentirem capazes de ministrar aulas para surdos. As autoras afirmam

Cumprir a legislação, agregando ao currículo uma disciplina de um semestre não é suficiente para atender às necessidades de formação de professores que poderão lecionar em uma sala de aula que inclua o aluno surdo. Por outro lado, garante-se, ao menos, que a questão se coloque em discussão entre os futuros professores (NASCIMENTO; SOFIATO, 2016, p. 13).

De acordo com a Lei de Diretriz e Bases da Educação Nacional (LDB), os profissionais da educação precisam atender às especificidades do exercício de suas atividades, e para tanto é necessário que tenham uma formação sólida, ou seja, esses profissionais devem ter conhecimento dos fundamentos científicos e sociais para o exercício da docência. Segundo o parágrafo único do artigo 1° da LBD:

(26)

A formação dos profissionais da educação, de modo a atender às especificidades do exercício de suas atividades, bem como aos objetivos das diferentes etapas e modalidades da educação básica, terá como fundamentos: a presença de sólida formação básica, que propicie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas competências de trabalho (BRASIL, 1996).

Quanto à formação específica para a habilitação da docência, as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) determinam que a formação de profissionais da Educação Básica se dará em nível superior em cursos de licenciaturas de graduação plena, como define o artigo 62º da DCN:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal (BRASIL, 1996).

Uma análise do Decreto nº 5.626 de 2005, que menciona a formação do professor e do instrutor de Libras, encontra-se no terceiro capítulo, intitulado como “da formação do professor de Libras e do Instrutor de Libras”. Este se inicia com uma descrição sobre a formação de profissionais de Letras Libras ou Letras Libras/Língua Portuguesa para atuar no ensino fundamental das séries finais

Mais uma vez questionamos a formação desses profissionais surdos nos cursos que os habilita a ensinar Libras em todos os níveis educacionais. Estariam os professores surdos preparados para ensinar Libras? Albres (2014), em sua pesquisa de doutorado analisou essa questão. Como um dos resultados da pesquisa, Albres (2014) afirmou

Constatamos que os institutos de formação provêm de um conhecimento científico e de um conhecimento técnico (como fazer), mas sua fraca articulação com a experiência docente e com os problemas reais de sala de aula desfavoreceram uma formação mais consolidada dos professores evidenciado nos discursos dos professores de Libras (ALBRES, 2014, p. 247).

A formação de docentes para atuar no ensino infantil e nas séries iniciais do

ensino fundamental encontra-se no artigo 5º do Decreto n° 5.626 de 2005. Observa-se, portanto, que o curso Letras Libras, sendo uma licenciatura, não

(27)

O sexto artigo daquele decreto aborda a formação do instrutor de Libras, que, diferente do professor de Libras, deve ter formação em nível médio, em instituições que podem ser realizadas tal formação: “I - cursos de educação profissional; II - cursos de formação continuada promovidos por instituições de ensino superior; e III - cursos de formação continuada promovidos por instituições credenciadas por secretárias de educação” (BRASIL, 2005). Neste artigo, o primeiro parágrafo menciona a formação do instrutor de Libras deve ser realizada por organizações da sociedade civil representativa da comunidade surda, como por exemplo, Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS)8, Centro de Atendimento ao Surdo (CAS)9 ou Associação de Surdos, desde que o certificado seja convalidado por pelo menos uma das instituições referidas nos incisos II e III. De acordo com esse artigo do decreto, se o curso de formação for realizado em uma associação de Surdos, o instrutor só poderá ministrar aulas de Libras em instituição de ensino escolar, se esse curso for reconhecido por um curso de educação profissional ou instituição de ensino superior.

