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A infidelidade virtual e o dano moral nos relacionamentos pós-modernos

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GRANDE DO SUL

ANDRESSA TAMIOZZO

A INFIDELIDADE VIRTUAL E O DANO MORAL NOS RELACIONAMENTOS PÓS-MODERNOS

Três Passos (RS) 2014

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ANDRESSA TAMIOZZO

A INFIDELIDADE VIRTUAL E O DANO MORAL NOS RELACIONAMENTOS PÓS-MODERNOS

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Lisiane Beatriz Wickert

Três Passos (RS) 2014

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Dedico este trabalho às minhas queridas irmãs, que me apoiaram durante todo o

curso; à minha orientadora, pela

disponibilidade e assistência; ao meu namorado e colega, pelo amor e paciência que teve comigo durante o curso de Direito, bem como na elaboração deste trabalho; ao meu pai, responsável pela minha formação moral, por toda sua dedicação e esforço, enquanto em vida, para que eu e minhas irmãs pudéssemos estudar e também pelo incentivo dado a mim para que eu aproveitasse ao máximo o curso, estudando cada vez mais; e, enfim, principalmente à minha amada mãe, que muitas vezes abriu mão de seu lazer para que eu estivesse onde estou, e especialmente pela confiança que sempre depositou em mim, me presenteando com um apoio puro, sem cobranças, durante toda a minha jornada.

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“[...] e prometo-lhe ser fiel, amar-te e respeitar-te, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, por todos os dias de minha vida, até que a morte nos separe.” (Juramento tradicional da cerimônia de

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A infidelidade virtual é um tema polêmico, em que a vítima, muitas vezes, não sabe como (re) agir. Esse assunto é tratado neste trabalho, o qual analisa a viabilidade da aplicação do instituto do dano moral aos casos de infidelidade virtual. Para isso, faz uma análise dos relacionamentos virtuais, comparando-os aos reais, apontando as principais diferenças e características de ambas as modalidades. Aborda também os deveres legais de fidelidade e de lealdade, inerentes, respectivamente, ao casamento e a união estável. Examina o dano moral, o inserindo na responsabilidade civil, trazendo seus precedentes históricos, passando pela prova e quantificação do dano moral, chegando na reparação do referido dano. Além disso, estuda ainda a infidelidade virtual e o dano moral de forma conjunta, sob a égide do princípio da dignidade da pessoa humana, passando pela produção de prova para a caracterização da infidelidade virtual, a mensuração do dano sofrido, chegando, por fim a análise da satisfação experimentada pelo adimplemento do dano sofrido a partir do recebimento da compensação do dano moral.

Palavras-Chave: Infidelidade virtual. Dever legal de fidelidade. Dano moral. Caso concreto.

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The virtual infidelity is a controversial topic, in which the victim often does not know how to (re) act. This matter is addressed in this paper, which examines the feasibility of applying the Institute of moral damages in cases of virtual infidelity. For this, an analysis of virtual relationships, comparing them to actual, pointing out the main differences and characteristics of both modalities. Also addresses the legal duties of fidelity and loyalty, inherent, respectively, to marriage and stable relationships. Examines moral damages, the entering into civil responsibility, bringing its historical precedents, through trial and quantification of moral damages, arriving in repairing that harm. In addition, further studies virtual infidelity and moral damages jointly under the auspices of the principle of human dignity, through the presentation of evidence for the characterization of virtual infidelity, measuring the damage suffered, coming finally to analysis of satisfaction experienced by the due performance of the damage suffered from the receipt of compensation for moral damage.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

1 RELACIONAMENTOS REAIS E VIRTUAIS ... 9

1.1 Relacionamentos reais ... 9

1.2 O casamento e o dever de fidelidade ... 11

1.3 A união estável e o dever de lealdade ... 14

1.4 Relacionamentos virtuais ... 18

1.5 Internet ... 20

1.6 Infidelidade virtual ... 22

2 DANO MORAL ... 26

2.1 Responsabilidade civil ... 27

2.2 Conceito e precedentes históricos do dano moral ... 29

2.3 A prova do dano moral ... 32

2.4 A quantificação da indenização do dano moral ... 34

2.5 A reparação do dano moral ... 36

3 A INFIDELIDADE VIRTUAL E O DANO MORAL ... 39

3.1 Princípio da dignidade da pessoa humana ... 40

3.2 A produção de prova para a caracterização da infidelidade virtual ... 42

3.3 Fixação de indenização por dano moral nos casos de infidelidade virtual 45 3.4 O dano moral como forma de satisfação da infidelidade virtual ... 46

CONCLUSÃO ... 53

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INTRODUÇÃO

A fidelidade é um dever vigente no nosso ordenamento jurídico. Porém, sem haver nenhum remédio jurídico específico para o descumprimento de tal, a cada dia que passa cresce mais o número de casais rompendo o laço por uma nova modalidade de infidelidade: a virtual.

A exposição excessiva das pessoas comprometidas, somada a facilidade ao acesso dos meios virtuais, forma um ambiente propício para as relações extraconjugais, criando-se assim um clima de permissividade que encoraja as pessoas a se envolverem virtualmente, o que causa profunda dor e constrangimento ao parceiro traído.

O presente trabalho apresenta um estudo acerca da infidelidade em sua modalidade virtual, vislumbrando como forma de reparação do dano a possibilidade da aplicação do instituto do dano moral. Para a realização deste trabalho foram efetuadas pesquisas bibliográficas em materiais disponíveis em meios físicos e por meio de materiais eletrônicos, todos capazes e suficientes para a construção de uma pesquisa coerente sobre o tema em estudo, atingindo os objetivos propostos na pesquisa.

Inicialmente, o primeiro capítulo trata de uma abordagem acerca dos relacionamentos virtuais, comparando-os aos reais, passando pelo dever legal de fidelidade e lealdade, expressos em nosso ordenamento jurídico. Em seguida, realizou-se um breve estudo sobre a Internet, até chegar ao tema da infidelidade

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virtual, como nova modalidade de infidelidade existente nos relacionamentos pós-modernos.

No segundo capítulo foi analisado o dano moral, onde iniciou-se com a exposição de sua história, logo após, passou-se a análise dos meios de prova, pela quantificação e, enfim, às formas de reparação, para que quando do terceiro capítulo, reste claro o conhecimento deste respeitável instituto.

Por fim, no terceiro e último capítulo, foi feita uma análise mais aprofundada e em conjunto, com a infidelidade virtual e o dano moral sob a ótica da dignidade da pessoa humana, avaliando a possibilidade da aplicação do instituto do dano moral ao caso concreto, como forma de reparação do dano suportado.

A importância deste estudo reside na possibilidade do instituto do dano moral vir a ser aplicável aos casos de infidelidade em sua modalidade virtual, devido à ausência de mecanismos próprios para o descumprimento do dever legal de fidelidade e da grande globalização virtual a qual é vivenciada, sendo que, não fosse o instituto mencionado, restariam os danos morais sofridos pelas vítimas da transgressão do dever legal de fidelidade, irreparáveis.

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1 RELACIONAMENTOS REAIS E VIRTUAIS

Todo o ser humano já nasce com a capacidade de amar. A maioria das pessoas querem encontrar o par perfeito, manter um relacionamento, formar família, ser feliz em conjunto. A própria Constituição Federal diz que “a família é a base da sociedade”. Ao longo dos anos, dos relacionamentos reais foram derivando outros tipos de relacionamentos, como o relacionamento virtual, que, com o grande avanço tecnológico, vem ganhando maior espaço em nosso meio.

