Expediente
FGV DAPP
Diretoria de Análise de Políticas Públicas | Fundação Getulio Vargas
DIRETOR
Marco Ruediger
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As manifestações expressas por integrantes dos quadros da Fundação Getulio Vargas, nas quais constem a sua identificação como tais, em artigos e entrevistas publicados nos meios de comunicação em geral, representam exclusivamente as opiniões dos seus autores e não, necessariamente, a posição institucional da FGV.
O DAPP Report é uma publicação sem vinculação política ou partidária , produzida pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV DAPP), que tem o objetivo de disponibilizar uma análise do cenário político brasileiro a partir do debate público nas redes sociais.
As análises produzidas neste Report não visam representar pesquisa eleitoral , e sim aferir a percepção social, no ambiente digital, acerca de temáticas da agenda pública, tais como atores políticos e pautas de políticas públicas. Portanto, não autorizam o seu uso para finalidades políticas, partidárias ou endosso de posições particulares. Mais informações acerca deste trabalho podem ser acessadas em dapp.fgv.br/observa2018/metodologia.
A metodologia de análise de redes sociais desenvolvida pela FGV DAPP e aplicada a este relatório pode ser aferida na publicação "Nem tão #simples assim: o desafio de monitorar políticas públicas nas redes sociais", em
http://dapp.fgv.br/observa2018/wp-content/uploads/2018/06/nem_tao_simples_assim_fgvdap p.pdf
Sumário-Executivo
● Parlamentares do PSL e do PT protagonizam debate no Twitter impulsionado por contas de congressistas da nova composição da Câmara e do Senado;
● Entre deputados da direita, discussões sobre segurança, elogios à primeira-dama e críticas à esquerda motivaram mais engajamento;
● Parlamentares de esquerda criticaram agenda conservadora dos discursos do presidente e reajuste do salário mínimo;
● Com posse de Bolsonaro, debate político registra 4 milhões de tuítes em sete dias, retomando níveis identificados na campanha eleitoral;
● Presidente é principal condutor do debate em sua base de apoio, sendo autor de 19 dos 20 tuítes mais compartilhados no grupo;
● Direitos humanos é principal tema associado a Bolsonaro, com discussões sobre indígenas, quilombolas e grupos minoritários em geral, além de debate sobre papel da mulher na política.
1. #ObservaCongresso
O ano de 2019 teve início com forte atividade nas plataformas digitais dos parlamentares que assumirão a próxima legislatura. E duas questões ressaltam desde já: (1) a baixa interação entre parlamentares de direita e de esquerda; e (2) a ausência de políticos de partidos de centro como influenciadores.
Entre 31 de dezembro e 02 de janeiro, a FGV DAPP coletou todos os tuítes, retuítes, citações e comentários das contas de 482 deputados federais e senadores — ou seja, todos os que tinham perfis na rede social. Sob esse primeiro panorama, é possível identificar inicialmente quais são os parlamentares de maior repercussão na rede social, com quem falam e sobre o que falam, sinalizando quais agendas poderão orientar a articulação política no Congresso neste começo de mandato de Bolsonaro. De um total de 358.834 tuítes, o mapa de interações sobre os grupos parlamentares na rede é formado por 229.726 retuítes (já excluídas as interações de robôs, apenas 0,6%), com sete subgrupos mais proeminentes.
1.1 Mapa de interações no debate via Twitter
À direita, o grupo azul (18,4% dos perfis e 25,7% das interações) tem como principais interlocutores o deputado federal Eduardo Bolsonaro (SP) e o senador Flávio Bolsonaro (RJ), filhos do presidente e ambos do PSL, partido que aglutina volume expressivo dos perfis de mais expressão e impacto nas redes dentre atores da situação. No grupo azul-claro (16,9% de perfis e 29,6% de interações), destacaram-se as deputadas federais do PSL de São Paulo Carla Zambelli e Joice Hasselmann, seguidas do deputado federal Paulo Martins (PSC-PR). A posse foi o objeto central do debate em ambos os grupos, com ênfase à participação popular e da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, na cerimônia e no combate ideológico à esquerda no governo federal.