O decreto determina que nos dez anos seguintes à sua promulgação, caso não haja docente com título de pós-graduação ou de graduação em Libras para o ensino dessa disciplina em cursos de educação superior, poderá ser ministrada por profissionais que apresentem pelo menos um dos seguintes perfis, conforme no sétimo artigo:

I - professor de Libras, usuário dessa língua com curso de pós-graduação ou com formação superior e certificado de proficiência em Libras, obtido por meio de exame promovido pelo Ministério da Educação;

II - instrutor de Libras, usuário dessa língua com formação de nível médio e com certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da Educação; III - professor ouvinte bilíngue: Libras - Língua Portuguesa, com pós-graduação ou formação superior e com certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da Educação (BRASIL, 2005).

Estes perfis trazem uma incoerência. Quando se menciona no item III, o professor ouvinte bilíngue está em evidência, sendo que o professor de Libras e o

8 Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS) é uma entidade filantrópica, sem

fins lucrativos, que tem por finalidade a defesa de políticas linguísticas, educação, cultura, saúde e assistência social, em favor da comunidade surda brasileira, bem como a defesa de seus direitos. Link disponível: http://feneis.org.br/

9 Link do Centro de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS) de Ribeirão Preto na página do

Facebook: https://pt-br.facebook.com/CAS-Centro-de-Apoio-ao-SurdoRibeirão-Preto-694409923935096/.

(28)

instrutor de Libras descritos nos itens I e II não são mencionados como sendo “surdo”, só como “usuário dessa língua”. Essa definição entre aspas poderia referir-se a um ouvinte que possui família surda e utiliza a Libras como língua para se comunicar. A palavra “surdo” é omitida ou esquecida? Não há perspectiva à priorização da pessoa surda, uma vez que o termo “surdo” não foi utilizado e sim “usuários dessa língua”?

Segundo Bakhtin, nenhuma palavra é utilizada por uma escolha aleatória ou deixa de ser utilizada por um simples esquecimento. “A palavra é o fenômeno ideológico por excelência” (BAKHTIN, 1999, p. 36). Há, portanto, uma significação ideológica no fato de se omitir a palavra “surdo” nos itens I e II e inserir a palavra ouvinte no item III. Como ele mesmo afirma

Um signo não existe apenas como parte de uma realidade; ele também reflete e refrata uma outra. Ele pode distorcer essa realidade, ser-lhe fiel, ou apreendê-la de um ponto de vista específico, etc. Todo signo está sujeito aos critérios de avaliação ideológica (isto é: se é verdadeiro, falso, correto, justificado, bom, etc.). O domínio do ideológico coincide com o domínio dos signos: são mutuamente correspondentes. Ali onde o signo se encontra, encontra-se também o ideológico. Tudo que é ideológico possui um valor semiótico (BAKHTIN, 1999, p. 32).

Continuando com a análise do texto do decreto, verificamos que também por meio de aprovação no exame de Proficiência em Libras (Prolibras)10 proposto pelo Ministério da Educação (MEC), os profissionais poderão atuar na docência do ensino de disciplina de Libras, e o artigo 8º do primeiro parágrafo define que o exame deve ser promovido anualmente pelo MEC e instituições de educação superior para tal finalidade. No entanto, desde a promulgação do decreto até no dia de hoje, foram realizados apenas sete Prolibras11, ou seja, os exames não foram realizados anualmente como orienta o decreto.

Ainda segue a polêmica de que esse certificado do Prolibras é aceito para atuar como instrutor ou professor para a função docente. A polêmica vem à tona quando o decreto diz que esse exame pode habilitar profissionais graduados ou pós-graduados em

10 Segundo o site do Prolibras (http://www.prolibras.ufsc.br/) “O exame Prolibras é uma combinação de

um exame de proficiência propriamente dito e uma certificação profissional proposto pelo Ministério da Educação como uma ação concreta prevista no Decreto n. 5.626/2005, decreto que regulamenta a Lei n. 10.436/2002, chamada “Lei de Libras”. Basicamente, esse exame objetiva avaliar a compreensão e produção na língua brasileira de sinais – Libras. O exame Prolibras não substitui a formação em todos os níveis educacionais”.