Os relacionamentos reais representam a forma originária dos relacionamentos amorosos. No mundo real é clara a necessidade do contato físico para que um relacionamento se inicie. Para isso, é indispensável que ocorram algumas fases, tais como: olhares, sinais, risos, conversas, boa aparência, etc. Além disso, para um maior envolvimento, é necessário tempo para que as pessoas se conheçam mais profundamente.

Por outro lado, nos relacionamentos virtuais, o contato físico, bem como as fases antecedentes ao início de um relacionamento amoroso, inexiste. Nesse tipo de relacionamento, as pessoas podem até mesmo manterem-se no anonimato, se preferirem, ou então forjar uma falsa identidade, podendo se conhecer, virtualmente, ainda que de forma errônea, em alguns minutos.

Feitas essas primeiras considerações, esclarece-se que o presente capítulo tem por objetivo analisar os relacionamentos reais em suas principais espécies, os relacionamentos virtuais e a infidelidade virtual, a fim de possibilitar a posterior averiguação de uma forma de reparação aos danos suportados por esta, objeto deste estudo.

1.1 Relacionamentos reais

Um relacionamento real oportuniza a análise das características da outra pessoa relacionada, segundo suas atitudes. Em cada gesto, expressão, comportamento, é exposta sua personalidade, sendo esta analisada pela íntima convicção de quem com ela se relaciona. Dentre os relacionamentos amorosos

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reais, os principais são o namoro, o noivado, a união estável e o casamento. É importante observar que, no entendimento do doutrinador Sílvio de Salvo Venosa (2012, p. 2), “o casamento ainda é o centro gravitador do direito de família, embora as uniões sem casamento tenham recebido parcela importante dos julgados nos tribunais, nas últimas décadas, o que se refletiu decididamente na legislação.”

No namoro, apesar da obrigatoriedade moral, não há a obrigatoriedade jurídica de fidelidade, lealdade, mútua assistência... Enfim, não existem obrigações jurídicas concernentes a esse tipo de relacionamento, sendo irrelevantes para o direito, suas especificidades. Assim, conforme Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pampolha Filho (2012, p. 135):

Mais sério do que o simples encontro casual, o namoro não se notabiliza

simplesmente pelo envolvimento sexual, mas também pelo

comprometimento afetivo. Tal aspecto, no entanto, não serve para conferir-lhe roupagem jurídica familiar, dada a sua tessitura instável, mais pertinente à moral do que propriamente ao Direito.

Quanto ao noivado, este não possui em sua essência maiores formalidades. O que não significa que não gere consequências jurídicas. Conhecido na doutrina como esponsais, o noivado deve ser visto não só sob o aspecto jurídico, como também sob o aspecto moral e ético. “Denominamos esponsais o compromisso matrimonial contraído por um homem ou uma mulher, geralmente entendido como noivado. Trata-se na realidade de promessa de contratar.” (VENOSA, 2012, p. 30).

Para os autores Gagliano e Pampolha Filho (2012, p. 136, grifo dos autores), o noivado vai além de um simples namoro e constitui maior grau de responsabilidade, pois “[...] traduz maior seriedade no vínculo afetivo, uma vez que por meio dele, homem e mulher firmam a promessa recíproca de unirem-se por meio

do casamento, formando uma comunhão familiar de vida.” Nessa mesma linha de

conceitos desenvolvidos pela doutrina, tem-se que:

Logo, os esponsais consistem num compromisso de casamento entre duas pessoas desimpedidas, de sexo diferente, com o escopo de possibilitar que se conheçam melhor, que aquilatem suas afinidades e gostos. (CHAVES apud DINIZ, 2005, p. 47).

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Portanto, apesar da importância do noivado para a constituição do matrimônio, basta aqui apenas deixar claro o seu conceito e sua relevância jurídica como uma espécie de relacionamento real. Dessa forma, segundo Tereza Rodrigues Vieira e Rafaela Lanutte Ferreira (2009, p. 18):

Os nubentes não estão obrigados ao matrimônio. O rompimento ou não da relação faz parte da liberdade matrimonial, não se configurando, em si mesmo, uma falta. No entanto, dependendo das circunstâncias, a ruptura do noivado poderá gerar sérios prejuízos e consequente indenização, considerando-se o compromisso público um pré-contrato.

No que tange a união estável e ao casamento, cabe aqui introduzir apenas a ideia de que “a unidade familiar, sob o prisma social e jurídico, não mais tem como baluarte exclusivo o matrimônio. A nova família estrutura-se independentemente das núpcias”, (VENOSA, 2012, p. 6) sendo que seus conceitos, bem como os institutos, serão analisados no próximo ponto desta pesquisa.

1.2 O casamento e o dever de fidelidade

O casamento é conhecido por ser a principal forma de constituição de família, sendo utilizado desde os primórdios da humanidade. Por ser assim, está elencado no ordenamento jurídico brasileiro no art. 226 da Constituição Federal. O casamento ou matrimônio, como também é chamado, envolve não apenas o liame jurídico como também aspectos religiosos e morais. Para Maria Helena Diniz (2005, p. 39), “é o casamento a mais importante e poderosa de todas as instituições de direito privado, por ser uma das bases da família, que é a pedra angular da sociedade.”

Desse modo, visto por grande parte da doutrina como um contrato, o casamento, mais do que isso, é a exteriorização de um relacionamento amoroso. É o início da formação de uma nova família. É a coabitação dos cônjuges. Segundo Sílvio de Salvo Venosa (2012, p. 25),

O casamento é o centro do direito de família. Dele irradiam suas normas fundamentais. Sua importância, como negócio jurídico formal, vai desde as formalidades que antecedem sua celebração, passando pelo ato material de conclusão até os efeitos do negócio que deságuam nas relações entre os cônjuges, os deveres recíprocos, a criação e assistência material e espiritual recíproca e da prole etc.

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Por ser uma tradição histórica, são várias as definições de casamento na doutrina brasileira. José Lamartine Côrrea de Oliveira (apud GONÇALVES, 2012, p. 40) considera o casamento

o negócio jurídico de Direito de Família por meio do qual um homem e uma mulher se vinculam através de uma relação jurídica típica, que é a relação matrimonial. Esta é uma relação personalíssima e permanente, que traduz ampla e duradoura comunhão de vida.

O casamento foi se aperfeiçoando ao longo dos anos, sendo que, antigamente existia tão somente o casamento religioso, mais precisamente, o católico, por ser esta a religião oficial do Estado. Com o passar do tempo foram surgindo novas religiões, modificando este quadro. Somente mais tarde, no período republicano é que veio a figura do casamento civil, consagrando-se assim o costume do casamento ocorrer tanto no civil quanto no religioso. Portanto hoje, para Gagliano e Pampolha Filho (2012, p. 112), o casamento deriva de um sistema organizado socialmente, com regras formais, de fundo espiritual ou laico. Assim,

Para o Direito Canônico, o casamento é um sacramento e também um contrato natural, decorrente da natureza humana. Os direitos e deveres que dele derivam estão fixados na natureza e não podem ser alterados nem pelas partes nem pela autoridade, sendo perpétuo e indissolúvel. (VENOSA, 2012, p. 25).

Um casamento além de ser uma verdadeira comunhão, construído com amor, carinho e companheirismo, deve, principalmente ser vivenciado pelo respeito. Dessa forma, além de existirem direitos inerentes a este tipo de relacionamento, também existem deveres. Deveres estes tão importantes que foram mantidos pelo código civil de 2002, no seu artigo 1.566, I a IV, quais sejam: fidelidade recíproca, vida em comum no domicílio conjugal, assistência, respeito e consideração mútuos.

