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Conteúdos da educação física e a pedagogia de Freinet : pintando uma possibilidade para o aluno com síndrome de Down

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CAMILA LOPES DE CARVALHO

CONTEÚDOS DA EDUCAÇÃO FÍSICA E A PEDAGOGIA DE FREINET: PINTANDO UMA POSSIBILIDADE PARA O ALUNO COM SÍNDROME DE

DOWN

CAMPINAS 2014

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CARVALHO, Camila Lopes. Conteúdos da educação Física e a Pedagogia de Freinet: Pintando uma possibilidade para o aluno com Síndrome de Down. 197f. Dissertação (Mestrado em Educação Física)-Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.

RESUMO

A inclusão educacional está determinada legalmente no Brasil – tanto a Constituição, de 1988, quanto a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, garantem o direito a uma educação de qualidade para as pessoas com deficiência na rede regular de ensino. Contudo, publicações relatam dificuldades de efetivação destas legislações no âmbito do cotidiano das escolas, principalmente referentes às pessoas com Síndrome de Down, uma vez que o aspecto intelectual ainda é privilegiado em detrimento dos demais. Neste contexto, a educação física busca sua consolidação enquanto disciplina escolar em consonância com a nova realidade inclusiva. Por conseguinte, esse estudo tem por objetivo analisar o processo de inclusão de alunos com Síndrome de Down nos diferentes conteúdos da educação física escolar – jogo, esporte, ginástica, luta e dança – e, com fundamentação desses dados, elaborar uma proposta de trabalho escolar inclusivo por meio da Pedagogia de Freinet. Para isso, foi desenvolvida revisão bibliográfica exploratória com posterior pesquisa de campo qualitativa onde, num estudo de caso, foram observadas aulas de educação física durante 1 ano letivo em uma turma de 21 alunos, dos quais dois possuem Síndrome de Down, em uma escola regular do município de Americana, São Paulo. A coleta de dados foi feita por observação direta com análise da inclusão em cada aula por meio do “Instrumento de avaliação da interação entre alunos com e sem deficiência na educação física escolar”, de Salerno, Araújo e Silva (2009). A análise dos dados foi desenvolvida por categorização, com representação por tabulação em gráficos e tabelas. Posteriormente, a elaboração de uma proposta de trabalho inclusiva baseado na Pedagogia de Freinet foi desenvolvida fundamentada na revisão literária sobre o pedagogo e nos dados observados na realidade escolar. Como principais resultados observou-se o predomínio dos conteúdos de jogo e esporte sobre os demais, a ocorrência de algumas interações negativas entre os alunos e barreiras atitudinais e de conhecimento por parte do professor. Com as técnicas de Freinet, possibilidades de alteração dessa realidade foram encontradas, como criação de aulas em cantos com diversos conteúdos trabalhados concomitantemente e com diferentes níveis de dificuldade, além dos ideais de respeito, cooperação e afetividade que vão ao encontro da proposta inclusiva. Foi possível concluir que os ideais e técnicas elaborados por Freinet podem contribuir na superação dos entraves da inclusão, facilitando a construção de uma educação física escolar inclusiva. Espera-se que novas pesquisas sejam desenvolvidas acompanhando o caminhar da implantação da inclusão educacional e propondo mais possibilidades que facilitem esse processo de acordo com as diferentes necessidades.

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CARVALHO, Camila Lopes. Contents of Physical education and Freinet pedagogy: Painting a possibility for the student with Down Syndrome. 197f. Dissertation (Master in Physical Education)-School of Physical Education. State University of Campinas, Campinas, 2014.

ABSTRACT

The educational inclusion is determined legally in Brazil - both the 1988 Constitution as the Law of Education Guidelines and Bases, 1996, guarantees the right to a quality education for people with disabilities in regular schools. However, publications report effective difficulties of those laws in the daily life of schools, particularly relating to people with Down syndrome, since the intellectual aspect is still privileged over others. In this context, physical education seeks its consolidation as school discipline in line with the new inclusive reality. Therefore, this study aims to analyze the process of inclusion of students with Down syndrome in the different content of school physical education - play, sport, gymnastics, wrestling and dance - and, based on these data, a proposed inclusive school work by Freinet pedagogy. For this, a literature review was developed with subsequent qualitative field research where, in a case study, physical education classes were observed for 1 school year in a class of 21 students, two with Down syndrome in a regular school the city of Americana, São Paulo. Data collection was done by direct observation with analysis of inclusion in each class through the "instrument for assessing interactions between students with and without disabilities in school physical education" of Salerno, Araújo e Silva (2009). Data analysis was developed by categorization, with tab-representation in graphs and tables. Later, the development of an inclusive work proposal based on Freinet Pedagogy was developed based on the literature review on the teacher and the data observed in the school reality. The main results showed a predominance of game content and sports on the other, the occurrence of some negative interactions between students and attitudinal barriers and knowledge from the teacher. With the Freinet techniques, possibility of alteration of this reality were found, such as creating classes in corners with different contents worked concurrently and with different levels of difficulty, in addition to the ideals of respect, cooperation and affection to meet the inclusive proposal. It was concluded that the ideals and techniques developed by Freinet can contribute to overcome the barriers of inclusion, facilitating the construction of an inclusive physical education. It is hoped that further research will be developed following the journey of the implementation of educational inclusion and offering more possibilities to facilitate such a process according to the different needs.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 01

2 PREPARANDO AS TELAS - SISTEMAS EDUCACIONAIS ... 06

2.1 Tela 1 - ensino escolar ... 07

2.2 Tela 2 - escolarização e a pessoa com deficiência ... 19

2.2.1 A pessoa com deficiência ... 19

2.2.2 Escolarização da pessoa com deficiência ... 30

2.2.3 Inclusão escolar – desvendando o tema ... 38

3 SEPARANDO AS TINTAS - CONTEXTUALIZANDO A EDUCAÇÃO FÍSICA .. 47

3.1 Tinta 1 - educação física escolar ... 55

3.2 Tinta 2 - teorias da educação física ... 60

3.3 Tinta 3 - inclusão na educação física escolar ... 67

4 ESCOLHENDO AS TONALIDADES – CONTEÚDOS DA EDUCAÇÃO FÍSICA .... 75

4.1 Tonalidade 1 - dança ... 80

4.2 Tonalidade 2 - esporte ... 83

4.3 Tonalidade 3 - ginástica ... 90

4.4 Tonalidade 4 - jogo ... 94

4.5 Tonalidade 5 - luta ... 98

5 DELIMITANDO OS PINCEIS: DEFICIÊNCIA INTELECTUAL – A SÍNDROME DE DOWN ... 102

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5.2 Pincel n°2 - inclusão educacional das pessoas com Síndrome de Down ... 109

5.3 Pincel n°3 - aluno com Síndrome de Down na educação física escolar ... 113

6 O QUADRO DA REALIDADE - A PESQUISA ... 119

6.1 Metodologia ... 120 6.1.1 Tipo de estudo... 120 6.1.2 População ... 121 6.1.3 Local do estudo... 122 6.1.4 Procedimentos ... 123 6.2 O instrumento de avaliação ... 125

7 ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÕES... 128 8 PINTANDO UMA NOVA REALIDADE: PROPOSTA DE INTERVENÇÃO - A PEDAGOGIA DE FREINET COMO POSSIBILIDADE ... 147

8.1. Organizando os materiais - a pedagogia de Freinet ... 149

8.2 Uma nova pintura - Freinet como uma proposta de inclusão ... 155

8.2.1 Aproximando os conceitos ... 155

8.2.2 As técnicas como possibilidade inclusiva ... 160

CONSIDERAÇÕES FINAIS – ENTRE AS PINTURAS EXISTENTES E AS FUTURAS... 172

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ANEXOS ...192

ANEXO A – Parecer do Comitê de Ética ... 192 ANEXO B – Instrumento de avaliação da interação entre alunos com e sem deficiência na educação física escolar (SALERNO; ARAÚJO; SILVA, 2009) ... 196

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Aos meus pais pela confiança, apoio e amor incondicional.

