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O consulado honorário da França em Florianópolis no contexto das relações diplomáticas Brasil-França

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RAISSA ALEXANDRA MARIANI

O CONSULADO HONORÁRIO DA FRANÇA EM FLORIANÓPOLIS NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS BRASIL-FRANÇA

Florianópolis 2013

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RAISSA ALEXANDRA MARIANI

O CONSULADO HONORÁRIO DA FRANÇA EM FLORIANÓPOLIS NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS BRASIL-FRANÇA

Relatório de Estágio apresentado ao Curso de Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais.

Orientador: Prof. Msc. João Batista da Silva. Co-orientador: Profª. Msc. Fabiana Witt.

Florianópolis 2013

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Àqueles que, através do amor e de seus exemplos de vida, me ensinaram a forjar o caráter também na adversidade - e a jamais desistir: À Vânia Elizabete da Trindade Mariani e a Alexandre Altino Mariani, de quem me orgulho - meus amados pais e luz nesta e desta existência.

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AGRADECIMENTOS

Ao mestre, orientador, professor e amigo João Batista da Silva, por ter em mim despertado e nutrido a paixão pelo Direito Internacional e pela Segurança Internacional; por ser um modelo e um norte; nas orientações, por todo seu tempo, atenção e presteza, constante motivação e paciência, bem como pela amizade sobrevivente aos anos e às minhas “crises existenciais”: Todo o infinito agradecimento, respeito e admiração que poderia lhe reservar.

Monsieur Jean-Victor Martin: Vous m'avez donné plus qu’une signature – vous m’avez donné une opportunité ! Je tiens à vous remercier énormement, tout particulièrement pour m’accorder votre pleine confiance, pour m’attribuir des missions valorisantes et pour être également disponible à m’aider avec compréhension et patience pendant cette étape délicate. Travailler avec vous et pouvoir apprendre sur le tas, c’est un honneur pour moi ! À vous toute ma gratitude, mon respect et mon admiration !

Representando a Universidade do Sul de Santa Catarina: À Coordenadora Professora Sílvia Barbosa Back e à Professora Fabiana Witt, ambas por serem sempre tão solícitas e desempenharem coordenação e co-orientação, respectivamente, sob abordagem tão humana. Muito obrigada por sempre terem me recebido com braços, mente e coração abertos! Ao Professor José Baltazar de Andrade Guerra: Por me relembrar, um dia quando já não me sentia assim, de que “toda gente é gente” – por ter sempre instigado minha veia de pesquisa e, através de suas aulas e ensinamentos, ter me estimulado sempre a continuar dando o melhor de mim. Igualmente, todo o meu agradecimento, respeito e admiração.

Ao Doutor José Paulo Figueiredo, por cuidar da minha saúde fragilizada, principalmente nos anos mais recentes - verdadeiro médico, amigo e exemplo de vida. Muito obrigada por tratar do corpo e da alma do ser humano com tamanha vocação. Todo o meu agradecimento, respeito e admiração. Este trabalho também é dedicado ao Sr., que sempre acreditou em mim.

Ao amigo-irmão Yuri Castro Flach e família, pelo indescritível apoio durante as inúmeras caminhadas. Todo o meu reconhecimento, respeito e afeto a vocês quatro, que há muito habitam o meu coração e sempre o farão. Digo o mesmo à amiga-irmã Beatriz D’Elia – palavras, aqui, tornam-se insuficientes.

Adriana Bonherberger, Cátia Bernardo, Marcos Mauricio Marafon, Suzanne Scoz Pasteur de Faria, Maria Carolina Iaczinski, Fabiana Dutra; também a Thales Augusto Brasil da Rosa, Lívia Sudare, André Luiz, Ana Maria Joenck, Patrícia Boeing e Carlos Eduardo Corrêa Nogueira, Rodrigo Fabre Feltrin: O verdadeiro significado de companheirismo e de

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lealdade – o que seria de mim sem a amizade de vocês? Diariamente me restituem a fé na humanidade por serem quem são.

À Raphael de Andrade, por toda a sua paciência e auxílio na impressão deste trabalho. Aos demais, presentes na lembrança e que, de forma direta ou indireta, contribuíram para que concluísse este ciclo com êxito.

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« Il y a quelques années qu’en visitant, ou, pour mieux dire, en furetant Notre-Dame, l’auteur de ce livre trouva, dans un recoin obscur de l’une des tours, ce mot gravé à la main sur le mur : AN† • KH. Ces majuscules grecques, noires de vétusté et assez profondément entaillées dans la pierre, je ne sais quels signes propres à la calligraphie gothique empreints dans leurs formes et dans leurs attitudes, comme pour révéler que c’était une main du moyen-âge qui les avait écrites là, surtout le sens lugubre et fatal qu’elles renferment, frappèrent vivement l’auteur. Ainsi, hormis le fragile souvenir que lui consacre ici l’auteur de ce livre, il ne reste plus rien aujourd’hui du mot mystérieux gravé dans la sombre tour de Notre-Dame, rien de la destinée inconnue qu’il résumait si mélancoliquement. L’homme qui a écrit ce mot sur ce mur s’est effacé, il y a plusieurs siècles, du milieu des générations, le mot s’est à son tour effacé du mur de l’église, l’église elle-même s’effacera bientôt peut-être de la terre. [...] C’est sur ce mot qu’on a fait ce livre. » (Victor Hugo)

« Ave Maria: Protège-moi de la misère, du mal et des fous qui règnent sur la terre. Ave Maria: Des étrangers il en vient de partout. Ave Maria, écoute-moi: Fais tomber les barrières entre nous, qui sommes tous des frères. Ave Maria: Veille sur mes jours et sur mes nuits. Protège-moi, veille sur mon amour et ma vie. » (Luc Plamondon, Richard Cocciante)

« Bohémienne, nul ne sait le pays d'où je viens. Bohémienne, je suis fille de grands chemins. Bohémienne, qui peut dire où je serai demain? Bohémienne, c'est écrit dans les lignes de ma main. » (Luc Plamondon, Richard Cocciante)

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RESUMO

O Direito Internacional procura disciplinar os membros da sociedade internacional a agirem numa posição jurídico-pública no âmbito das Relações Internacionais. Ao lado dos interesses estatais, políticos e socioeconômicos, encontram-se como práticas prioritárias a cooperação, a solidariedade e o intercâmbio. As relações de cooperação são percebidas como forma de gerenciamento da crise dos Estados que se pretendem Democráticos e de Direito. Com a complexização das Relações Internacionais e a evolução do Direito Internacional Público, acrescida de uma modificação nos movimentos migratórios, reforça-se a necessidade de resgatar a hospitalidade à esfera pública. O Direito Diplomático da atualidade, alicerçado nas Convenções de Viena sobre Relações Diplomáticas e sobre Relações Consulares, procura instrumentalizar o trato nesse novo cenário. Torna-se imprescindível a presença do ente diplomático para o desenvolvimento das relações nacionais e internacionais, a avalização da execução dos deveres oficiais na defesa dos interesses recíprocos dos Estados, a proteção do cidadão nacional e a manutenção da cidadania. Nesse contexto, são analisadas as relações franco-brasileiras e a atual presença francesa no Brasil, identificadas no delineamento da estrutura consular do Consulado Honorário da França em Florianópolis, com suas competências gerais e específicas.

Palavras-chave: Relações Internacionais. Direito Internacional Público. Direito Diplomático. Relações franco-brasileiras. Consulado Honorário da França em Florianópolis.