Neste diapasão, “o dever moral e jurídico de fidelidade mútua decorre do caráter monogâmico do casamento e dos interesses superiores da sociedade, pois constitui um dos alicerces da vida conjugal e da família matrimonial.” (DINIZ, 2005, p. 130, grifo da autora). Portanto, não mais importante do que os outros deveres elencados no parágrafo acima, o dever legal de fidelidade merece ser alvo deste estudo, para que se chegue ao fim desejado.

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Na mesma linha de raciocínio, Sílvio de Salvo Venosa (2012, p. 147 e 149) traz o caráter monogâmico como corolário da fidelidade recíproca. Para o autor, a norma tem caráter social, estrutural, moral e normativo, sendo que a transgressão dos deveres conjugais pode gerar danos indenizáveis ao cônjuge inocente. No entender de José Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz (2003, p. 292),

Tendo perdido relevância a distinção entre adultério e injúria grave, constituem infração do dever de fidelidade tanto o adultério (no sentido estrito de relações sexuais com terceiro) como toda uma gama de comportamentos que, por seu caráter licencioso ou leviano, significam também quebra da fé conjugal.

O dever de fidelidade, em verdade, foi instituído com o objetivo de preservar a família. Da mesma forma, Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 190), também vê este dever como decorrente do caráter monogâmico do casamento. Para ele,

A infração a esse dever, imposto a ambos os cônjuges, configura o adultério, indicando a falência da moral familiar, além de agravar a honra do outro cônjuge. Se extrapolar a normalidade genérica, pode ensejar indenização por dano moral. O dever em apreço inspira-se na ideia da comunhão plena de vida entre os cônjuges, que resume todo o conteúdo da relação patrimonial. Impõe a exclusividade das prestações sexuais, devendo cada consorte abster-se de praticá-las com terceiro.

Diante das palavras referidas, é possível extrair o valor moral existente neste dever de fidelidade, valor este imprescindível para a existência de um relacionamento satisfatório para ambas as partes. Neste sentido, o artigo 1.565 do Código Civil Brasileiro dispõe: “Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família”. Para os autores Gagliano e Pampolha Filho (2012, p. 291), “a violação deste dever poderá, independentemente da dissolução da sociedade conjugal ou da relação de companheirismo, gerar consequências jurídicas, inclusive indenizatórias.”

Portanto, ao iniciar um relacionamento, deve-se estar preparado para, acima de tudo, respeitar a pessoa escolhida. Apesar de não existir mais em nosso ordenamento jurídico o crime de adultério, o dever de fidelidade continua vigente em nosso meio. É importante mencionar que existem algumas divergências doutrinárias quanto à mantença deste dever, não pela sua falta de importância, mas pela

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inexistência de mecanismos jurídicos hábeis para um possível descumprimento deste dever codificado, restando o mesmo praticamente ineficaz.

Cabe ainda mencionar que ao lado de dever de fidelidade existente no casamento, está o dever de lealdade inerente á união estável, objeto de estudo do próximo ponto desta pesquisa.

1.3 A união estável e o dever de lealdade

Não necessariamente, um casal precisa casar-se para constituir família. A convivência entre um homem e uma mulher, via de regra sob o mesmo teto, com ânimo de constituir família, configura a união estável. Assim, para Euclides Benedito de Oliveira (apud DIAS, 2009, p. 161), “nasce a união estável da convivência, simples fato jurídico que evolui para a constituição de ato jurídico, em face dos direitos que brotam dessa relação.”

A Constituição Federal de 1988 acolheu expressamente a união estável no seu artigo 226 e parágrafos, onde a equiparou ao casamento e, principalmente, a acolheu como entidade familiar. Nesse sentido, Orlando Gomes (2001, p. 35, grifo do autor) considera “[...] família o grupo fechado de pessoas, composto dos genitores e dos filhos, e para limitados efeitos outros parentes, unificados pela convivência e comunhão de afetos, em uma só economia, sob a mesma direção.”

A respeito da regulamentação da união estável, Luiz Augusto Gomes Varjão (2007, p. 9) preceitua que:

[...] a norma constitucional apenas introduziu a união estável no direito de família, possibilitando, desse modo, regulamentação da matéria pela lei ordinária, com a fixação de direitos e deveres entre os conviventes [...] ao atribuir à união estável o status de entidade familiar, a Constituição considerou-a família, conferindo-lhe a mesma proteção assegurada pelo Estado a esta última.

O advento da regularização constitucionalizada foi importante até mesmo para a nomenclatura da união estável, antes conhecida pelo pesado nome de

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concubinato, e agora, conhecida pela expressão companheirismo ou propriamente união estável. Para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pampolha Filho (2012, p. 426),

essa palavra, com forte carga pejorativa, derivada da expressão latina concubere, significava “dividir o leito”, “dormir com”, ou, conforme jargão popular, caracterizaria a situação da mulher “teúda e manteúda”: “tida e mantida” por um homem (sua amante, amásia, amigada).

Prevista no Código Civil nos artigos 1.723 a 1727 e no artigo 1790, não traz tantas formalidades quanto o casamento. Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 611) também considera a ausência de formalismo como sendo uma característica da constituição da união estável. Segundo o autor,

enquanto o casamento é precedido de um processo de habilitação, com publicação dos proclamas e de inúmeras outras formalidades, a união estável, ao contrário, independe de qualquer solenidade, bastando o fato da vida em comum.

Apesar de algumas divergências doutrinárias quanto à importância e equiparação da união estável com o casamento, não se pode negar que a entidade da família sempre existiu, seja com ou sem matrimônio. E, dessa forma, por que não a reconhecer como uma entidade familiar? As necessidades da vida e as razões de equidade, segundo Sílvio de Salvo Venosa (2012, p. 35), prepararam caminho para decisões homogêneas e para a posição legislativa definitiva de proteção em matéria união na Constituição e legislações atuais.

Segundo a doutrina, existem alguns elementos que devem se fazer presentes nas uniões de fato para que se configure a união estável. São os chamados elementos essenciais, que, conforme Maria Helena Diniz (2005, p. 361 a 369) consiste em: diversidade de sexo; ausência de matrimônio civil válido e de impedimento matrimonial entre os conviventes; notoriedade de afeições recíprocas; honorabilidade; fidelidade ou lealdade; e, coabitação.

Entretanto, no que tange a “diversidade de sexo”, não se pode olvidar que houve grande mudança quanto a este elemento, perdendo o sentido a sua mantença pela doutrina, uma vez que a união homoafetiva já é aceita juridicamente como

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entidade familiar, podendo, os casais homoafetivos, adotar filhos e até mesmo se casarem, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, em 05 de maio de 2011, em julgamento proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4277, reconheceu às uniões homoafetivas o status de entidade familiar, estendendo assim a essas relações, a mesma proteção existente à união estável, prevista constitucionalmente e pelo Código Civil.

O Supremo Tribunal Federal julgou ainda a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 132/RJ, onde decidiu que todos os órgão do poder judiciário estão proibidos de interpretar a Constituição Federal e o Código Civil de maneira a impedir o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Da mesma forma, e, baseada nas decisões mencionadas do STF, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.183.378/RS, em outubro de 2011, decidiu pela possibilidade de pessoas do mesmo sexo habilitarem-se para o casamento, fundamentando tal decisão na dignidade da pessoa humana, consagrada pela Constituição, uma vez que tal dignidade não é aumentada nem diminuída em razão do uso da sexualidade, e que a orientação sexual não pode servir de pretexto para excluir família da proteção jurídica representada pelo casamento.