Em outro núcleo menor de direita, em verde (3,9% dos perfis e 2,3% das interações), o principal tópico foi segurança pública, com mensagens de exortação ao endurecimento no combate a criminosos, na flexibilização do desarmamento civil e na oposição a grupos de esquerda que defendem direitos humanos. Hasselmann, Zambelli e os filhos de Bolsonaro também são influentes no grupo, mas o principal perfil é do Sargento Fahur (PSD-PR). Nos grupos à esquerda, o principal é o que aglutina lideranças do PT, em vermelho (19,9% dos perfis e 22,1% de interações), com destaque à presidente do partido e deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), e aos também deputados Erika Kokay (DF), Paulo Pimenta (RS) e Paulo Teixeira (SP), além do senador Humberto Costa (PT-PE). Afora nomes petistas, os dois principais influenciadores foram os deputados Ivan Valente (PSOL-SP) e Jandira Feghali (PC do B-RJ). O discurso de Bolsonaro na posse e as condições de atuação da imprensa no evento foram os eixos centrais de debate, com ênfase no reajuste do salário mínimo, na desigualdade do país e na agenda conservadora quanto a políticas identitárias.
Outros três grupos pequenos são identificados, articulados por postagens específicas de políticos e que também se alinham à esquerda: em roxo (9,5% de perfis e 4,2% de interações), as parlamentares do PSOL Sâmia Bomfim (SP), Talíria Petrone (RJ) e Fernanda Melchionna (RS) dão ênfase a questões de direitos humanos e citam a vereadora Marielle Franco. Em rosa (17,8% dos perfis e 8,4% das interações), as três são novamente influentes, junto ao deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), abordando sobretudo feminismo e participação das mulheres e minorias na política.
Por fim, em laranja (4,4% dos perfis e 2,2% das interações), o tuíte que organiza o debate é de Patricia Lelis, candidata a deputada federal não eleita por São Paulo, e que cita a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) por conta da lei que regulamenta a profissão de intérprete de libras, em virtude da repercussão do discurso de Michelle Bolsonaro com o uso da língua brasileira de sinais.
2. Debate geral
2.1 Mapa de interações no debate via Twitter
Finalizado o hiato entre o fim das eleições e a posse de Jair Bolsonaro, são poucas as mudanças na configuração dos principais grupos de debate político nas redes sociais, levando-se em conta a campanha presidencial. Tanto pelo ponto de vista temático quanto de influenciadores e atores políticos em destaque, persiste expressiva polarização entre a base de apoio a Bolsonaro, em azul, e os grupos em rosa e vermelho em oposição ao presidente, embora não alinhados internamente a partir da esfera de influência do PT e de outros partidos de esquerda. É sob esse cenário que se inicia o governo Bolsonaro — sem uma terceira via com força para se posicionar nas redes como alternativa à polarização temático-partidária dos últimos anos no Brasil.
De 27 de dezembro a 02 de janeiro, foram identificados 4.048.342 tuítes sobre o debate político associado ao novo governo, e 2.836.492 retuítes compõem o mapa de interações, já excluídos robôs (3,6% do total de interações identificadas). O alto volume de menções retorna a discussão aos níveis identificados na campanha eleitoral, da qual se mantiveram muitos atores, à direita e à esquerda, como os principais influenciadores.
No grupo em azul, que reuniu 19,9% dos perfis e 43,2% das interações do grafo, o presidente é, com sobras, o interlocutor de maior representatividade: dos 20 tuítes mais compartilhados no grupo, 19 são de Bolsonaro e um é do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao congratulá-lo pela posse. Ao conduzir a agenda, o presidente organizou os principais temas que engajaram a base de apoio, como política externa, segurança pública, combate à corrupção e redução dos gastos estatais — e que foram também impactantes, em resposta, nos grupos que o fazem oposição.