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente, agradeço a Deus e Nossa Senhora, que me oportunizaram, nortearam e protegeram durante o caminhar da realização desse estudo.

Ao Professor Dr. Paulo Ferreira de Araújo, pela oportunidade ao me receber como sua orientanda, e por toda a atenção, dedicação e aprendizagem proporcionadas por meio de sua orientação.

Ao grupo de estudos, pelas reflexões constantes que contribuíram com meu amadurecimento como educadora, e especialmente à Professora Dra. Joseane Filus e ao Professor Dr. Luís Seabra, pela participação direta na construção dessa pesquisa com contribuições pertinentes e valorosas como banca, e à Professora Dra. Marina Salerno pela disponibilidade constante em auxiliar tanto na elaboração desse trabalho quanto nas demais atividades acadêmicas desenvolvidas durante o curso.

Aos funcionários e docentes da FEF/UNICAMP, pela formação crítica e autônoma que me proporcionaram.

Ao meu pai Ednei e minha mãe Ana, meus primeiros educadores, que me proporcionaram a formação como pessoa necessária para que eu compreendesse e seguisse os valores e ideais corretos, e dispuseram do apoio necessário para que mais essa etapa fosse alcançada.

A minha irmã, pela cumplicidade e acompanhamento durante essa fase.

Aos amigos e todas as pessoas que me acompanharam e, de alguma forma, contribuíram com mais essa fase de estudo.

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Haverá uma melhoria pedagógica na medida em que o dinamismo das novas forças triunfar sobre essas resistências e souber construir, pedra a pedra, o mundo novo com que sonhamos (FREINET, C., 1975, p. 09).

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Rafael Sanzio. A Escola de Atenas. 1510-11 ... 08

Figura 2 – Pieter Bruegel. Jogos e Brinquedos Infantis. 1560... 10

Figura 3 – Candido Portinari. O Lavrador de Café. 1939 ... 13

Figura 4 – Lord Frederick Leighton. Estudo; na mesa de leitura. 1877 ... 17

Figura 5 – Pieter Bruegel. Os Aleijados. 1568b ... 22

Figura 6 – Robert Henri. Cantora Espanhola Cega. 1912 ... 24

Figura 7 – Diego Velazquez. Um Anão Sentado no Chão. 1645 ... 28

Figura 8 – Konrad Grob. Pestalozzi com Órfãos em Stans. 1879 ... 33

Figura 9 – Henri Matisse. A Dança (primeira versão). 1909 ... 41

Figura 10 – Ernst Ludwig Kirchner. Arco. 1935 ... 48

Figura 11 – Emiliano di Cavalcanti. Linha de Produção. 1960-70 ...50

Figura 12 – Edi Cavalcanti. Tempos Modernos. 1961 ... 56

Figura 13 – Orlando Teruz. Meninos Pulando Carniça. 1972 ... 59

Figura14 – Vicente Van Gogh. Romanos Parisienses. 1888 ... 61

Figura 15 – Eduardo Lima. Inclusão Social. 2009 ... 70

Figura 16 – Marc Chagall. O Grande Circo. 1968 ... 77

Figura 17 – Kiki Lima. Dança de Batuque. 2012 ... 80

Figura 18 – Camille Pissarro. Meninas Jogando Tenis. 1981 ... 86

Figura 19 – Francisco Rebollo. Futebol. 1936 ... 88

Figura 20 – Giandomenico Tieplo. Polichinelos e Saltimbancos. 1793 ... 90

Figura 21 – Fatima Carvalho. Sarau de Ginástica e Eu. 1967 ... 93

Figura 22 – Henri Matisse. Um Jogo de Boliche. 1908 ... 96

Figura 23 – Rosina Becker do Valle. Capoeira. 1966 ... 99

Figura 24 – Andrea Mantegna. A Virgem e a Criança. 1495 ... 104 Figura 25 – Karel Appel. Menino Selvagem. 1954 ... 111

Figura 26 – Jan Joest of Kalkar. Adoração do Menino Jesus. 1515 ... 114

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Figura 28 – A inclusão do aluno com Síndrome de Down nas aulas de educação física

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAIDD American Association on Intellectual and Development Disabilities AAMR American Association of Mental Retardation

ABDEPP Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas da Pedagogia Freinet ABDM Associação Brasileira de Deficiência Mental

APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

CADEME Campanha Nacional da Educação e Reabilitação de Deficientes Mentais CEL Cooperativa de Ensino Leigo

CENESP Centro Nacional de Educação Especial COESP Comissão de Especialistas

CONADE Conselho Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência

CORDE Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

FIMEM Federação Internacional dos Movimentos da Escola Moderna FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica ICEM Instituto Cooperativo da Escola Moderna

INES Instituto Nacional de Educação dos Surdos LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LIBRAS Língua Brasileira de Sinais

MEC Ministério da Educação e Cultura NEE Necessidades Educativas Especiais ONU Organização das Nações Unidas PCD Pessoa Com Deficiência

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais QI Quociente Intelectual

SEESP Secretaria de Educação Especial SESu Secretaria de Ensino Superior

UNESCO Conferência da Organização das Nações Unidas USP Universidade de São Paulo

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APRESENTAÇÃO

Se em alguns momentos uma pesquisa acadêmica exige o distanciamento do pesquisador com o objeto de estudo para a maior validade deste, em outros incita a aproximação para que temas sejam delineados e construídos.

Dessa forma, dissertar sobre a relação entre a minha formação e ideais educacionais e a construção deste trabalho torna-se relevante para a maior compreensão do mesmo.

Em minha formação inicial, no curso de educação física, os primeiros contatos com a Pedagogia de Célestin Freinet foram realizados, de forma rápida e pontual. Durante esse curso, as temáticas relacionadas à população com alguma condição de deficiência ressoaram em minhas reflexões, tanto pelas dificuldades enfrentadas no cenário social quanto pelas relevantes possibilidades de superação destas por meio da área. Concomitantemente, os assuntos relacionados ao cenário educacional dessa temática conquistaram minha preferência pessoal, encaminhando-me para as discussões a respeito da inclusão educacional dessa população.

Dessa forma, realizei em sequência o curso de especialização em “Educação especial e educação inclusiva”. Já me atentando aos fundamentos educacionais de forma mais enfática, iniciei uma segunda formação como contribuição a minha construção profissional - a de pedagogia. Nesse segundo curso, Célestin Freinet, que até então vinha adormecido em minhas memórias, foi retomado pelas disciplinas acadêmicas.

Nesse mesmo período, vinha delineando o projeto desse estudo de Mestrado, e Freinet se mostrou como uma possibilidade de união entre as duas formações, integrando a educação física e a pedagogia de forma a contribuir com o desenvolvimento da temática já escolhida como central em minha formação profissional.

Dentre os diversos educadores estudados, Célestin Freinet destacou-se, para mim, por sua vivência no ambiente escolar e compreensão das diversas dificuldades a serem superadas no mesmo. Se outros estudiosos construíram teorias em cenários distantes do educacional, Freinet atuou diretamente neste local, não apenas elaborando sugestões, mas implantando-as, ele mesmo, em prol da construção de uma educação de qualidade para todos.