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RÉSUMÉ

Le droit international vise à imposer aux membres de la société internationale une position juridique et publique qui s'inscrive dans le cadre des relations internationales. Parallèlement aux intérêts d'Etat, politiques et socio-économiques, se trouvent des pratiques prioritaires telles que la coopération, la solidarité et l'échange. Les relations de coopération sont perçues comme une forme de gestion de crise d'Etats qui se disent démocratiques et de droit. Face à la complexité croissante des relations internationales et à l'évolution du droit international public, qui s'aggrave par une modification des mouvements migratoires, il devient de plus en plus nécessaire de sauvegarder l'hospitalité vis à vis de la sphère publique. Le droit diplomatique actuel, défendu par les Conventions de Vienne relatives aux relations diplomatiques et consulaires, vise à régir les relations dans ce nouveau cadre. La présence du service diplomatique devient indispensable au développement des relations nationales et internationales, à la garantie de l'exécution des devoirs officiels pour la protection des intérêts réciproques des Etats, à la protection des citoyens et au maintien de la citoyenneté. Dans ce contexte, seront analysées les relations franco-brésiliennes et la présence française, actuellement, au Brésil, identifiées dans la structure consulaire du Consulat Honoraire de France à Florianopolis, au travers de ses compétences générales et spécifiques.

Mots-clés: Relations Internationales. Droit International Publique. Droit Diplomatique. Relations franco-brésiliennes. Consulat Honoraire de France à Florianópolis.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Privilégios e imunidades diplomáticas: ... 57 Tabela 2 – Privilégios e imunidades consulares: ... 58

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

1.1 EXPOSIÇÃO DO TEMA E DO PROBLEMA ... 13

1.1.1 Tema ... 13 1.1.2 Problema ... 13 1.1.3 Objetivo geral ... 13 1.1.4 Objetivos específicos ... 13 1.2 JUSTIFICATIVA ... 13 1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 14 1.4 ESTRUTURA DA PESQUISA ... 15 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 16

2.1 DO ESTADO – BREVES APONTAMENTOS ... 16

2.1.1 Definições e elementos formais constitutivos ... 18

2.1.2 Outros conceitos norteadores ... 21

2.1.3 Estado Moderno – Estado Democrático de Direito ... 24

2.2 DIREITO INTERNACIONAL: DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E RELAÇÕES INTERNACIONAIS ... 26

2.3 DO PROCESSO MIGRATÓRIO ... 29

2.3.1 Identidade versus diferença ... 36

2.3.2 Neocolonialismo versus identidades nacional, cultural e híbrida ... 40

2.3.3 Políticas migratórias: Cidadania versus soberania. ... 44

2.4 DIREITO DIPLOMÁTICO ... 52

2.4.1 Organismos do Estado e suas funções nas Relações Internacionais ... 56

2.4.2 Regulamentações ... 59

2.4.2.1 Verificação da Convenção de Viena Sobre Relações Consulares (1963) ... 63

2.5 O EU E O OUTRO: BRASIL E FRANÇA ... 67

2.5.1 Relações franco-brasileiras ... 67

2.5.2 Atual presença francesa no Brasil ... 74

3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS ... 77

3.1 CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DE ESTÁGIO ... 77

3.2 APRESENTAÇÃO DE DADOS SOBRE O PROBLEMA DE PESQUISA ... 78

3.2.1 Identificação da estrutura consular no delineamento do Consulado Honorário da França em Florianópolis ... 78

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3.2.2 Verificação das competências gerais e específicas ... 81

3.2.3 Cônsul honorário: Jean-Victor Martin ... 82

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 85

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1 INTRODUÇÃO

Com a complexização das Relações Internacionais e a evolução do Direito Internacional Público a partir dos períodos de Pós-guerra, a sociedade internacional adquire caráter universal ao ter sua atividade regida por diversos atores no cenário: O surgimento de novos Estados, a busca pelo reconhecimento de sua soberania e a sua efetiva aplicação nas relações de interdependência em um sistema anárquico, este apresentando sua dinâmica funcionando em um plano de horizontalidade. Se as relações diplomáticas existem desde os primórdios, desde a primeira ocasião em que o homem sentiu a necessidade de ser representado, tem-se que essa prática também fora intensificada com a interação com os demais Estados, organismos internacionais, organizações não-governamentais, dentre outros sujeitos de Direito Internacional.

Nas últimas décadas, após de percebida também uma modificação nos movimentos migratórios, mundialmente surgiram os primeiros estudos direcionados no mundo acadêmico. Observa-se, entretanto, que nunca foi tão difícil circular. Em um mundo onde as distâncias se tornam cada vez menores, com pessoas e informações rompendo as barreiras do tempo e das fronteiras; em um sistema internacional e globalizado, em que se propõe pensar em uma ética igualmente global, faz-se preciso repensar e resgatar a hospitalidade à esfera pública, compreendendo de que modo o sentimento de ser ou não bem recepcionado favorece ou dificulta as políticas públicas de respeito aos direitos do outro1.

Assim sendo, se por um lado os interesses estatais, políticos e socioeconômicos majoraram, por outro a cooperação, a solidariedade e o intercâmbio tornam-se cada vez mais prioritários e presentes na nova Agenda Mundial, fazendo com que o Direito Diplomático instrumentalize cada vez mais as relações no novo cenário. A variedade, volume e alcance das tratativas agora sujeitas ao Direito Diplomático são indubitavelmente maiores do que no passado. Frente a tal desenvolvimento nas Relações Internacionais, faz-se necessário que os representantes diplomáticos atenham meios de garantir certa autonomia e flexibilidade. O presente trabalho, deste modo, apresenta como proposta maior expor o quão importante é a presença do ente diplomático, mais especificamente do agente consular, como meio de desenvolver as relações internacionais e avalizar a execução dos seus deveres oficiais na defesa dos interesses recíprocos dos Estados, da proteção do cidadão nacional e na manutenção da hospitalidade.

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1.1 EXPOSIÇÃO DO TEMA E DO PROBLEMA

1.1.1 Tema

O tema da presente pesquisa trata da atuação do Consulado Honorário da França em Florianópolis no contexto das relações diplomáticas Brasil-França, a partir de uma análise de sua ação no que diz respeito à presença de franceses em território brasileiro, mais especificamente na região metropolitana da Grande Florianópolis.

1.1.2 Problema

Busca-se verificar com esta pesquisa quais são as competências do Consulado Honorário da França em Florianópolis, o papel do Cônsul Honorário e se ambos respondem às demandas às quais se destinam.

1.1.3 Objetivo geral

Demonstrar a estrutura consular da França em Florianópolis e sua relação com o meio diplomático.

1.1.4 Objetivos específicos

a) Identificar a estrutura consular no delineamento do Consulado Honorário da França em Florianópolis;

b) Verificar quais as finalidades lá contidas e se as mesmas são atendidas; c) Destacar o papel do Cônsul Honorário face às questões levantadas.

1.2 JUSTIFICATIVA

O presente Relatório de Estágio deve ser apresentado ao Curso de Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais.

Ademais, o vínculo entre o Estado e indivíduo se estabelece através do exercício da cidadania: Os braços extensivos do primeiro tornam-se necessários não mais apenas para garantir a sua supremacia internacional. Igualmente, com a evidente intensificação da vida

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internacional, tem-se que a existência e atuação de entes diplomáticos constituam um verdadeiro imperativo, haja vista os governos necessitarem de agentes confiáveis e competentes nas tratativas entre o eu e o outro. O ente consular é aqui percebido como instrumento de gestão da identidade e de proteção ao nacional, garantindo sua cidadania onde quer que este esteja. Além disto, a paixão pelo Direito Internacional Público aliada ao imenso apreço pela história, cultura e língua francesas conduziram a um vínculo cooperativo com o Consulado Honorário da França; o acolhimento por este, conseqüentemente, impulsiona a busca pela graduação efetiva quase quatro anos após ter finalizado o curso de Relações Internacionais.

1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Em termos de procedimentos metodológicos, a pesquisa apresenta caráter exploratório e descritivo; é bibliográfica e documental quanto à coleta de dados; e qualitativa na abordagem do problema. Como estabelece GIL (1999, p.41), as pesquisas exploratórias visam proporcionar maior familiaridade com o problema, evidenciando-o ou construindo hipóteses. Seu objetivo primordial é o aprimoramento de idéias. Quanto a ser exploratória, ainda conforme GIL (1999, p.43), “tem como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias”.

