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EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NOS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” (2011 – 2012): ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DA REDE MUNICIPAL DE SANTO ANDRÉ MESTRADO EM EDUCAÇÃO

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Texto

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC – SP

REGINA MARIA DA SILVA

EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NOS CADERNOS DIDÁTICOS

“FORMADORES DO SABER” (2011 – 2012): ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DA REDE MUNICIPAL DE SANTO ANDRÉ

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

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REGINA MARIA DA SILVA

EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NOS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” (2011 – 2012): ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DA

REDE MUNICIPAL DE SANTO ANDRÉ

Mestrado em Educação

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Educação: História, Política, Sociedade, sob a orientação da Prof.ª Dra. Helenice Ciampi

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Banca Examinadora

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ERRATA

SILVA, Regina Maria da. 2014. Educação das Relações Étnico-Raciais Nos Cadernos Didáticos “Formadores Do Saber” (2011 – 2012): Análise Da Experiência Da Rede Municipal De Santo André. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: PUC/SP – Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade.

Página Linha Excluir

9 19 2.2 Políticas

educacionais no estado neoliberal

Página Parágrafo Linha Onde se lê Leia-se 9

11 16 1 á à

12 22 1 Ruben

Valetim Valentim Rubem

19 1 2 ás às

56 7 1 ano 1983

70 2 23 à a

133, 134, 135, 136, 137 e

138

Fonte da figura ADRÉ ANDRÉ

136 3 1 Afro-brasileiro Afro-brasileira

137 1 1 Rubem

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DEDICATÓRIA

Iwin–Igi (O espírito da árvore) – Mestre Didi Acervo do Museu de Arte Moderna da Bahia

“Essa é a melhor alegoria que conheço do contador de histórias. Nós contamos histórias para não morrer. Todo professor de história é uma Sheherazade [...]. Pois a

verdade, se há, é essa: a alma da história são as histórias”. Joel Rufino dos Santos

“A nossa escrevivência não pode ser lida como histórias para ‘ninar os da casa grande’ e sim para incomodá-los em seus sonos injustos”

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AGRADECIMENTOS

Todo grande projeto só se concretiza com a participação e contribuição direta e indireta de muitas pessoas.

Assim, agradeço a Deus, aos Orixás e a todos os elementos de luz que me protegeram e ampararam nos momentos mais difíceis, me mantiveram firme mesmo nas situações de grande angústia e dificuldade!

Agradeço aos meus pais que, à sua maneira, foram um alicerce primordial, ajudando no que podiam, mesmo sem entender direito o porque de me enveredar nestas trilhas tão tortuosas, perdendo horas de sono e me alimentando tão mal na reta final e relevando a luz acesa madrugada afora!

Agradeço aos professores do EHPS: Profª. Dra Alda Junqueira Marin, Prof. Dr. Carlos Antonio Giovinazzo Júnior, Prof. Dr. José Geraldo Silveira Bueno, Prof. Dr. Kazumi Munakata, Profª. Dra. Circe Maria Fernandes Bittencourt e Profª. Dra. Helenice Ciampi.

Ao meu amor Jomo, companheiro das horas boas e ruins, responsável por me motivar, divertir, acolher e ajudar com o Abstract.

A estas duas últimas o agradecimento será duplo: à Profª. Dra. Circe Bittencourt por aceitar participar do Exame de Qualificação com a Profª. Dra. Patrícia Teixeira Santos (UNIFESP), no qual, ambas analisaram o texto com rigor e fizeram apontamentos pertinentes que ressignificaram a pesquisa!

À Profª Dra. Helenice Ciampi por assumir o compromisso de ser minha orientadora e auxiliar nesta caminhada, com olhar minucioso e rigoroso para minhas escritas!

Não tenho como não agradecer à Betinha, que se envolve com cada aluno, se preocupa e vibra por cada etapa cumprida!

Agradeço aos colegas do programa com os quais pouco me socializei fora da sala de aula, lanchonete ou copiadora por estar sempre correndo, mas que foram atenciosos, solícitos e incentivadores e, quem sabe, poderemos nos conhecer e encontrar mais após a conclusão desta etapa de nossa formação!

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SILVA, Regina Maria da. 2014. Educação das Relações Étnico-Raciais Nos

Cadernos Didáticos “Formadores Do Saber” (2011 – 2012): Análise Da Experiência Da Rede Municipal De Santo André. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: PUC/SP – Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade.

RESUMO

Esta pesquisa tem por escopo a investigação da abordagem das relações étnico-raciais nos cadernos didáticos utilizados pela rede municipal de Santo André, “Formadores do Saber” (2011-2012), tendo como principais fontes: a Lei nº 10.639/03 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas (DCNERER). A pesquisa considera o contexto educacional do município de Santo André - SP que desenvolveu um material didático próprio em parceria com o Centro Universitário Fundação Santo André (CUFSA). O problema central da pesquisa é analisar como os conteúdos de Arte, História do Brasil e Literatura, respondem às questões colocadas pela Lei nº 10.639/03. Tem como hipótese que os cadernos didáticos “Formadores do Saber” apresentam conteúdos relacionados à lei 10.639/03 com possíveis dificuldades no trato do conteúdo de modo a atender aos objetivos das DCENERER. Os principais referenciais teóricos são: Ivor Goodson (1998; 2001), Circe Maria Fernandes Bittencourt (2009), Kabengele Munanga (1995; 1996; 1999), Nilma Lino Gomes (2001; 2007; 2011) e Antonio Sergio Alfredo Guimarães (2005). Para atingir o objetivo, a metodologia aplicada foi a análise do conteúdo em busca dos elementos que demonstrem a abordagem da questão étnico-racial. Avaliou-se que o Ensino de História e Arte foi trabalhado de modo integrado, mas somente no 4º ano. Do 1º ao 3º ano, os conteúdos enfatizam a valorização da identidade. Em Literatura, há um número significativo de obras africanas do 2º ao 5º ano, mas se notou a ausência de escritores afro-brasileiros.

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SILVA, Regina Maria da. 2014. Education of Racial-Ethnic Relations In Didactic Books of "Formadores do Saber" (2011 - 2012): Analysis From the Experiment in Santo André County. Dissertation (Education Master's). São Paulo: PUC/SP - Program of Postgraduate Studies in Education: History, Politics, Society.

ABSTRACT

The Scope of this research is to investigate the approach of ethnic-racial relations in didactic books used by the Santo André County, "Formadores do Saber" (2011- 2012), whose main sources are: Law No. 10.639/03 and Guidelines National Curriculum for the Education of Racial-Ethnic and Teaching of History and Afro-Brazilian and African relations (DCNERER). The research considers the educational context of the municipality of Santo André - SP that has developed its own educational materials in partnership with the Centro Universitário Fundação Santo André (CUFSA). The central research problem is how to analyze the contents of Art, History and Brazilian Literature, respond to questions raised by Law No. 10.639/03. Have hypothesized that didactic books "Formadores do Saber" feature content related to the law 10.639/03 possible difficulties in dealing with the content in order to meet the objectives of DCENERER. The main theoretical frameworks are: Ivor Goodson (1998, 2001), Circe Maria Fernandes Bittencourt (2009), Kabengele Munanga (1995, 1996, 1999), Nilma Lino Gomes (2001, 2007, 2011) and Antonio Sergio Alfredo Guimarães (2005). To achieve the goal, the methodology was applied content analysis in search of evidence of the approach of ethno-racial issue. Evaluate the Teaching of History and Art were worked in an integrated manner, but only in 4th grade. 1st to 3rd year, the contents emphasize the development of identity. In literature, there are a significant number of African works from the 2nd to 5th year, but note the absence of african-Brazilian writers.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 14

