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CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS: QUEBRANDO PRECONCEITOS

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Academic year: 2021

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CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS: QUEBRANDO PRECONCEITOS

* Irene Zanette de Castañeda O objetivo deste texto é mostrar através do mundo fascinante da literatura, que a criança, a partir de 6 ou sete anos, pode aprender a quebrar “preconceitos” ou antipatias, brincando. E a contação de histórias é a forma mais agradável de brincar com a literatura tornando-a útil e agradável, também para jovens e adultos.Agradável porque encanta, fascina, motiva, sensibiliza, faz vivenciar e inspira a busca de novos mundos. Útil porque veicula valores como o respeito ao homem e à natureza, a solidariedade, a amizade, a bondade, o amor, a fraternidade.

O trabalho que faço com alunos de diversos cursos tem trazido situações angustiantes.

Trata-se de uma vivência etnográfica com práticas e impressões. É bom observar que não tomamos a palavra da criança ao pé da letra, mas lemos nos implícitos ou explícitos situações constrangedoras que chocam. São crianças de escolas públicas, carentes, que expressam seus sentimentos . As meninas ou meninos choram diante do que ouvem dos colegas.

A proposta inicial foi selecionar livros de autores consagrados da Literatura Brasileira ou não que tratam de valores e desvalores. Dos valores a serem seguidos. Dos desvalores, privilegiamos a questão dos preconceitos, que estão em todos os lugares ancorados em expressões como: a respeito da cor, que se ouve, comumente entre as crianças e adolescentes; “cabelo de bom-bril”, “pretinha”,”neguinha suja” “café – com – leite”, “loura burra”; de peso que comumente as crianças chamam umas as outras de

“gorducha”; de classe social “ “miserável”, “pobretona”, “zé ninguém”; de sexo, que pejorativamente chamam de “bicha”, “sexo frágil”, de portadores de necessidades especiais como “aleijada”, “imprestável”, “não presta para nada”; de idade: “velha coroca”, “bruxa”, “biruta”, “gagá”, ; formas de pensar: “retrógrada”, “ultrapassada”, “já era”, “o meu pensamento é o certo” o seu está fora de cogitação”; de religião: “crente”,

“pagão”; política: “ de esquerda, de direita”; diferenças físicas: “ magrela”, “tísica”.

Com um trabalho de contação que realizamos há vários anos, demonstramos que a criança, é capaz de pensar, de assimilar, de discutir temas relacionados ao seu dia- a – dia, sem dúvida, dentro de suas limitações e amadurecimento.

Tanto as crianças, os adolescentes, os jovens e os adultos podem aprender a ouvir e a contar histórias não só prazerosas pelo humor, pelo suspense, pelo mundo imaginário, mas também pela temática relacionada a vários tipos de preconceitos expressos pela antipatia ou gozação, comuns entre crianças, espelhos da família e da comunidade.

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Além de propiciarem lazer através da magia da contação, podem levar temas para um questionamento mais sério através da Literatura. Neste tipo de trabalho não se subestima a inteligência das crianças, a capacidade de pensar criticamente. Não é claro, como o olhar do adulto. Tentamos entender o olhar das crianças. Quando se trabalha com a contação, mostramos a elas e aos adolescentes que as pessoas são diferentes em certos aspectos como físicos, culturais, idiossincrásicos, porém iguais em termos de cidadania, isto é, que todas têm os mesmos direitos e deveres na sociedade. Fazemos compreenderem que é preciso respeitar as diferenças, tolerá-las para que haja harmonia e paz entre os colegas de escola, os familiares, a comunidade e o mundo. . As crianças e adolescentes compreendem que não se deve colocar apelidos pejorativos nos colegas por serem portadores de necessidades especiais auditivos ou por serem magros, gordos, índios, usarem óculos, serem de outra religião, porque podem causar traumas irreparáveis, etc.Temos proposto essa temática a partir de alguns livros da Literatura Infantil que enlaçam fantasia e realidade, de forma sutil e artística, propõem valores metaforizados através de personagens, ações e comportamentos. E, acima de tudo, através do prazer da contação de histórias.

