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J Pneumol 26(2) – mar-abr de 2000 III AIDS e tuberculose: novo problema, velho problema

EDITORIAL

AIDS

e tuberculose: novo problema, velho problema

O início da década de 90 ressuscitou na mídia, e na literatura médica, um personagem do cenário nosológico de há muito fora do circuito. Para tal foi necessário que se aliassem, o velho e o novo, numa conjunção das mais instigantes cientificamente, porque o primeiro teria seu perfil e magnitude já definidos e, o segundo, porque nascia como uma condição clínica propiciadora de inúmeras outras doenças, em particular as de natureza infecciosa. Assim, se nos aparece como um desafio maior a associação da tuberculose à síndrome de imunodeficiência adquirida, porque o mais freqüente enlace mórbido deste fim de século.

Definida a magnitude do problema, é de se perguntar, o que se passou em termos de progresso e controle para ambas – a endemia e a epidemia –, e as razões que justificam não só sua permanência, mas a perspectiva de aumento, ambas cada vez mais marcadas pelo corte socioeconômico, no cenário mundial. As estimativas oficiais revelam cifras de 33 milhões de pessoas infectadas pelo vírus HIV, dos

quais uma terça parte está também pelo bacilo da tuberculose. Desta, 8% (500.000 pessoas) vivem na América Latina, onde se sabe que as taxas de incidência da tuberculose alcançam, em algumas áreas urbanas, como no Brasil, níveis epidemiológicos considerados pela Organização Mundial da Saúde, “de emergência”.

Responder, portanto, à esta indagação pelo veio epidemiológico tout court, mostra-se limitado. São ambas entidades de características endêmicas, passíveis de encontrar situações favorecedoras que lhes conferem, eventual e não casualmente, um caráter epidêmico, como os surtos de transmissão nocosomial de formas multirresistentes de tuberculose entre pacientes com AIDS, ocorridos em Nova York entre

91-92. O que se observa hoje na antiga União Soviética, reflete dramática e pedagogicamente, as condições em que o ciclo de transmissão da tuberculose encontra suas condições ideais: uma inacredi-tável cifra de um milhão de pessoas presas, em condições carcerárias precaríssimas, das quais 10% são portadoras de tuberculose ativa e, destas, 40%, apresentam formas resistentes às drogas disponíveis (mais de 40.000 pessoas com tuberculose multirresistente!!). A diferença está na conduta: o primeiro fenômeno, por si só, causou alarme nacional e justificou imensos investimentos por parte da saúde pública norte americana, resultando num declínio de 31% no número de casos de tuberculose registra-dos nos EU, entre 93 e 98. Face ao desmantelamento soviético e seus caos social, onde se chega ao

tráfico de escarro contaminado para auto-infecção por tuberculose, com a finalidade de se obter bene-fícios sociais e aposentadoria por invalidez, a situação torna-se ameaça real para a Europa, e, resta saber quais medidas serão tomadas e quem o fará, para controlar o problema.

Em relação à tuberculose, como doença sabidamente prevenível, facilmente diagnosticável, tratável e curável, poder-se-ia dizer que o conhecimento alcançado, se não é suficiente, é, pelo menos, muito eficaz quando bem aplicado: a vacina BCG protege crianças e não infectados quanto às formas

dissemi-nadas, a quimioprofilaxia protege os infectados contra a progressão para a doença e, os medicamentos existentes demonstram alto poder terapêutico.

Por outro lado, a AIDS, com o advento dos novos antivirais, evolui com drástica redução no número

de hospitalizações e de mortes. Os substantivos avanços terapêuticos permitiram, sobretudo, a recons-tituição da imunidade, resultando em sobrevida maior e melhores desfechos nos tratamentos das doen-ças infecciosas. A velocidade do conhecimento neste campo traz como uma das grandes questões atuais, o momento e sob qual situação imunológica se poderia interromper a profilaxia de doenças, em particular, as que atingem o aparelho respiratório, como a Pneumocistose e a Tuberculose. Neste aspecto o Brasil vem conseguindo avanços consideráveis, com o provimento governamental dos antivirais, já resultando em impacto sobre o número de hospitalizações e de mortes por AIDS no país.