1 CURRÍCULO, RACISMO, PRECONCEITO ... 43

1.1 O CURRÍCULO COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL ... 43

1.2 O MULTICULTURALISMO E A INTERCULTURALIDADE COMO ABORDAGENS DA DIVERSIDADE ... 49

1.3 RACISMO, PRECONCEITO E SUAS MANIFESTAÇÕES NA EDUCAÇÃO ... 53

1.4 LEI Nº 10.639/03 E AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRAS E AFRICANAS 60 2 SANTO ANDRÉ E OS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” ... 68

2.1 O MUNICÍPIO DE SANTO ANDRÉ ... 68

2.2 A REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE SANTO ANDRÉ ... 71

2.3 OS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” ... 75

2.4 MATERIAIS DIDÁTICOS: LIVROS E SISTEMAS APOSTILADOS OU ESTRUTURADOS ... 80

2.2 POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO ESTADO NEOLIBERAL ... 46

3 O ENSINO DE ARTE, HISTÓRIA E LITERATURA E A LEI 10.639/03 NOS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” ... 95

3.1 A MATERIALIDADE DOS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” ... 95

3.2 ENSINO DE HISTÓRIA E EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NOS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” .. 100

3.3 ENSINO DE ARTE E EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NOS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” ... 127

3.4 LITERATURA E EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NOS CADERNOS DIDÁTICOS “FORMADORES DO SABER” ... 138

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 153

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 162

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LISTA DE ABREVIATURAS

ABC Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra

ANPEd Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior CEFAM Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério CESA Centro Educacional de Santo André

CNE Conselho Nacional de Educação

COGEAE Coordenadoria Geral de Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão

CPEJA Centro Público de Educação de Jovens e Adultos CUFSA Centro Universitário Fundação Santo André DCN Diretrizes Curriculares Nacionais

DCNERER Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana

DEIEF Departamento de Educação Infantil e Ensino Fundamental DEJA Departamento de Educação de Jovens e Adultos

EHPS Educação: História, Política, Sociedade EJA Educação de Jovens e Adultos

EMEIEF Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental FNB Frente Negra Brasileira

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDH Índice de Desenvolvimento Humano

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC Ministério da Educação

MG Minas Gerais

MS Mato Grosso do Sul

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PCN Parâmetros Curriculares Nacionais PNLD Programa Nacional do Livro Didático PT Partido dos Trabalhadores

PTB Partido Trabalhista Brasileiro

PUC/SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

SARESP Sistema de Avaliação de Rendimento do Estado de São Paulo SC Santa Catarina

SECADI Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão

SEPPIR Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial TEN Teatro Experimental do Negro

UFABC Universidade Federal do ABC

UFJF Universidade Federal de Juiz de Fora UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UFPB Universidade Federal da Paraíba UFPR Universidade Federal do Paraná

UFRPE Universidade Federal Rural de Pernambuco UFSC Universidade Federal de Santa Catarina UFSCar Universidade Federal de São Carlos UnB Universidade de Brasília

UNESP Universidade Estadual Paulista

UNIOSTE Universidade Estadual do Oeste do Paraná UNISO Universidade de Sorocaba

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Modelo de Capa dos Cadernos Didáticos “Formadores do

Saber” ... 97

Figura 2 Modelo de Folha de Rosto dos Cadernos Didáticos “Formadores do Saber” ... 97

Figura 3 Modelo de Capa Interna dos Cadernos Didáticos “Formadores do Saber” ... 98

Figura 4 Sequência Didática sobre o nome introduzindo a noção de nacionalidade ... 106

Figura 5 Atividade “Eu sou assim...” para identificação de características pessoais dos alunos ... 107

Figura 6 Atividade - Desenhe suas características ... 107

Figura 7 Atividade – Observar e escrever sobre os colegas de turma ... 108

Figura 8 Conhecendo outras famílias ... 108

Figura 9 Lugares diferentes, escolas diferentes - 3º Bimestre - 2º ano .. 109

Figura 10 Pintura “Uma senhora brasileira em seu lar” J. B. Debret - 1º Bimestre - 3º ano ... 109

Figura 11 Atividade sobre as condições infantis ... 112

Figura 12 Um país, vários povos: o negro - 2º Bimestre - 4º ano ... 112

Figura 13 Poema “O Brasil Poético” ... 114

Figura 14 Atividade sobre o Poema “O Brasil Poético” ... 114

Figura 15 Colonização brasileira e africana pelos portugueses ... 115

Figura 16 Mapa da África anterior á chegada dos portugueses ... 115

Figura 17 Atividade de Leitura de um mapa de continente africano ... 116

Figura 18 Atividade de pesquisa de um mapa do continente africano ... 116

Figura 19 Informativo sobre o deserto do Saara ... 117

Figura 20 A África pré-colonial ... 117

Figura 21 Continuação do conteúdo: África pré-colonial ... 118

Figura 22 Migração da humanidade a partir do continente africano ... 118

Figura 23 Pré-História África ... 119

Figura 24 Saiba mais sobre o continente africano ... 119

(14)

Figura 26 Os nobres da Região da Bacia do Congo ... 120

Figura 27 Algo sobre os reinos africanos ... 121

Figura 28 Saiba mais sobre os sudaneses ... 121

Figura 29 O desenvolvimento dos sudaneses ... 122

Figura 30 Anexos para realização das anteriores ... 122

Figura 31 Conteúdos do 3º Bimestre: o escravizado ... 123

Figura 32 Saiba mais sobre o contexto do tráfico de escravos ... 123

Figura 33 Viagem dos escravos da África ao Brasil ... 124

Figura 34 Trabalho “escravo” em terras brasileiras ... 124

Figura 35 Alimentos oferecidos aos escravizados ... 125

Figura 36 Castigos Físicos e exemplos de alguns instrumentos ... 125

Figura 37 Pesquisa sobre os Quilombos dos Palmares ... 126

Figura 38 Análise sobre os remanescentes de quilombos no Brasil ... 126

Figura 39 Indique no mapa as áreas com maior número de remanescentes ... 126

Figura 40 Corpo e Arte ... 133

Figura 41 Percepção do corpo ... 133

Figura 42 Romero Brito ... 134

Figura 43 Di Cavalcanti ... 134

Figura 44 Instrumento Musical “Djembê” ... 135

Figura 45 Máscaras Africanas ... 135

Figura 46 Cultura Afro-Brasileira ... 136

Figura 47 Ruben Valetim ... 137

Figura 48 Auxílio na compreensão da Cultura Afro-brasileira ... 138

Figura 49 Um Conto Africano ... 143

Figura 50 Uma Narrativa Africana: As duas mulheres e o Céu ... 144

Figura 51 A lenda gaúcha: O Negrinho do Pastoreio ... 145

Figura 52 Resenha do livro Menina Bonita do Laço de Fita ... 147

Figura 53 Um conto estrangeiro ... 148

Figura 54 Compreendendo o texto ... 149

Figura 55 Ibejis, os gêmeos ... 150

Figura 56 Interpretação do Texto “Ibejis, os gêmeos” ... 150

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(16)

INTRODUÇÃO

Há algum tempo tenho investigado de forma crítica minha experiência como estudante desde a Educação Infantil até o Ensino Médio em escolas públicas. Essa reflexão foi enriquecida pela inserção, na adolescência, em movimentos sociais e culturais, revelando uma história de angústia, solidão, silêncio e subestimação pelo fato de sofrer discriminação racial. Eu não sabia expressar o que sentia e, ao mesmo tempo, não compreendia o porquê de muitas pessoas agirem diferente devido à cor da minha pele, porém, essa autoidentificação e autoconhecimento não aconteceram sem dor. Com orgulho da figura projetada no espelho e buscando compreender mais sobre essas questões, comecei a fazer aulas de capoeira, onde além dos movimentos, aprendia a história de luta e resistência dos negros enquanto escravos e suas manifestações culturais. Participei, também, do Grupo Folclórico Raízes Negras no qual, coordenados pelo Padre André Imolu Babaya1 (in memoriam), missionário comboniano2 da República Democrática do Congo desenvolvíamos atividades de leitura e discussões para desenvolvimento de nossa identidade cultural, resgatando danças de origem africana e fazendo apresentações para difundir o que aprendíamos.