Para o autor (1999, p.43), “este tipo de pesquisa é realizado especialmente quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele formular hipóteses precisas e operacionalizáveis.”. É descritiva ao compreender a coleta, análise e exposição de dados representativos de determinada situação ou fenômeno. GIL (1999, p.44) versa então: “têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis.”.

Segundo RUDIO (1999, p.71), o propósito de se encontrar assim caracterizada é o de “descobrir e observar fenômenos, procurando descrevê-los, classificá-los e interpretá-los, de modo que possamos conhecer sua natureza, composição, e os processos que nele se constituem ou se realizam”. Ainda, a presente análise pode ser caracterizada como avaliativa, ao descrever os fundamentos discutidos na área e no que concerne ao assunto abordado, alcançando os objetivos e metas propostas.

Por fim, trata-se de uma investigação qualitativa, pois, de acordo com RICHARDSON (1999, p.79-80) “se dá de forma a entender a natureza de um fenômeno social (...) e têm como objeto situações complexas ou estritamente particulares.”. Descreve a

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complexidade de determinado problema, analisa a interação de certas variáveis, compreende e classifica processos dinâmicos vividos por grupos sociais, contribui no processo de mudança de determinado grupo e possibilita, em maior nível de profundidade, o entendimento das particularidades do comportamento dos indivíduos.

Foram empregadas noções de conhecimento empírico e filosófico na construção desta pesquisa, no que concerne ao sentido prático do Relatório de Estágio. Ademais, utilizou-se do meio eletrônico e da pesquisa bibliográfica (livros e periódicos) como método de coleta de dados, posteriormente realizando-se a leitura preliminar, seletiva e reflexiva acerca do material pesquisado. Para fins de esclarecimento, toda a tradução efetuada será própria.

1.4 ESTRUTURA DA PESQUISA

A parte primeira traz a Fundamentação Teórica alinhavada através de cinco principais abordagens: Breves apontamentos quanto à definição, aos elementos formais constitutivos e a outros conceitos norteadores do Estado, compreendido enquanto Democrático de Direito; o Direito Internacional Público e as Relações Internacionais sinteticamente demonstrados sob o viés da cooperação no gerenciamento da crise do Estado; o processo migratório, recepcionado em algumas de suas recorrentes questões e visando à vinculação do indivíduo ao Estado, com destaque para a posição brasileira quanto à temática; a resumida valorização do Direito Diplomático para, dentro de sua esfera, apontar-se os organismos de Estado e suas funções nas Relações Internacionais, verificando a regulação e a justificação do ente consular através da Convenção de Viena sobre Relações Consulares; e, por derradeiro, a organização da ponte entre o eu (Brasil) e o outro (França) em um panorama das relações franco-brasileiras e a atual presença francesa no Brasil, de modo a permitir que, a partir desse contexto, se estabeleça e dimensione o foco do presente relatório, através do Consulado Honorário da França em Florianópolis.

No elemento segundo, apresentar-se-ão os dados e informações recolhidas acerca do problema de pesquisa, caracterizando o local de estágio e respondendo ao objetivo geral e aos específicos. O último item apresentará as considerações finais.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Com o intuito de elucidar o tema abordado, o presente capítulo realizará uma fundamentação teórica relacionando temas que atendam à aplicação do trabalho desenvolvido no Consulado Honorário da França em Florianópolis.

2.1 DO ESTADO – BREVES APONTAMENTOS

Numerosas e variadas teorias tentam explicar a origem do Estado, todas se contradizendo nas suas premissas e nas suas conclusões. O problema é dos mais difíceis, porquanto a ciência não dispõe de elementos seguros para reconstituir a história e os meios de vida das primeiras associações humanas. Basta ter em vista que o homem apareceu na face da Terra há pelo menos cem mil anos, enquanto os mais antigos elementos históricos dos quais se dispõem remontam apenas a seis mil. Assim é que todas as teorias são baseadas em meras hipóteses. A verdade, sem embargo dos subsídios que nos fornecem as ciências particulares, permanece envolta nas brumas da era pré-histórica - escassos são os informes que se tem, por exemplo, da formação do Estado egípcio, um dos mais antigos. Nem mesmo o bramanismo esclarece-nos com dados objetivos os pródromos do Estado hindu. Com esta nota preliminar fica a advertência de que as teorias sobre a origem do Estado, aqui resumidas, são meramente conjecturais, isto é, resultantes de raciocínios hipotéticos (MALUF, 2010. p.69).

Para COLARD (1981 apud CASTRO, 2012, p.32-33), a sociedade internacional contemporânea – fruto da transição de dois pós-guerras mundiais, e da alteração de eixos bipolares para multipolares com o pós-Guerra Fria – se torna complexa e instável devido a múltiplos fatores, apontando-se fundamentalmente três critérios, a saber: Processo de descolonização; unificação do campo de atividade diplomática e emergência de países em vias de desenvolvimento; revoluções nuclear, espacial, científica e técnica.

Politicamente, concomitantemente ao fenômeno de independência houve o aprofundamento do poder dos antigos impérios coloniais e a aparição d’uma vasta gama de novos Estados, compondo novos atores nos cenários nacionais e internacionais; economicamente e culturalmente, por conseguinte, surgiu vital reivindicação de uma nova ordem econômica mundial e o despertar das especificidades nacionais (COLARD, 1981 apud CASTRO, 2012, p.32-33). CASTRO (2012, p.55) dialoga e defende que, “superando o absolutismo das certezas prontas e imediatas – típicas do atual momento da pós-modernidade e da instantaneidade líquida da sociedade de massa midiaticamente explorada – é que será

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possível avançar [...] na compreensão de fenômenos internacionais tão antigos quanto a própria existência humana, com seus agrupamentos ampliados geograficamente e com suas especificidades culturais e religiosas”.

Segundo COLARD (1981 apud CASTRO, 2012, p.32-33), “são reforçadas as interdependências políticas, econômicas e estratégicas entre Leste e Oeste, Norte e Sul”; com o desenvolvimento de coadjuvantes e possíveis protagonistas no cenário internacional, e o declínio da antiga noção exclusivista de potência mundial, as relações, agora, passam a se horizontalizar e visar à cooperação estratégica. Porquanto avançam as tecnologias de observação, comunicação e exploração, também o progresso de políticas de segurança e de proteção aos interesses nacionais se faz necessário. Ainda que tornada a guerra um estado de exceção, diante da interdependência mundial e de questões sociais, intensificam-se e aceleram-se, respectivamente, as relações de cooperação e a corrida armamentista (COLARD, 1981 apud CASTRO, 2012, p.32-33).

Conforme salientado por BULL (2002 apud CASTRO, p.72), o ponto inicial das Relações Internacionais é “a existência de Estados, comunidades políticas independentes, cada uma das quais possui um governo e afirma sua soberania com relação a uma parte da superfície terrestre e a um segmento da população humana”. CASTRO2 (2012, p.36) comenta que a criação do conceito moderno de Estado, alicerçado na soberania (summa potestas), encontrava-se amparado pelo reconhecimento do princípio de estatocentrismo (sistema de uniformização estatal e de prevalência de seus institutos soberanos) como instrumento de política entre as nações, em um momento histórico - século XVII - onde os conceitos do realismo clássico (razões de estado) também começavam a se impor.

Para CASTRO (2012, p.36), a despeito de a soberania estatal representar o pilar da Paz de Vestfália (Tratados de Münster e de Osnabrück, embora também se considere comparte o Tratado dos Pirineus), suas origens e amadurecimento já estavam sendo traçados desde a Paz de Augsburgo em 1955, quando cada religião politicamente organizada poderia

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Cônsul A.H. da República de Malta. Presidente da Sociedade Consular de Pernambuco. Doutor em Ciência Política pela UFPE. Realizou estudos, após o doutorado, na Texas Tech University School of Law (1L). Mestre em Relações Internacionais (MA Public Affairs) pela Indiana University of Pennsylvania. Bacharel cum laude em Relações Internacionais e em Economia (minor) pela Indiana University of Pennsylvania, EUA. Assessor de Relações Internacionais e Interinstitucionais da Reitoria da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Coordenador do Núcleo de Estudos para a América Latina (NEAL). Coordenador da Cátedra Konrad Adenauer na UNICAP. Professor, coordenador do curso de Relações Internacionais e da pós-graduação em Diplomacia e Negócios Internacionais da Faculdade Damas da Instrução Cristã. Consultor e palestrante em Relações Internacionais.

