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QUEIRUGA, Andrés Torres; GARCIA, Manuel Rivas, [Coords.] – Dicionário enciclopédia do pensamento galego, Consello de Cultura Galega, 2008, 723 p.

Como se escreve na Introdução a esta obra, de consulta obrigatória para quem se queira abeirar da cultura galega, repositório, simultaneamente, do trabalho que tem sido feito de busca das raízes e vitalidade da cultura galega, “trata-se de unir um dicionário de pensadores galegos e uma visão temática que permita enquadrar o labor mais directamente filosófico, no campo geral da nossa cultura”.

Daqui nasce a divisão desta obra monumental em duas grandes partes: a primeira de autores que se estende do início até às páginas 327 e a segunda de temas que se estende da página 327 até à pagina 667. Acrescenta-se ainda o excelente índice temático e índice onomástico que completam a obra um apreço.

Entre os autores lá encontramos os antigos como Prisciliano, Egéria, Martinho de Braga e os recentes como Rosália, Álvaro Cunqueiro, Otero Pedrayo, Vicente Risco, Manuel Murguía, Castelao, Rof Carballo, Emília Pardo Bazán, etc.

Entre os temas, são abordados o Pensamento Científico, a Antropologia, o Direito, a Economia, a Estética, o Exílio, o Feminismo, o Liberalismo Absolutismo, a Literatura Galega, a Matemática, a Medicina, o Nacionalismo, a Pedagogia Galega, a Política, A Imprensa e a Religião.

O conjunto dá ao leitor, um quadro da importância, da identidade e da riqueza da cultura galega, abafada por regimes autoritários ao longo da história e que agora se exprime mais livremente e, por isso, se expõe.

Trata-se duma enciclopédia de pensamento o que permitiu abarcar áreas que sem este qualificativo, ficariam fora, tais como a Estética, a Literatura ou a Religião, acabando assim por defraudar o horizonte cultural do povo galego. Foi uma opção feliz não apenas por ter libertado esta obra da tentação do Jacobinismo tão frequente por cá (não sei se por lá) mas também porque se reconhece que na Galiza não é um dado adquirido reconhecer uma tradição filosófica, sistematicamente institucionalizada.

Compendiando metodologicamente estas três constantes - os autores, os temas e a especificidade dum povo – estamos diante duma obra de referência que simultanea-mente reflecte o trabalho levado a cabo pelas instituições culturais galegas e projecta para o futuro uma individualidade hoje reconhecida no quadro autonómico de Espanha. Cada autor é tratado duma forma sistemática, seguindo o seguinte modelo: pequena biografia, obra, apreciação crítica e bibliografia actualizada. Este método serve tanto para autores como Baquiário (Gallaecia?, finais do século IV? – meados do século. V? d.C), como para Rof Carballo, nascido em Lugo em 1905 e falecido em Madrid em 1994, que fez uma brilhante carreira na área da Medicina.

A parte temática desta obra, recorre, como a primeira, a autores qualificados que assinam os artigos e que são especialistas dos assuntos tratados, tentando fornecer um contexto sincrónico ou diacrónico às obras dos diversos autores.

O tema Religião correr a cargo de Victorino Pérez Prieto e estende-se por vinte e seis páginas. Desenvolve o tema religioso na vida e no pensamento galego em diversas etapas,

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contextualizando-o da seguinte forma: “o pensamento religioso galego não proveio fundamentalmente de filósofos metafísicos e teólogos stricto sensu, que foram mais bem escassos, mas de poetas, escritores e leaders sociais, algo não de todos estranho também noutras culturas”. Estas três ideias veicularam o tratamento do tema, originando uma aportação muito própria, que bem se pode aplicar, também, à cultura do Norte de Portugal.

Aproveitando os muitos trabalhos monográficos já produzidos e algumas obras gerais como a coordenada pelo Professor José Luís Barreiro, O Pensamento galego na história. Aproximación crítica, Santiago, USC 1992, estamos, creio, que pela primeira, perante uma visão de conjunto, que oferece, aos leitores, um panorama unitário duma cultura com indiscutível individualidade.

Este trabalho, que honra a cultura galega foi dirigido por André Torres Queiruga, secretariado por Manuel Rivas Garcia. Da Comissão Organizadora fizeram parte também Maria José Agra Romero, J.L. Barreiro, J.L. Barreiro Rivas, Antón Fernandez, Xoán López Facal e Xosé Garcia.

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STEIN, Edith – Correspondance I (1917-1933), Introduction, traduction et annotations par Cécile Rastoin, Paris, Cerf, Ed. Du Carmel, 2009, 767 p.