Como professora na Educação Infantil e no Ensino Fundamental I em escolas públicas municipais do Grande ABC3 constatei que outras tantas crianças negras passam continuamente pela mesma situação: seja pela omissão ou pela ação, o preconceito, a discriminação e o racismo estão presentes nas salas de aula, nos educadores, nos educandos, no material didático, nos conteúdos desenvolvidos.

Desde a infância, eu, uma garotinha de quatro anos que aprendeu a ler e a escrever com a mãe, desejava ser professora. E esse desejo persistiu. Persistiu tanto que ingressei no Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento do

1 André Imolu Babaya nasceu na cidade de Kisangani, Congo, estudou Filosofia e foi ordenado diácono quando atuou no Episcopado de São Paulo – SP, onde estudou Teologia e desenvolveu o trabalho com jovens negros no Grupo Folclórico Raízes Negras.

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Magistério (CEFAM), onde estudei de 1997 a 2000 e graduei-me em Ciências Sociais (2006) e Pedagogia (2011), com a intenção de ser uma professora diferente das que tive, oferecendo qualidade para uma educação libertadora, no sentido atribuído por Paulo Freire. No entanto, essa educadora que estou sendo, encontrou e ainda encontra muitos obstáculos, mas nunca deixou de acreditar que a Educação sozinha não pode muito, porém, sem ela, pouco se concretiza de transformação social, como ensinou Paulo Freire.

Em minha formação como cientista social e pedagoga percebo, corroborada por falas e discursos de outros (as) educadores (as), que ainda não houve a implementação da lei 10.639/2003. Contudo, pergunto-me: esperar até quando? Pelo quê? Quantos indivíduos terão de passar pelo que passei até que a educação transformadora de que falamos comece a transformar algo de fato? Não há como ficar esperando por essas respostas; portanto, deparo-me com muitas questões a serem respondidas e compreendidas e que pretendo continuar investigando a partir desta pesquisa, com seres reais, sujeitos do processo de ensino e aprendizagem, educadores e educadoras, educandos e educandas. Digo continuar investigando porque a lei 10.639/03 já foi meu foco de pesquisa no curso de Especialização que fiz pela Coordenadoria Geral de Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (COGEAE/PUC-SP) em 2007 e 2008, que resultou em uma monografia intitulada “Pedagogia do Silêncio: os entraves à implementação da lei 10.639/03 em uma escola municipal de Ensino Fundamental I de Santo André”, sob orientação da Profª Dra. Elisa Maria Cordeiro da Paixão.

Muitas redes de ensino ainda encontram dificuldades para o atendimento da referida lei. Os cursos de formação de professores, de modo geral, ainda não reformularam o seu currículo e os educadores e educadoras atuantes, em muitos casos, não recebem a formação adequada em serviço. Pouco tem sido feito além de ações isoladas ou pontuais, como em datas comemorativas (13 de maio – Dia da Abolição da Escravatura ou 20 de novembro – Dia da Consciência Negra). Entretanto, a grande preocupação é de que haja investimento em ações ao longo do ano letivo articuladas aos conteúdos das diferentes áreas do conhecimento.

E a pergunta que paira: como os professores abordam o problema? Eis que por força de uma Lei, a de nº 10.639/034, obriga-se o ensino de História e Cultura

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Afro-Brasileiras e Africanas. Minha preocupação aumenta a cada dia, pois são milhões de indivíduos a quem estão sendo negados direitos fundamentais previstos na legislação brasileira, e o conhecimento e valorização de sua história e cultura podem ser imprescindíveis para atuação no combate ao racismo.

Como o município de Santo André, onde nasci, moro e trabalho, adotou no 1º bimestre de 2011 um conjunto de cadernos didáticos próprios para o Ensino Fundamental I, tenho a intenção de, nesta pesquisa para obtenção do título de Mestre em Educação, investigar como se articulam seus conteúdos nas áreas de Arte, História do Brasil e Literatura, apontadas como prioritárias no atendimento à lei 10.639/03 com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas (DCNERER), possibilitando uma atuação mais consistente sobre o tema como professora e pesquisadora, respectivamente, na rede municipal de Santo André e no coletivo de estudos e intervenção política Kilombagem5.

CONTEXTO DA PESQUISA

Na atual perspectiva social e histórica, a globalização apresenta um cenário de aproximação de diferentes culturas e povos, mas, ao mesmo tempo, facilita o ressurgimento de sentimentos e movimentos racistas adormecidos (xenofobia, políticas anti-imigração) e o acirramento dos já existentes. No caso brasileiro, vemos as políticas de ação afirmativa, como as cotas raciais nas universidades e concursos públicos provocando polêmicas sobre o racismo às avessas, como se qualquer medida tomada para minimizar as diferenças entre brancos e negros fosse vista como privilégio destes sobre aqueles. Entretanto, no Brasil, temos um quadro de abismo entre brancos e negros nos indicadores sociais em relação aos aspectos educacionais:

março de 2008, nova alteração, originando a lei 11.645/08, prevê a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, porém, a pesquisa abordará somente os temas e diretrizes pertinentes à lei de 2003.

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• a taxa de analfabetismo entre pessoas acima de 15 anos era de 17,3% entre os negros e de 7,5% entre brancos em 2002. Em 2012, o índice ficou em 5,3% entre os brancos e 11,8% entre os negros (IBGE, 2012);

• a população de 18 a 24 anos cursando o Ensino Fundamental (modalidade não adequada à idade) aparece com 2,6% de brancos e 9,0% de negros, no Ensino Médio, 23,7% de brancos e 44,2% de negros (IBGE, 2012);

• a média de anos de estudos da população acima de 25 anos entre os brancos era de 7 anos e para negros era de 4,9 anos em 2002. Em 2012, esse índice foi de 8,5 anos para os brancos e 6,7 para negros (IBGE, 2012). Ou seja, o índice atingido por negros em 2012 ainda é inferior ao atingido por brancos em 2002; • em 2012, em relação ao acesso ao ensino superior, 66,6% dos brancos e 37,4% de pretos e pardos cursavam essa modalidade entre os 18 e 24 anos (IBGE, 2012). Em 2002, dez anos antes, o índice de brancos no ensino superior já era de 43,4%, superior ao patamar atingido pelos negros (pretos e pardos) em 20126.

Esse quadro está presente em uma população de 196,9 milhões de pessoas, sendo 46,2% de brancos e 52,9% de negros (pretos e pardos). A disparidade entre negros e brancos nestes indicadores nos mostra que o racismo produz consequências perversas no que tange à educação e, sem dúvida, o mesmo é expresso em outros indicadores sociais.

LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO E REFERENCIAL TEÓRICO

Para desenvolvimento e elaboração do presente estudo fez-se um levantamento sobre o tema: Educação das Relações Étnico-Raciais, no qual se localizou sites, artigos, teses e dissertações de significativa relevância. Assim, é importante apresentar uma síntese do que foi pesquisado sobre a temática, no contexto após a promulgação da Lei nº 10.639/03, até mesmo para direcionar este trabalho. Apresentam-se, a seguir, dois grupos de resultados desse levantamento. O primeiro reúne os sites, de modo geral, ligados a entidades, movimentos negros e instituições como organizações não governamentais e fundações, que apresentam discussões sobre Educação das Relações Étnico-Raciais com textos mais

6 Dados da Síntese de Indicadores Sociais

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acessíveis ao grande público. O segundo compreende artigos, dissertações e teses, compilando trabalhos acadêmicos de pesquisas recentes, utilizando o ano de 2003 como início do recorte temporal devido à assinatura da Lei.

No primeiro grupo, tem-se:

- O Portal Geledés7 (Movimento de Mulheres Negras) apresenta artigos sobre as Leis 10.639/03 (História e Cultura Afro-Brasileira) e 11.645/08 (História e Cultura Indígena), com relatos de experiências educativas de sucesso, novidades do meio editorial e, mais recentemente, uma seção destinada à divulgação de planos de aula com sugestão de conteúdos e metodologias para o trabalho com as referidas leis;

- O site do Projeto A Cor da Cultura8, da Fundação Roberto Marinho, apresenta um material, resultado de um programa de formação de educadores que percorre os municípios do país, realizando parcerias com as Secretarias Municipais de Educação para a implementação da Lei. Além disso, periodicamente, são publicados artigos que discutem o papel do negro nas áreas social, política, econômica e cultural na sociedade brasileira e a importância da África no desenvolvimento tecnológico universal da humanidade;

- O Portal do 9 Ministério da Educação (MEC), além da legislação e das novidades das ações e projetos do ministério, disponibiliza para pesquisa e download materiais de apoio10 referentes às leis 10.639/03 e 11.645/08 a professores e gestores, como a produção da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI);

- As revistas de grande circulação, a Nova Escola11 (Editora Abril) e a Raça Brasil (Editora Scala), eventualmente trazem matérias sobre educação das relações

7 O Portal Geledés (<www.geledes.org.br>) contém matérias referentes às conquistas e desafios da mulher negra, atividades de expressão da cultura negra (música, teatro, artes visuais, dança, etc.) pouco veiculadas em outros meios de comunicação e traz discussões sobre ações afirmativas, como as cotas nas universidades, a participação dos negros no cenário político, social, econômico e cultural e notícias do mercado de trabalho.

8 O Projeto A Cor da Cultura produziu um material de apoio com livros, vídeos, jogos e brincadeiras que resgatam a história e a cultura afro-brasileiras e africanas que cada Unidade Escolar recebe após a formação. O conteúdo pode ser utilizado por professores da Educação Básica, pois boa parte fica disponível para pesquisa e download no endereço: <www.acordacultura.org.br>

9 <www.portalmec.gov.br> 10

Os documentos “Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino de História e Cultura Afro -Brasileiras e Africanas e a Educação das Relações Étnico-Raciais” (parecer do Conselho Nacional de Educação), “Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais” e a Coleção Educação para Todos, que inclui o livro “Educação Antirracista: caminhos abertos pela Lei Federal nº

10.639/03” e materiais sobre Educação Indígena e Quilombola fazem parte dos arquivos do Portal MEC.

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étnico-raciais. Na revista Nova Escola o tema é apresentado somente em meses pontuais como abril (sobre o indígena) e novembro (ás vezes, também em maio, sobre o negro). Isto indica que a revista parte da concepção de que essa temática deve ser trabalhada de maneira fragmentada e pontual e não integrada ao currículo escolar. A revista Raça Brasil12 aborda o tema da educação das relações étnico-raciais esporadicamente e quando aparece há menções à Lei 10.639/03, às iniciativas governamentais, institucionais e a valorização de pessoas de referência na área, professores e pesquisadores.

O segundo grupo do levantamento traz artigos acadêmicos, teses e dissertações. No levantamento realizado no site Scientific Electronic Library Online (Scielo) percebe-se um acervo de artigos sobre Educação das Relações Étnico-Raciais, mas a análise de materiais didáticos aparece em poucas produções, geralmente na perspectiva da imagem dos negros, estereotipados e estigmatizados. Os artigos encontrados mais relevantes foram:

- “Cultura Negra e Educação”, de Nilma Lino Gomes (Universidade Federal de

Minas Gerais - UFMG), de 2003, traz uma discussão com base na concepção de cultura de Clifford Geertz: nas especificidades culturais de cada povo se encontra a essência humana. Entretanto, para Gomes, com a cultura negra ocorreu uma hierarquização e desqualificação, sendo a escola, um dos espaços de difusão dessa ideia. A autora propõe um posicionamento por parte dos educadores para a compreensão do racismo e, a partir daí, a construção de representações positivas em relação à cultura negra com práticas pedagógicas antirracistas.

Para Nilma Lino Gomes, o fato de que as questões sobre cultura estão cada vez mais presentes no cenário educacional é um dado significativo. Termos como “cultura escolar, cultura da escola, diversidade cultural, multiculturalismo, interculturalismo, sujeitos socioculturais, [...] cultura negra” (GOMES, 2003, p. 75) nunca foram tão abordados nas temáticas educacionais. Mas Gomes alerta que a discussão sobre cultura na educação não pode ficar restrita ao elogio das diferenças ou estudos do currículo ou cultura escolar, pois pode contribuir para um debate muito mais amplo, já que a cultura se refere: “às vivências concretas dos sujeitos, à variabilidade de formas de conceber o mundo, às particularidades e semelhanças

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construídas pelos seres humanos ao longo do processo histórico e social” (GOMES, 2003, p. 75).

É uma forma de adaptação do indivíduo ao meio que, também, pode transformá-lo. Destaca a perspectiva de Geertz (1978) de que nas particularidades culturais de cada povo é possível encontrar elementos do que é ser humano e, deste modo, as diferenças entre negros e brancos não se dão no âmbito genético, mas se constituíram pela cultura. Essas diferenças, usadas na forma de classificação e hierarquização

construídas na efervescência das relações sociais e no contexto da escravidão e do racismo, passaram a regular as relações entre negros e brancos como mais uma lógica desenvolvida no interior da nossa sociedade. Uma vez constituídas, são introjetadas nos indivíduos negros e brancos pela cultura. Somos educados pelo meio sociocultural a enxergar certas diferenças, as quais fazem parte de um sistema de representações construído socialmente por meio de tensões, conflitos, acordos e negociações sociais (GOMES, 2003, p. 76).

Nessa lógica, a escola, instituição responsável pela transmissão e socialização do conhecimento e da cultura, onde são difundidas algumas das representações negativas em relação ao negro, figura como espaço estratégico para sua superação. “O negro é o ponto de referência para a construção da alteridade em nossa sociedade. Ele é o ponto de referência para a construção da identidade do

branco” (GOMES, 2003, p. 80).

- “A História da África nos Bancos Escolares. Representações e imprecisões

na literatura didática”, de Anderson Ribeiro Oliva (Universidade de Brasília - UnB),

de 2003, traz uma análise de um livro didático de História que apresenta um capítulo inteiro dedicado ao ensino da História da África e dos africanos, com um alerta: apesar das críticas que faz, percebe aspectos positivos dadas à incipiência ou inexistência do tema nos demais livros didáticos. Questiona como ensinar algo que não foi aprendido pelos docentes, já que somente após a lei tal conteúdo começa a aparecer com mais especificidade, denotando o pouco conhecimento que se tem da história do continente africano para além da escravidão, colonização e descolonização.