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deter autonomia para determinar a religiosidade. Ainda em consonância com CASTRO (2012, p.36):

[...] uma revolução nada silenciosa estava ocorrendo: por um lado, a força da idéia da soberania estatal que brotava à época, passando pelo período chamado de Guerra dos Oitenta Anos (1568-1648) das revoluções de independência dos Países Baixos e, por outro lado, o declínio luso-espanhol vinha consolidar a mais expressiva mudança sistêmica das Relações Internacionais, assumindo o formato da política internacional moderna.

A partir daí, tornavam-se mais aplicáveis os limites entre as soberanias/políticas interna e a externa nos e dos Estados Nacionais (Estados-nação). O nascimento da concepção de Estado Contemporâneo como cerne da conjuntura internacional, “geraria, por seu turno, a formatação (naturalmente delineada ou artificialmente forjada) do ideal de nação, de nacionalidade e de identidade territorial” (CASTRO, 2012, p.36). Se a paz derivaria de um equilíbrio de poder, ver-se-ia um aprofundamento dessa noção com o Congresso de Viena (1815) e com o Tratado de Versalhes (1919).

2.1.1 Definições e elementos formais constitutivos

Antes de traçar-se um breve histórico, convém relacionar algumas citações sobre as definições de Estado para o entendimento de suas várias dimensões, bem como de conceitos a ele vinculados e norteadores da presente pesquisa. Dessa forma, desenvolve VATTEL (2004, p.01):

Nações ou Estados são corpos políticos, sociedades de homens unidos em conjunto e de forças solidárias, com o objetivo de alcançar segurança e vantagem comuns. Semelhante sociedade tem suas próprias atividades e interesses; ela delibera e toma decisões em comum e com isso se torna uma pessoa jurídica que tem entendimento e vontade próprios, e que é capaz de obrigações e de direitos.

KELSEN (1992, p.183-185) especifica: “Estado é a comunidade criada por uma ordem jurídica nacional (em contraposição a uma internacional)”. RESEK (2005, p.161) examina: “[...] personalidade originária de direito internacional público, ostenta três elementos conjugados: uma base territorial, uma comunidade humana estabelecida sobre essa área, e uma forma de governo não subordinada a qualquer autoridade exterior”. VAN CREVELD (2004 apud CASTRO, 2012, p.107), por sua vez, “entende o Estado como entidade corporativa abstrata dotada de personalidade. Assim, os autores demonstram que as

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definições de Estado encontram-se intrinsecamente ligadas à sua concepção – ambas a atemporal-filosófica e a histórica -, e, portanto, aos seus elementos constitutivos.

O Estado, SOARES (2002, p.21) estabelece,

[...] é uma das formas de organização que as sociedades humanas podem assumir. Seus elementos componentes são: um povo relativamente homogêneo, denominado nação, uma porção de espaço terrestre, marítimo e aéreo, denominado território, porção essa delimitada por fronteiras reconhecidas pelo Direito Internacional, e um elemento de relativa autonomia normativa dentro de tais espaços e sobre essa nação, exercida por um governo independente, denominado soberania.

CASTRO (2012, p.108) constata que a origem do Estado história moderna freqüentemente encontra-se forjada “na guerra, na violência e no revolucionarismo”, seja no âmbito interno ou no externo. Através da autonomia gradual, dos processos de independência, de insurreições e revoluções sociais e políticas, “o Estado vai sendo amoldado, atrelando um sentimento partilhado no tecido humano de nacionalismo e de pertença àquela ordem estatal” (CASTRO, 2012, p.108). No entanto, observa-se o caso peculiar do surgimento do próprio Brasil enquanto Estado:

[...] sob o ponto de vista da teoria formal (elementos constitutivos e reconhecimento) e substancial (eficácia e efetividade do governo), ainda no contexto da transferência da família Real de D. João VI, em 1808, e da revolução liberal do Porto de 1820. O Brasil teve seu nascimento, sob o recorte histórico, em 7 de setembro de 1822, com o grito às margens do riacho do Ipiranga por D. Pedro I. No entanto, tal fato histórico não traz seus necessários desdobramentos diretos e automáticos para o cenário internacional, pois seu nascimento no prisma político-jurídico-diplomático se deu em 1824 – ano da primeira carta constitucional que fora outorgada em 24 de março após dissolução da Assembléia Constituinte; e também em razão do primeiro reconhecimento do Império do Brasil por parte dos EUA. Vale ressaltar que a decretação da República pelo Marechal alagoano Deodoro da Fonseca, em 15 de novembro de 1889, é tida, igualmente, como data histórica e político-jurídico-diplomática como marco da criação da nova ordem estatal republicana. Tendo que diferenciar, na tipologia kantiana, entre Estado (forma imperii) e governo (forma regminis), pode haver, como se percebe, a sincronia e a diacronia do fato histórico com o fato/ato político-jurídico-diplomático concernente ao reconhecimento como fator de nascimento do Estado. (CASTRO, Thales. Teoria das relações

internacionais. Brasília: FUNAG, 2012, p.108-109)

CASTRO (2012, p.109-110) prossegue apontando que para poder adentrar ao campo histórico-constitutivo do instituto Estado, deve-se considerar que este possui “prerrogativas privativas inerentes à sua condição e [...] representa a engrenagem central das Relações Internacionais dotada de população permanente, território reconhecido, governo aceito e exercício de soberania interna e externa”. Ademais, interpreta seis conceitos derivados do latim os quais, de maneira instrumental, são cingidos pelo sistema estatal, a

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saber: Summa potestas, jus in bellum, jus tractum, jus legationis, jus petitionis, jus representationis.

Para o nominado autor, a soberania, “prerrogativa exclusiva do exercício da capacidade de mando, em última instância, do Estado nacional reconhecido”, diz respeito ao exercício de autogoverno e organização jurídico-administrativa (domínio interno) e à sua presença, ao direito e à articulação internacional (esfera externa) - com base em outros direitos igualmente efetivos e reconhecidos. Sintetiza-se:

[...] o exercício pleno e efetivo de soberania estatal pressupõe o direito de decretar guerra e celebrar a paz com outros Estados, de representação diplomática e consular, de celebrar tratados, de solicitar prestação jurisdicional em tribunais internacionais e de representar e ser representado em instâncias multilaterais com exercício de voto, de voz e de agenda. (CASTRO, 2012, p.110)

Vale reforçar que, conforme ilustra CASTRO (2012, p.110), os “paradigmas westphalianos" do Estado e de seus elementos constitutivos desenvolvem noções primazes e clássicas do funcionamento das Relações Internacionais: Territorialidade demarcada e reconhecida/unidade territorial; população permanente/sociedade civil; governo e poder reconhecidos como soberanos, interna e externamente. Deste modo, ao Estado e aos seus nacionais são articulados posições, direitos, deveres, legitimidade e legalidade de atos. CASTRO (2012, p.110) compõe:

Sob a égide dos debates jusfilosóficos de formação do Estado de Direito e do Estado Democrático de Direito, o corpo orgânico, seus aspectos administrativos internos diversos e a população (sociedade civil) dos Estados fazem parte da lógica estatocêntrica de influência direta no plano da política internacional. O Estado é uma macroprojeção dos indivíduos, de suas instituições e seus processos internos e com relação ao exterior que estão tutelados sob sua summa potestas.