Neste contexto, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no ato nº 175, aprovou resolução proposta por seu presidente, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, que obriga os cartórios de todo o país a registrar o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Determinou ainda que sejam convertidas em casamento as uniões estáveis homoafetivas já registradas.

Assim como no casamento existe o dever de fidelidade, na união estável, e, portanto, nas uniões homoafetivas, da mesma maneira existe o dever de lealdade, previsto no artigo 1.724 do Código Civil. Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 623) compartilha dessa ideia ao dizer que “como também ocorre nas uniões conjugais, o

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vínculo entre os companheiros deve ser único, em face do caráter monogâmico da relação.”

Trata-se de dever expresso na lei brasileira, o qual está intimamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana. Ao ser regulamentada, a união estável ganhou proteção jurídica por parte do Estado, devendo dessa forma, serem respeitados os deveres à ela inerentes. Segundo Maria Helena Diniz (2007, p. 364), “não havendo fidelidade, nem relação monogâmica, o relacionamento passará a condição de ‘amizade colorida’, sem o status de união estável.”

O dever de lealdade é tão importante que sua transgressão pode gerar a ruptura da união estável, além de outras consequências, as quais serão analisadas posteriormente neste trabalho. Assim sendo,

O dever de lealdade, compreensivo do compromisso de fidelidade sexual e afetiva, remete-nos à ideia de que a sua violação, aliada à insuportabilidade de vida em comum, poderá resultar na dissolução da relação de companheirismo. (GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2012, p. 446, grifo dos autores).

Nas relações entre os companheiros deve haver, segundo o artigo 1.724 do Código Civil, lealdade, respeito, assistência, guarda, sustento e educação dos filhos. Para Sílvio de Salvo Venosa (2012, p. 45), “a quebra desse dever pode, dependendo de sua amplitude, fazer cair por terra a comunhão de vida, de interesses e de sentimentos.”

Portanto, inegável é a importância do dever jurídico de lealdade, o qual foi mantido pelo legislador no Código Civil de 2002. No entanto, apesar da vigência do referido dever, da mesma forma que o dever de fidelidade existente no casamento, é notório no meio jurídico a sua falta de instrumentalidade, já que não existe em nosso ordenamento nenhum mecanismo responsável pela reparação quando de uma possível transgressão deste dever, o que acaba por gerar algumas críticas da doutrina pela mantença do dever de lealdade na legislação brasileira.

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1.4 Relacionamentos virtuais

Graças à grande globalização virtual vivenciada hoje em dia, pela comodidade e pela relativa segurança que o meio virtual proporciona devido ao anonimato, muitas pessoas passaram a manter relacionamentos virtuais. Nesse mundo virtual, as pessoas estão livres para sonhar, fantasiar, mentir o que quiserem, chegando muitas vezes do contato virtual a um contato físico. Isso porque, de acordo com Diogo Schelp (2009, p. 94 a 102), alguns sociólogos, psicólogos e antropólogos concluíram que essa forma de comunicação e relação não consegue suprir as necessidades afetivas mais profundas dos indivíduos.

Diferentemente dos relacionamentos amorosos reais, os relacionamentos virtuais não se iniciam com olhares, abraços, beijos ou qualquer outro tipo de contato físico. No meio virtual, o romance se inicia, geralmente em sites de relacionamentos, com uma conversa no bate-papo, troca de mensagens, fotografias e até mesmo vídeos. Muitas pessoas realmente se apaixonam pelo parceiro virtual, o qual é eleito, geralmente pelas afinidades que apresenta, além é claro da aparência existente em suas fotos.

Isso ocorre porque no mundo virtual não existe o contato físico. A pessoa envolvida pode imaginar o que quiser, criar em sua cabeça o parceiro ideal, atribuir a ele as melhores qualidades existentes em um ser humano. Da mesma forma, a própria pessoa que busca um relacionamento amoroso virtual pode se apresentar de maneira mais bonita, inventar qualidades e omitir defeitos, ou seja, mostrar-se como gostaria de ser. Desse modo, o mundo virtual, e, em consequência, um relacionamento virtual, passa a ser muito mais atraente do que um relacionamento real.

Por esses motivos, as salas de bate-papo estão cada vez mais lotadas, cheias de homens e mulheres a procura do amor de suas vidas. Muitos chegam a perder a noção do tempo, adentrando madrugadas com conversas intermináveis com o parceiro virtual. Isso faz com que algumas pessoas passem mais tempo conversando com pessoas desconhecidas na internet do que com as pessoas com quem convivem. Assim, já previa Rodrigo da Cunha Pereira (2005, p. 119):

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A realidade cibernética terá como consequência uma modificação inevitável das formas sociais atuais, como casamento, sexo casual, namoro e infidelidade. Isto não significa que as relações on line se tornarão a nova essência das experiências modernas, mas certamente trazem uma nova dimensão para estas experiências, que serão cada vez mais populares.

Outra peculiaridade dos relacionamentos virtuais é a de que se pode manter relacionamento com várias pessoas ao mesmo tempo, pela suposta privacidade que o meio oferece. Na verdade o que deixa os relacionamentos virtuais mais interessantes é a possibilidade de que eles se tornem reais, pois somente assim poderá se desfrutar das mais maravilhosas sensações causadas pelo contato físico.

Sem a necessidade de sair de casa, os relacionamentos virtuais são mais cômodos do que os reais. “As expectativas das pessoas em relação à interação humano/computador são frequentemente inerentes ao que elas esperam da interação humano/humano.” (BRENAN apud LEMOS, 2002, p. 112). Por meio da webcam, é possível manter não só uma linguagem falada como também uma linguagem corporal, pois inclui a imagem em tempo real no contato, garantindo certa segurança ao relacionamento. No meio virtual, as pessoas realizam suas fantasias sem pudor e principalmente sem culpa.

Com a pós-modernidade a qual estamos vivenciando, as famílias, o trabalho, o lazer e principalmente as máquinas mudam, se atualizam, se adequam conforme seu tempo. Com os relacionamentos amorosos não poderia ser diferente. Conforme o entendimento dos autores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pampolha Filho (2012, p. 133), “A sociedade brasileira, acompanhando as ingentes mudanças experimentadas pela humanidade nos últimos anos, alterou profundamente a sua tábua de valores no campo da efetividade.”

Esse tipo de relacionamento amoroso só pôde existir graças a uma revolução tecnológica trazida pela internet. Acompanhando a evolução das tecnologias, os relacionamentos virtuais são uma realidade cada vez mais presente em nosso meio. A partir desse pressuposto, a internet será analisada no ponto a seguir para uma melhor compreensão do surgimento destes relacionamentos.

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1.5 Internet

A internet, rede mundial de computadores, teve origem logo após a segunda guerra mundial. Conforme Manuel Castells (2003), criada com objetivos militares foi desenvolvida primeiramente pela empresa ARPANET em 1969. Em 1980, a ARPANET se dividiu em MILNET e ARPANET. A interligação dessas redes foi denominada de “Defense Advanced Research Projects Agency Internetwork”, nome que foi abreviado posteriormente para Internet. Assim, a internet representa o marco desta era virtual a qual estamos vivendo. Nesse sentido, para Manuel Castells (2003, p. 13):

A história da criação e do desenvolvimento da Internet é a história de uma aventura humana extraordinária. Ela põe em relevo a capacidade que tem as pessoas de transcender metas institucionais, superar barreiras burocráticas e subverter valores estabelecidos no processo de inaugurar um mundo novo. Reforça também a ideia de que no processo a cooperação e a liberdade de informação podem ser mais propícias à inovação do que a competição e os direitos de propriedade.