A correspondência de Edith Stein, já publicada também em língua espanhola, chega--nos em língua francesa, abrangendo este volume, o período que vai de 1917 a 1933, data da sua entrada no Carmelo.

Trata-se dum conjunto fundamental para o conhecimento da vida, do pensamento e das tendências espirituais da pensadora e santa, que podemos dividir em duas partes: a primeira, antes da converão “o baptismo de Edith dá-se no dia 1 de Janeiro de 1922” a segunda após a sua conversão, com um leque mais vasto de intelrocutores, devido sobretudo à actividade de conferencista que vai desenvolver no vasto mundo da língua alemã.

Quase metade do livro, é preenchido com a correspondência para Roma Ingarden, o pensador polaco, fenomenólogo, com quem se corresponde sobre temas filosóficos e sobre temas comuns e vidas do círculo começado na Unievrsidade de Göttingen em 1913, aos 22 anos, com E. Husserl, com passagem posterior a Freiburg, onde estuda com Husserl de novo, retomando sua tese sobre a empatia (Einfülung), que defenderá, em 1916, com a mais alta classificação.

Trata-se dum conjunto de cartas fundamentais com um amigo intelectual e também afectivos (ver a reacção quando sabe do casamento de Ingarden) mas com muito poucas confidências romanescas. Nesta parte encontramos os trabalhos e os dias de Edith e perfil que traça de autores que mais tarde se tornaram eminentes como Koyre, ou M. Heiddegger, de quem trata sempre com muita elevação e enorme simpatia.

Na segunda parte, após a sua conversão, o leque de amizade abre-se ao mundo católico, sem menosprezo da familia, sobretudo da mãe, uma judia piedosa a quem custa muito a conversão de Edith, onde Edith, após o abandono da colaboração com Husserl, (que nunca foi uma ruptura) encontra terreno favorável ao desenvolvimento de suas ideias, na área da pedagogia e da formação.

Na verdade, na sequência de seu Baptimo e da sua decisão de se consagrar totalmente à vida espiritual, Edith toma o lugar de professora na escola das Dominicanas de Spire, a conselho do P. Schwind, um secerdote intelectual e experiente com quem a santa está muito segura. Aqui está a judia católica, trabalhando num lugar que não correspondia totalmente às suas enormes capacidades e abrindo-se desta pequena enseada da vida e da alma, à releitura, e conselho aos antigos amigos do círculo de Göttingen e também às traduções de Newman e mais tarde de S. Tomás de Aquino, para além da investigação no caminho de seu prório trabalho intelectual.

É a partir da bela cidade renana de Speyer e do convento das dominicanas de Santa Madalena due Edith contacta com alguns intelectuais alemães de grande projecção, sobretudo Dom Walzer, prior em Beuron e o P. Prizwara , jesuíta e grande pensador. Um e outro encorajam a jovem autora a desenvolver uma carreira de conferencista, fora do quadro da Universidade que lhe estava fechado por causa da sua condição feminina e mais tarde judaica. Um e outro a ajudam a desenvolver um pensamento personalista contra a tendência massificadora do Nazismo que subia.

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MOREIRA, Maria de Fátima Semblano Pereira – A Igreja serva no Concílio Vaticano II e em Paulo VI, Évora, 2009, 336 p.

A autora é membro duma Congregação religiosa fundada pelo notável Bispo D. Manuel Mendes da Conceição Santos e por isso, como confessa, sentiu-se atraída pelo tema que tendo embora os seus fundamentos no Concílio, não aparece, como tal, nos documentos conciliares.

A obra divide-se em duas grandes partes, a primeira analítica desenvolvendo o tema nos documentos do Concilio e nos documentos do pontificado de Paulo VI, que foi o grande e eficaz homem da aplicação do Concílio e a segunda alargando-se numa reflexão mais propriamente teológica em que tenta trazer à superfície as consequências duma Igreja serva.

A primeira parte oferece-nos, sem dúvida, uma documentação exaustiva sobre o tema, quer apresentando as referências conciliares, quer os documentos e declarações de Paulo VI. Essa apresentação, é um bom ponto de partida, mas tem os seus limites. Efectivamente a nosso ver, seria útil integrá-la numa perspectiva mais ampla da situação da cultura, marcada, desde o Iluminismo, pela aspiração à autonomia e desde logo pela necessidade de um novo posicionamento da Igreja. De facto, o Sitz da nova situação da Igreja em face do mundo é incompreensível sem este momento da história da cultura. A segunda parte desenvolve uma reflexão teológica de cariz fundamentalmente cristológico, procurando fundamentar a nova eclesiologia na concepção de Igreja como sacramento de salvação e tirando daí as consequências para a postura de serva. O procedimento é justo e rigoroso, mas resultaria melhor se na primeira parte se cumprisse o requisito do novo contexto, em que actua a Igreja, de pluralismo cultural, liberalismo e da democracia.