11

Segundo o link do Prolibras, o último exame de proficiência realizado no Brasil foi o sétimo Prolibras no ano de 2015, conforme no link: http://www.prolibras.ufsc.br/edicoes-anteriores/

(29)

qualquer área, que serão considerados professores de Libras, podendo lecionar tanto nas séries iniciais do ensino fundamental quanto no médio sem ter nenhuma formação na área educacional. Também podemos questionar como uma pessoa com formação em ensino médio pode ser instrutor de Libras, ou seja, ter a função de ensinar Libras, sem ter nunca tido qualquer formação em docência. Essa situação se deu pela urgência de profissionais para atuar no ensino de Libras, o que deveria, segundo o decreto, ocorrer pelo período de 10 anos, ou seja, até 2015. A partir daí, estariam, a partir de 2016, as instituições de ensino superior preparadas para formar docentes para o ensino de Libras?

Para problematizar a questão da nomenclatura ‘Instrutor de Libras’ atribuída aos surdos que ensinam Libras e que possuem nível educacional em ensino médio e ainda, aqueles que mesmo tendo concluído a graduação são contratados com a denominação de Instrutor, trago a comparação com outras profissões que também utilizam essa nomenclatura.

Diante do exposto acima, os quadros abaixo apresentam outras formações de instrutores de cursos existentes nos sites online, com formação em diversas áreas com formação mínima, pré-requisito, objetivo, documento necessário para se inscrever e a fonte do site online.

Levando em conta estes aspectos, percebe-se que os requisitos que caracterizam o profissional instrutor se prendem a uma formação técnica e prática.

FORMAÇÃO DE INSTRUTOR DE TRÂNSITO

Objetivo Qualificar recursos humanos para atuarem como Instrutores de Centro de Formação de Condutores, na formação de condutores de veículos automotores, com ênfase no valor segurança.

Público-alvo Comunidade em geral.

Pré-requisitos Ser maior de 21 anos; Comprovar escolaridade de conclusão de Ensino Médio, através da apresentação de cópia do Certificado de Conclusão do Ensino Médio; Possuir carteira de habilitação no mínimo há dois anos; Ser aprovado em avaliação psicológica para fins pedagógicos (em data a ser agendada).

Documento necessário para inscrição

Cópia do RG, CPF, CNH e Comprovante de Residência; Cópia do Certificado de Conclusão do Ensino Médio

Fonte http://www.feevale.br/ensino/cursos-e-eventos/formacao-de-instrutor-de-transito-37-edicao

(30)

CURSO DE INSTRUTOR DE ARMAMENTO E TIRO

Objetivo Nosso método visa formar instrutores de armamento tiro nos padrões de qualidade internacional além de prepará-los para que tenham excelentes chances no teste de Credenciamento feito pela Polícia Federal.

Público-alvo Todos aqueles que buscam tal formação que tenham um mínimo conhecimento no assunto, Instrutores de Armamento e Tiro credenciados pelo Departamento de Policia Federal cujos querem se enquadrar na nova normatização de formação, Instrutores de Armamento e Tiro de Escolas de Formação, aos candidatos ao credenciamento de instrutor de armamento e tiro pelo DPF e também atiradores desportistas em busca de conhecimento, bem como candidatos ao Porte de Arma de Fogo.

Pré-requisitos Ter mais de 21 anos; Não possuir antecedentes criminais; Envio de demais documentações pessoais que serão solicitados após reserva de matrícula.

Documento necessário para inscrição

Para reserva de matrícula, o interessado deverá primeiramente entrar em contato via e-mail para verificar a disponibilidade de vagas para a data desejada, onde receberá todas as informações pertinentes à matrícula.

Fonte http://propoint.com.br/?curso=curso-de-instrutor-de-armamento-e-tiro

Tabela 02: Curso de instrutor de armamento de tiro

INSTRUTOR DE MERGULHO LIVRE

Objetivo Qualificar o mergulhador para: prestar assistência a um Instrutor durante os cursos de mergulho Scuba e ministrar aulas práticas e teóricas de mergulho livre.