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Dalcolmo MP

IV J Pneumol 26(2) – mar-abr de 2000

Há que se evitar a simplificação do que encerra uma complexidade multicausal, e, nesse sentido, o conceito de medicação diretamente observada – DOT (directly observed therapy), como chamado pela OMS, seguramente não será uma resposta mágica aos problemas relacionados à tuberculose, como

altas taxas de abandono de tratamento, irregularidade na tomada dos medicamentos, esquemas tera-pêuticos mal administrados, todos geradores de resistência progressiva aos medicamentos. Sua aplica-ção normativa nada mais representa do que assistência adequada a uma pessoa que procure um serviço de saúde com queixas sugestivas de tuberculose, para o diagnóstico e tratamento de sua doen-ça. Em outras palavras, ingerir remédios, diariamente, por seis meses, considerando uma melhora clínica relativamente rápida proporcionada pelo tratamento, mesmo nos pacientes com AIDS, exige, da

parte de quem prescreve e assiste, uma atenção permanente, pessoal, humanizada e, de abordagem multidisciplinar.

As grandes endemias passam deste ao próximo século, em sua maior parte, incólumes, e, neste aspecto, o Brasil dos grandes contrastes, o país que processa tecnologia de ponta em diversas áreas, que realiza cerca de 40.000 cirurgias cardíacas ao ano, que erradicou a poliomielite, é o mesmo que assiste, silente e grotescamente, o dilapidamento de seu sistema básico de saúde, computando, ano após ano, as cifras espantosas de incidência, umas mais, outras menos aparentes, na dependência de quem atinge, de doenças infecto-contagiosas.

Vale o registro de que são os próprios órgãos governamentais que mostram o quanto se alargou a distância entre os que tem mais e os que tem menos, não nos permitindo nenhum otimismo neste fim de década, tão peculiar por sua carga simbólica de fim de século e de milênio. Nosso compromisso, é mais que nunca, atentar para que a anestesia cívica não nos contamine, assegurar que os investimentos em pesquisa se incrementem, e, para que o conhecimento acumulado seja aplicado adequadamente.

MARGARETH PRETTI DALCOLMO

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J Pneumol 26(2) – mar-abr de 2000 V AIDS e tuberculose: novo problema, velho problema

AIDS

e tuberculose: novo problema, velho problema

O início da década de 90 ressuscitou na mídia, e na literatura médica, um personagem do cenário nosológico de há muito fora do circuito. Para tal foi necessário que se aliassem o velho e o novo, numa conjunção das mais ins-tigantes cientificamente, porque o primeiro teria seu per-fil e magnitude já definidos e, o segundo, porque nascia como uma condição clínica propiciadora de inúmeras ou-tras doenças, em particular as de natureza infecciosa. As-sim, se nos aparece como um desafio maior a associação da tuberculose à síndrome de imunodeficiência adquirida, porque o mais freqüente enlace mórbido deste fim de sé-culo.

Definida a magnitude do problema, é de se perguntar o que se passou em termos de progresso e controle para ambas – a endemia e a epidemia –, e as razões que justi-ficam não só sua permanência, mas a perspectiva de au-mento, ambas cada vez mais marcadas pelo corte socioe-conômico, no cenário mundial. As estimativas oficiais re-velam cifras de 33 milhões de pessoas infectadas pelo vírus HIV, dos quais uma terça parte está também pelo

bacilo da tuberculose. Desta, 8% (500.000 pessoas) vi-vem na América Latina, onde se sabe que as taxas de incidência da tuberculose alcançam, em algumas áreas urbanas, como no Brasil, níveis epidemiológicos conside-rados pela Organização Mundial da Saúde “de emergên-cia”.

Responder, portanto, a esta indagação pelo veio epide-miológico tout court mostra-se limitado. São ambas enti-dades de características endêmicas, passíveis de encon-trar situações favorecedoras que lhes conferem, eventual e não casualmente, um caráter epidêmico, como os sur-tos de transmissão nosocomial de formas multirresisten-tes de tuberculose entre pacienmultirresisten-tes com AIDS, ocorridos

em Nova York em 91-92. O que se observa hoje na anti-ga União Soviética reflete, dramática e pedagogicamen-te, o meio em que o ciclo de transmissão da tuberculose encontra suas condições ideais: uma inacreditável cifra de um milhão de pessoas presas, em situação carcerária precaríssima, das quais 10% são portadoras de tuberculo-se ativa e, destas, 40% apretuberculo-sentam formas resistentes às drogas disponíveis (mais de 40.000 pessoas com tubercu-lose multirresistente!!). A diferença está na conduta: o primeiro fenômeno, por si só, causou alarma nacional e justificou imensos investimentos por parte da saúde públi-ca norte-ameripúbli-cana, resultando num declínio de 31% no número de casos de tuberculose registrados nos EUA,