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Por conseguinte, uma crença nas possibilidades de contribuição das teorias desse educador de forma favorável à construção da educação inclusiva, temática escolhida desde minha primeira formação acadêmica, tomou forma.

Com isso, concluo enfatizando que, tanto a escolha do tema central quando dos atores principais para fundamentá-la, vieram do fato de eu acreditar na possibilidade de superação e transformação de todas as ocasiões escolares em situações mais humanas. Posso dizer, por fim, que acredito nas capacidades de todo ser humano, possuindo uma condição de deficiência ou não. Acredito na validade e na intenção sincera de Célestin Freinet ao desenvolver suas propostas educacionais. Acredito na força da educação física enquanto disciplina escolar possível de contribuir diretamente com a construção de um cenário educacional inclusivo. Acredito na necessidade de educadores desenvolverem trabalhos que propiciem a todos acesso a uma educação de qualidade. Acredito na urgência dos professores em atuarem de forma a combater os preconceitos e construírem uma educação digna para todos, inclusive para a pessoa com deficiência. Acredito, portanto, na contribuição que Freinet pode trazer para a construção de propostas educacionais que facilitem a inclusão de um aluno com deficiência em todas as disciplinas escolares e, em especial, na educação física.

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1 INTRODUÇÃO

Interagir com um corpo humano, interagir com um indivíduo, é interagir com a própria sociedade na qual este está inserido, uma vez que, desde o momento de seu nascimento o indivíduo é incorporado a uma dada cultura e organização social que moldam seu corpo e seus conceitos (DAÓLIO, 1996).

No âmbito educacional, a afirmação acima se faz não apenas verdadeira, mas também determinante para a compreensão da temática deste estudo.

Dessa forma, a inclusão de um aluno com deficiência nas aulas de educação física de uma escola regular é um tema que traz a obrigatoriedade de compreensão acerca das questões relacionadas ao contexto da educação física enquanto componente curricular e da pessoa com deficiência enquanto participante do cenário social, para que de fato possa ser compreendida a relação estabelecida entre elas na atual proposta da educação inclusiva.

Em relação à Educação Física, nota-se sua constituição enquanto disciplina do currículo escolar entre os séculos XVIII e XIX, iniciando suas atividades sem a presença de profissionais da área, mas amparada e influenciada pela instituição militar e pela medicina. Sendo o corpo, nesse momento, entendido como uma estrutura mecânica, a disciplina escolar de educação física tinha por objetivo a promoção da saúde para a população e a contribuição para o desenvolvimento de mão de obra para a sociedade que se estabelecia na época vigente. Passando a ser explorada por grupos sociais com diferenciados objetivos, questionamentos dessa realidade emergiram e conduziram às propostas de novas formas de entendimento e de finalidade da educação física, culminando em sua presente configuração no cenário escolar baseada na vivência dos diferentes conteúdos da cultura corporal ou de movimento (BRACHT, 1999).

Concomitantemente, a pessoa com deficiência encontrou resistência para ser incorporada socialmente sofrendo exclusão, abandono, exposição e até mesmo condenação à morte. Com propagação de correntes humanistas, sua aceitação enquanto ser humano foi alcançada, porém com vivência segregada do restante populacional. O sistema educacional para essa população teve inicio tardiamente, pela educação especial em ambiente separado dos demais. Familiares e pessoas que se sensibilizaram com a causa foram em buscas de

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métodos educacionais adequados e, posteriormente, ações políticas deram continuidade às discussões (MIRANDA, 2003).

A partir da década de 1950, no Brasil, organizações não governamentais e classes especiais dentro do ensino regular expandiram-se. Em sequência, discussões passaram a defender a participação das pessoas com deficiência conjuntamente com as demais em todas as disciplinas escolares – incluindo a educação física. Da normalização e integração, definiu-se a inclusão educacional.

Pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, a educação deve ser inclusiva, ou seja, receber e proporcionar a mesma qualidade de ensino para todos, independente de suas dificuldades ou deficiência (BRASIL, 1996).

Se antes a pessoa com deficiência (PCD) era desprezada e até mesmo condenada à morte, hoje possui a garantia pelo Estado em não sofrer nenhum tratamento desumano ou degradante, possuindo os mesmos direitos educacionais que as demais pessoas (BRASIL, 2007).

Contudo, a dificuldade em fazer das determinações legais uma realidade escolar tem sido comum, com a presença de barreiras atitudinais, arquitetônicas e de conhecimento. O preconceito teve sua origem em muitos anos atrás e, abarcado de fatores históricos e culturais, ainda se mantem presente, numa sociedade que dita e impõe padrões de pessoas e de vida, rejeitando as diferenças.

Especificamente em relação às pessoas com Síndrome de Down, sua entrada no cenário das escolas regulares trouxe relevante impacto em toda a organização, estrutura e funcionamento da escola, pois ela rompeu com a definição curricular imposta a todos, rompeu com a estrutura criada há séculos e tão relutante às mudanças. Esse aluno trouxe explicitamente uma necessidade já enfatizada há muito tempo - a de transformação da instituição escolar para essa nova forma de organização social. Ele tirou o professor da comodidade de seguir fielmente um material didático pré-estabelecido, induzindo-o a planejar e adaptar, a criar mecanismos que facilitem o aprendizado de cada aluno.

Mas, afinal, não é essa a função do professor, de ser um facilitador, um mediador entre o aluno e o conhecimento?

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relacionadas à inclusão da pessoa com deficiência, mas objetivando maior compreensão dos alunos e adequação educacional, diferentes profissionais como pedagogos, filósofos e psicólogos estudaram e propuseram teorias educacionais. Por outro lado, a precariedade na qualidade de ensino, de formação de professores e de acesso e permanência das crianças e adolescentes no cenário educacional se mantiveram presentes. Nesse contexto antagônico, o pedagogo Célestin Freinet buscou a construção de uma educação adequada sem desconsiderar as diferentes realidades e dificuldades possíveis de serem encontradas. Ainda no século XX, Freinet propagou ideais educacionais em consonância com os necessários no momento presente para que uma educação para todos de fato ocorra – fundamentada na cooperação, afetividade e respeito às diferentes capacidades e dificuldades, numa época na qual as discussões a respeito da educação inclusiva ainda não estavam em pauta.

A inclusão enfrenta problemas em sua implantação, permeados por aspectos históricos e sociais, que dificultam a consolidação dos diferentes aspectos necessários à construção inclusiva, como os referentes à capacitação dos profissionais da área de educação para atender a todos com qualidade, e à dificuldade de valorização da diversidade humana e do respeito às diferenças individuais pela comunidade escolar – envolvendo pais, alunos, profissionais. Com isso, uma aproximação do tema com a proposta de Freinet torna-se pertinente, uma vez que esta possui uma batorna-se epistemológica a qual procura compreender e transformar aspectos da realidade histórica e social numa busca pela aceitação e construção de vida digna para todos.

Neste cenário e a partir destas discussões, esse estudo tem o objetivo de analisar o processo de inclusão de alunos com a condição específica de Síndrome de Down nos diferentes conteúdos da educação física escolar – jogo, esporte, ginástica, luta e dança – para, em seguida e fundamentada nesses dados, elaborar uma possibilidade de trabalho escolar inclusivo por meio da pedagogia de Freinet. A metodologia envolveu uma revisão bibliográfica exploratória inicial por meio da base de dados Scopus e Edubase com os termos “educação física escolar”, “adapted physical education”, “educação inclusiva”, “inclusion school”, “conteúdos da educação física escolar”, “Síndrome de Down”, “Down Syndrome” e “Célestin Freinet”. Posteriormente foi realizada uma pesquisa de campo qualitativa composta por um estudo de caso, conforme definição de Ludke e André (1986),

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na qual foram observadas, durante 1 ano letivo, aulas de educação física escolar de uma sala regular do 2° ano do ensino fundamental a qual possui dois alunos com Síndrome de Down, em uma escola do município de Americana, São Paulo.