Público-alvo O programa é designado para treinar mergulhadores experientes e com um bom nível de conhecimentos a se tornarem instrutores da primeira modalidade de mergulho; o mergulho em apneia ou livre

Pré-requisitos

Idade mínima: 18 anos para a certificação; Certificação de Mergulhador Livre ou Básico Scuba; Avaliação de conhecimentos e habilidades para o curso; 32 mergulhos logados.

Documento necessário para inscrição

Não mencionado

Fonte http://hidrofobia.com.br/cursos-de-mergulho/profissionalizante/instrutor-de-mergulho-livre/

Tabela 03: Instrutor de mergulho livre

INSTRUTOR DE VOO

Objetivo O curso de Instrutor de Voo requer formação prévia como Piloto Comercial.

Público-alvo

Para se tornar um Instrutor de Voo, você deve ter concluído o curso de Piloto Comercial prático.

(31)

Pré-requisitos Possuir 18 anos de idade, 2º grau completo e ser portador da licença de Piloto Comercial

Documento necessário para inscrição

Não mencionado

Fonte http://www.ej.com.br/cursos-para-piloto/curso-de-instrutor-de-voo

Tabela 04: Instrutor de voo

Vale ressaltar que os conceitos que se encontram nas fontes quando se fala do "instrutor" são voltados para a formação técnica, na qual a formação mínima para exercer o trabalho de instrutor é de ensino médio sem nenhuma formação específica para tal curso. Todos os pré-requisitos nos cursos de instrutores solicitam a mínima formação de ensino médio e outros não são mencionados, o que significa que qualquer pessoa pode se formar como instrutor e exercer essa função apenas com esse curso. Vale lembrar que esses tipos de cursos para formação de instrutor encontram-se inexistentes nos catálogos de cursos técnicos no site do portal do Ministério da Educação (MEC)12. Segundo o portal

Como política de desenvolvimento e valorização da educação profissional e tecnológica de nível médio, o MEC iniciou, em 2007, a elaboração do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, um dos marcos do centenário da educação profissional no Brasil. O documento é elaborado de forma clara e objetiva para facilitar a consulta dos estudantes diante da quantidade de cursos ofertados. O catálogo agrupa os cursos em formato e linguagem simples, de acordo com as características científicas e tecnológicas de cada um. Para cada perfil de formação, sintonizado com o mundo do trabalho, o catálogo apresenta uma descrição do curso. As informações englobam atividades do perfil profissional, possibilidades de atuação e estrutura mínima recomendada (MEC, s/d).

No entanto, cabem aqui as indagações em relação ao conceito de instrutor ao pensar que "todo instrutor é professor?" ou vice-versa. Como fica a posição do instrutor surdo mesmo com sua formação acadêmica? Porque a denominação de instrutor de Libras necessita de formação em nível médio para lecionar nas instituições? Os instrutores de outras áreas podem ser docentes?

12 Segue o link do portal de catálogo de cursos técnicos no portal do MEC:

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=41271-cnct-3-edicao-pdf&category_slug=maio-2016-pdf&Itemid=30192

(32)

Segundo Guerra (2015), o manual de curso Instrutor de Voo – Avião – INVA - MMA 58-16, de julho 1992, em seu anexo 16, utiliza para fazer referência ao professor como: “profissional credenciado na forma da lei, com preparação pedagógica, responsável pelo ensino de matérias teóricas ou práticas dos diversos cursos”, e ao instrutor como: “elemento que possui experiência ou especialidade decorrente do exercício de atividade técnica, responsável pela instrução de matérias teóricas ou práticas dos diversos cursos” (BRASIL, 1992).

O manual de curso citado mostra claramente o quanto há distinção entre duas denominações que refere o professor como profissional e o instrutor como exercício de atividade técnica responsável pela instrução de matérias teóricas ou práticas.