Temos utilizado vários livros para essa finalidade. Suas histórias são lidas, adaptadas, memorizadas, contadas e discutidas. Posteriormente à leitura, abrimos espaço para conversas, no nível das crianças que expõem suas idéias com mais espontaneidade, mostrando-se mais abertas às transformações desejadas como a eliminação de preconceitos, antipatias, ou o resgate da auto-estima e a motivação à leitura. No decorrer do trabalho, os participantes recolhem muitos depoimentos sobre fatos ocorridos com familiares, vizinhos ou colegas das crianças, dos adolescentes e dos adultos. Eles retratam muito bem os resultados positivos da contação. Alguns são expressos por escrito ou através de desenhos. Quanto aos idosos do asilo, percebemos que eles querem mais contar suas histórias dramáticas do que ouvi-las, querem exorcizá-las, purificarem-se. Esse lado da contação é bastante atraente, curioso, catártico e digno de um estudo mais aprofundado. Os alunos atendidos pelo projeto ACIEPE melhoram de comportamento em relação aos colegas e às professoras, à disciplina, e o respeito se restabelece, a ordem se instaura, a motivação para a leitura torna-se constante, a procura por livros, sobretudo os das histórias contadas, torna o ambiente das bibliotecas eufórico, quando há bibliotecas.Quando não existem, os alunos fazem seus próprios livros. A expectativa para as sessões de contação exige dos professores que se atualizem

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exigência dos alunos é saudável. Os professores que adotam essa alternativa tornam-se mais queridos por seus alunos. A interação é fantástica. Dão suas aulas mais produtivas e mais felizes.

Como já foi expresso, anteriormente, os contos contados têm servido de motivação para a busca de livros, não mais didáticos, mas de Literatura nacional e internacional.

Os métodos utilizados são os mais diversos: Leitura, pesquisa, fichamento, resumo, memorização, contação , desenhos e discussão ou conversas..O curso de literatura Infanto-juvenil é fundamental para compreender-se o histórico do livro, da literatura, da família..

As pesquisas também são bastante promissoras. Buscamos em livros de Psicologia, de Ciências Sociais, filosofia, questões teóricas que nos auxiliam no aprofundamento das relações com alunos e reflexões sobre sua atitude. São feitas as mais variadas pesquisas. Dentre elas, damos importância ao o texto “O “Narrador” de Walter Benjamin, sobre o livro como brinquedo necessário para as crianças e terapia para”.

adultos; Roger Bastide.: Relações raciais entre brancos e negros em São Paulo;.

JONES, M. James. Racismo e Preconceito; .Joel Rufino dos Santos. O que é Racismo.E outros presentes na bibliografia.

Outros livros são pesquisados sobre o racismo, anti-racismo, preconceito, violência, o trabalho infantil,a ecologia , a prostituição infantil pobreza e miséria e tantos outros relacionados à vida cotidiana dos ouvintes. As pesquisas que os alunos fazem propiciam o crescimento da compreensão do ser humano na sua bidimensionalidade: ser humano e cidadão. Todos crescem intelectual e academicamente, pois adquirem-se mais conhecimentos que os ajudam a melhorar o senso crítico. Experiência profissional torna-se mais enriquecedora em contato com crianças, adolescentes e o nome da Universidade é levado para a comunidade carente como a facilitadora de projetos sociais.A experiência .ajuda os alunos a melhorarem como pessoas, na compreensão dos seus semelhantes , além de resgatarem a auto-estima, sobretudo dos mais carentes.

Consegue-se, se não eliminar os mais diversos tipos de preconceito na sua totalidade, ao menos consegue-se sua amenização gradativa, além de melhorar a disciplina.

Trata-se de um trabalho coletivo e de integração entre alunos de vários departamentos como : de Psicologia, de Pedagogia e Biblioteconomia e Educação Física, Música e Ciências Sociais, algumas vezes também com alunos das Ciências exatas. . O

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enriquecedor deste trabalho foca também a questão do intercâmbio de informações intercursos e interdisciplinares. Nesse sentido, obtemos a relevância acadêmica. .