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resultado do “encontro ou desencontro” de diferentes grupos étnicos (ameríndios, europeus e africanos), logo, a proximidade entre História da África e a História do Brasil.

Oliva destaca o artigo “O Ensino de História e a Luta contra a Discriminação Racial no Brasil”, de Hebe Maria Mattos, no qual esta apresenta um olhar diferenciado para com o negro, a África e os africanos no contexto histórico do mundo atlântico. Também traz a análise da abordagem de História da África em um livro didático. Oliva volta à questão da Lei nº 10.639/03 e salienta o quanto ela é importante, apesar de tardia, e aponta as dificuldades práticas:

[...] muitos professores formados ou em formação, com algumas exceções, nunca tiveram, em suas graduações, contanto com disciplinas específicas sobre a História da África. Soma-se a esse relevante fator a constatação de que a grande maioria dos livros didáticos de História utilizada nesses níveis de ensino não reserva para a África espaço adequado, pouco atentando para a produção historiográfica sobre o continente. Os alunos passam assim, a construir apenas estereótipos sobre a África e suas populações (OLIVA, 2003, pp. 428-29).

Oliva analisa o livro Nova História Crítica (Editora Nova Geração, 2002), de Mario Furley Schmidt. Oliva detecta alguns acertos, mas também algumas falhas das mais corriqueiras, como a generalização dos grupos étnicos africanos, anacronismos e a tentativa de analisar a África por associação a aspectos da Europa Ocidental. Enfatiza, inclusive, que o autor do livro, Schmidt, em algumas situações, parece tentar supervalorizar alguns fatos, o que pode incorrer em distorções. Isso acontece, por exemplo, quando menciona a riqueza de algumas construções, como a Universidade de Tombuctu e se surpreende que lá “até vendiam livros” ou quando simplifica certos aspectos da cosmologia africana ao tentar analisá-la como uma religião. O artigo, em uma análise rigorosa de um livro didático, nos mostra um exemplo prático, critérios e justificativas para as escolhas de autores e/ou editoras.

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Valente (2005) parte do pressuposto de que diversos estudos brasileiros indicam as situações de preconceito e discriminação racial vivenciadas pelas crianças negras na escola. Para o combate e superação desse problema, enfatiza, em especial, a elaboração de propostas pedagógicas e materiais didáticos. É fundamental “a construção de uma identidade negra positiva que se construa na relação com o branco e no reconhecimento da diferença” (VALENTE, 2005, p. 62). Destaca a importância de iniciativas nos cursos de formação de professores, reconhecendo os avanços das pesquisas. Considera urgente a definição de medidas de intervenção na questão racial por parte dos docentes.

De nada adianta dispor de livro didático e currículo apropriados se o professor for preconceituoso, racista, e não souber lidar adequadamente com a questão. Uma proposta de formação/capacitação dos professores para trabalhar com a temática é capaz de enfrentar o desafio lançado para a implementação da lei nº 10.639/03 (Brasil, Congresso Nacional, 2003) – a Lei Ben-Hur -, que torna obrigatório o ensino da história e da cultura afro-brasileira no currículo oficial das escolas públicas (VALENTE, 2005, p. 63).

Valente (2005) investiga uma proposta de combate ao racismo na educação básica que teve resultados expressivos, em Campo Grande (MS) e Belo Horizonte (MG). Esta proposta teve por objetivos: reforçar que a educação básica é o nível de escolaridade em que há maior prejuízo das crianças negras; descaracterizar a hipótese de que as políticas de ação afirmativa de caráter universal e específico sejam excludentes; indicar que os melhores resultados em políticas afirmativas ocorrem o quanto antes o racismo, o preconceito e a discriminação são enfrentados, ou seja, nos anos iniciais e, desse modo, indica os desafios para a formação de professores.

“Embora a coibição de manifestações de racismo seja imprescindível no plano legal, conquistas e avanços alcançados nessa direção não bastam para transformar as concepções arraigadas no imaginário da população brasileira” (VALENTE, 2005, pp. 63-64).

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Valente (2005) narra casos em que havia crianças negras sofrendo com o preconceito dos colegas nas turmas em que a proposta foi desenvolvida e, em alguns casos, o encaminhamento foi positivo, enquanto outros reforçam a necessidade de embasamento teórico do professor para evitar que este se desestabilize ou difunda ideias que não contribuam para a compreensão da criança sobre o porquê das diferenças. O uso da literatura infantil foi importante para os bons resultados. A obra principal foi “Menina Bonita do Laço de Fita”, de Ana Maria Machado (Editora Ática, 2000).

- “Etnicidade e Ensino de História: a matriz cultural africana”, de Elio Chaves

Flores, (Universidade Federal da Paraíba - UFPB), de 2006, aborda o ensino de História da África nas universidades e a legislação atual sobre o ensino desse conteúdo. Para o autor, a Universidade passou muito tempo dedicando-se a uma abordagem eurocêntrica da História em que o negro e o continente africano apareciam somente no contexto da escravidão e expansão do capitalismo nas guerras pela independência no pós 2ª Guerra Mundial. “Esta cultura escolar viria a ser enfrentada somente depois da Constituição de 1998, que tornou possível a criminalização do racismo no Brasil” (FLORES, 2006, p. 66). Também considera que para que a Lei 10.639/03 faça parte das práticas curriculares inserindo a História da África “as bases curriculares dos cursos de História devem ser pensadas com ênfase nas espacialidades e nas durações históricas e não exatamente nas linearidades

cronológicas” (FLORES, 2006, p. 67). O autor acredita que não basta que os

conteúdos mencionados na Lei façam parte do cotidiano escolar, mas considera sua importância na “construção da negritude e avança sobre os referenciais curriculares da etnicidade na história que se afirma no tempo presente como diversidade cultural” (FLORES, 2006, p. 67). Para ele, o ensino da matriz africana pode contribuir significativamente para o combate ao racismo no Brasil. Considera que o “ensino de da matriz africana se constituiria numa barreira propedêutica contra o racismo à

brasileira” (FLORES, 2006, pp. 66-7). Tece uma crítica aos Parâmetros Curriculares

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alusão à uma África mítica e remota, sem menção aos aspectos contemporâneos. Neste caso, como responder à questão que o próprio documento apresenta: “ensinar a pluralidade ou viver a pluralidade?”. Nessa perspectiva, o discurso institucional prega “devoção e vocação” do profissional da educação, e não a “sustentabilidade

da cultura escolar”, evidenciando o mito da democracia racial ao invés de combatê

-lo como propõe os Parâmetros Curriculares Nacionais. No entanto, F-lores (2006) destaca no âmbito de ações afirmativas das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais (DCNERER) para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana a afirmação dos relatores de sua importância como política de reparação, reconhecimento e valorização de ações afirmativas; e, na perspectiva da educação das relações étnico-raciais é evidente a ressignificação do conceito de raça no contexto do combate ao racismo. O autor conclui que a História como ciência tem um imperativo ético em suas problematizações, atuante para o protagonismo africano e afro-brasileiro e a crítica do cânone da mestiçagem.

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da flexibilidade em relação aos objetos a serem estudados e sinalizarem para a inclusão equilibrada dos recortes associados ao tratamento das histórias do Brasil, Europa, América e África” (OLIVA, 2009, p. 147).

Culmina por estimular uma abordagem superficial e sem especificidade, logo, insuficiente para proporcionar o estudo da História da África. No entanto, entende como mais assertiva a proposta do tema transversal “Pluralidade Cultural” ao “apontar para possíveis recortes da história das sociedades africanas e para o cuidado em desvincular sua abordagem do estudo da história da escravidão e do tráfico” (OLIVA, 2009, p. 147).