Podemos constatar que todos os quadros se enquadram como cursos técnicos, algo manual que é ensinado por um instrutor de formação adquirida. Em cima disso, as questões a serem pensadas são “Quem são os profissionais qualificados que ensinam para o curso técnico?”, “Qual a formação adquirida por eles?”, “Por acaso, o instrutor surdo é formado por curso técnico?” e “Em qual categoria ele se encaixa profissionalmente?”.

Figueredo (2014) afirma em seu artigo intitulado “O enquadramento e representação sindical do instrutor técnico do Serviço Social de Aprendizagem Industrial - SENAI”, que discute sobre o enquadramento sindical em relação com a diferenciação da categoria professor com a da do instrutor. Ela salienta que a formação do instrutor é diferente a do professor, como diz em seu artigo

O instrutor, diferentemente do professor, detém seu ensino voltado somente aos aspectos de conhecimento técnico. O professor dá sua aula para alunos e o instrutor dá treinamento para aprendizes (FIGUEREDO, 2014, p. 4).

Segundo a citação, o instrutor é voltado para conhecimento técnico, enquanto o professor é responsável pelo conhecimento teórico. A autora ressalta que o curso de profissionalização é voltado para prática técnica, que é ministrado pelo instrutor.

No caso do ensino de Libras, ao utilizar como docentes a figura dos instrutores, estaria o decreto promovendo a ideia de que saber Libras é uma atividade técnica? Uma língua pode ser considerada uma técnica? Essa prerrogativa coloca em grau de inferioridade a Libras, como uma habilidade técnica e não como uma língua.

(33)

Para compreender sobre as etapas da formação escolar, deve-se observar que a educação básica é composta por três níveis: educação infantil, ensino fundamental e o ensino médio. No último nível do ensino educacional tem a educação profissional. Neste sentido, Figueredo (2014) esclarece a educação profissional dentro do ensino médio

[...] A atividade preponderante exercida pelo profissional dentro dos cursos ministrados pelo SENAI é efetivamente realizada no âmbito da aprendizagem industrial, de formação e orientação profissional. Assim, não se pode considerar como professor de educação regular o instrutor do ensino profissionalizante, cuja atividade enfatiza a prática profissional, de modo que os cursos de aprendizagem não têm relação com o exercício do magistério (FIGUEREDO, p. 7, 2014).

Diante dessa situação, acaba tornando-se uma entidade de educação, que o diferencia das demais instituições de ensino, seja de ensino fundamental, médio ou superior, justamente pela natureza de seu ensino, que é a profissionalização do aluno dentro de determinada área específica e técnica.

Há uma contradição: um sistema de ensino deveria priorizar o profissional professor, que conhece o pedagógico, a língua em toda a sua estrutura, que trabalha com os conhecimentos científico e cultural e não o instrutor, que domina a parte técnica, prática?

Como o instrutor surdo dentro de uma escola e sala bilíngue ou classe inclusiva pode ministrar aula, se a instituição é de ensino regular sem possuir certificação para ministrar a tal aula? Como entrelinhar a profissão do instrutor dentro de uma instituição que é de ensino regular? Eis a questão a ser pensada e analisada. Onde o professor surdo fica incluído, se há o instrutor?

Recentemente, foi lançado o Relatório de Grupo de Trabalho designado pelo MEC pelas portarias nº 1.060 de 2013 e nº 91 de 2013. Esse grupo de trabalho teve como, objetivo trocar e atualizar informações, conhecimentos sobre temas e aspectos específicos sobre a educação dos surdos, a fim de elaborar políticas públicas nessa área. Neste relatório não há denominação de conceito “instrutor” como mostra a seguinte citação retirada do relatório

A formação de professores de Libras, de Língua Portuguesa como L2, de tradutores e intérpretes é fundamental para formar profissionais para atuarem na educação básica. Essas formações devem ser garantidas em nível superior (licenciatura e bacharelado) e enquanto

(34)

formação continuada para os professores que já estejam atuando na educação básica e superior. Os cursos de graduação envolvem a Pedagogia Bilíngue (que forma o professor bilíngue de atuar na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental), os cursos de Letras Libras licenciatura (que forma professores de Libras para atuar no ensino da Libras na educação básica e nível médio) e bacharelado (que forma tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa). O Curso de Língua Portuguesa como L2 deve ser oferecido para formar os professores que atuarão, tanto na educação básica, como no nível superior. 19) Fomentar a formação inicial e continuada de professores surdos, professores bilíngues, professores de Língua Portuguesa como L2, professores de Libras e tradutores e intérpretes de Libras (BRASIL/MEC/SECADI, p.14, 2014).