.Enfim, faz-se uso da Literatura não só como fonte de prazer, de incentivo à leitura, mas como um instrumento transformador da sociedade. Tenta-se mostrar que ela pode também ser um meio formador de uma nova mentalidade.

A ligação da arte de contar histórias com as atividades acadêmicas ajuda muito na eliminação da timidez e no aprofundamento do conhecimento. A arte de contar Histórias não só propicia lazer, mas desperta o senso crítico dos participantes, sobretudo das crianças, pois elas passam a ser vistas como cidadãs em sua formação e criadoras de cultura. Selecionamos as histórias para serem contadas, na maioria das vezes, polêmicas e críticas. Daí a importância do trabalho não só para o Departamento de Letras, mas de outros cursos , e das escolas públicas carentes, creches e entidades assistenciais para as crianças, jovens e adultos.

A Universidade é o lugar onde se plantam essas sementes que são distribuídas para a sociedade. Neste sentido, a universidade ganha certa relevância social.

O conteúdo deste projeto propõe perspectivas de soluções para problemas graves que temos na sociedade em geral: 1) Contribuirão como sementes que se proliferam em amplos campos frutíferos no seio da sociedade. 2) Contribuirão para a formação das crianças, dos jovens e de adultos no aspecto: a) da socialização, inserindo harmonicamente, sobretudo a criança no meio social, respeitando e se fazendo respeitar;

b) do desenvolvimento individual na medida em que haverá interpretação pessoal bem estruturada, fazendo-a construir-se no seio da comunidade ; c) da educação, passando-se o conhecimento reflexivo, tornando a sociedade mais justa, solidária, fraterna e mais humana.

Os livros mais indicados são os seguintes: . Literatura Infantil de Fanny ABRAMAOVICH. ;ALMEIDA. Não me Chame de Goducha, , Fernanda Lopes de Almeida; Minha Irmã é Diferente; A princesa dos cabelos azuis e o horroroso homem dos pântanos; Não me Chame de Gorducha; A Montanha Encantada dos Pássaros Selvagens de Ruben Alves ; Como Nasceu a alegria; A menina e o Pássaro encantado;.

O Patinho feio de ANDERSEN;.. Júlio Emílio. Pretinha Eu? De Júlio Emílio Braz;

Histórias Africanas para contar e recontar de Rogério Andrade. Barbosa; A Zebra Branca de Milton Filho Camargo; Irmão negro de Walcyr Carrasco; “ Contar histórias, uma arte sem idade” de Betty Coelho; O Povo Pataxó e suas historias Vanusa Brás da

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Laço de Fita de Ana Maria Machado;. Faustino. Luana e sua turma de Arnoldo e Osvaldo Macedo; Maria Heloísa Penteado. Lúcia já vou indo; O amigo do Rei de Ruth Rocha;. O Coelhinho que não era de Páscoa R. O Dragão da Montanha;VAZ, Joaquim Mattar e João.;ZIRALDO. Um pai para o Saci; O Menino Marrom de Ziraldo.

Estes são alguns dos livros adotados para as sessões de contação. São narrativas agradáveis que deleitam o leitor e fascinam os ouvintes, além de propiciar-lhes uma calorosa conversa. Depois das sessões de contação das histórias selecionadas, as crianças, livremente são convidadas a uma conversa . Foram bastante produtivas porque elas expressam situações que ouvem dos colegas, em casa, dos irmãos, dos vizinhos.

Desenham situações constrangedoras e também sinalizam com sentimentos positivos a auto-estima,o gostar-se de si mesmo depois de ouvir as histórias como menina Bonita do laço de Fita”, por exemplo..Há maior interação entre as crianças, mudam de comportamento junto aos professores, e familiares, segundo os depoimentos.Percebemos que o trabalho há 6 anos tem servido como instrumento facilitador de socialização e de inclusão social.

.Ajudou os alunos a melhorarem como pessoas, na compreensão dos seus semelhantes, sobretudo os mais carentes. Conseguimos, se não eliminar os mais diversos tipos de preconceito, ao menos amenizá-los

.Enfim, fizemos uso da Literatura não só como fonte de prazer, de incentivo à leitura, mas como um instrumento transformador da sociedade e tentamos mostrar que ela pode também ser um meio formador de uma nova mentalidade.