Partindo do fundamento cristológico, a autora desenvolve, muito bem, em três sub--capítulos a atitude da Igreja decorrente da nova situação, que convida a um seguimento de Jesus: as atitudes essenciais, os âmbitos do serviço e o serviço do testemunho profético. Em geral, estes três sub-capítulos, quase programáticos, são não apenas bem fundamentados, mas muito claros e convincentes, pois longe da ganga das retóricas livrescas e doutrinais que por aí se encontram.

O texto termina com um bem documentado aparato bibliográfico que o enriquece, pela sua actualidade e pertinência.

Resta-nos felicitar a autora por ter escolhido um tema síntese do Concílio e o ter desenvolvido de maneira clara e não raro programática.

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TAVARES, Pedro Vilas Boas – Os Loios em Terras de Santa Maria da Feira, Ed. do Município de Santa Maria da Feira, 2009, 227 p.

Da passagem tão corrente por terra da Feira, guardo eu a imagem do castelo e da magnífica Igreja, mas sem fundamentos que me ajudassem a construir essas memórias. Também me lembrava, desde cedo, do Largo dos Loios e aí já tivera alguma luz sobre a origem do nome portuense.

Foi por isso de bom proveito a leitura da obra do Professor Pedro Vilas Boas Tavares, que, como outros da nossa Faculdade de Letras do Porto – e recordo aqui a sua esplêndida tese sobre a reacção portuguesa a Miguel de Molinos - têm prestado um óptimo serviço à historia das mentalidades e da espiritualidade em Portugal.

O nome Loios, vulgarmente dado aos Cónegos de S. João Evangelista resulta da designação dum hospital localizado na freguesia de S. Bartolomeu, em Lisboa, fundado pelo Bispo e Chanceler Domingos Jardo no século XIII e que mais tarde, no século XV, viria a ser entregue a esta Congregação de Cónegos Regrantes.

Foi o Papa Eugénio IV quem os aprovou com o nome de S. Salvador de Vilar de Frades e deu-lhes as constituições do mosteiro de Alga. Mais tarde, a pedido da rainha D. Isabel, chamaram-se cónegos seculares de S. João Evangelista. Foram também chamados bons homens de Vilar e cónegos azuis devido à cor do respectivo hábito e correntemente Loios. Tiveram casa, primeiro em Vilar de Frades, depois em Lisboa, Xabregas que foi cabeça da Congregação, Évora, Arraiolos, Feira, Porto, Coimbra e Lamego, como o autor refere à partida página 175 a 200.

A obra em apreço divide-se fundamentalmente em duas partes: a construção da memória (p. 19-127) e etapas de materialização do quadro da vida de Loio (145-189).

Na primeira parte, o autor faz a contextualização do nascimento da Congregação, idealizada como instrumento da reforma eclesiástica, no período dos séculos XV e XVI, época dominada pelas ideias e ideais que desaguam no Concílio de Trento. O grande problema enfrentado pela Igreja nesse tempo, na península como alhures, é o problema da falta de preparação do clero, que levava à inconsistência teológica dos pastores, num clima de grande efervescência nascido do Renascimento. E a fundação dos cónegos azuis, até hoje pouco ou nada estudado, constitui, como afirma o autor, (p.23) o protesto mais veemente que se fez em Portugal, contra a degradação moral e intelectual do clero, antes da chegada dos jesuítas já no Pós-Consílio de Trento. A sua originalidade de vida consistia numa síntese de vida devota, humilde e solitária, com a solenidade da vida coral e litúrgica e da aliança da vida em comum por clérigos seculares, com o rigor da disciplina claustral.

Merece especial atenção ao autor o estudo dos hagiógrafos e memorialistas da Congregação, através dos quais passa a história da Congregação e a mentalidade da época, antes de se debruçar, especificamente, sobre Santa Maria da Feira. É aqui que nos aparece a moldura, a história e a circunstância do aparecimento da fundação feirense, a que esta obra consagra cerca de setenta páginas de história, com anotação cuidada de protagonistas, vicissitudes e actores, do aparecimento e desenvolvimento do mosteiro, desde a origem até à sua extinção pelo liberalismo, segundo o Decreto conhecido de D. Pedro e de Joaquim António de Aguiar, que declarava extintos em Portugal, Algarve e ilhas adjacentes e demais domínios portugueses, todos os conventos, mosteiro, colégios, hospícios e quaisquer casas de religiosos de todos as ordens regulares.