Hoje, a internet já faz parte do cotidiano da sociedade. Com ela, o mundo já não é tão grande assim. Encurtando distâncias, ninguém está tão longe que não se possa conversar, e o melhor, sem ter que pagar por cada uma dessas conversas. Sendo um meio de comunicação rápido que atinge todas as classes sociais, além de proporcionar conhecimentos e novas amizades, também serve para se relacionar amorosamente com outro “internauta”, expressão utilizada para designar àqueles que se utilizam da internet. Assim, de acordo com Gustavo Testa Corrêa (2000, p. 8),

A Internet é um sistema global de rede de computadores que possibilita a comunicação e a transferência de arquivos de uma máquina a qualquer outra máquina conectada a rede, possibilitando, assim, um intercâmbio de informações sem precedentes na história, de maneira rápida, eficiente e sem a limitação de fronteiras, culminando na criação de novos mecanismos de relacionamento.

Importante se faz tomar um certo cuidado com relação a internet, pois todos os que dela se utilizam são responsáveis pelo que escrevem na rede. Apesar da aparência de segurança, a vulnerabilidade das informações existentes na internet é muito grande, e, somada ao desconhecimento técnico de seus usuários, “navegar”

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na internet é sempre um risco, mesmo que no anonimato. Conforme Liliana Mainardi Paesani (2012, p. 43):

Estão em risco os nichos mais preciosos da privacidade. Contas correntes, declarações de Imposto de Renda, números e operações dos cartões de crédito, dados do passaporte, nomes e endereços de contatos comerciais e pessoais poderão ser devassados e alterados por qualquer pessoa. O mais grave: isso poderá ocorrer em qualquer lugar do mundo. Serão crimes, porém difíceis de apurar e de punir. Proteger-se será o mesmo que renunciar aos computadores.

Inicialmente, as relações virtuais se davam basicamente por e-mail (mensagem eletrônica). Posteriormente, foram surgindo as redes sociais, as quais possibilitam o usuário a comunicar-se com inúmeras pessoas, além de postar fotos e vídeos na rede. Segundo Manuel Castells (apud ZANIOLO, 2012, p. 270), redes sociais são:

[...] estruturas abertas capazes de expandir de forma ilimitada, integrando novos nós desde que consigam comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem os mesmos códigos de comunicação (por exemplo, valores ou objetos de desempenho). Uma estrutura social com base em redes é um sistema aberto altamente dinâmico suscetível de inovação, sem ameaças do seu equilíbrio.

Por ser um sistema tão complexo, merece a internet ser estudada sob as mais variadas esferas. No direito não pode ser diferente. Sem regulamentação, resta quase que impossível saber o que é lícito e o que não o é no mundo virtual. A realidade moderna necessita cada vez mais da intervenção do Estado nas relações virtuais. Com interesses diferentes, cada usuário possui crenças e valores próprios, o que, com certeza é a causa de muitos conflitos no meio virtual.

Conforme exposto anteriormente, a internet é responsável por milhões de relacionamentos virtuais. No entanto, deve se estar atento para que estes relacionamentos não passem dos limites, tomando o cuidado para não inserir na rede um número muito elevado de informações, pois muitas vezes o sonho de um amor pra vida toda, pode virar pesadelo. Neste contexto, Gabriel Cesar Zaccaria de Inellas (2009, p. 13), comenta que:

É indubitável que a internet modificou o comportamento humano. Se, por um lado, incentivou a busca de novos conhecimentos e a expansão da

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cultura, por outro lado, também propiciou o surgimento de criminosos digitais. A internet possui hoje, mais de cem milhões de pessoas conectadas, em mais de cento e sessenta Países [...] A verdade é que, a internet evolui em velocidade muito maior do que as medidas de segurança capazes de proteger as informações.

Certamente, a internet trouxe muitos benefícios para a interação social de pessoas das mais variadas idades. Por ser um meio de comunicação fácil de ser acessado, a internet ganha cada vez mais adeptos, sendo raras as pessoas que dela não se utilizam. A internet marcou os anos 90 com um aumento significativo de comunicação entre as pessoas, o que se mantém até os dias atuais, e, tudo isso, em uma velocidade antes inimaginável. Desta forma,

[...] o funcionamento da rede recusa um controle hierárquico, global, ou qualquer possível sistema de censura de informação ou da comunicação, mas acata e faz apelo à responsabilidade dos fornecedores e usuários da informação desse espaço público, A profusão do fluxo de informações não impede que a coletividade dos internautas construa hierarquias e estruturas por sua própria conta e crie mecanismos próprios de defesa da privacidade e do controle das informações. (PAESANI, 2012, p. 44).

Por outro lado, a internet trouxe algumas mudanças negativas que também originadas pela facilidade de acesso ao meio virtual, acabaram por ofender a honra e a integridade de muitas pessoas, vítimas da má-fé empregada por quem faz da internet um meio capaz de cometer ilicitudes ou imoralidades, como é o caso da infidelidade virtual, a qual será analisada no próximo ponto deste trabalho.

1.6 Infidelidade virtual

Da mesma forma que a infidelidade existe nos relacionamentos reais, nas relações virtuais não seria diferente. Os relacionamentos virtuais analisados neste trabalho, nada mais são do que uma nova modalidade de relacionamentos amorosos. Do mesmo modo, a infidelidade virtual, objeto deste ponto da pesquisa, é caracterizada como uma nova modalidade de infidelidade, acompanhando as tecnologias e a era pós-moderna vivenciadas.

A traição vista de uma maneira geral engloba tanto o adultério (que é a prática do ato sexual com pessoa diversa do cônjuge), até a prática de atos diversos da conjunção carnal, como beijos ou até mesmo a infidelidade virtual. Esta última

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caracterizada pelo professor Caio Mário da Silva Pereira (2010, p. 175) por ser onde os relacionamentos extramatrimoniais dão-se no universo da informática, especificamente via internet, o que, segundo ele, não deixa de caracterizar uma atitude de efetivo desrespeito ao outro cônjuge.

Em busca de uma nova aventura, pessoas comprometidas passaram a se envolver virtualmente com outras pessoas interligadas pela rede, a fim de criar novos laços amorosos ou até mesmo com o único propósito de satisfazer-se sexualmente. Isso ocorre geralmente por meio da masturbação, caracterizando o que se pode chamar de sexo virtual. Assim, segundo Maria Helena Diniz (2005, p. 291),

Diante do fato de haver a possibilidade de o internauta casado participar, por meio de programa de computador, como o ICQ, de chats, de mirc e salas de bate-papo voltados a envolvimentos amorosos geradores de laços afetivo-eróticos virtuais, pode surgir, na Internet, infidelidade, por e-mail e contatos sexuais imaginários com outra pessoa, que não seja seu cônjuge [...]

Como já exposto anteriormente, a fidelidade é dever expresso para o casamento na legislação brasileira. Se a infidelidade gerada pelos meios virtuais é considerada uma nova modalidade de infidelidade, lógico se faz perceber que ela viola o dever jurídico de fidelidade existente no casamento, e, por equiparação, viola também o dever jurídico de lealdade previsto para os companheiros na união estável.

Além do dever de fidelidade, alguns autores defendem que a infidelidade virtual afeta também o dever de respeito e consideração mútuos, o qual também é dever vigente em nosso ordenamento, elencado no mesmo artigo 1.566 do Código Civil de 2002. Um exemplo é o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 190, grifo do autor), defendendo que:

Quando a conduta pessoal reflete uma variedade de situações desrespeitosas e ofensivas à honra do consorte, uma forma de agir inconveniente para pessoas casadas, inclusive a denominada “infidelidade virtual” cometida via Internet, pode também caracterizar-se a ofensa ao inciso V do aludido art. 1.566, que exige “respeito e consideração mútuos”.