DALLARI (1998, p.79) adianta os princípios orientadores dos Estados no cumprimento da democracia: Participação popular no governo através da supremacia da vontade popular; preservação de uma fração de liberdade - não-interferência por parte do Estado na individualidade do homem e em seus bem, desde que de natureza lícita e não-conflituosa; igualdade de direitos, tidos aqui sob a ótica da proibição de distinções e/ou de discriminações em termos de direitos e deveres, sob o pretexto de motivos socioeconômicos. Perante o cenário internacional, CASTRO (2012, p.110) discute que o surgimento do Estado se dá, ainda, pela formalização do reconhecimento com o posterior início de relações bilaterais, multilaterais e diplomáticas entre os Estados; ou seja, através do direito de legação, a expressão da soberania e da cidadania nacionais. Para o Direito Internacional, amplia-se o

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alcance, a profundidade dos elementos constitutivos acima descritos, uma vez que complexo é um povo ao se tornar nação (povo com consciência histórica, cultura, senso de coletividade), a título de exemplo. Discorrer-se-á mais à frente, ao se esboçar o Estado que se pretende não somente Moderno, Soberano e Constitucional, mas, ainda, Democrático e de Direito.

2.1.2 Outros conceitos norteadores

Orientam BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO (1998, p.70-74) que, geralmente, entende-se por autodeterminação a capacidade que populações suficientemente definidas étnica e culturalmente detêm para dispor de si próprias. Pode, portanto, distinguir-se um aspecto de ordem internacional que consiste no direito de um povo não ser submetido à soberania de outro Estado contra sua vontade, de se separar de um Estado ao qual não queira estar sujeito (direito à independência política) e, ainda, um aspecto de ordem interna, o direito de cada povo escolher a forma de Governo de sua preferência.

Embora não faltem referências a um senso de soberania nacional mesmo em épocas precedentes, costumam ser individualizadas as origens doutrinárias do princípio de autodeterminação na teoria da soberania popular de Rousseau; ademais, os primeiros enunciados do princípio foram feitos com a Revolução Francesa; interpreta-se, ainda, que o direito à autodeterminação dos povos está intimamente ligado aos direitos dos indivíduos, estes decorrendo imediatamente daquele; destarte, a luta pela autodeterminação não poderia desrespeitar os direitos fundamentais da pessoa humana, visto que legitimidade de uma causa não justifica o recurso a certas formas de violência, especialmente contra os inocentes - “existem limites para aquilo que a comunidade internacional pode tolerar e aceitar” (BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO, 1998, p. 70-74).

Constitucional: Um corpo de princípios fundamentais ou de precedentes estabelecidos, de acordo com o qual uma organização estatal ou outra forma organizacional são reconhecidamente governadas. Vide aprofundamento no item 2.1.3.

[...] movimento consagrador das aspirações democráticas do século XVIII foi a Revolução Francesa. As condições políticas da França eram diferentes das que existiam na América, resultando disso algumas dessemelhanças entre uma e outra orientação. Além de se oporem aos governos absolutos, os líderes franceses enfrentavam o problema de uma grande instabilidade interna, devendo pensar na unidade dos franceses. Foi isto que favoreceu o aparecimento da idéia de nação, como centro unificador de vontades e de interesses. Outro fator importante de diferenciação foi a situação religiosa, uma vez que na França a Igreja e o Estado eram inimigos, o que influiu para que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, diversamente do que ocorrera na Inglaterra e nos Estados Unidos

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da América, tomasse um cunho mais universal, sem as limitações impostas pelas lutas religiosas locais. Declara-se, então, que os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos. Como fim da sociedade política aponta-se a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem, que são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão. Nenhuma limitação pode ser imposta ao indivíduo, a não ser por meio da lei, que é a expressão da vontade geral. E todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou por seus representantes, para a formação dessa vontade geral. Assim, pois, a base da organização do Estado deve ser a preservação dessa possibilidade de participação popular no governo, a fim de que sejam garantidos os direitos naturais.

Foram esses movimentos e essas idéias, expressões dos ideais preponderantes na Europa do século XVIII, que determinaram as diretrizes na organização do Estado a partir de então. Consolidou-se a idéia de Estado Democrático como o ideal supremo, chegando-se a um ponto em que nenhum sistema e nenhum governante, mesmo quando patentemente totalitários, admitem que não sejam democráticos. [...] As transformações do Estado, durante o século XIX e primeira metade do século XX, seriam determinadas pela busca de realização desses preceitos, os quais se puseram também como limites a qualquer objetivo político. A preocupação primordial foi sempre a participação do povo na organização do Estado, na formação e na atuação do governo, por se considerar implícito que o povo, expressando livremente sua vontade soberana, saberá resguardar a liberdade e a igualdade (DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p.77-78.)

Democrático é a forma de governo em que o poder soberano reside no povo como um todo, e é diretamente exercido por ele ou através de representantes por ele eleitos. Denota, de forma mais generalizada, um estado social onde todos deteriam direitos iguais, sem que houvesse distinções ou privilégios hereditários ou arbitrários de posição3. Vide aprofundamento no item 2.1.3.

O Oxford English Dictionary define notavelmente a prática da diplomática como sendo “a condução das relações internacionais através de negociações; o método através do qual estas relações são reguladas e mantidas por embaixadores e encarregados; o ofício ou a arte do diplomata”. O objeto da Diplomacia é, conseqüentemente, o artifício através do qual são conduzidos as negociações, e não o conteúdo das mesmas - foi justamente este teor que sofreu progressivas transformações no decorrer dos séculos. O termo foi empregado pela primeira vez em sua atual acepção em 1796, por Edmund Burke, teórico político e filósofo inglês - derivaria de diploma, “folha enrolada antigamente utilizada para as leis e para os editais públicos, e que passou a ser, depois, sinônimo de licença e privilégio concedidos às pessoas” (BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO, 1998, p.348-349).

Na ausência de um consenso doutrinário acerca do instituto da jurisdição, apresentar-se-ão aqui dois dentre seus variados significados: Em seu sentido corrente,

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In: ONLINE, Oxford Dictionaries. Oxford Dictionaries Online. Oxford University Press, 2013. Disponível em: <http://oxforddictionaries.com/>. Acesso em: 01 maio 2013.

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utilizado de forma generalizada, o termo delineia o âmbito de autoridade ou poder de uma determinada pessoa ou entidade; com rigor, a doutrina apresenta-o como a função pública do Estado de administrar a justiça (CARMO, 2005). Igualmente, CARMO4 (2005) relaciona:

A palavra jurisdição é de origem latina, deriva de: juris (direito) + dictionis (ação de dizer). E, este dizer o direito, representa três elementos básicos do Estado, são eles: Poder, Função e Atividade. Assim, a jurisdição tem performance diferenciada, critério de averiguação também distinto, a cada necessidade em que deve ser exercida pelo ente Estado. Podendo ser ordinária (comum) ou constitucional, podendo estar relacionada à soberania, ao poder-dever, ao grau ou instância, à matéria, valor ou qualidade do sujeito, ainda, ao território ou circunscrição. Por fim, é representada pela competência, procedimento ou função. Todavia, sempre exerce uma função delimitadora, ou, porque não dizer, limitadora. Ou seja, sob qualquer de seus aspectos, a jurisdição demarca sempre os limites deste agir e assinala os parâmetros cabíveis a esta atuação.

A autora (RULLI JR. apud CARMO, 2005) provê uma ampliação da citada função ao estabelecer jurisdição como “o direito de pacificar e harmonizar as relações sociais, dizendo a justiça, garantia de segurança jurídica, social e política”. Sendo uma função do Estado, una e indivisível, limitada apenas pela soberania, o Estado exerce a jurisdição por seus órgãos constitucionalmente definidos.

Cientistas políticos como BOBBIO, MATTEUCCI E PASQUINO (1998, p.675-679) discriminam uma vertente genérica e outra específica para o conceito de legitimidade: na primeira, seria legítimo tudo aquilo que adquirisse tal caráter em conformidade com a justiça e com a racionalidade; a preocupação desses autores reside, contudo, em apresentar o significado específico do termo, por este ser freqüentemente empregado na linguagem política quando em relação ao Estado - nesse sentido, a legitimidade seria uma qualidade estatal. O status de legitimidade garantiria a presença de um nível satisfatório de consenso, assegurador da obediência da maioria da população, sem que, para tanto, houvesse o uso da força – salvo em episódios esporádicos –, fazendo com que o poder exercido em um Estado fosse reconhecido como fidedigno e transformasse a obediência em adesão.