A coleta de dados por observação direta no sentido de identificar ou não a prática da inclusão em cada aula foi realizada meio do “Instrumento de avaliação da interação entre alunos com e sem deficiência na educação física escolar”, de Salerno, Araújo e Silva (2009). A posterior análise dos dados foi desenvolvida por categorização a qual, segundo Ludke e André (1986), permite uma organização destes em categorias em prol da sua descrição, interpretação e questionamentos, sendo desenvolvida nesse trabalho uma organização e representação destes por tabulação em gráficos e tabelas temáticos. Em seguida, foi desenvolvida a elaboração de uma proposta de trabalho inclusivo baseada na Pedagogia de Freinet, fundamentada na revisão literária sobre a proposta do pedagogo e nos dados coletados.

A elaboração desse trabalho vem do resultado das observações referentes à dificuldade na implantação da inclusão no cenário educacional, em detrimento das definições legais já estabelecidas, buscando não apenas uma análise da real situação, mas também uma alternativa contribuinte.

Esse estudo orienta-se pelo entendimento de que, as pesquisas educacionais relacionadas à temática inclusiva vivenciam um momento no qual, somada a análise de dada realidade, as dificuldades devem ser identificadas e posteriores soluções devem ser sugeridas, proporcionando possibilidades de superação das barreiras educacionais em um caminhar direcionado à efetivação do cenário inclusivo.

Por fim, o estudo se alicerça numa das técnicas principais de Freinet, a livre expressão por meio de desenhos, a qual valoriza o ato de desenhar como recurso de desenvolvimento da criatividade e dos comportamentos intelectual, afetivo e cultural. Dessa forma, o desenrolar da temática é entremeado por pinturas que ilustram os conhecimentos descritos ao longo do estudo. Para isso, foram trazidas obras de artistas já consagradas no cenário cultural, sendo estas uma representação dos desenhos livres, da livre expressão desses pintores.

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construção de todo esse trabalho estrutura-se como a criação de uma nova pintura a tornar-se tão relevante no cenário sociocultural quanto às demais - a de um detornar-senho livre composto pela almejada inclusão educacional.

Preparam-se as telas, separam-se as tintas e escolhem-se os pincéis, para que os quadros já construídos possam ser contemplados criticamente e as novas pinturas sejam possíveis.

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PREPARANDO AS TELAS - SISTEMAS EDUCACIONAIS

O ensino das instituições escolares tem inquestionável importância e espaço na sociedade contemporânea, sendo o centro das atenções políticas e também das exigências cidadãs.

Antes de se tornar esse grande pilar sociocultural, a educação escolar percorreu longo caminhar, surgindo com rígida seletividade em relação às pessoas que dela poderiam usufruir, até expandir-se e tornar-se uma exigência e direito mundial. Mesmo quando já estabelecida como fenômeno sociocultural indispensável, muitos grupos sociais continuaram negligenciados por este sistema de ensino, sendo necessário um longo trajeto de lutas para seu ingresso acadêmico, como no caso das pessoas com alguma condição deficiência.

Se ao pintar um quadro, o momento inicial exige um preparo das telas de forma que estejam suficientemente aprontadas para receber as novas cores e histórias a ali serem construídas, da mesma forma, ao desenvolver um tema, seu plano de fundo deve ser profundamente trabalhado para que cada nova informação e conhecimento sejam devidamente contextualizados e compreendidos.

Por conseguinte, contextualização da instituição escolar e do acesso das pessoas com deficiência a este ambiente torna-se necessária, de forma a ser compreendida a situação histórica e social do ambiente no qual se desenvolveu esta pesquisa. Essa conjuntura traz consequências diretas e considerações explicativas a respeito da realidade das instituições escolares em relação às pessoas com deficiência na presente sociedade, considerações estas a serem detalhadas a seguir, como as telas sobre as quais uma nova história se pinta.

Para isso faz-se necessário uma retomada desde momentos da antiguidade, ao invés de um recorte histórico mais delimitado, no sentido de ser visualizada a complexidade do atual processo inclusivo, contrastando os quase dezenove séculos de exclusão e rejeição aos quase dois últimos séculos de busca pela aceitação e inclusão social.

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2.1 Tela 1 - ensino escolar

A escola pode ser entendida como uma instituição que seleciona e usufrui de determinados conteúdos e conhecimentos de caráter social e histórico-cultural, objetivando não apenas transmiti-los, mas possibilitando possíveis transformações e recriações destes. Numa análise mais profunda, Faria (2004) ressalta que a atuação da escola não é isolada de fatores externos, recebendo influências políticas, científicas, religiosas, pedagógicas e econômicas e, ao mesmo tempo, também influenciando essas diversas dimensões.

Anteriormente à criação das escolas, o ensino era desenvolvido por meio da própria vivência e pela transmissão oral de pais para filhos, sendo apenas com os sofistas o surgimento dos primeiros relatos de uma atuação parecida a de um educador. Os sofistas atuaram no período Socrático como educadores pagos por membros da classe social dominante para ensinarem seus filhos algumas disciplinas específicas, como a matemática e a gramática, e também os conteúdos relacionados à atuação política e ao bom desenvolvimento da retórica, como a arte de falar e convencer com as palavras. Após este período, movimentos filosóficos despontaram com os ideais de Sócrates, Platão e Aristóteles, os quais deram início às reflexões pedagógicas e às discussões acerca de um processo educacional (NABÃO, 2011).

Observa-se que o processo educacional, desde esse período principiante no qual não era exclusivamente desenvolvido em instituições específicas como as escolas, se desenvolveu estreitamente vinculado à sociedade, sendo utilizado de acordo com as exigências e interesses desta, num contexto de segregação, a fim de controlar as possíveis transformações sociais favoráveis às classes subordinadas as quais a educação poderia possibilitar.

De forma a exemplificar o pensamento acima elaborado, algumas civilizações da antiguidade podem sem citadas. No Egito Antigo, considerado o berço de todas as civilizações por ter desenvolvido conhecimentos em áreas diversas, a educação objetivou explicitamente o desenvolvimento da sociedade, sendo restrita a poucos e com diferentes conteúdos, os quais eram definidos conforme a classe social. Em Esparta, uma Cidade-Estado permanentemente em guerras e buscas territoriais, a educação foi baseada num ideal

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denominado de “Kaloskagathia”, o qual se fundamentava na excelência física e moral, objetivando a formação de capacitados guerreiros; enquanto em Atenas, a Cidade-Estado impulsionadora do conceito inicial de democracia, a educação era baseada nos ideais de “paideia”, idealizando o desenvolvimento de cidadãos capazes de atuar na política, como ilustrado pela tela de Rafael Sanzio, na Figura 11 (MANACORDA, 2004; GILES, 2006).

Figura 1 – Rafael Sanzio. A Escola de Atenas. 1510-11. Fonte: www.raphaelsanzio.org.