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Com o mesmo grau de imposição que o dever de fidelidade e lealdade, o dever legal de respeito e consideração mútuos certamente é violado com a infidelidade virtual, sem a necessidade de que esta se transforme em real para ofender este dever legal. Maria Helena Diniz entende dessa forma (2005, p. 291):

Deveras os problemas do dia a dia podem deteriorar o relacionamento conjugal, passando, em certos casos, o espaço virtual a ser uma válvula de escape por possibilitar ao cônjuge insatisfeito a comunicação com outra pessoa, cuja figura idealizada não enfrenta o desgaste da convivência. Tal laço erótico-afetivo, platônico com pessoa sem rosto e identidade, visto que o internauta pode fraudar dados pessoais, por exemplo, usando apelido (nickname) e mostrar caracteres diferentes do seu real comportamento, pode ser mais forte do que o relacionamento real, violando a obrigação de respeito e consideração que se deve ter em relação ao consorte.

Assim, claro está que a infidelidade virtual viola deveres codificados do cônjuge e do companheiro. Para além de um relacionamento extraconjugal virtual, muitos desses relacionamentos virtuais acabam por se tornar reais, na medida em que a interação vai ficando mais frequente, o que intensifica ainda mais a dor e o sofrimento do cônjuge ou companheiro traído.

Nesse sentido, a Revista Veja (2006) publicou estudos indicando que, na época, 60% dos casos de infidelidade virtual já terminavam em sexo real. "É por isso que muitos escondem essa relação do cônjuge. Eles sabem que, no fundo, há uma tensão sexual ocorrendo", diz Magdalena Ramos (apud Daniela Pinheiro, 2006), coordenadora do núcleo de terapia de casal e família da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Dessa forma, os casos em que a infidelidade virtual não passa desse mundo virtual (os quais já são minoria), causam, por si só, profundo sofrimento e um grande constrangimento ao parceiro que suportou o dano. Daniela Pinheiro (2006) destacou que a internet criou uma nova maneira de ser infiel. Quando menos se espera o parceiro já está tendo conversas virtuais com um desconhecido. Para a autora, mesmo que esses relacionamento nunca vire real, a traição machuca da mesma forma.

Dentre as pessoas envolvidas em romances virtuais, muitas buscam na internet uma satisfação sexual, advinda geralmente da masturbação,

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fazendo surgir o sexo virtual e interferindo em muitos relacionamentos reais já existentes. (DINIZ, 2005, p. 291).

Do exposto, conclui-se que a infidelidade virtual é uma realidade cada vez mais presente em nosso meio. A própria infidelidade advinda dos relacionamentos reais já causa um dano imenso no parceiro traído. Ainda mais do que esta, a infidelidade em sua forma virtual, além de causar dor e sofrimento advindas de qualquer tipo de infidelidade, ainda causa, na maioria dos casos, um constrangimento gigantesco, visto que a internet é um sistema mundial, onde em qualquer parte do mundo se pode visualizar, desde que em meio público (como o orkut, facebook, twitter), a traição alheia.

Visto isso, a importância desta pesquisa torna-se ainda mais clara, tanto do ponto de vista social, quanto do ponto de vista jurídico, já que o problema da infidelidade virtual como nova modalidade de infidelidade não encontra em nosso ordenamento jurídico um remédio específico para essa atitude ilícita, qual seja, a transgressão do dever legal de fidelidade ou lealdade. Nesse sentido, será analisado no capítulo a seguir o instituto do dano moral, como medida de aplicação da responsabilidade civil, seus meios de prova, quantificação e suas formas de reparação, com o objetivo de vislumbrar ao final deste trabalho a possibilidade da aplicação do referido instituto nos casos de infidelidade virtual.

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2 DANO MORAL

A partir de uma análise dos relacionamentos amorosos reais e virtuais, do dever de fidelidade/lealdade e de seu consequente descumprimento por um dos amantes, e, ainda, diante da inexistência de um mecanismo próprio para salvaguardar esse direito previsto em lei, faz-se necessária a busca de uma alternativa apta a reparar os danos advindos da transgressão de tal dever, a fim de dar a essas relações uma solução construtiva. A conjuntura atual não permite mais que se prolonguem conflitos e danos em razão da falta de mecanismos próprios para a punição do cônjuge virtualmente infiel, bem como para a satisfação dos danos suportados pela vítima.

Dessa forma, eis que surge o instituto do dano moral, que vem exatamente para socorrer o mais nobre dos danos, qual seja, o da esfera moral, sendo que seu cabimento ou não aos casos de infidelidade virtual, será objeto do terceiro capítulo deste trabalho, mas que não se poderia ter perdido a oportunidade de arguir aqui a possibilidade de sua aplicação, para que haja um melhor aproveitamento do presente capítulo.

O instituto em questão possui uma importância imensurável em nosso ordenamento jurídico pátrio, pois aproxima a jurisdição com a humanidade, trazendo àquele que teve seu íntimo abalado, ainda que relativamente, um certo conforto, que, apesar de não modificar o dano já sofrido, o torna diminuído diante da possibilidade de um retorno econômico para ser utilizado em distração da dor armazenada, interrompendo de certa forma as mágoas e ressentimentos.

É neste contexto que o presente capítulo será desenvolvido: irá demonstrar a importância do instituto, inserindo-o na responsabilidade civil, trazendo seus precedentes históricos, passando pela prova e quantificação até chegar a reparação do dano moralmente sofrido, sendo estes os objetivos deste capítulo, para fins de compreensão do instituto para uma posterior análise de cabimento ou não aos casos de infidelidade virtual.

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2.1 Responsabilidade civil

No âmbito jurídico, a responsabilidade civil se caracteriza por apurar um dano causado por alguém a outrem e responsabilizar quem o cometeu, sendo portanto, em outras palavras, a obrigação de reparar um dano, que, geralmente possui cunho pecuniário. Na verdade, a responsabilidade civil busca determinar quais são as situações em que alguém pode ser responsabilizado por um dano sofrido por outrem e em que condições esta pessoa estará obrigada a reparar referido dano.

O anseio de obrigar o agente, causador do dano, a rapará-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça. O dano causado pelo ato ilícito rompe o equilíbrio jurídico-econômico anteriormente existente entre o agente e a vítima. Há uma necessidade fundamental de se restabelecer esse equilíbrio, o que se procura fazer recolocando o prejudicado no statu quo ante. (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 14, grifo do autor)

A partir da Constituição Federal de 1988, surge a garantia constitucional da reparação do dano causado a outra pessoa, seja este dano material ou moral. Na sequencia, o Superior Tribunal de Justiça edita a Súmula 37, onde, desde que provenientes do mesmo fato, é permitida a cumulação de danos morais e danos materiais.

Apesar de ser claro e unânime entre a doutrina o caráter reparatório da responsabilidade civil, o instituto passou por diversas mudanças ao longo dos anos, acompanhando as mudanças sociais que surgem em nosso meio. Atualmente, a ideia predominante que se tem é a de que nenhum dano se passe por despercebido, sem receber uma reparação, para que ninguém seja prejudicado injustamente. Dessa forma, conforme Rui Stoco (2007, p. 114, grifo do autor):

A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana.