Em suma, “a crença na legitimidade é, pois, o elemento integrador na relação de poder que se verifica no âmbito do Estado” (BOBBIO, MATTEUCCI E PASQUINO, 1998, p.675-679). É curioso verificar que, na prática, o consenso em relação ao Estado seja um valor impelido, e em partes até fictício, embora normalmente necessário até em países considerados democráticos. Para esses mesmos articulistas (1998, p.675-679),

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Especialista em Direito Constitucional pela Escola Superior de Direito Constitucional de São Paulo e, em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pós-graduada em Semiótica Psicanalítica - Clínica da Cultura, também pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

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A definição geral proposta no início acabou, pois, por se revelar insatisfatória, uma vez que pode ser aplicada a qualquer conteúdo. Para superar tal incongruência, que parece invalidar a própria exatidão semântica da definição descritiva, faz-se necessário evidenciar uma característica que o termo Legitimidade tem em comum com muitos outros termos da linguagem política (liberdade, democracia, justiça, etc.): o termo Legitimidade designa, ao mesmo tempo, uma situação e um valor de convivência social.

Ressalte-se que, em cada manifestação histórica das nações, o termo legitimidade nada mais é do que uma aspiração, haja vista sempre se esboçar como esperança e promessa na interminável construção de uma sociedade mais justa, onde o consenso seja livremente manifestado “sem interferência do poder ou da manipulação e sem mistificações ideológicas”. Com isso, seria possível uma aproximação da real legitimidade de um Estado somente quando as condições sociais, caracterizadas pela constatação do exercício de valores mais humanos, propiciarem uma tendência ao desaparecimento da manipulação e/ou redução da influência do poder sobre a sociedade – ou seja, quanto menos aparente e menos forçado, menos ideológico for esse consenso, mais consistente, consciente e autônoma será a realidade social dos indivíduos (BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO, 1998, p.675-679).

Alçados tais conceitos, pode-se abordar o Estado no item posterior.

2.1.3 Estado Moderno – Estado Democrático de Direito

MIRANDA (1997, p.44) qualifica o surgimento histórico do Estado como interdisciplinar: Resulta de certo quantitativo mínimo de organização política, da localização de sua estrutura no tempo e no espaço, das transformações e reorganizações políticas e societárias que originaram maior complexidade e diferenciação sobre a instituição estatal, e da necessidade de se traduzir, no âmbito do Direito, as regras jurídicas condizentes com tais formações e reformulações. Os fundamentos iniciais do Leviatã hobbesiano tiveram sua constitutividade alterada ao longo dos século; dessa forma, a esteira lógico-dedutiva dos argumentos apresentados se funde nas teorias mais recentes sobre a formalidade (primeira geração) e a substancialidade (segunda geração) sobre o Estado Moderno. O Estado Contemporâneo é, portanto, sujeito e objeto do fenômeno complexo das Relações Internacionais (CASTRO, 2012. p. 99).

Posto isso, para evitar a perda de foco, delimitar-se-á o esboço de um histórico a partir da origem do Estado Moderno, uma vez que se pretende caracterizar o Estado Democrático de Direito, instituição ligada à idéia de dignidade humana protegida pelo Estado,

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organização e gestão estatal, e participação popular. Como anteriormente especificado, se antes o Estado-nação se alicerçava sobre três elementos básicos (soberania, território e povo), mede-se que o Estado se torna Moderno quando passa a ter atribuída uma finalidade à sua existência - a de atingir, através de uma ordem jurídica e soberana, o bem comum de um povo situado em determinado território. PIOVESAN (2001, p.1), ao adotar as lições de Bobbio de que “os direitos humanos nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares (quando cada Constituição incorpora Declarações de Direito), para finalmente encontrarem sua plena realização como direitos positivos universais”, sugere que com a evolução histórica entre o Estado Liberal de Direito, o Direito Natural se transforma em Direito Positivo: o Estado Moderno, através da doutrina liberal, procura criar um Direito que constitucionalize as normas, de modo a codificar (legislando), aplicar e solucionar conflitos e atender às demandas sociais, protegendo juridicamente tais direitos.

Assim, conclui JO (2000), “o conceito ocidental de lei foi o instrumento central para a organização do Estado e da sociedade civil no mundo”, passando o Estado a se dividir em três poderes distintos, imparciais, independentes e harmônicos: Legislativo (congresso), judiciário (tribunais) e executivo (administração, forças policial e militar). Foi então que, com a sociedade tida como democrática e questionando o Estado de Direito, produziu-se o conceito de Estado Social de Direito e, em instância ulterior, o de Estado Democrático de Direito. Isso significa dizer que o Estado de Direito nada mais é do que um Estado subordinado ao Direito, mais especificamente a uma Constituição. Portanto, MARTINS (2010, p.41) prepara:

É provável que haja uma vinculação entre a dignidade da pessoa humana e o Estado Democrático de Direito, pois se trata de uma relação de conteúdo consciente e fraterno, na medida em que, se houver uma aproximação entre o Estado e a sociedade, o indivíduo receberá condições adequadas para o seu desenvolvimento num ambiente propício e comprometido com modificações sociais, a fim de que o direito atue adequadamente e se ajuste aos interesses coletivos e individuais. E, conseqüentemente, cabe ao Direito assegurar que as relações entre os homens, seres humanos dignos se desenvolvam adequadamente [...].

SILVA (2005, p.228-229) aconselha a não determinar um conceito para Estado Democrático de Direito, visto que mais válido à sua compreensão seja reestruturar fielmente os valores que com ele se relacionam. Em síntese, para caracterizar um Estado como tal precisar-se-ia da existência dos seguintes itens: Fundamentação na soberania popular; dotação de uma Constituição igualmente emanada da vontade popular e que seja “material, legítima, rígida”, com supremacia e vinculadora “de todos os poderes e atos dela provenientes”

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(SILVA, 2005, p.228-229); existência de um órgão salvaguarda dessa composição e dos princípios fundamentais societários, órgão esse previsto por essa mesma Constituição e que através dela possa atuar de forma aberta; existência de aparatos judiciais livres, independentes e interdependentes, os quais solucionem conflitos surgidos na esfera estatal; existência de mecanismos “de apuração e de efetivação da vontade do povo nas decisões políticas fundamentais do Estado, conciliando uma democracia representativa, pluralista e livre, com uma democracia participativa efetiva” (SILVA, 2005, p.228-229); observância dos princípios de legalidade, de isonomia e de segurança (previsibilidade) jurídica; manutenção de um sistema que vise à proteção dos direitos humanos em suas várias expressões; “realização da democracia – além da política – social, econômica e cultural, com a conseqüente promoção da justiça social” (SILVA, 2005, p.228-229).

É, pois, através do Direito e sujeito a um ideário de justiça que o Estado atua, tanto em seu âmbito interno quanto em sua projeção internacional.

2.2 DIREITO INTERNACIONAL: DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E

RELAÇÕES INTERNACIONAIS

MELLO (1986, p.60-61), ao cruzar os ensinamentos de Korff e de Vinogradoff, estabelece algumas considerações respeitáveis quanto ao Direito Internacional: Seria um erro admitir a existência do Direito Internacional somente a partir de uma fase adiantada na História, visto que a Antiguidade não carece de exemplos da manutenção de relações entre os povos, da prática – ainda que primitiva – da arbitragem, e do conhecimento do instituto de imunidade dos emissários diplomáticos. Nesse sentido, NUNES (2011, p.72) complementa que além dos mencionados casos, a observância a certas regras em conflitos armados e a concessão de asilo tracejam a concepção de elementos do direito internacional do porvir.