Nos momentos seguintes, o desenvolvimento das sociedades foi desdobrando-se e adquirindo características e conceitos cada vez mais próximos dos predesdobrando-sentes na sua atual organização, perpetuando esta relação de interdependência entre a educação e a sociedade. Caminhando ao período da Idade Média, apenas os nobres tinham acesso à educação, sendo esta manipulada pela Igreja, instituição que, detendo poder sobre as demais, empenhou-se em manter sua posição de superioridade evitando possíveis questionamentos. Em período posterior, durante o Renascimento, a valorização e a procura pelo saber ganharam força, e a educação passou a ser vista em um grau de maior importância ao haver a conscientização da sua necessidade para o desenvolvimento de uma nova sociedade, a capitalista, porém os processos educativos ainda continuavam sendo diferenciados segundo os níveis das classes sociais. Com o Iluminismo, o qual exaltou

1 A tela de Rafael Sanzio ilustra a educação desenvolvida na cidade de Atenas, conforme discutido no

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como necessária a busca pelo conhecimento, e com a substituição da maioria das sociedades absolutistas – que detinham o controle de todo o poder – por instituições republicanas, a educação finalmente passou a ser pensada como possibilidade de tornar-se um direito de todos. No século XX, as organizações sociais democráticas consolidaram-se na maioria absoluta dos países, o que contribuiu para que o Estado passasse a atuar de modo a possibilitar a criação e difusão de um ensino público que facilitasse o acesso popular à educação (LUZURIAGA, 2001).

Nesse contexto, o evento do Iluminismo e a Revolução Industrial contribuíram com novas formas de pensar e de viver socialmente, culminando não apenas no acesso da população aos processos educacionais, mas também induzindo o surgimento de instituições especificas para a educação, como a escola. Visualiza-se uma transformação na estrutura educacional vinculada a uma reestruturação familiar e das sociedades.

Recorrendo a Ariés (1981), anteriormente ao século XVII não existia a formação de uma consciência das particularidades exigidas pelo período da infância, e nem mesmo interesse pelas crianças, sendo estas compreendidas apenas como indivíduos em fase de transição, de aguardo pela idade adulta. Sem consideração relevante nem sequer atenção especial a essa etapa da vida, não havia instituições escolares, sendo os conhecimentos transmitidos pelas famílias através da observação e auxílio que as crianças dispendiam aos adultos em suas tarefas diárias.

Com contribuição dos estímulos proporcionados pela citada Revolução Industrial, uma nova organização social estruturou-se, fase esta visualizada na pintura de Pieter Bruegel, na Figura 22.

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Neta tela, o período de transição da indiferenciação entre adultos e crianças e o início das particularidades infantis pode ser visualizado. Ao mesmo tempo no qual as crianças e os adultos são indiferenciados quanto aos trajes com crianças vestidas como “mini-adultos”, por outro lado grande diversidade de jogos e brincadeiras típicos do universo infantil são vivenciadas, dando início à construção de uma cultura típica do da infância como um período destinado ao brincar.

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Figura 2 - Pieter Bruegel. Jogos e Brinquedos Infantis. 1560. Fonte: www.pieter-bruegel-the-elder.org

Segundo o mesmo autor, entre os séculos XVI e XVII foram se desenvolvendo os sentimentos de “paparicação” – o qual, iniciado pelas mulheres, estimulou nas pessoas um encanto com a ingenuidade e a graça das crianças - e de “disciplinamento” – uma preocupação em disciplinar e induzir os valores morais -, colaborando com o surgimento das escolas, instituições que se tornaram responsáveis pela instrução e ensinamentos das crianças, separando-as do mundo adulto até que se completasse o período de educação destas. Pode ser notado, por conseguinte, um vínculo entre a origem das instituições escolares e a importância e atenção destinadas às crianças e aos adolescentes e as suas particularidades.

Continuamente, a escola se desenvolveu unida aos dispositivos disciplinares, uma vez que a educação deixou de ser responsabilidade apenas familiar e transferiu-se também para o poder central, o Estado. Neste caso, entende-se a disciplina como um conceito criado por Foucault no qual está baseado o funcionamento de instituições modernas, como a escolar. A disciplina é percebida, portanto, como uma forma de se exercer o poder sobre outros de maneira a auxiliá-los na conquista de um domínio sobre si próprio, possibilitando também a organização de multidões de indivíduos e o controle de

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grandes massas populacionais por uma instituição superior (KOHAN, 2003).

Adicionado a esses fatores, a Revolução Industrial consolidou o sistema capitalista, transformando essa nova faixa etária em mais um mercado consumidor específico, e alterou as antigas posições sociais estáticas, pré-determinadas e sem possibilidade de mudanças em classes sociais mutáveis onde a educação tornou-se uma ferramenta de auxílio para essa modificação, instigando o interesse num sistema educacional escolar.

Estabelecendo como foco o Brasil, neste período o país estava sendo colonizado pelos europeus, que se esforçavam não apenas para tomar posse do território, mas também em povoar a terra, converter religiosamente os habitantes locais e ainda organizar as formas de trabalho. Junto com os europeus vieram, nos anos de 1549, os jesuítas - missionários religiosos liderados por Padre Manoel de Nóbrega, incumbidos pelo Rei de Portugal, Dom João III, de organizar a socialização e a educação da população nativa. Para isso, Hilsdorf (2003) esclarece que os jesuítas atuaram em duas frentes - de um lado organizaram agrupamentos de indivíduos nativos com o ensino oral, e de outro inauguraram e expandiram, nos séculos XVII e XVIII, colégios educacionais para os meninos filhos dos europeus da classe dominante. Estes colégios eram oriundos de uma aliança baseada em interesses econômicos entre esses missionários e a Coroa Portuguesa.

Os estudiosos do tema, como o autor acima citado, concluem que os jesuítas foram os responsáveis pelo primeiro sistema educacional do Brasil. Porém, Aranha (2009) elucida que apesar do sistema educacional ter tido, finalmente, seu início, esse não foi um passo glorioso. Quando os missionários chegaram ao Brasil, a sociedade era agrária e elitista, e como o trabalho na agricultura não exigia qualificação, a educação era utilizada como forma de converter os índios ou para ocupar o tempo dos filhos dos colonos ricos, mantendo grande parte da população analfabeta.

Com a expulsão dos jesuítas do Brasil, em 1759, por Marquês de Pombal – Primeiro Ministro do então Rei de Portugal, Dom José I -, a Coroa Portuguesa passou a realizar diretamente a educação no território brasileiro, e a situação d a educação brasileira manteve-se na precariedade, com pouca qualidade, dificultando o acesso da população ao ensino, já que era ausente um planejamento educacional adequado. Com a posterior

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Proclamação da Independência do Brasil, por Dom Pedro I, e com a Constituição do Império, este declarou a instrução e a educação popular um direito ao organizar a primeira legislação referente ao cenário educacional brasileiro. Porém, sem definir os responsáveis por arcarem com o encargo de disponibilizar tal educação, esta tinha sua existência escassa e, quando da abertura de novas escolas estas dispunham de uma educação sem grande qualificação para a maior parte da população (SAVIANI, 2002).

Durante período compreendido pelo Império e a Primeira República (1822-1930), a educação brasileira foi desenvolvida em consonância com o contexto mundial, de acordo com os interesses das classes sociais dominantes. Enquanto que membros da alta sociedade deslocavam-se ao exterior para terem acesso a uma educação com alta qualidade, as classes baixas foram ingressando vagarosamente nas instituições escolares, as quais tiveram sua construção e disponibilização à população conforme necessário para que os interesses da elite fossem atendidos. Elucidando o fato, Jannuzzi (2006) cita como grande impulso contribuinte para o acesso à educação da classe baixa a necessidade de voto e de mão de obra destas pessoas, que eram essenciais para a classe dominante manter o sistema social, político e econômico vigente na época.