Quando comparado ao Decreto n° 5.626 de 2005, o Relatório acima citado representa um avanço, uma vez que não utiliza a terminologia “Instrutor”, porém o mesmo não tem força de lei. Para efeitos de implantação das políticas educacionais ainda é o decreto que deve ser seguido.

Vale a reflexão: se um instrutor formado em uma escola de idioma ou numa associação que oferece curso de idioma para comunidade do bairro, este aluno poderá ministrar a aula numa instituição educacional onde a lei prevista para docência é de formação em ensino superior? Por que a lei permite o instrutor nessas instituições e qual seriam os espaços de atuação profissional de um instrutor de Libras? O que o aluno surdo fará com o certificado da Feneis, por exemplo, para trabalhar em um lugar onde a escola não exige a formação específica?

Nestas circunstâncias, a reflexão da descrição do profissional habilitado para o ensino de Libras sob a base do Decreto nº 5.626 de 2005 e da legislação educacional brasileira, prevê a necessidade de alguns pressupostos e possibilidades para reflexão. Tais questões que necessitam de discussão para a solução dos problemas em que se encontra no cenário do ambiente educacional no ensino e Libras: os professores de qualquer licenciatura podem se formar em curso de pós-graduação em Libras e atuar como professor dessa disciplina na educação superior mesmo que sua licenciatura não seja em Letras ou Pedagogia. A carga horária dos cursos de especialização é bem inferior a de um curso de graduação, no entanto, possibilita esse profissional formar outros profissionais para o ensino de Libras? Como o Prolibras pode habilitar um profissional com certificado em proficiência num mercado de trabalho que não privilegia a docência? Será que esses problemas serão resolvidos até a adequação da lei? Onde estão os profissionais surdos que se encontram nessa posição? No entanto, como

(35)

afirma Faria (2011), o primeiro passo é superar a nomenclatura de instrutor de Libras para que haja reconhecimento e valorização do sujeito surdo licenciado.

Diferenciar instrutor de Libras e professor é extremamente necessário, para dar qualidade ao trabalho de docência no ensino de Libras, sobretudo, dar visibilidade, espaço e “mãos e olhos” ao professor surdo.

Referências

Documentos relacionados

De acordo com o objetivo deste estudo, apresentaremos comentários relativos a uma primeira incursão no texto que com- põe as “Instruções metodológicas para a execução

A litografia era muito popular na França e, como Niépce não tinha habilidade para o desenho, tentou obtê-los através da câmara escura, recobrindo um papel com cloreto de prata

Com base no trabalho desenvolvido, o Laboratório Antidoping do Jockey Club Brasileiro (LAD/JCB) passou a ter acesso a um método validado para detecção da substância cafeína, à

• Quando o navegador não tem suporte ao Javascript, para que conteúdo não seja exibido na forma textual, o script deve vir entre as tags de comentário do HTML. &lt;script Language

O transplante cardíaco representa a terapia definitiva para o tratamento de IC, sendo também o tratamento de escolha para os pacientes portadores de cardiomiopatia da doença

Como parte de uma linha de pesquisa definida junto à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Ministério de Educação (MEC),

E essa mudança começa pela maior compreensão de que as fontes vêm adquirindo em relação não apenas à importância da assessoria de imprensa, mas também pelo reconhecimento de que

Na imagem abai- xo, por exemplo, as dimensões e o posicionamento dos personagens (Tio Sam e Cardoso) traduzem, em linguagem simples, o desnível geopolítico existente entre Brasil