O autor produziu um excelente trabalho científico não apenas com recurso às fontes documentais, mas também à bibliografia que contextualiza o aparecimento dos Loios, no dealbar do mundo moderno, entre as heresias ou tendências protestantes e a reforma católica, saída do Concílio de Trento.

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Muito valorizam esta obra a excelente edição e a óptima fotografia que fornece ao leitor os aspectos relevantes da arquitectura e escultura do convento de Loios, na cidade de Santa Maria da Feira.

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BOAVENTURA, S. – Itinerário da Mente para Deus, Tradução de António Soares Pinheiro, S.J.; Uma leitura introdutória de Maria Manuela Brito Martins, Colecção Textos Franciscanos, Ed. Centro de Estudos Franciscanos, Porto, 2009, 223 pgs.

A publicação deste clássico de S.Boaventura, e do pensamento cristão de inspiração franciscana, deve-se à feliz iniciativa do Centro de Estudos franciscanos que, ao criar a colecção Textos Franciscanos de que este é o primeiro volume, pretende divulgar as obras mais representativas deste carisma e tradição.

Associa-se ainda ao 800º aniversário da fundação da Ordem Franciscana, da qual S.Boaventura foi Ministro Geral. Precisamente em 1259 (há 750 anos) S.Boventura subiu ao Monte Alverne, nos Apeninos, em busca de refúgio e solidão, e aí, revivendo a aparição de um Serafim a S.Francisco, terá recebido a inspiração para escrever o Itinerário.

Esta obra, de carácter essencialmente místico, consta de sete capítulos, cujos títulos, na sua sequência e progressão indiciam a estrutura da obra, e o perfil do próprio pensamento boaventuriano. Assim:

O cap. I intitula-se Degraus para a ascensão para Deus e dispeculação de Deus pelos seus vestígios no Universo

O cap. II – Dispeculação de Deus nos seus vestígios no mundo da sensação O cap. III – Dispeculação de Deus pela sua imagem impressa nas potências naturais O cap. IV – Dispeculação de Deus na sua imagem renovada pelos dons sobrenaturais O cap. V – Dispeculação da Unidade Divina pelo seu primeiro nome que é a existência O cap. VI – Dispeculação da Santíssima Trindade no nome que é o Bem

O cap. VII – xtase mental e místico em que se dá descanso ao entendimento e pelo êxtase o amor se transfere totalmente para Deus

Estamos perante uma autêntica arquitectura do pensamento que, qual catedral, nos procura conduzir , por caminho seguro e gradativo à contemplação de Deus, fazendo--nos evocar, por analogia, as célebres Moradas de Sta. Teresa de Ávila.

Tomando como referência a excelente introdução a cargo da Prof.Dra. Maria Manuela Martins esses seis degraus apresentam a seguinte especificação e finalidade:

“O primeiro capítulo pretende mostrar como, através da ordem sensível universal, podemos, por meio de uma escala ascencional, encontrar os vestígios da presença de Deus” (p.29)

“No segundo grau desta ascensão, já não procuramos contemplar a Deus por meio da imagem das realidades sensíveis, mas enquanto elas são imagens do próprio Deus, com essência, potência e presença. A este segundo grau compete “levar-nos à contemplação de Deus, em todas as criaturas que entram na nossa mente pels sentidos corporais” (capII, 1)” (p.35)

“Chegados ao terceiro gau, somos levados a contemplar Deus através da sua imagem impressa nas faculdades naturais. Trata-se agora de contemplar Deus, por meio da sua imagem (per suam imaginem) . Para isso teremos de entar na nossa mente para podermos aí contemplá-Lo. Porque é na nossa mente que Ele reluz a Sua imagem” (p.38).

“O quarto grau é aquele que nos faz entrar em nós, de forma a contemplarmos o Primeiro Princípio. Visto que Deus está mais próximo das nossas mentes, é necessário, portanto, que contemplemos em nós, Aquele que é a origem dessa contemplação.” (p.45)

“No quinto grau passamos a contemplar Deus acima de nós, não como o tínhamos feito até aqui, por meio de vestígio exterior a nós, mas por meio de imagem interior a nós”. A partir de agora será, por meio da luz e acima de nós, mediante a qual a nossa mente é iluminada” (p.48)

“(No sexto grau) o olhar da nossa inteligência deve agora ser elevado até á contemplação da Santíssima Trindade, por meio do fundamento essencialíssimo que é o Bem”.(…) (Nele) podemos contemplar, no primeiro princípio supremo e mediador,

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entre Deus e o homem, que é Jesus Cristo, todas aquelas coisas que não têm correspon-dência analógica, na ordem da criação, a algo semelhante a esses Princí pios (p.53/54) Esta obra é pois de uma grande riqueza espiritual não só pelo seu conteúdo interno , mas também pelas conexões que se podem estabelecer com grandes autores da espiritualidade medieval. É o caso, entre outros de S.Francisco, Sto.Agostinho ou Dionísio Pseudo-Areopagita como é aliás relevado no estudo prévio.