Com a difusão dessas instituições escolares, discussões sobre a criação de um sistema nacional de ensino passaram a permear o cenário político nacional. Conforme esclarecido por Saviani (2002), vários foram os fatores que contribuíram para a proliferação dessa ideia. Inicialmente, os próprios filhos da aristocracia ao irem ao exterior estudar voltaram trazendo para o Brasil os ideais democráticos que estavam em efervescência na Europa. Além disso, havia a necessidade de uma solução para os problemas sociais que dificultavam a implantação da modernização no país, adicionados ao questionamento das camadas média e baixa - que passaram a defender o acesso à educação - e a influência do liberalismo e do movimento da Escola Nova - que culminaram numa série de reformas no sistema educacional para democratizar o ensino brasileiro.

Contudo, apenas a partir da Segunda República, no período compreendido pela denominada Era Vargas (1930-1945), a educação adquiriu relevância nacional devido a sua necessidade para o alcance aos objetivos políticos do governo vigente, uma vez que o país mantinha-se com grande parte da população analfabeta e rural, como ilustrado pela Figura

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33, em contrapartida a uma crescente urbanização e intenção de modernização.

Figura 3 - Candido Portinari. O Lavrador de Café. 1939. Fonte: masp.art.br

Com esse cenário conflituoso entre a realidade e as intenções do país, o governo de Getúlio Vargas assumiu as rédeas da questão num marco no cenário educacional brasileiro. Com a Primeira Constituição de Vargas, a educação definitivamente passou a ser considerada como fator de desenvolvimento social e industrial para o país, instigando o estabelecimento da maioria das bases do sistema educacional brasileiro existente até os dias atuais. Dentre as medidas e propostas estabelecidas por este documento, Aranha (2009) ressalta que estavam o planejamento nacional para a educação, o ensino primário

3A tela de Candido Portinari retrata um trabalhador rural, ilustrando o período vivenciado no cenário

brasileiro no qual os trabalhadores da zona rural iniciaram um processo de migração em direção às áreas urbanas devido à intensa busca por trabalhadores pelas novas indústrias instaladas no país. Industrialização e urbanização estas instigadas pelo governo brasileiro em prol da construção de um país com desenvolvimento semelhante aos países desenvolvidos europeus.

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obrigatório e gratuito, a difusão de escolas públicas, a criação de fundos de auxílio para alunos necessitados, além do início da exigência de concurso para os cargos de magistério principiando uma atenção referente à qualificação dos profissionais da educação.

Seguindo os interesses políticos e socioeconômicos da época vigente, o sistema educacional brasileiro passou por 21 reformas desde o ano de 1759 – ano no qual os jesuítas foram expulsos e o governo português assumiu a atuação educacional no Brasil - até o ano de 1996 – quando foi promulgada a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional -, reformas estas que alteraram a finalidade e a estrutura da educação, as características do ensino, a divisão e a duração dos ciclos escolares (MARCILIO, 2005).

Desdobrando esses acontecimentos de forma a esclarecer as ações que influenciaram e ainda refletem-se no atual cenário da educação brasileira, posteriormente ao período do governo de Vargas, foi promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), pela Lei n° 4.024 de 1961. Esta foi uma lei consideravelmente importante por abarcar todos os níveis de ensino, decretando o ensino primário como obrigatório e gratuito, e os ensinos do ginásio, colegial e superior como facultativos. A segunda LDB foi publicada em 1971 pela Lei n° 5.692. Sem muitas mudanças em relação à anterior, sua principal característica foi a unificação do ensino primário com o ginásio transformando-os em um primeiro grau obrigatório e gratuito, com a intenção de atender a demanda social que clamava por maior escolarização (SILVA; FERNANDAES, 2011).

Já em 1996 foi instituída a terceira e última, até o momento, LDB pela Lei n° 9.394, de 20 de dezembro (BRASIL, 1996), norteando o sistema educacional atual. A legislação em questão regulamentou a educação brasileira – a qual passou a ter por objetivo o desenvolvimento pleno do aluno, incluindo a cidadania e a preparação para o mercado de trabalho - e distinguiu a educação da educação escolar. Dessa forma, a educação passou a compreender todos os processos que auxiliam na formação humana em uma sociedade como a família, o trabalho, os movimentos sociais, entre outros; e a educação escolar ficou delimitada à educação desenvolvida especificamente em instituições especiais para esse fim – as escolas -, com os objetivos acima mencionados. Acrescentadas a essas definições, a lei acima anda:

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quais passaram a ser constituídos pelo ensino básico (com a inclusão do ensino infantil abarcando as crianças de 0 a 5 anos), o ensino fundamental e o ensino médio;

 Iniciou propostas de educação escolar baseada em tempo integral de permanência do aluno na escola;

 Predisse a necessidade de haver um atendimento especializado e gratuito para os alunos com necessidades especiais preferencialmente nas escolas regulares;

 Proporcionou autonomia para que as próprias escolas estabelecessem algumas de suas organizações e padrões de funcionamento, como a criação de seu próprio projeto político pedagógico, com o governo determinando apenas um conteúdo básico e mínimo como obrigatório;  Propôs uma ampliação do conceito de educação a qual passou a ser

entendida além do ensino escolar, incorporando também as relações nos diversos ambientes sociais.

Acarretando elogios e críticas por diferentes segmentos da sociedade, aproximando essas definições da realidade atual, são notórias as contribuições trazidas por esta Lei, contudo ainda é nítida a falta de desenvolvimento da proposta na realidade da sociedade brasileira, o que pode ser comprovado quando analisado o fato de que, apesar da Lei relacionar a educação a outros setores de convivência social, na maioria das vezes as escolas não realizam essa aproximação do conteúdo escolar com as questões e vivências da cidadania e das realidades sociais, restringindo-se a cumprir e seguir os conteúdos teóricos dos materiais didáticos.

Relevante também é mencionar a questão trazida pela Lei sobre a educação especial, pois apesar de ter o intuito de contribuição para a inclusão escolar, deve-se esclarecer que apenas devido ao fato do aluno com alguma necessidade especial frequentar o ambiente da escola regular não denota a inclusão deste de fato, já que não há a garantia de estrutura e de funcionamento adequados, de conscientização e respeito dos demais alunos e funcionários sobre a pessoa em condição de deficiência, muito menos de uma boa qualidade de ensino.

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Outras determinações desta Lei como valorização do professor e garantia de um padrão de qualidade no ensino ainda estão muito distantes da realidade sem medidas práticas destinadas à questão. Nota-se, por conseguinte, a ausência de ações efetivas para que cada item estipulado se consolide, porém a importância desses temas educacionais serem legalmente estabelecidos não deve ser negligenciada, sendo um passo relevante para o futuro desenvolvimento de projetos no cenário educacional.

Outro documento importante a ser trazido a essa discussão foi o proclamado pela Lei n° 10.172, decretada em 09 de janeiro de 2001, a qual instituiu o primeiro Plano Nacional da Educação (BRASIL, 2001b), orientando o cenário educacional brasileiro. Com validade para 10 anos, esse plano teve por objetivos a elevação do nível de escolarização da população, maior qualidade do ensino, a acessibilidade e a permanência do aluno na escola, e a redução das desigualdades quanto à escolarização. Neste documento, o governo federal definiu como obrigatório o acesso e permanência de todas as crianças entre 07 a 14 anos no ensino fundamental. Além disso, garantiu o acesso ao ensino fundamental às pessoas que não o tiveram na idade estipulada, por meio da educação de jovens e adultos (EJA), objetivou a ampliação do atendimento dos indivíduos no ensino infantil, médio e na educação superior, além de valorização dos professores.