en-tre 93 e 98. Em face do desmantelamento soviético e seu caos social, onde se chega ao tráfico de escarro

contami-nado para auto-infecção por tuberculose, com a finalida-de finalida-de obter benefícios sociais e aposentadoria por invali-dez, a situação torna-se ameaça real para a Europa e res-ta saber quais medidas serão tomadas e quem o fará para controlar o problema.

Em relação à tuberculose, como doença sabidamente prevenível, facilmente diagnosticável, tratável e curável, poder-se-ia dizer que o conhecimento alcançado, se não é suficiente, é, pelo menos, muito eficaz quando bem apli-cado: a vacina BCG protege crianças e não infectados

quan-to às formas disseminadas, a quimioprofilaxia protege os infectados contra a progressão para a doença e os medi-camentos existentes demonstram alto poder terapêutico. Por outro lado, a AIDS, com o advento dos novos

antivi-rais, evolui com drástica redução no número de hospitali-zações e de mortes. Os substantivos avanços terapêuticos permitiram, sobretudo, a reconstituição da imunidade, re-sultando em sobrevida maior e melhores desfechos nos tratamentos das doenças infecciosas. A velocidade do co-nhecimento neste campo traz, como uma das grandes ques-tões atuais, o momento e sob qual situação imunológica se poderia interromper a profilaxia de doenças, em parti-cular as que atingem o aparelho respiratório, como a pneu-mocistose e a tuberculose. Neste aspecto o Brasil vem conseguindo avanços consideráveis, com o provimento go-vernamental dos antivirais, já resultando em impacto so-bre o número de hospitalizações e de mortes por AIDS no

país.

Neste contexto, reaparecem as formas de tuberculose resistentes a múltiplas drogas. Por que razão, uma doen-ça para a qual se dispõe de medidas de prevenção e trata-mento, que é virtualmente curável, em sua quase totalida-de totalida-de casos, vem totalida-desafiando a medicina, atingindo, totalida-de acordo com os estudos publicados no Brasil e em outros países, pessoas entre as terceira e quarta décadas de vida, portanto, em sua fase mais produtiva e reproduzindo o perfil epidemiológico da tuberculose em geral?

Há que se evitar a simplificação do que encerra uma complexidade multicausal e, nesse sentido, o conceito de medicação diretamente observada – DOT (directly observ-ed therapy), como chamado pela OMS, seguramente não

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Dalcolmo MP

VI J Pneumol 26(2) – mar-abr de 2000

quada a uma pessoa que procure um serviço de saúde com queixas sugestivas de tuberculose, para o diagnóstico e tratamento de sua doença. Em outras palavras, ingerir remédios, diariamente, por seis meses, considerando uma melhora clínica relativamente rápida proporcionada pelo tratamento, mesmo nos pacientes com AIDS, exige, da

parte de quem prescreve e assiste, uma atenção perma-nente, pessoal, humanizada e de abordagem multidiscipli-nar.

As grandes endemias passam deste ao próximo século, em sua maior parte, incólumes e, neste aspecto, o Brasil dos grandes contrastes, o país que processa tecnologia de ponta em diversas áreas, que realiza cerca de 40.000 ci-rurgias cardíacas ao ano, que erradicou a poliomielite, é o

mesmo que assiste, silente e grotescamente, ao dilapida-mento de seu sistema básico de saúde, computando, ano após ano, as cifras espantosas de incidência, umas mais, outras menos aparentes, na dependência de quem atinge, de doenças infecto-contagiosas.

Vale o registro de que são os próprios órgãos governa-mentais que mostram o quanto se alargou a distância en-tre os que têm mais e os que têm menos, não nos permi-tindo nenhum otimismo neste fim de década, tão peculiar por sua carga simbólica de fim de século e de milênio. Nosso compromisso é, mais que nunca, atentar para que a anestesia cívica não nos contamine, assegurar que os investimentos em pesquisa se incrementem e para que o conhecimento acumulado seja aplicado adequadamente.

MARGARETH PRETTI DALCOLMO

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