O facto de estarmos perante uma edição bilingue, é uma tradução de inegável qualidade que torna a obra ainda mais apetecível e valiosa.

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ALVES, Herculano – Sementes da Palavra I Antigo Testamento; II Novo Testamento; III Evangelhos, Coimbra, Colecção Dinamização Bíblica vols.30; 31; 32, Difusora Bíblica 2009.

O autor, franciscano capuchinho e docente de Novo Testamento na UCP Porto desde 1986, e coordenador geral da tradução da Bíblia em português da Difusora Bíblica, sintetiza aqui em três volumes a sua actividade de dinamização dos cursos bíblicos que a sua congregação promove há um quarto de século por esse país fora, servindo ao povo de Deus o contacto e a oração com a Palavra. Não se trata de qualquer comentário bíblico sistemático monográfico ou dedicado a um único livro, nem sequer de uma teologia do Antigo ou do Novo Testamento. Também não pretende ser uma introdução ao Antigo nem ao Novo Testamento. Mas como o próprio autor refere, pretende coligir nestes três tomos as respostas sintéticas e rápidas às muitas perguntas que foi encontrando ao longo destes anos no contacto com o povo de Deus, escolhendo dos textos bíblicos aquelas passagens (umas mais significativas, outras mais difíceis ou surpreendentes) que mais directamente enfrentam as questões difíceis da vida humana. O público-alvo destes três volumes é constituído sobretudo pelos destinatários da actividade que o autor vem exercendo ao longo dos últimos anos. O autor mesmo explicita-os: catequistas, grupos bíblicos, escolas bíblicas ou escolas da Palavra, e outros eventualmente.

Por tudo isto já agradecemos ao autor esta recolha, de alguém que contactou e contacta no terreno com o povo de Deus e que por isso é acarinhado. Recorde-se que este seu trabalho constitui uma consequência directa dos anseios do Concílio. No caso presente, ajuda a Igreja que está em Portugal a distribuir o manancial da Palavra de Deus, dando-a a conhecer, conversando sobre ela, para mais ser amada.

O autor limpou o texto de notas de roda-pé. Organizou 49 parágrafos no primeiro volume, 53 no segundo e 45 no terceiro. No1º volume distribui os temas em seis capítulos: I – personagens do Antigo Testamento; II-temas do livro dos Génesis; III – as principais festas bíblicas; IV- a oração salmódica em Israel; V – os desertos bíblicos; VI – temas variados do Antigo Testamento. No 2º volume também começa com uma secção sobre personagens importantes do Novo Testamento, para de seguida abordar questões da área da propedêutica bíblica na secção II sobre a palavra de Deus transmitida. No cap. III vê Paulo do ponto de vista biográfico e geográfico e no IV a Igreja como comunidade. No cap. V reflecte sobre o baptismo mais numa perspectiva pastoral, no cap.VI aborda alguns títulos de Jesus nos evangelhos, no cap.VII alguns traços de Maria, e no último capítulo trata mais em concreto algumas passagens do texto do Novo Testamento, reservando algumas notas para a importante área da apocalíptica. O terceiro tomo está organizado de modo diverso, porque dedica um capítulo a cada evangelista, apresentando-o a partir de alguns excertos do respectivo texto evangélico.

Estamos, portanto, perante uma introdução geral a algumas secções do texto bíblico e a alguns temas mais comuns, constituindo este um bom instrumento para de um modo rápido ficar com um panorama ora sobre algum texto, ora sobre alguma figura bíblica, ora sobre algum tema candente. Certamente as comunidades saberão tirar proveito de tudo isto nos seus diversos grupos.