O site da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) trouxe somente a partir da 25ª edição (2002) um Grupo de Trabalho ligado ao tema da Educação das Relações Étnico-Raciais. Os trabalhos mais significativos que apresentam alguma aproximação com o presente tema são:

- “Relações Raciais em Livros Didáticos de Língua Portuguesa”, de 2005, de

Paulo Vinícius Baptista da Silva (PUC/SP), mostra uma análise de personagens brancos e negros em livros didáticos de Língua Portuguesa da 4ª série produzidos de 1975 a 2004, detectando estereótipos raciais. Há percepção de mudanças a partir da década de 1990, em razão da legislação educacional. Ocorre a adoção somente dos livros didáticos aprovados com base em alguns critérios e reivindicações dos movimentos negros. Apesar disso, o livro didático ainda veicula ideias racistas e a proposta é de mais alterações nos critérios de seleção dos textos e imagens veiculadas;

- “Relações Raciais, Discurso e Literatura Infanto-juvenil” (2010), de Débora

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[...] em alguns momentos, a postura da professora atuou no sentido de reforçar estereótipos ora por meio do silêncio e omissão diante de práticas discriminatórias, ora através de conceituações restritivas e estigmatizantes sobre a população africana [...]. (ARAÚJO, 2010, p. 170).

Araújo (2010) também detectou indícios de tentativas de ruptura com o modelo depreciativo de representação da cultura africana. É um fato fundamental, uma vez que as escolas pesquisadas fazem parte de uma rede cuja Secretaria tem programas contínuos de formação de professores e o município de Curitiba integra o Fórum Permanente de Educação e Diversidade Étnico-Racial do Paraná.

No site da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) há um número significativo de pesquisas relacionadas ao tema e se elencou como trabalhos relevantes, que podem contribuir com a pesquisa:

- “Educação Continuada e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana: um estudo sobre o programa ‘São Paulo: Educando pela Diferença para a

Igualdade’”, de 2007, de Ana Regina Santos Borges, do Programa de Estudos Pós

-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade/PUC-SP. Descreve a proposta do programa e avalia as percepções dos participantes da formação, concluindo que as metas foram alcançadas como uma etapa inicial da formação de professores nessa área. A pesquisa investiga a proposta de educação continuada do programa São Paulo: Educando pela Diferença para a Igualdade (2003 a 2006), identificando a percepção de seus atores no processo e os resultados em relação à inserção da temática da educação das relações étnico-raciais na escola. Para Borges (2007, p. 1),

[...] a educação pode apresentar um discurso antirracista que incorpore nos currículos escolares a diversidade racial para favorecer os alunos negros, fazendo-os construir sua autoestima com base na sua historicidade e, por outro lado, proporcionar as demais crianças conhecer a abrangência da cultura de tradição africana na constituição da sociedade brasileira. .

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universalização do programa e pouco espaço para debater a questão étnico-racial na escola.

- “Imagem da África, dos africanos e seus descendentes em Coleções de

Didáticos de História aprovadas no PNLD de 2004”, de Alfredo Boulos Júnior, de 2008, do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade – PUC/SP. Apresenta uma pesquisa baseada na análise de imagens e representações da África, dos africanos e afrodescendentes em três coleções de livros didáticos da História do Ensino Fundamental I. São elas: Coleção Horizontes (IBEP, 2001), Coleção Pensar e Viver (Editora Moderna, 2001) e Coleção História (Editoras Ática e Moderna, 2001). O pesquisador analisa o papel tanto do Movimento Negro quanto do Estado no contexto do processo de avaliação dos livros didáticos. Detectou que houve mais permanências do que mudanças na representação da África, dos africanos e afrodescendentes. Boulos Júnior (2008) chama a atenção não somente para a quantidade menor de imagens por etnia, mas também para a incidência de representações de negros no passado, geralmente, como escravos, com poucos registros do período pós-abolição. Outro dado interessante que o autor reforça é a exaustão de imagens de Debret e Rugendas que demonstram a retratação do olhar do europeu do século XIX e pontua: “As representações sociais, como se sabe constituem um determinado imaginário” e questiona:

Que imaginário é este – o brasileiro – que esquece de ilustrar um mito jeje-nagô distribuído por três páginas? Que não coloca um afrodescendente (ao menos um) entre os três brasileiros fotografados votando? Que consegue inserir 5 rostos de crianças para ilustrar a composição da população brasileira e, de novo, esquece de incluir um rosto (ao menos um) de criança afrodescendente? (BOULOS JÚNIOR, 2008, p. 184).

- “O que e como ensinar: proposta curricular, materiais didáticos e prática de

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pelos professores de todos os componentes curriculares, o impacto produzido pela maneira como a proposta foi apresentada à rede, na qual docentes se viram como meros executores, sem respeito à sua autonomia, desse modo, enfatizou também o processo de implantação do projeto São Paulo faz Escola. Para Boim (2010, p. 41):

A exclusão do professor no processo de elaboração do currículo e escolha do material didático corresponde ao modelo adotado em São Paulo. Não basta mudar as regras de funcionamento das estruturas, é imperioso mudar práticas, mentalidades, compreender os mecanismos de produção de mudanças no interior do território escolar.

O autor também pondera que “a uniformização dos conteúdos curriculares é controversa entre os professores” (BOIM, 2010, p. 107) e que

constata-se o aparelhamento da escola com recursos que ‘auxiliam’ a

prática docente na implementação da nova Proposta Curricular. A sistematização do conteúdo por materiais didáticos elaborados para professores e alunos, segundo os docentes entrevistados, foi o maior obstáculo à prática docente (BOIM, 2010, p. 108-9).

No projeto São Paulo faz Escola percebe-se que há um controle rígido do que e como o professor trabalha em sala de aula, tanto pela maneira que a proposta foi apresentada à rede como pela forma que o material dialoga (ou não) com os docentes, com orientações extremamente detalhadas de “como preparar e aplicar a aula, o tempo e o modo de conduzi-la” (BOIM, 2010, p. 110). “O currículo prescrito que chega aos professores expressa apenas parte do que é ensinado em sala de aula. Ele é ditado pelos órgãos político-administrativos, e tem um papel de orientação relativa ao conteúdo” (BOIM, 2010, p. 116). Boim conclui, assim, que houve perda de autonomia do professor em elaborar seu planejamento.

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representante da humanidade e a estigmatização do negro, principalmente da mulher negra.

No livro de Língua Portuguesa, Pacífico (2011) observa que não há reconhecimento da existência de uma “literatura negra”, pois não há a presença de textos da literatura africana ou afro-brasileira. “Interpretamos esse silêncio como estratégia ideológica que opera socialmente para manter no plano simbólico uma hegemonia dos que autorrepresentam como de origem europeia em relação aos de origem (e indígena)” (PACÍFICO, 2011, p. 86).

Os textos utilizados em um dos capítulos exploraram o negro como escravo, sua passividade e a hipersexualidade da mulher negra ou a situação atual de marginalidade do negro, sem problematização e exemplos positivos. O livro de Educação Física se estrutura nos conteúdos: Esporte, Jogos, Ginástica, Lutas e Dança e contempla a temática étnico-racial ao incluir a capoeira em Lutas e o hip hop em Dança. Apresenta personagens negros ao longo da obra em papéis variados e contextualiza a origem da cultura hip hop como movimento de contestação política e apresenta fotos de Malcolm X e Martin Luther King. Pacífico (2011) conclui, considerando também a revisão bibliográfica, que houve permanência quanto ao “predomínio da branquidade normativa; hierarquizando em posição superior aos

brancos em relação aos negros” (PACÍFICO, 2011, p. 141).