Assim, a responsabilidade civil possui o condão de restituir a parte lesada ao seu status quo, recebendo esta uma indenização para que com ela possa se distrair

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com outras coisas, proporcionando prazeres de valor econômico, visando o esquecimento e principalmente a reparação do dano, moral ou material suportado. De acordo com Sérgio Cavalieri Filho (2012, p. 2):

Em seu sentido etimológico e também no sentido jurídico, a responsabilidade civil está atrelada a ideia de contraprestação, encargo e obrigação. Entretanto é importante distinguir a obrigação da responsabilidade. A obrigação é sempre um dever jurídico originário; responsabilidade é um dever jurídico sucessivo consequente à violação do primeiro.

Tal fenômeno ensejador da responsabilidade civil pode se exteriorizar tanto por ação, quanto por omissão, podendo ser causado o dano por dolo ou culpa (negligência, imperícia ou imprudência) do agente. Este ato, que não necessariamente precisa ser ilícito em sua origem, pode advir tanto do agente quanto de outra pessoa que esteja sob a responsabilidade do agente, além de poder ser causado por animal ou coisa que pertença ao responsabilizado. Maria Helena Diniz (2005, p. 43) constata que

A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou licito, voluntario e objetivamente imputável do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.

No Código Civil brasileiro, os artigos mais específicos sobre o assunto são o art. 186 e o 927. O artigo 186 do Código Civil assim disciplina: “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Diante desse artigo, extrai-se a análise dos pressupostos necessários, já consagrados pela doutrina, para a caracterização da responsabilidade civil, quais sejam: dano, nexo causal e conduta culposa do agente. São esses os elementos básicos para a caracterização da responsabilidade civil.

Desse modo, por serem tão amplas as possibilidades ensejadoras da responsabilidade civil, e, pela raridade de dispositivos legais que tratem sobre o instituto, ficou a cargo da doutrina e da jurisprudência a interpretação de tais artigos

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de leis, analisando, nos casos concretos, a classificação ou não dos danos suportados por alguém, como sendo responsabilidade de outrem.

Encontram-se também na legislação extravagante alguns dispositivos que versam sobre o instituto: Código Eleitoral (Lei nº 4.737/65); Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90); Código Brasileiro de Telecomunicação (Lei nº 4.117/62) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).

Portanto, quando houver violação por uma pessoa ao bem jurídico de outra pessoa, causando-lhe um dano, seja ele material ou moral, imperiosa se faz a aplicação do instituto da responsabilidade civil, a fim de apurar o dano sofrido e fixar para tanto uma correspondente indenização, para que se restabeleça uma relação pacífica entre o ofendido e o ofensor.

Dentro da responsabilidade civil, a aplicação do instituto pode ocorrer de diversas formas, sendo uma delas a responsabilidade civil por danos morais, principal questão a ser estudada por este capítulo, que será analisada nos próximos pontos dessa pesquisa.

2.2 Conceito e precedentes históricos do dano moral

Espécie de ato ilícito, o dano moral é capaz de gerar a responsabilidade civil analisada anteriormente. Para que se inicie um estudo a cerca do dano moral, importante se faz conhecer o conceito a ele despendido pela doutrina. Antonio Jeová Santos (2003, p. 78) aduz que quando “a lesão afeta sentimentos, vulnera afeições legítimas e rompe o equilíbrio espiritual, produzindo angústia, humilhação, dor etc., diz-se que o dano é moral.”

Conforme Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pampolha Filho (2012, p. 90), o dano moral

Trata-se, em outras palavras, do prejuízo ou lesão de direitos, cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro, como é o caso dos direitos da personalidade, a saber, o direito à vida, à integridade física (direito ao corpo, vivo ou morto, e a voz), à integridade psíquica (liberdade,

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pensamento, criações intelectuais, privacidade e segredo) e à integridade moral (honra, imagem e identidade)[...]

No entendimento de Silvio de Salvo Venosa (2011, p. 49), ”Dano moral é o prejuízo que afeta o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima. Sua atuação é dentro dos direitos da personalidade.” Já para Carlos Alberto Bittar (1993, p. 41),

Qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se, portanto, como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social).

Diante dos conceitos elaborados pela doutrina, fica clara a essência, bem como a importância do dano moral em nosso meio. Mas esses conceitos modernos nem sempre foram assim. A reparação do dano moral obteve maior importância após a Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, X). Conforme Sílvio de Salvo Venosa (2011, p. 49), “Com a Lei Maior expressa, superou-se a renitência empedernida de grande massa da jurisprudência, que rejeitava a reparação de danos exclusivamente morais.”

Após a conceituação doutrinária atual, passa-se a demonstrar a evolução do dano moral ao longo dos anos. A primeira informação de codificação do dano moral que se tem notícia, segundo Gagliano e Pampolha Filho (2012) é o Código de Hamurabi, promulgado por volta de 1750 a.C.. Conforme João Batista de Souza Lima (1983), o artigo 219 preceituava que, se um médico fizesse uma incisão difícil com lanceta de bronze no escravo de um homem vulgar e causasse a sua morte, ele deveria restituir um escravo idêntico ao escravo morto. Nas palavras de Clayton Reis (apud GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2012, p. 103)

Noção de reparação de dano encontra-se claramente definida no Código de Hamurabi. As ofensas pessoais eram reparadas na mesma classe social, à custa de ofensas idênticas. Todavia o Código incluía ainda a reparação do dano à custa de pagamento de um valor pecuniário.

Em 300 a.C., surge a Lei das XII Tábuas, trazendo o cabimento da ação de dano moral quando alguém colocar seu rebanho para pastar no campo de outrem. Trouxe ainda, penas como a de amarrar, flagelar e matar queimado aquele que

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colocasse fogo intencionadamente em bens alheios. E, não o acontecendo por querer, a reparação pecuniária do dano. Conforme Gagliano e Pampolha Filho (2012), no século II a.C., é editado o Código de Manu, prevendo a reparação pecuniária para indenização do dano moral sofrido, tanto pelos homens quanto pelos danos causados pelos animais.

De acordo com os referidos autores, o Alcorão também trouxe repressão às esferas extrapatrimoniais, como por exemplo, a previsão de que um adúltero só poderia se casar com outra adúltera. Conforme o autor, na Bíblia Sagrada também encontram-se passagens prevendo a reparação do dano moral, mais precisamente no Antigo Testamento, tutelando amplamente a honra e aplicando castigos para quem não à praticasse, incluindo castigos corporais e indenização pecuniária.

Quanto à evolução do dano moral na legislação brasileira, o legislador teve que criar mecanismos de reparação de danos imateriais, graças a percepção de que os danos sofridos pela sociedade iam muito além de meros danos patrimoniais. Assim, o Código Penal de 1890, mais precisamente em seu artigo 316 previa

Art. 316. Si a calumnia for commettida por meio de publicação de pamphleto, impresso ou lithographado, distribuido por mais de 15 pessoas, ou affixado em logar frequentado, contra corporação que exerça autoridade publica, ou contra agente ou depositario desta e em razão de seu officio: Penas – de prisão cellular por seis mezes a dousannos e multa de 500$ a 1:00000$

Contudo, foi o advento do Código Civil de 1916 (Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916) que trouxe mais claramente a possibilidade de reparação do dano exclusivamente moral sofrido. Apesar de ser um Código patrimonialista, e de não se referir expressamente ao dano moral e, consequentemente à isso, alguns negarem a reparabilidade do dano moral, o diploma legal foi muito importante para inspirar as futuras legislações sobre o tema. “O fato é que em nosso ordenamento de 1916, o art. 159, astro-rei de nossa responsabilidade civil, nunca restringiu a indenização aos danos exclusivamente materiais.” (VENOSA, 2011, p. 49).