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JAFFÉ, Dan – El Talmud y los orígenes judíos del cristianismo Jesús, Pablo y los judeo-cristianos en la literatura talmúdica, Bilbao, Desclée de Brouwer 2009, 235 pp. Estamos perante a tradução de uma obra de 2007 em língua francesa, da autoria de um professor de História das religiões e das relações entre o judaísmo rabínico e o cristianismo primitivo na Universidade Bar-Ilan em Israel, e que retoma uma obra sua anterior de 2005 com o título Le Judaïsme et l’Avènement du christisanisme. Orthodoxie et hétérodoxie dans la littérature talmudique Ier-IIesiècle, publicada pela Cerf de Paris. A perspectiva do autor é eminentemente histórica e judaica sobre um período muito difícil do judaísmo contemporâneo do Novo Testamento, o judaísmo de Yabné que vai entre a destruição do templo e a revolta de Bar-Kochba (p.17). Por outro lado, isto obriga o autor a não fugir ao difícil tema do judeo-cristianismo e à respectiva definição, tanto quanto é possível. Dan Jaffé parte da sociedade judía do fim do primeiro século, contemporânea do surgimento do Novo Testamento e do movimento decorrente de Jesus e de Paulo. O judaísmo deste período apresentava-se como plural (como o próprio Flávio Josepho o atesta: Ant.Jud XIII.289), mas os sábios de Israel, os “amoraim” e os “tannaîm” (essa elite dominante: p.48) tentarão superar estas divisões após a trágica destruição do templo por Tito no ano 70 para recompor a identidade do judaísmo, impondo-se aos demais grupos, pelo menos àqueles menos representativos. Este acontecimento marca a história judaica, e os seus ecos chegarão à literatura talmúdica. Dan Jaffé parte daqui, sobretudo do primeiro corpo literário que molda o judaísmo rabínico – a Mishna. Trata-se, portanto, nesta obra, de uma investigação histórica sobre o contexto social e cultural do judaísmo rabínico. Não sendo uma investigação exaustiva das fontes do cristianismo na literatura rabínica (p.13), o autor pretende isolar desta última referências históricas às figuras de Jesus e de Paulo, ainda que reconhecendo que elas são a maior parte das vezes crípticas (p.201) ou implícitas. O autor assume uma clássica directriz dos estudos exegéticos do Novo Testamento e que recentemente tem estado outra vez na moda na exegese bíblica e na cristologia: confrontar Jesus e Paulo com o judaísmo do seu tempo.

A separação entre o judaísmo e o cristianismo nascente, para Dan Jaffé, resulta apenas da destruição do templo no ano 70. Esse acontecimento separou o judaísmo rabínico do judeo-cristianismo (como se este fosse um movimento exclusivamente cristão) porque os sábios de Israel trataram de reencontrar a identidade do povo de Israel após a destruição definitiva do templo de Jerusalém, inspirando-se da halaká (pp.12.202). De facto, Dan Jaffé explica esta separação como sendo apenas da exclusiva responsabilidade das autoridades judaicas emergentes, como se o próprio cristianismo não se demarcasse do judaísmo tardo-vetero-testamentário ou não representasse uma novidade face ao mesmo. Ora, o fenómeno do judeo-cristianismo é muito mais complexo do que o autor aqui o apresenta. Não é rigoroso dizer que os judeo-cristãos todos iam sem mais à sinagoga ou que um judeu em nada se distinguia de um judeo-cristão (pp.45.78.203). aliás, a própria cristologia de Mateus é exemplificativa disso mesmo, como o mostra C. Focant, “La christologie de Matthieu à la croisée dês chemins”, RThL 41 (2010) 30. Depois de uma longa introdução, o autor desenvolve sete capítulos, um por cada citação implícita ou explícita ao movimento religioso iniciado por Jesus e por Paulo. Começa com uma citação de AbodZar 16-17 em que é referido “yeshua ha-nosrî” (p.66), cujo discípulo Tiago encontra Rabbi Eliézer. Com isso mostra como a partir dos anos 80-90 do séc.I d.C. se dá já uma separação dos cristãos das tradições judaicas porque os sábios proclamam a oração de execração, a birkat-haminîm (p.76). O mesmo é reafirmado no capítulo seguinte (p.77) onde analisa um texto da tosephta sobre a degolação ritual e a kashrût (Hulin II.22-23). No capítulo terceiro (p.87) especifica esta separação entre os Sábios e os judeo-cristãos a partir do modo inquisitorial como os Sábios tratavam os “minim” e os seus livros (os “guilyônim”) de acordo com o tratado sobre o sábado na tosephta (Shab XIII.5). Aqui o autor tem o cuidado de advertir o leitor do terreno extremamente movediço a propósito das origens e do sentido do termo “guilyônim” (p.92) apresentando