- “História da África, uma disciplina em construção”, de Márcia Guerra Pereira

(2012), do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade/ PUC–SP. Pretende acompanhar o processo de constituição de História da África como disciplina acadêmica, demanda evidenciada com a Lei 10.639/03 que prevê a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica. Para a pesquisadora o interesse está em “estudar como a compreensão de que existe uma África cuja história confere identidade aos negros brasileiros deixou de ser exclusivamente uma bandeira do Movimento Negro e passou a ser assimilada pelo sistema de educação superior” (PEREIRA, 2012, p. 21).

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professores responsáveis pela disciplina em universidades públicas de cinco estados, sendo: Maranhão (onde a disciplina é obrigatória para os alunos da Graduação em História), Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo.

Pereira (2012) deparou-se com um cenário no qual, em 2003, conforme Oliva (2008), os cursos de História avaliados no Exame Nacional de Cursos ofereciam a disciplina História da África, mas geralmente de caráter optativo e sem professores especialistas no tema. Entre suas conclusões, a pesquisadora ressalta a importância da recente criação de um Grupo de Trabalho de História da África pela Associação Nacional de História (ANPUH) e reforça que “é preciso estudar a história da África para superação da perspectiva eurocêntrica do conhecimento que, epistemicamente assimétrica racialmente, reafirma a discriminação racial e a desigualdade social” (PEREIRA, 2012, p. 187).

Quanto às recentes produções acadêmicas, percebe o combate à “instrumentalização do conhecimento” e que procuram ver o continente africano em sua historicidade.

O tema da Educação das Relações Raciais apresenta-se repleto de significados tendo em vista o passado escravista e o presente de invisibilidade do negro, apesar de seu papel nos aspectos social, econômico, cultural e político da História do Brasil. A escola tem sido apontada como reprodutora das desigualdades raciais presentes na sociedade, sendo assim, a presente pesquisa aspira, contudo, por contribuir para um diagnóstico sobre como os educadores estão trabalhando para a implementação da Lei 10.639/03 a partir do material didático da rede.

Já os documentos oficiais de análise da pesquisa foram: a Lei nº 10.639/03, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas (DCNERER), as Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais e os Parâmetros Curriculares Nacionais, além das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica. O texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas foi o primeiro documento oficial que surge como norteador para os educadores e gestores construírem referências sobre os conteúdos e formas de abordagem para implementação da referida Lei.

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fontes de consulta e elenco de conteúdos para a prática educativa, em consonância com o pressuposto formativo e educativo da valorização da pluralidade cultural brasileira [...] (PEREIRA, 2011, p. 149).

No texto da Lei 10.639/03 há menção à prioridade da abordagem de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas nas áreas de Língua Portuguesa (Literatura), Educação Artística e História (História do Brasil). Nesse sentido, analisaremos os conteúdos dos cadernos didáticos “Formadores do Saber” em Arte, História e Literatura do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental. No entanto, essa proposta inicial foi descartada, ao cursar a disciplina de Elaboração de Anteprojeto, por parecer muito ampla. O pré-projeto apresentou, então, somente a intenção de analisar o tema da Educação das Relações Étnico-Raciais no ensino de História. Após o exame de qualificação, a questão voltou à tona, pois História aparece na matriz curricular da rede municipal de Santo André, somente com 1 ou 2 aulas semanais. Desde modo, o material a ser analisado seria muito restrito, dificultando uma conclusão mais fundamentada. Logo, o objetivo volta a ser a análise dos conteúdos relacionados à Educação das Relações Étnico-Raciais nas três áreas mencionadas na lei nº 10.639/03: Arte, História do Brasil e Literatura do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental.

Pretende-se com esta pesquisa, investigar as possibilidades de viabilizar a inserção de uma política de Educação das Relações Étnico-Raciais a partir da análise dos cadernos didáticos “Formadores do Saber”, considerando que eles são a materialização da proposta curricular da rede municipal de Santo André a partir de 2011. A pesquisa será pautada no ensino de Arte, História do Brasil e Literatura, do 1º ao 5º ano (1º e 2º ciclo) 13.

De modo geral, há trabalhos (teses e dissertações) sobre Educação das Relações Étnico-Raciais, porém, poucos apresentam ênfase em como ocorre a articulação dos conteúdos na disciplina de História para que se cumpra o principal propósito da Lei 10.639/03, disposto no artigo 26-A: a compreensão do papel dos negros no desenvolvimento humano nos aspectos político, social, econômico e cultural. Os aspectos culturais são apresentados de forma estigmatizada e estereotipada, desconsiderando a diversidade dos povos africanos e afro-brasileiros e as descobertas científicas e tecnológicas que permitiram a evolução da

13 Na rede municipal de Santo André, o Ensino Fundamental I (Instituído pela Lei nº 7.760 de 30 de Dezembro de 1998 do Município de Santo André) divide-se em dois ciclos de aprendizagem: 1º ciclo

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humanidade a partir do intercâmbio com a África já que deve haver a inclusão da temática no currículo escolar e não de forma estanque, fragmentada ou descontextualizada.

Conclui-se com este levantamento que trabalhos sobre o ensino de História articulada à Educação das Relações Raciais com foco nos conteúdos ainda são incipientes, mesmo com a elevação do número de trabalhos sobre o assunto, mas nada ainda foi produzido sobre o Projeto “Formadores do Saber”, que originou o material didático estruturado da rede municipal de Santo André – objeto de análise desta pesquisa.

Por sua vez, quanto ao referencial teórico, os pesquisadores nortearam a investigação são:

Ivor Goodson (University of Cambridge e University of Brighton) é professor de Teoria da Aprendizagem no Centro de Pesquisa em Educação da Universidade de Brighton, na Inglaterra. Seu campo de investigação envolve a história do currículo, histórias de vida, profissão docente e profissionalização. Pesquisou a História do Currículo, mas ao discutir currículo na contemporaneidade, ressalta sua construção social que, dessa maneira, pode ser desconstruído e reconstruído, principalmente, com a necessidade de refletir a equidade e a justiça social. Ivor Goodson será o principal referencial em relação à concepção de currículo, entendido por ele como conflito social. O autor afirma que “[...] os conflitos existentes sobre a definição do currículo escrito oferecem provas visíveis, públicas e documentais da luta contínua sobre as aspirações e intenções da escolarização” (GOODSON, 2001). Entendemos, assim, como currículo escrito da rede municipal de Santo André, o material didático estruturado “Formadores do Saber”, com seus elementos simbólicos e práticos.

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Desde que se compreenda em toda a sua amplitude a noção de disciplina, desde que se reconheça que uma disciplina escolar comporta não somente as práticas docentes da aula, mas também as grandes finalidades que presidiram sua constituição e o fenômeno de aculturação de massa que ela determina, então a história das disciplinas escolares pode desempenhar um papel importante não somente na história da educação mas na história cultural (CHERVEL, 1990, p. 184).

Dominique Julia trabalha outro conceito importante que poderá permear a pesquisa, em alguns momentos, o de cultura escolar, entendida como

um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas (finalidades religiosas, sociopolíticas ou simplesmente de socialização) (JULIA, 2001, p. 10).