O Direito Internacional seria uma conseqüência mandatória de toda civilização, tendo surgido onde dois ou mais Estados com culturas dotadas de certa homogeneidade, estabelecendo-se entre eles relações sob certo grau de igualdade. Ainda, prossegue aclamando MELLO (1986, p.60-61), as formas de organização social são de imensa relevância no delinear de um histórico do Direito Internacional, devendo admitir-se a sua existência “desde que exista uma comunidade internacional; isto é, no momento em que duas ou mais coletividades independentes passam a manter relações entre si”. A obra escrita pelo holandês

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Hugo Grotius5, De jure beli ac pacis (1625), é considerada como primeiro trabalho de sistematização da Lei das Nações. Todavia, JO (2000) narra que o neologismo Direito Internacional (International Law) foi empregado pela primeira vez pelo jurista e filósofo inglês Jeremy Bentham, em 1789, visando à substituição das antigas e populares terminologias utilizadas até então (Law of Nations, Droit de Gens, Ius Gentium).

JO (2000) elucida que até a Primeira Guerra Mundial o Direito Internacional era tido como sinônimo de Direito Internacional Público, uma vez que regia as relações públicas entre os Estados. Até a Segunda Guerra Mundial, a doutrina positivista tradicional pregava que os Estados eram o único sujeito do Direito Internacional (personalidade legal); após a Segunda Guerra, o entendimento contemporâneo acerca dos Direitos Humanos foi estimulado pelo processo de reconstrução e internacionalização dos direitos, procedimento baseado na Declaração Universal de 1948, ratificada pela Declaração de Direitos Humanos de Viena de 1993. Distingue PIOVESAN (2012, p.09) que essa estruturação foi oriunda de uma “concepção positivista de um ordenamento jurídico indiferente a valores éticos, confinado à ótica meramente formal – tendo em vista que o nazismo e o fascismo ascenderam ao poder dentro do quadro da legalidade e promoveram a barbárie em nome da lei”.

PIOVESAN (2000, p.96), em artigo, completa:

O processo de universalização dos direitos humanos permitiu, por sua vez, a formação de um sistema normativo internacional de proteção destes direitos. Na lição de André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros: “Em termos de Ciência Política, tratou-se apenas de transpor e adaptar ao Direito Internacional a evolução que no Direito Interno já se dera, no início do século, do Estado-Polícia para o Estado-Providência. Mas foi o suficiente para o Direito Internacional abandonar a fase clássica, como o Direito da Paz e da Guerra, para passar à era nova ou moderna da sua evolução, como Direito Internacional da Cooperação e da Solidariedade”.

Sinteticamente, o Direito Internacional surge simultaneamente ao esboço da instituição Estado, enfrenta um período onde as teorias positivistas restringem-no à figura estatal (pré e entre Guerras) para, posteriormente, fruto de uma lenta e contínua modificação da ordem mundial – e, conseqüentemente, da concepção da personalidade legal de atores que adquiririam força no cenário internacional -, passar a não se limitar tão somente no Estado.

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Considerado por muitos o pai do Direito Internacional Moderno - era poeta, filósofo, diplomata e jurista, além de defensor do Direito Natural. Foi condenado à prisão perpétua ao se envolver em disputas políticas, tendo conseguido emigrar para a França.

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Este, enquanto sujeito gozando de direitos e deveres reconhecidos pelo Direito Internacional, interage com os demais Estados e atores no cenário internacional.

Outro direito que caracteriza o Direito Internacional Público no decorrer do século XX é a dilatação da noção de personalidade internacional. Tal fato pode ser constatado na proliferação de organismos intergovernamentais dotados de personalidade jurídica própria, tanto de âmbito global como regional, e com as mais variadas finalidades. Igualmente, tornou-se cada vez mais usual o reconhecimento da personalidade internacional do ser humano; o desenvolvimento do Direito Internacional Humanitário e a criação do Tribunal Penal Internacional muito auxiliaram a solidificar a personalidade internacional do indivíduo. Destaca-se ainda no processo de transformação do DIP contemporâneo a sua especialização, isto é, o surgimento de uma gama notável de ramos autônimos, com o Direito Internacional Penal ou Ambiental. Ressalta-se, também, o fenômeno da integração regional. Chama-se, outrossim, a atenção para a influência de entidades não-governamentais e da participação da sociedade civil organizada na produção de normas internacionais. Movimentos sociais e organizações-não governamentais têm participado cada vez mais das discussões relacionadas às questões ambiental, humanitária, econômica ou à integração regional. [...] As Convenções de Genebra de 1949, por sua vez, fazem parte do núcleo fundamental do Direito Internacional Humanitário e tratam dos seguintes temas: proteção dos enfermos e dos feridos em guerras terrestres e navais; tratamento dos prisioneiros de guerra; proteção da população civil, vítima de conflitos bélicos. (NUNES, Paulo Henrique Faria. Direito Internacional:

Introdução crítica. Goiânia: ASOEC - Universo, 2011, p.91-92).

Enquanto para REZEK (2005, p.02) o Direito Internacional é um “sistema jurídico autônomo, no qual se ordenam as relações entre Estados soberanos”, para TOUSCOZ (apud MELLO, 1986, p. 77) trata-se do “o conjunto de regras e de instituições jurídicas que regem a sociedade internacional e que visam estabelecer a paz e a justiça e a promover o desenvolvimento”. ACCIOLY e SILVA (2000, p.03) e MELLO (1986, p.15) aquiescem ao definirem o Direito Internacional como sendo o conjunto de normas jurídicas reguladoras das relações mútuas entre os Estados, bem como das relações externas entre eles e os atores que compõem a sociedade internacional - organizações não-governamentais, empresas transnacionais, indivíduos, a título de exemplo. GOUVEIA (2005, p.14) arremata: O Direito Internacional é constituído pelo “conjunto de princípios e regras, de natureza jurídica, que disciplina os membros da sociedade internacional a agirem em uma posição jurídico-pública, no âmbito das suas relações internacionais”.

Tais relações basicamente se instituem pelo senso de cooperação que rege a dinâmica jurídico-pública internacional. Nesse sentido, MCWHINNEY (1991 apud BEDJAOUI, 1991) detecta a cooperação como uma terminação com significado particular do Direito Internacional, surgida após a Segunda Guerra Mundial quando se afirma como um dever dos Estados de colaborar, uns com os outros, conforme a Carta das Nações Unidas de

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1945 – e, ainda, como um corpo de Direito Internacional em seu próprio direito, baseado teoricamente em relações amistosas e solidárias.

OLIVEIRA (2004, p.495-496) seleciona:

A crise do Estado de bem-estar, por outro lado, pode ser analisada em termos de crise de um determinado paradigma de relações entre o Estado e a sociedade, através de três motivos, entre outros: a) porque a sociedade iniciou a questionar sobre a vigência da igualdade como meta social; b) porque o crescimento do Estado durante a crise econômica não foi acompanhado por uma reformulação do contrato social; c) porque os ataques doutrinários ao Estado de bem-estar encontram-se em setores da população que, até certo momento, estavam preocupados com o aumento da solidariedade pública.

A autora (2004, p.497) reitera que após a Segunda Guerra Mundial o espaço público estatal - até então fechado - foi pouco a pouco cedendo lugar à coletividade, propiciando o surgimento de outro modelo de cidadania: A comunitária. Faz distinção (2004, p.500), ainda, entre as noções de cooperação e de integração, sendo aquela mais ampla do que por pressupor diretrizes orientadas a reduzir e eliminar as discriminações do comércio de forma geral. Os Estados, de tal maneira, essencialmente passam a ter o dever de cooperar uns com os outros, independentemente das diferenças de seus sistemas políticos, econômicos e sociais, nas diversas esferas das Relações Internacionais, a fim de manter a paz e a segurança internacionais e de promover a estabilidade econômica internacional e o progresso, o bem-estar geral das nações e a cooperação internacional livre de discriminação (MCWHINNEY, 1991 apud BEDJAOUI, 1991).