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os defensores e os detractores da tese que identifica estes “guilyônim” com os evangelhos cristãos. Apesar do esforço de crítica textual, as conclusões não o chegam a ser, ou seja, o autor continua a chegar a resultados inconclusivos (pp.94-95). Uma base igualmente movediça constitui a reflexão no capítulo IV (pp.115-126) sobre uma referência ao evangelho na versão mateana de Mt 5,17, essa discussão infindável sobre os contornos da leitura tipológica do Antigo no Novo Testamento. O capítulo V é dedicado à famosa oração da birkat ha-minim que já lá vem indiciada desde o período da Grande Assembleia no domínio asmoneu em Israel, e o capítulo seguinte é dedicado a uma referência talmúdica a Jesus em Sanh 107b. Ambos os capítulos concluem pela exiguidade dos testemunhos cujos processos redactoriais não permitem chegar a grandes resultados (p. 157). Mas apesar disso, o capítulo VII mostra como a temática da lei – tema tão caro ao mundo judaico – efectivamente separa Paulo e a fé cristã da tradição de Moisés. Intitular este capítulo com a busca do “ensinamento de Paulo no talmud” é já à partida sintomático. Na verdade, o leitor acabará por descobrir da incongruência do mesmo. Quando o talmud fala em lei restringe apenas à lei mosaica. Ora, se existe um conceito paulino antanáclico é este, semântica que o autor não tem em conta, e por causa disso acaba-se por se compreender o título deste capítulo, título que não corresponde ao sentido que Paulo dá ao termo “lei” mas que um judeu contempla – apenas a lei de Moisés. Assim, ao chegarmos ao final da obra, mantém-se a perspectiva judaica da leitura da Torah. Apesar de evidenciar no início aspectos da vida do judaísmo (como a ênfase no valor da vida acima do valor da lei [p.28], o que mostra que os sábios adoptaram uma postura pragmática), a interpretação feita de alguns textos de Paulo na p.177 continua a evidenciar a insistência judaica, farisaica, rabínica, no estudo da Torah (a talmud torah), o que é sinal de que não se compreendeu a intenção retórica evidente do apóstolo das Gentes. Consideramos, no entanto, o capítulo final como o melhor conseguido, no qual são apresentados autores em contraposição com a escola protestante liberal de Tübingen a partir dos meados do século XIX (já desde Spinoza, passando por Klausner, Dupuy, e mais recentemente David Flusser e Geza Vermes), autores judaicos esses que aceitam já nessa fase o valor histórico dos evangelhos. É interessante e útil esta leitura judaica de Jesus, sobretudo a partir dos contributos que também por isso mesmo deixaram marcas na exegese. Todavia, neste ponto gostaríamos de ver um maior distanciamento face a algumas conclusões da obra de Klausner de 1922 (p.189), porque Jesus, ao contrário do que é afirmado, não está nos antípodas da doutrina da encarnação (como o prova o título daniélico de “filho do homem” distribuído ao longo dos sinópticos).

O livro conclui-se com uma extensa e actualizada bibliografia e com um índice muito útil para o leitor, como são todos os índices quer de autores (p.228) quer de passagens bíblicas ou da literatura cristã antiga (pp.229-235). Mas há uma ausência demasiado evidente, até do ponto de vista metodológico. Não são citados quaisquer textos apócrifos do Antigo Testamento, nem são referidos os trabalhos de Martin Hengel. Ora, se existe sinal da pluralidade do judaísmo mesmo depois da destruição do templo no ano 70 é precisamente esta, a qual, por sua vez, traz à colacção a questão ainda não resolvida nesse período do cânone bíblico do Antigo Testamento. Cânones não coincidentes são sinónimo de medidas diferentes. Neste sentido, não é possível acompanhar o autor na p.21 e depois quando refere que depois do ano 70 o judaísmo uniformizou-se, nem é possível aceitar esta mesma tese defendida por S. C. Mimouni, Le judéo-christianisme ancien. Essais historiques, Paris 1998, 486.

Em síntese, este esboço de exercício histórico das fontes do cristianismo a partir das fontes judaicas é bastante interessante, fornecendo uma imagem que muitas vezes não é tida em conta na exegese bíblica. E é sempre bom ter outros olhares, de outros quadrantes. Foram estes quadrantes que ajudaram a reposicionar Jesus no seu tempo, no seu mundo judaico, contexto cultural particular em que se dá a revelação universal. José Carlos Carvalho

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PETROVICH, Nicola – 2009. La voce dell’amore. Verità e agape nel Nuovo pensiero di Franz Rosenzweig. Sulla Persona e sulla Famiglia 1. Siena: Edizioni Cantagalli.