Para o autor os professores são levados a cumprir estas normas a partir de determinados dispositivos. Mas considera também as relações entre os alunos e a maneira como elas se dão como parte da cultura escolar. Para esta pesquisa, como a ênfase estará naquilo que está prescrito nos livros do material didático estruturado, as práticas não serão evidenciadas, mas os conteúdos apresentados como norteadores da proposta da rede municipal configurar-se-ão como os conhecimentos a serem ensinados e, de certa maneira, inculcados nos alunos. No entanto, Julia alerta: “[...] a escola não é o lugar da rotina e da coação e o professor não é o agente de uma didática que lhe seria imposta de fora” (JULIA, 2001, p. 16). Acredita, assim como Chervel, que a escola não é um lugar somente de transmissão, mas também de criação de um habitus, comportamentos, condutas e práticas. Logo, a sociedade está impregnada de práticas que foram aprendidas e só são ensinadas no espaço escolar. Por essa via, entendemos a necessidade de que a lei 10.639/03 seja ressignificada na escola e construa-se uma prática escolar de educação das relações étnico-raciais consistente com o reconhecimento e a valorização das diferenças para a superação das desigualdades.

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Uma tal identificação – (“quem somos nós?” – “de onde viemos e aonde vamos?” – “qual e a nossa posição na sociedade?” – “quem são eles?” – “de onde vieram e aonde vão?” –“qual éa posição deles na sociedade?” – “quem são eles?” – “de onde vieram e aonde vão?” – “qual é a posição deles na sociedade?”) vai permitir o desencadeamento de um processo de

construção de sua identidade ou personalidade coletiva, que serve de plataforma mobilizadora (MUNINGA, 2004, p. 14).

Essa autoidentificação seria uma das necessidades para a identidade dos movimentos negros, considerando alguns aspectos comuns, como: o passado histórico de ancestrais africanos escravizados, a condição de pertencer a um grupo racializado, estigmatizado e excluído da sociedade contemporânea, mediante a negação de sua humanidade e inferiorização de sua história e cultura. Ao mesmo tempo, Munanga compreende que essa autoidentificação para a construção de uma nova consciência atrelada a uma identidade comum é um grande desafio. A construção dessa identidade apresenta-se sempre em processo e não como produto e constitui-se de elementos, como a língua, a história, o território, a cultura, a religião, a situação social, dentre outros, porém, tratando-se de culturas em diáspora, conta-se somente com os elementos que resistiram ou foram conquistados nas novas configurações territoriais.

Antonio Sergio Alfredo Guimarães (USP) é sociólogo e pesquisa identidades raciais, racismo e classes sociais. Para ele, os grupos humanos se diferenciam com base em características consideradas naturais em um contexto de desigualdades de poder e de direitos, entretanto, esta distinção se faz com base em teorias, critérios e fundamentos diversos. Como exemplo, expõe o caso da integração de imigrantes italianos e ex-escravos negros no início do século XX em São Paulo. Ambos tiveram o desafio da inserção em uma sociedade nacional, mas a ideologia racial predominante fez com que os imigrantes italianos fossem considerados uma etnia e os ex-escravos negros, uma raça. Essa mesma ideologia respalda e justifica a desigualdade social resultante, ao passo que se faz indispensável definir um

conceito de “raça” e de “racismo” de acordo com os desafios que se apresentam,

levando em consideração a formação histórica dessa hierarquia social, o racismo brasileiro.

Contudo, a identidade pauta-se no elemento “cor”, ou ainda, na recuperação física e cultural da negritude14. E esta tarefa tem sido árdua e frustrada nas

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contra-tentativas de mobilização de membros no pós-abolição. Ao que Munanga justifica como resultado dos fundamentos ideológicos do racismo propagados no final do século XIX e ao longo do século XX pela elite nacional. “Essa ideologia, caracterizada entre outros pelo ideário do branqueamento, roubou dos movimentos negros o ditado ‘a união faz a força’ ao dividir negros e mestiços e ao alienar o processo de identidade de ambos” (MUNANGA, 2004, p. 15). As tentativas de branqueamento físico da população brasileira não foram bem-sucedidas, mas o ideal inculcado permaneceu no inconsciente coletivo de negros e mestiços e dificulta as possibilidades de alavancar o processo de identidade com base na negritude e na mestiçagem15, tendo em vista a busca pela identidade branca, tida como superior.

As dificuldades dos movimentos negros em mobilizar todos os negros e

mestiços em torno de uma única identidade ‘negra’ viriam do fato de que

não conseguiram destruir até hoje o ideal do branqueamento. Algumas vozes nacionais estão tentando, atualmente, encaminhar a discussão em

torno da identidade ‘mestiça’, capaz de reunir todos os brasileiros (brancos,

negros, mestiços). Vejo nessa proposta uma nova sutileza ideológica para recuperar a ideia da unidade nacional não alcançada pelo fracassado branqueamento físico. Essa proposta de uma nova identidade mestiça, única, vai na contramão dos movimentos negros e outras chamadas minorias, que lutam para a construção de uma sociedade plural e de identidades múltiplas. Algumas correntes dos movimentos negros preferem

utilizar a expressão ‘afrodescendentes’ ou ‘identidade afrodescendente’,

sugerindo, implicitamente, que esse seja capaz de criar o consenso e a

unidade que a identidade ‘negra’ ou ‘mestiça’ não consegue cristalizar

(MUNANGA, 2006, p. 16).

Mas Munanga deixa um questionamento: a busca por uma identidade mestiça não nega a solidariedade a negros, índios, orientais e outros grupos brancos que almejam o direito ao reconhecimento de sua diferença?

Circe Maria Fernandes Bittencourt (PUC/SP) é historiadora e desenvolve pesquisas sobre livros didáticos, o ensino de História e educação indígena. Bittencourt apontou em suas pesquisas a importância de ir além da denúncia do conteúdo ideológico dos livros didáticos, mas analisá-los como política pública (2009). O livro didático veicula ideias e valores, mas também, é uma mercadoria que visa o mercado escolar. O livro didático contém o conjunto de conteúdos escolares elencados pelas propostas curriculares e, assim, os conhecimentos e as técnicas consideradas fundamentais. “Realiza uma transposição do saber acadêmico para o

aculturação, ou seja, desalienação autêntica” (MUNANGA, Kabengele. Negritude: usos e sentidos. Série Princípios. São Paulo: Ática, 1988, p. 56).

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saber escolar no processo de explicitação curricular” (BITTENCOURT, 2009, p. 72), tornando-se um instrumento pedagógico determinante na produção de técnicas de aprendizagem, possibilitando uma difusão de “como” os conteúdos devem ser ensinados. No entanto, este processo envolve uma série de sujeitos que farão diferentes interpretações e usos do seu conteúdo. O livro didático é, pois, um objeto cultural complexo. Bittencourt apresenta em sua obra Ensino de História: fundamentos e métodos (2009), uma abordagem histórica sobre os conteúdos e métodos no ensino de História, uma discussão sobre as propostas curriculares de História mais recentes e sobre livros e materiais didáticos da disciplina que servirão como norteadores desta pesquisa que terá como um dos objetos, o ensino de História, para desvelar a Educação das Relações Raciais nos cadernos didáticos “Formadores do Saber”.

A História escolar integra o conjunto de disciplinas que foram sendo constituídas como saberes fundamentais no processo de escolarização brasileira e passou por mudanças significativas quanto à métodos, conteúdos e finalidades até chegar à atual configuração nas propostas curriculares (BITTENCOURT, 2009, p. 33).

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Tabela 1 Total de aulas do 1º até o 5º ano do Ensino Fundamental I
Figura 1  Modelo de capa dos cadernos didáticos “Formadores do Saber”
Figura  2  Modelo  de  Folha  de  rosto  dos  Cadernos  Didáticos
Tabela 2 Quantidade de menções nas expectativas de aprendizagem em História
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Referências

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