Do outro lado, no grupo em rosa (41,2% dos perfis, 25,3% das interações) e no grupo em vermelho (15,9% dos perfis, 22% das interações) não se identificou o mesmo predomínio de um único perfil como organizador do debate — inclusive, com poucos políticos em destaque. Sob o ponto de vista temático, no núcleo em rosa, para além dos temas mobilizados a partir da figura de Bolsonaro, o tópico de maior destaque é a pauta de direitos humanos e proteção a minorias, que divide espaço com memes e piadas.
Já no núcleo em vermelho, Fernando Haddad continua com bastante força, e há postagens de veículos da imprensa tradicional sobre as condições de atuação de jornalistas durante a cerimônia de posse. Outro tema destacado no grupo de maior alinhamento a partidos e nomes de esquerda foi educação pública e o fim do Ministério da Cultura, assim como a investigação do Coaf sobre a movimentação financeira do assessor Fabrício Queiroz.
Há que destacar, porém, que dois grupos de presença oscilante no debate político voltaram a crescer em função da posse de Bolsonaro. Em verde (8,6% dos perfis e 3,5% das interações), formou-se um núcleo de repercussão internacional, mobilizado por posts de líderes políticos de outros países sobre o novo presidente, articulando Trump e o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e estadistas da América Latina, como Mauricio Macri (Argentina) e Ivan Duque (Colômbia). Em laranja (7,7% dos perfis e 3,9% das interações), há um grupo de perfis orientados a partir de piadas e ironias sobre o cenário político, mas com predomínio de menções críticas à esquerda e que satirizam a imprensa.
2.2 O debate no Twitter na semana
A agenda temática do início do governo Bolsonaro apresenta como eixo central de debate a recuperação de um tópico de forte importância na corrida
presidente: a questão dos direitos humanos, abrangendo diferentes pautas de muita repercussão. Um dos destaques do debate foi a participação da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, na cerimônia de posse, com o discurso em libras e a proeminência que obteve ao falar antes do marido — eventos que engajaram discussão sobre feminismo e o papel das mulheres nos próximos anos na administração pública.
Mais um subtema de expressiva relevância para impulsionar o debate sobre direitos humanos — que suplantou, com folgas, outros macrotemas de constante força nas redes, como corrupção, economia e segurança — foi a retirada da demarcação de terras indígenas da alçada da Funai. A partir do fato simbólico de que foi uma decisão logo do primeiro momento do novo governo, a iniciativa catalisou o debate sobre os direitos de indígenas, quilombolas e grupos minoritários em geral. Posteriormente, com a posse da nova ministra do tema, Damares Alves, essa discussão se ampliou, abrangendo questões LGBT e de liberdade religiosa.
Outro destaque da semana, porém, emerge como agenda após ter papel secundário no debate eleitoral: política externa. O desconvite a delegações de Cuba, Venezuela e Nicarágua e a vinda do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, para a posse, assim como a aproximação com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sintetizam posições de igual polarização nas redes. Dentre os discursos inaugurais dos ministros que foram recém-empossados, o do novo chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, destacou-se como um dos de maior atenção e repercussão na web.
3. O que observar
● A agenda de segurança pública deve permanecer em destaque, com a expectativa pelo decreto presidencial que permitirá maior acesso a armas pela sociedade civil;
● Com o início das atividades do Congresso em 2019, é possível que o debate de política externa perca a proeminência que obteve quando da posse de Bolsonaro, cedendo lugar a pautas como, por exemplo, a reforma da Previdência;
● Discussões sobre direitos humanos e políticas identitárias, porém, devem seguir pelas próximas semanas com elevado destaque, em função do enfoque das primeiras ações do novo governo em educação e meio ambiente, dentre outros;
● Os ministros Sérgio Moro e Paulo Guedes continuam com forte espaço no debate político nas redes, e suas primeiras iniciativas irão organizar as discussões temáticas sobre o combate à corrupção e a economia, que seguem importantes na web, mas ainda sem eixos claros de quais subtópicos sobre cada tema serão predominantes.