Nicola Petrovich, veneziano doutorado no Pontificio Istituto Giovanni Paolo II per Studi su Matrimonio e Famiglia e presidente do Studio Teologico del Seminario Patriarcale di Venezia, firma-se nos ensaios do judeo[-cristão] alemão Franz Rosenzweig (1886 Kassel – 1929 Frankfurt), um dos mais determinantes filósofos-teólogos do século transato, autor de «Der Stern der Erlösung» («A estrela da redenção», 1921) e inspirador de Walter Benjamin e Emmanuel Lévinas. O escritor italiano intenta superar o cunho quase absolutamente racional do conceito greco-ocidental de «verdade», transmutando-o num existencial de aspiração veramente personalista e cósmica, a saber: a «verdade» que flore em «amor», geneticamente dialógico, como cadeia de ácido desoxirribonucleico combinando a liberdade de dois entes, nunca conclusivo, perenemente mutante em uma novidade expressa por pétalas linguísticas, surpreendentes.

A qual «verdade», em sentido heideggeriano, não logra ser descrita pela só razão do «anthropos theoretikos», por não superar as fronteiras do fenómeno «amor», milagre imprevisto, inacessível. Pois que a individualidade humana, metafísica, metalógica e metaética se altera por uma «ontologia da diferença» permita pelo «amor agápico»: A «correlacionalidade» prototípica, transfundo da revelação recíproca, emerge como Dasein identificador do sujeito. Amari ergo sum se reconhece como o lema que emana a possibilidade evolutiva da liberdade, categorial orientador da «atividade» que responde à «passividade» necessitante: Do apelo kenótico originário transborda a água que dá sede e sacia, enchendo o leito da «temporalidade» do evento enigmático do «amor renovado e renovante», e estabilizando a corrente da relação na instabilidade do caudal da história. Verdade é que a apofania do amor performativo, mais real que metafórico, acontece em modo de linguagem verbal, mediando e acercando distintos, assim ao nível antropológico, como na intuição do Amante e Amado Divino, o maestro da universalidade atemporal do cântico do amor.

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TAUBER, Alfred I – Patient autonomy and the Ethics Responsibility. Cambridge (MA): The MIT Press, 2005, 328pp

O princípio da autonomia do doente tornou-se, nas últimas décadas, um factor dominante na ética médica, à luz do qual se deveriam examinar todas as decisões tomadas no decurso da prestação de cuidados de saúde. Por oposição à atitude médica, de origem hipocrática, de se considerar o profissional de saúde como o melhor advogado do interesse dos doentes e o decisor mais apetrechado, atitude essa designada como paternalismo médico, o respeito pela capacidade do doente se governar a si próprio e tomar decisões acerca da sua saúde tem-se imposto em vasta medida. Todavia, reconhece-se cada vez mais que a autonomia do paciente tem limites, pode conflituar com outros princípios considerados como tendo valor prima facie (particularmente com a beneficência) e muitas vezes não pode ser exercida (doentes menores, incapazes, indecisos, em situação de ansiedade, medo ou pânico)

Parece-nos por isso particularmente importante este livro de Alfred Tauber que, sendo Professor de Medicina e de Filosofia na Universidade de Boston, inscreveu como epígrafe e leitmotiv da sua obra o aforismo de Galeno, “o melhor médico é também um filósofo”. O Autor encontra-se assim em boas condições de analisar o conceito de autonomia, de emergência recente, com os contributos de Locke, Kant, Hume e Stuart Mill a delinearem os seus traços e a tornar-se verdadeiramente importante, e até persuasivo, a partir do movimento dos direitos humanos, isto é, ao passar da esfera do social e político para o âmbito da ética.

Tauber disseca a história e a natureza da relação médico-doente e a sua relação com o conceito de pessoa e dignidade humanas, para avançar uma teoria sobre a competição, na medicina, entre factos e valores, concluindo que a autonomia do doente tem de ser reconfigurada à luz da responsabilidade e beneficência do médico. A beneficência e a responsabilidade são princípios morais compatíveis com a autonomia do paciente, podendo até reforçar o seu papel: desta forma, a medicina pode humanizar-se e tornar-se mais eficaz.

O que o Autor propõe é uma verdadeira aliança entre paciente e cuidador, em clima de “intimidade moral”. Estes conceitos devem encontrar reflexo no curriculum das escolas médicas, de modo a que os futuros médicos adquiram a armadura moral que lhes permita encarar, na sua prática, os problemas que se lhes depararão, conseguindo conciliar o respeito pela autonomia com a sua dedicação ao inalienável dever de cuidar ou até de curar, que é da sua responsabilidade pôr em prática.

A obra é acompanhada de extensas notas, de uma longa lista bibliográfica e de um índice alfabético remissivo.

Referências

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