Esse Plano foi estruturado, inicialmente, por profissionais da área da educação e estudantes, além de integrantes da sociedade que, com a conquista de atenção política exigiram a definição de uma Lei Nacional para a educação, pressionando, para isso, o governo do período vigente, presidido por Fernando Henrique Cardoso. A exigência foi acatada pelo governo, todavia, inúmeras mudanças foram sofridas nesta proposta inicial ao transformar-se no Plano Nacional de Educação aprovado. Uma das maiores críticas, segundo Valente e Romano (2002), está relacionada ao fato do Plano aprovado não estabelecer medidas e ações práticas a serem tomadas para desenvolver e aplicar cada item declarado, tornando-se um documento puramente teórico sem efetivação prática, conforme ocorreu também com a LDB publicada em 1996.

Já em momento seguinte, no ano de 2006, o governo brasileiro instituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), por meio da Emenda Constitucional 53. Este órgão foi incumbido da responsabilidade de organizar a

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distribuição de recursos financeiros para os diferentes segmentos educacionais, os quais foram renomeados como ensino infantil, fundamental, médio, educação de jovens e adultos e também educação especial. Além disso, neste mesmo ano foi criada a Lei n° 11.274, alterando a duração do ensino fundamental obrigatório de 8 para 9 anos ao incorporar as crianças com 06 anos de idade já completos, as quais anteriormente frequentavam nesse período a denominada pré-escola (BRASIL, 2009).

Dessa forma, se antes a infância era compreendida somente como um momento de transição e aguardo pela idade adulta, na sociedade contemporânea esses ideais foram integralmente transformados com o período infanto-juvenil amplamente considerado em suas particularidades por um sistema educacional intencionado de uma prática pedagógica adequada a esse período de desenvolvimento humano, conforme ilustração da Figura 4.4

Figura 4 – Lord Frederick Leighton. Estudo; na mesa de leitura. 1877. Fonte: www.frederic-leighton.org

Em contrapartida, por ser um país em desenvolvimento, lutando para combater profundas desigualdades entre sua população, percebe-se nitidamente a diferença ao acesso

4Na tela de Lord F. Leighton pode ser visualizado uma criança estudando representando o início da

construção de um sistema educacional destinado ao período da infância e juventude, em substituição aos séculos anteriores nos quais as crianças não possuíam local destinado à escolarização.

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e à qualidade de ensino escolar nas diferentes camadas sociais.

Especificamente sobre a questão do acesso e qualidade do ensino – que constituem a base de todo o sistema educacional -, elaboração de ações objetivando que todas as crianças e adolescentes obtenham de fato o acesso à escolarização ainda são corriqueiras e necessárias, considerando que apesar de leis regulamentarem e tornarem obrigatória e direito do cidadão a escolarização, uma parcela considerável da população, principalmente aqueles que residem em afastados lugares e com baixas condições econômicas, encontra-se marginalizada e excluída, sem acesso ao sistema educacional.

Ressalta-se, adicionado a esse tema da acessibilidade, a questão da qualidade da educação brasileira oferecida gratuitamente. Enquanto as classes mais baixas da população usufruem do ensino escolar público e gratuito, o qual nesse início do século XXI tem sido considerado, em sua maior parte, de baixa qualidade, as classes mais altas desfrutam de outro cenário e contexto em instituições educacionais particulares. Essa diferença na qualidade de ensino oferecida por essas instituições acarretam consequências em diversas áreas, como no acesso dos cidadãos ao ensino superior e, por consequência, na sua posição no mercado de trabalho, desencadeando distorções sociais, econômicas e políticas que acentuam e propagam as diferenças já existentes.

Repensada continuamente, não apenas pela política, mas também por educadores, hoje a escola é entendida como um local que proporciona diversos conhecimentos culturais específicos, disseminando e democratizando-os através do planejamento de seus conteúdos e métodos de ensino (VELOZO, 2004). Não sendo apenas transmissora de saberes, a escola tornou-se uma instituição com regras próprias, tendo a oportunidade de proporcionar a seus alunos a socialização, o aprendizado e ao mesmo tempo o questionamento dos diversos valores e conhecimentos, de forma a desenvolver a criticidade dos alunos em relação à sociedade estabelecida. Por conseguinte, tornando-se uma instituição que permite a vivência, a produção, a transformação e a reinvenção de conteúdos culturais, a presença de uma escola pública com qualidade torna-se indispensável para que o país se desenvolva de forma democraticamente justa para todos os cidadãos (GUIMARÃES et al., 2001; VAGO, 2009).

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seu processo educativo tem influência e importância incomensuráveis para o desenvolvimento mundial, proporcionando aos indivíduos não apenas a reprodução de determinados conteúdos e ideologias, mas também o próprio questionamento dessas ordens estabelecidas.

Certamente que a história do sistema educacional brasileiro é complexa, com inúmeros problemas e dificuldades em sua estrutura e funcionamento, que vão além do que foi por nós sintetizado até este momento. Contudo, estas são considerações que não podem deixar de serem citadas, mesmo que de forma sintetizada, para que um olhar crítico e contextualizado de qualquer tema relacionado à educação atual seja possível.

2.2 Tela 2 - escolarização e a pessoa com deficiência

O caminho transcorrido para a consolidação da instituição escolar na sociedade foi esboçado anteriormente, possibilitando neste momento uma discussão sobre a participação da pessoa com deficiência neste cenário inundado por questões socioeconômicas e políticas.

Primeiramente relegada às condições desumanas, a pessoa com deficiência passou por longa batalha para ser aceita e considerada como ser humano e cidadão, paralelamente ao desenvolvimento das escolas. Apenas nos últimos dois séculos as relações com essas instituições passaram a ser estabelecidas. Nos parágrafos abaixo, é desenvolvida uma narrativa a cerca da luta dessas pessoas para participarem da sociedade e sua inclusão nas instituições escolares.

2.2.1 A pessoa com deficiência

Nada mais explicativo do que se atentar para as denominações atribuídas às pessoas para se compreender a consideração a estas destinada. Em relação às pessoas com deficiência, foram várias as nomenclaturas impostas durante o decorrer histórico, influenciadas pelos valores e significados atribuídos a elas nos diferentes momentos socioculturais vigentes.

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Num panorama cronológico dessa situação, pode-se compreender a condição de marginalização e exclusão que essa população sofreu ao longo dos anos por uma sociedade desumana e individualista por meio das denominações a ela atribuída.

Conforme exposto por Bianchetti (1995), nas sociedades primitivas os indivíduos eram nômades, ou seja, eles se deslocavam pelo mundo em busca de condições ambientais propícias a uma vida adequada aos seus interesses de sobrevivência, o que fazia da pessoa com deficiência um empecilho para esses contínuos deslocamentos, sendo comumente abandonadas. A partir do momento no qual as pessoas passaram a se organizar em sociedades e fixaram-se em determinados territórios, também foram sendo estipulados e impostos diferentes ideais e paradigmas. Estabeleceu-se em Esparta, em início marcante dessa nova etapa de constituição social, o culto a uma forma corpórea ideal induzindo à condenação de morte os bebês que nascessem com qualquer alteração a esse modelo corporal pré-estabelecido - como uma deficiência. Já em Atenas, as pessoas com deficiência deixaram de ser mortas, porém, influenciados por um moralismo místico, suas deficiências passaram a ser consideradas como consequências de pecados cometidos em vidas anteriores, sendo continuamente rejeitadas e excluídas. Esse moralismo se fortaleceu na Idade Média, com a crença de que a presença de uma deficiência estaria associada a maus espíritos e feitiços. No final desse período, houve a imposição de uma nova teoria cristã defensora da presença de uma deficiência num individuo como uma possibilidade oferecida por Deus para que as demais pessoas ao redor deste fossem caridosas e se salvassem de seus pecados.