Foi com a promulgação da Constituição Federal de 1988 que a reparação do dano exclusivamente moral foi efetivamente tratada de forma expressa. O artigo 5°

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do diploma aludido, em seus incisos V e X trazem as seguintes previsões: V - “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.” Assim como no inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrentes de sua violação.”

Dessa forma, conforme Caio Mário da Silva Pereira (2001, p. 58)

Com as duas disposições contidas na Constituição de 1988 o princípio da reparação do dano moral encontrou o batismo que a inseriu em a canonicidade de nosso direito positivo. Agora, pela palavra mais firme e mais alta da norma constitucional, tornou-se princípio de natureza cogente o que estabelece a reparação por dano moral em nosso direito. Obrigatório para o legislador e para o juiz.

Já o atual Código Civil de 2002 não trouxe expressamente o termo “dano moral”, porém, a análise de alguns de seus dispositivos nos traz, em outras palavras, a certeza da previsão de sua reparação. Dessa forma, o artigo 186 é o que prevê o instituto do dano moral (Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito), sendo o artigo 927 o que prevê a sua reparabilidade: “Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

O dano moral sempre existiu e sempre existirá. A reparação em dinheiro dos danos sofridos pelas vítimas nunca acabou e nunca acabará com a dor, mas com toda certeza, a ameniza. O ser humano sofre constantemente ameaças em sua integridade pessoal, psíquica e física, geradas pelos mais diversos fatores, motivo pelo qual esse dano deve ser reparado com a maior efetividade possível.

2.3 A prova do dano moral

Após uma análise sobre o dano moral e sua evolução, convém que sejam analisados os meios de provas utilizados para que o dano moral suportado seja devidamente provado, sempre tendo em mente a honra e a dignidade da pessoa humana. Ocorre que, contrariando a regra geral de que o dano deve ser

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devidamente provado para só então ser indenizado, o dano moral que afeta direitos da personalidade não necessita dessa prova para ser reparado.

Às vezes a lei presume o dano, como sucedia na revogada Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67), que pressupunha a existência de dano moral em casos de calúnia, difamação e injúria praticadas pela imprensa. Acontece o mesmo em ofensas aos direitos da personalidade (GONÇALVES, 2011, p. 506).

Certamente, não se trata de meios de provas específicos. É difícil pensar em um meio de prova que demonstre o sofrimento de um dano na esfera íntima de outrem. Sílvio de Salvo Venosa (2011, p. 52) afirma que

A prova do dano moral, por se tratar de aspecto imaterial, deve lastrear-se em pressupostos diversos do dano material. Não há, como regra geral, avaliar por testemunhas ou mensurar em perícia a dor pela morte, pela agressão moral, pelo desconforto anormal ou pelo desprestígio social.

O dano moral, para bem da verdade, não existe no mundo material. Ele está no íntimo de cada um que o suporta. Por isso que muitos autores afirmam que não existem meios de provas aptos a provarem tal dano. Rui Stoco (2004, p. 1691) analisa a situação da seguinte forma:

Sob esse aspecto, porque o gravame no plano moral não tem expressão matemática, nem se materializa no mundo físico e, portanto, não se indeniza, mas apenas se compensa, é que não se pode falar em prova de um dano que, a rigor, não existe no plano material.

Realmente, a prova do dano moral é algo muito delicado, pois, se por um lado não há como provar o dano sofrido na moralidade de cada um, por outro, não se pode admitir como verdadeira qualquer alegação de sofrimento de dano moral, sem nenhum critério de percepção da veracidade ou não desse dano. Maria Helena Diniz (apud GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2012, p. 116) afirma que a prova da existência do dano moral “não é impossível ou difícil, visto que, se se tratar de pessoas ligadas à vítima por vínculo de parentesco ou amizade, haveria presunção

juris tantum da existência de dano moral”.

Com alguns argumentos contrários, a maior parte da doutrina trabalha com a impossibilidade ou desnecessidade da prova do dano moral. O que deve ser provado é o fato ensejador da ofensa, do dano moral. E tão somente isso, pois, via

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de regra, de acordo com a doutrina e jurisprudência majoritárias, o dano moral não se prova, ele apenas se sente, parecendo ser quase impossível demonstrar para alguém o sofrimento que habita dentro da alma do ofendido.

Desse modo, cabe ao juiz esse importante papel de análise dos fatos nos casos concretos, agindo sempre com respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais. (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 97).

Portanto, mais do que aparentemente impossível, a prova do dano moral sofrido, por vezes, se faz desnecessária. O que deve ser efetivamente provado (por todos os meios de provas em direito admitidas) são os fatos ensejadores desse dano e o nexo causal existente entre o dano sofrido e a ação (ou omissão) do ofensor. Essa análise da existência ou não do dano deve ser feita com o máximo de cuidado pelo magistrado, examinando as peculiaridades do caso concreto.

Contudo, podem ocorrer, de fato, algumas circunstâncias em que fique difícil para o magistrado descobrir a verdadeira existência do “dano moral”, mas isso se configura mais como uma simples dificuldade de ordem probatória do que um impedimento à ressarcibilidade do dano. (GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2012, p. 116).

Nesse sentido, a fim de ampliar a visão de como esse dano será indenizado, será apresentada, no próximo ponto deste trabalho, uma breve exposição de como chegar a uma quantificação da indenização do dano moral sofrido.

2.4 A quantificação da indenização do dano moral

Que o dano moral deve ser reparado, isso já está pacificado. O difícil é encontrar um parâmetro, uma base para se apoiar quando da fixação do valor da indenização. Uma vez que, como já demonstrado, o dano moral independe de prova, mais difícil ainda é encontrar critérios para uma quantificação justa da indenização atribuída ao lesado.

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Nesse sentido, vem o arbitramento judicial, onde a própria lei, em alguns casos, manda que se recorra a ele, tendo como exemplo o artigo 950 e o artigo 953 do Código Civil, onde fica a critério do juiz a mensuração da indenização. Conforme Sergio Cavalieri Filho (2012, p. 103),

Não há, realmente, outro meio mais eficiente para se fixar o dano moral a não ser pelo arbitramento judicial. Cabe ao juiz, de acordo com o seu prudente arbítrio, atentando para a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor, estimar uma quantia a título de reparação pelo dano moral.

De nada adianta fixar indenizações astronômicas sem seguir um critério, sem analisar a situação concreta, gerando com isso, inclusive, enriquecimento sem causa. Da mesma forma não se pode menosprezar o dano suportado, uma vez que a indenização deve reparar o dano sob os critérios da justiça e de acordo com o princípio da proporcionalidade, da razoabilidade e do livre convencimento motivado.

O magistrado não é, nem deve ser, um irresponsável, que fixará a indenização pelo dano moral a seu bel-prazer. Ao contrário, deverá agir com as cautelas de sempre, examinando as circunstancias dos autos e julgando fundamentadamente (GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2012, p. 120).

Para que isso ocorra, diz a doutrina que o dano deve ser analisado sob a égide do “homem médio”, não podendo o juiz se basear nem pelo homem significativamente sensível, nem por aquele que tem um “coração de pedra”.

Aqui, também é importante o critério objetivo do homem médio, o bônus

pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do homem

excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem o homem de pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino. (VENOSA, 2011, p. 49, grifo do autor).

É graças a essa falta de critérios objetivos que a decisão do quantum indenizatório deve ser deixada nas mãos do magistrado, que deverá aplicar a justiça em cada caso concreto, baseando-se nas regras de experiência, fixando uma quantia razoável, que atenda as condições do lesado e do lesante. De acordo com Humberto Theodoro Júnior (2010, p. 39),

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