* Professora de literatura Infanto-juvenil da UFSCar

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Fernanda Lopes de. Não me Chame de Goducha, São Paulo, Ática, 1993.

_______________________. Minha Irmã é Diferente. São Paulo, Ed. Ática, 1991.

________________________A princesa dos cabelos azuis e o horroroso homem dos pântanos. , Sãp Paulo, Ed. Ática, 1991.

________________________Não me Chame de Gorducha. São Paulo, Ed. Ática, 1994.

ALVES, Rubem . A Montanha Encantada dos Pássaros Selvagens. Ed. Paulus, 1987 _______________Como Nasceu a alegria. Paulus, 1997.

_______________ A menina e o Pássaro encantado. Edições Loyola,SP, 2001.

ANDERSEN. Hans Cristian. O Patinho feio. São Paulo, Ed. Ática, 1993.

BASTIDE, Roger. Relações raciais entre brancos e negros em São Paulo, UNESCO, 1955.

BENTO, Maria ap. Silva. Cidadania em Preto e Branco. São Paulo, Ática, 1996.

BENJAMIN, W. "O Narrador"im Magia e Técnica, Arte e Política, ed. Brasiliense, 1985.

BRAZ, Júlio Emílio. Pretinha Eu? Ed. Scipione, 1997.

BARBOSA, Rogério Andrade. Histórias Africanas para contar e recontar.Editora do Brasil,s/d.

CAMARGO, filho, Milton. A zebra branca. São Paulo, Ática, `987.

CÍCERO. Saber Envelhecer, LPM,1997

CARRASCO, Walcyr. Irmão negro. Sãp Paulo, Ed. Moderna, 1996.

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COELHO, Betty. Contar Histórias Uma Arte Sem Idade. Ätica,1986.

COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil. Ática, SP, 1997.

CONCEIÇÃO, Vanusa Brás da et alii. O Povo Pataxó e suas historias. Ed. Global, 1999.

CORONA, Lúcia Cerne Guimarães; Nagel Lígia Helena. Preconceitos e estereótipos em Professores e alunos. Petrópolis, Ed. Vozes, 1978.

CHIAPINI, . Invasão na Catedral, Porto Alegra, RS, Ática, 1983.

COMMELIN. P. Mitologia grega e romana. RJ, Ediouro, S/D

FRATE, Deléa. Histórias para Acordar. São Paulo, Companhia das Letrinhas, 1996.

JOSÉ, Ganymedes. A História do Galo Marquês, São Paulo, Ed. Moderna,1982.

JONES, M. James. Racismo e Preconceito. Ed. da Universidade de São Paulo.1973 LAJOLO, Marisa. Do Mundo da Leitura para a Leitura do Mundo, São Paulo, Ática, 1993 LOBATO, Monteiro. O Minotauro. Ed. Brasiliense, 1994

MACHADO, Ana Maria. Menina Bonita do laço de Fita. São Paulo, Ática, 1997.

MACEDO, Arnodo e Osvaldo. Faustino. Luana e sua turma. Ed. FTD, 1997 MASUR, Jandira. O Jogo do Contrário. São Paulo, Ed. Ática, 1990

PENTEADO, Maria Heloísa. Lúcia já vou indo. Ed. Ática, 1983 ROCHA, R. O amigo do Rei. SP Paulo, Ática, s/d

_________R. O Coelhinho que não era de Páscoa. São Paulo, Ed. Ática, 1994.

___________. R. O Dragão da Montanha. Eed. Melhoramentos, s/d SANTOS ,.Joel Rufino dos. O que é Racismo. Abril Cultura., 1984.

VAZ, Joaquim Mattar e João. O dia em que a natureza protestou. Ed. Ideal. 2000

Yamâ, Yaguarê. Puratig, O remo sagrado. São Paulo, Editora Fundação, 2001. Peirópolis. . ZIRALDO. Um pai para o Saci. Texto de livro didático.

__________ O Menino Marrom. Ed. Melhoramentos, 1991.

Obs.: Outros livros podem ser incluídos

Referências

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