Essa concepção do dever em auxiliar pessoas que tivessem em condição de alguma deficiência, visando à salvação eterna, culminou na inauguração das primeiras Santas Casas de Misericórdias - casas destinadas ao recebimento e manutenção da sobrevivência destas (JANNUZZI, 2006). Esse grupo de pessoas deixou de ser condenado à morte, porém passou a ser isolado e excluso do convívio social dentro destas instituições, mostrando, por um lado, a conquista da garantia de sobrevivência, e por outro, ampla rejeição a sua convivência.

Retomando Bianchetti (1995), caminhando ao século XVI a sociedade passou por profundas transformações – definiram-se novas divisões de classes sociais, as grandes

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navegações e as conquistas territoriais expandiram-se, e um sistema econômico capitalista foi incorporado à maior parte do mundo –, as quais induziram a um juízo da pessoa com deficiência como uma pessoa “infuncional”, ou seja, sem função dentro desta nova sociedade que se organizava.

Restrito aos interesses referentes a uma funcionalidade ao sistema de trabalho e à sociedade capitalista existiu, conforme afirmação de Zavareze (2009), uma seguinte denominação de “inválidas” em substituição ao termo anterior, que prosseguiu até o século XIX, enfatizando o entendimento de serem, estas pessoas, sem função significativa nem valorosa, apenas um fardo para a família e a sociedade. Prosseguindo ao começo do século XX, ainda com resquícios do século anterior, o novo termo difundido foi “incapazes”, enfatizando explicitamente a compreensão de que não poderiam trazer contribuições sociais, principalmente do ponto de vista da aptidão física e intelectual, necessárias para o mercado de trabalho.

Já nas décadas de 60 e 80, devido à propagação de movimentos sociais em defesa dessas pessoas, outros termos foram propostos como: “defeituosos”, “deficientes” e “excepcionais”, já baseados numa inicial preocupação com a conotação trazida pelas nomenclaturas, porém carregando ainda vestígios das anteriores características pejorativas que focalizavam a deficiência em detrimento de uma consideração da pessoa como ser humano.

Como fruto desses movimentos sociais, o ano de 1981 foi declarado “Ano Internacional da Pessoa Portadora de Deficiência” pela Organização das Nações Unidas, com o objetivo de convocar os países para que promovessem ações referentes ao tema, desdobrando-se numa série de ações políticas e sociais destinadas à defesa e à valorização dessas pessoas. Neste momento, novos termos apareceram visando uma forma mais respeitosa, como “pessoa deficiente”, “pessoa portadora de deficiência” e “pessoas especiais” (SASSAKI, 2003).

As transformações nas denominações podem ser vistas como reflexo do surgimento de uma nova forma de compreensão acerca dessa população, com mais respeito e aceitação, com início de uma conscientização de que todos possuimos capacidades e dificuldades, e podemos, em algum momento da vida, adquirirmos uma condição de

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deficiência, conforme retratado por Pieter Bruegel na Figura 5.5

Com progressiva atenção dispendida à questão, cada vez mais considerações foram sendo definidas. O termo “portador”, por exemplo, passou a ser considerado inadequado por não se referir às condições reais da pessoa que possui uma deficiência, uma vez que “portar”, segundo definições da língua portuguesa, refere-se a uma atitude opcional, como quando se porta um objeto qualquer, podendo deixá-lo quando desejar, o que não é a realidade da pessoa que possui uma deficiência.

Figura 5 – Pieter Bruegel. Os Aleijados. 1568b. Fonte: http://www.abcgallery.com

Com contínuas e efervescentes discussões a respeito, estabeleceu-se, na década de 90, o termo “pessoa com deficiência” e “pessoa em condição de deficiência”, considerados como os mais adequados atualmente. Estes termos idealizaram a consideração em primeiro momento da pessoa como ser humano, e apenas posteriormente de sua

5 Na tela de Pieter Bruegel cada pessoa com deficiência representa uma classe social distinta, as quais são

analisadas pelas toucas, sendo um rei, um bispo, um soldado, um burguês e um camponês, proporcionando uma reflexão de que todos podem adquirir uma condição de deficiência, independente da classe social a que pertence.

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característica de possuir uma dada condição específica, não com o objetivo de minimizar ou esconder tal característica, mas intencionando tratá-la de forma respeitosa e ao mesmo tempo dispor dos cuidados necessários exigidos pela condição em questão (SILVA; SEABRA JUNIOR; ARAÚJO, 2008).

Pesquisadores e documentos legais, em seguida, detalharam e esclareceram sobre essas novas nomenclaturas. A palavra deficiência consolidou-se, segundo Sassaki (2005), como uma condição resultante de algum impedimento para a pessoa que a possui, sendo esta submetida a uma desvantagem em relação a determinados fatores em comparação com as pessoas que não possuem essa condição.

Completando, a “Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência” (BRASIL, 2007) - em definição aceita e reforçada no Brasil pelo “Plano Nacional dos Direitos da Pessoa Com Deficiência”, instituído pelo Decreto n° 7.612, de 17 de novembro de 2011 - definiu a pessoa com deficiência como a pessoa que possui algum impedimento (físico, mental, intelectual ou sensorial) em longo prazo, que possa dificultar sua participação social quando em contato com alguma barreira, influenciando de forma dificultosa uma vida social com igualdade de oportunidade entre ela e as outras pessoas sem deficiência.

Devido à importância do ano de 1981 e seus posteriores documentos e ações elaborados que contribuíram para essa nova forma de compreensão a respeito da pessoa em condição de deficiência, a menção de alguns deles torna-se relevante para que o cenário e o caminhar dessa questão seja elucidado.

Abrindo caminho para a posterior ênfase alcançada no ano de 1981, a Organização das Nações Unidas proclamou a “Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes”, em 09 de dezembro de 1975 (BRASIL, 1975). Este documento declamou sobre a necessidade de prevenção de alguns tipos de deficiência, de apoio e atendimento às pessoas com essa condição, ressaltando os mesmos direitos destas a uma vida com qualidade tal qual os outros cidadãos, com atendimento médico assegurado e direito de segurança social, econômica, à vida em sociedade e proteção contra qualquer forma de discriminação e exploração. A pessoa com deficiência foi adquirindo respeito as suas

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características e espaço para sua atuação social, numa nova era de aceitação (FIGURA 6).6

Figura 6 – Robert Henri. Cantora Espanhola Cega.1912. Fonte: www.henrirobert.org

Posteriormente, foi publicada a “Declaração Mundial Sobre Educação para Todos”, em 1990, intencionando sensibilização governamental a respeito da educação como um direito de todas as pessoas, incluindo, neste momento, também as pessoas com deficiência (BRASIL, 1990a).

Ainda no âmbito educacional, uma terceira publicação influenciou suas estruturas e seu futuro mundial, a “Declaração de Salamanca”, estabelecida em 1994, em Salamanca, na Espanha (BRASIL, 1994). Este documento foi elaborado durante a

6A pintura de Robert Henri retrata uma nova era de aceitação e de vida em sociedade das pessoas com

deficiência, as quais passam a ter direitos civis e também a vivenciarem diferentes atividades socioculturais, como a música, não apenas como ouvinte, mas também atuando, como ao tocar um instrumento musical. A atuação na música representa todos os demais papéis sociais que essas pessoas possam a vir a ter.

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