2.3 DO PROCESSO MIGRATÓRIO

Ton christ est juif, ta pizza est italienne, ton café est brésilien, ta voiture est japonaise, ton écriture est latine, tes vacances sont turques, tes chiffres sont árabes et tu reproches à ton voisin d'être étranger! (JULOS BEAUCARNE)6

Quand tu auras besoin d'un abri, tu n'auras qu'à venir demander asile. [...] C'est ma maison, mon nid; c'est ma ville, c'est ma vie; mon air, mon toit, mon lit; c'est ma chanson, mon cri; ma raison, ma folie; ma passion, mon pays - ma prison, ma patrie. Dans ma maison à moi (à toi), il y fait toujours beau : L'hiver il fait moins froid, l'été il fait moins chaud. Tu (je) viendras (irai) quand tu (je) veux, quelle que soit la saison : Ma (ta) maison si tu (je) veux, ce sera ta (ma) maison. (LUC

PLAMONDON, RICHARD COCCIANTE)7

6

Tradução própria: Teu Cristo é judeu, tua pizza é italiana, teu café é brasileiro, teu carro é japonês, tua escrita é latina, tuas férias são turcas, teus números são árabes, e tu censuras ao teu vizinho de ser estrangeiro!

7

Tradução própria: Quando precisares de abrigo, tudo que terás de fazer será vir pedir asilo. [...] Esta é a minha casa, meu ninho; é minha cidade, é minha vida; meu ar, minha teto, minha leito; é minha canção, meu

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Fenômeno antigo que se reproduz com variada freqüência e intensidade ao longo da história - a migração configurou invasões, conquistas e êxodos. Mudanças sazonais, fome, superpopulação de determinadas regiões, a globalização, questões demográficas de certos países, a violação de direitos, o desemprego, a desorganização das economias tradicionais, as perseguições, a discriminação, a xenofobia, a desigualdade econômica entre os países e entre hemisfério norte e sul – eis algumas das inúmeras motivações da migração na atualidade. Desse modo, conforme HUIDOBRO (2010)8, serão aqui trazidos à luz alguns conceitos fundamentais e por vezes confundidos. Excluir-se-ão, aqui, os termos asilo, asilado, refugiado e deslocado, simplesmente por não configurarem exatamente o foco desta delimitada pesquisa; no entanto, sugere-se aprofundamento nos mencionados temas, uma vez que são de extrema importância no amplo âmbito da migração:

O direito à nacionalidade constitui uma garantia fundamental da pessoa humana, considerado na doutrina internacional como o direito que possibilita o exercício de outros direitos fundamentais. Para a obtenção da mesma, a maior parte dos países das Américas aplica o princípio ius solis (direito pelo solo) ou uma combinação entre este e ius sanguinis (direito pelo sangue). Em termos práticos, a nacionalidade se traduz no direito de toda criança ter uma origem desde seu nascimento, bem como o direito de mudança da nacionalidade e a não-privação arbitrária da mesma - leia-se: não ser apátrida (HUIDOBRO, 2010).

Emigração caracteriza o movimento de saída de pessoas ou grupos humanos de uma região para estabelecerem-se n’outra, em caráter definitivo ou por período de tempo relativamente longo. Além das causas econômicas, outras podem influenciar no desencadeamento de movimentos emigratórios, tais como questões políticas, religiosas, raciais ou ambientais. Emigrar significa, pois, deixar um país para ir estabelecer-se em outro; entende-se como emigrante a pessoa que deixa sua pátria e passa a residir em outra. As regiões ou países fortemente marcados por emigração são também chamados países ou regiões de origem dos migrantes e, em certas circunstâncias, países de expulsão de migrantes (HUIDOBRO, 2010).

clamor; minha razão, minha loucura; minha paixão, meu país - minha prisão, minha pátria. : Em minha casa, para mim (ti), o tempo está sempre bom: No inverno faz menos frio, no verão faz menos calor. Tu (eu) virás (irei) quando tu (eu) quiseres (quiser), qualquer que seja a estação: Minha (tua) casa, se tu (eu) quiseres (quiser), ela será o teu (meu) lar.

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Imigração, por sua vez, trata-se do movimento de pessoas ou de grupos humanos, provenientes de outras áreas, que entram em determinado país com o intuito de permanecer definitivamente ou por período de tempo relativamente longo. Se o fator econômico é preponderante na definição do país de destino, não devem ser esquecidos outros elementos que exercem importante influência, quando não decisiva, na escolha do país em que pretende residir. Quando o fator de expulsão é criado por pressões políticas, perseguições religiosas, discriminações raciais, violação de direitos, torna-se importante ao imigrante encontrar o necessário clima de liberdade, segurança, de ausência de preconceitos e de melhores condições de vida. Literalmente, imigrar significa entrar num país estrangeiro para nele viver. O imigrante é o indivíduo que, deslocando-se de onde residia, ingressou em outra região, cidade ou país diferente do de sua nacionalidade, ali estabelecendo sua residência habitual, em definitivo ou por período relativamente longo (HUIDOBRO, 2010).

Logo, migração constitui a movimentação de pessoas, grupos ou povos de uma localidade para outra - ao se optar por uma definição proveniente do dicionário, verificar-se-á que migrar é mudar. Migrante é, pois, toda a pessoa que se transfere de seu lugar habitual, de sua residência comum para outro lugar, região ou país. É um termo freqüentemente utilizado para definir os trânsitos em geral, tanto de entrada quanto de saída de um país, região ou lugar, não obstante existam termos específicos, como anteriormente vistos. É comum, ainda, falar em migrações internas, referindo-se aos migrantes que se movem dentro do país, e migrações internacionais, abordando os movimentos de migrantes entre países, além de suas fronteiras (HUIDOBRO, 2010).

Devido à sua experiência acerca do tema e junto às Nações Unidas, STALKER (2012) destaca cinco principais dentre as categorias de migrantes: Colonizadores (almejam à fixação e vida permanentemente no novo país, incluindo-se ainda aqui os indivíduos que partem para unirem-se à família ou constituírem uma); contratados (suas admissões trabalhistas são realizadas acima da consciência de que a permanência no novo país se dará por tempo determinado, duração esta estabelecida no contrato - alguns, inclusive, são trabalhadores temporários, designados para realizarem certa tarefa em determinada estação); profissionais (inserem-se aqui os empregados de corporações transnacionais que migram de país para país devido às suas funções); irregulares (comumente denominados ilegais ou não-documentados; alguns entram sem permissão, uns ultrapassam o período de seu visto, outros trabalham com vistos que não prevêem trabalho); refugiados e solicitantes de asilo (deixam seus lares para fugirem do perigo, violência e/ou perseguição).

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Quanto às teorias migratórias, pode-se tentar compreender o processo migratório sob duas óticas dessemelhantes: A abordagem individual e a estrutural. STALKER (2010) explana que a primeira considera cada migrante como um ser humano racional que possui acesso às destinações disponíveis e que escolhe aquela ofertante de uma melhor combinação salarial, segurança trabalhista, custos de vida e/ou de deslocamento. Essa abordagem também é denominada de capital humano, uma vez que cada pessoa pode ser considerada produto de uma série de investimentos – em educação/especialização, a título de exemplo - e que procura o melhor lugar para depositá-los e tê-los reconhecidos.

A perspectiva estrutural, por sua vez e ainda segundo STALKER (2010), não é associada ao conceito de determinismo, mas considera que os destinos dos migrantes estejam associados a estruturas (sociais, econômicas, políticas) que moldam suas vidas, sejam taxas de desemprego ou repressão com a qual lidam - tudo impulsiona a migração. No entanto, as idéias acerca do estruturalismo migratório vêm sob diferentes formas: Uma é subteoria do mercado dual, que explica que o desenvolvimento do capitalismo divide o trabalho em empregos seguros, permanentes, bem pagos e que requerem especialização; e, em trabalho temporário, mal remunerado, difícil e por vezes desagradável, evitado por trabalhadores locais.

STALKER (2010) alega que ambas as abordagens devem ser combinadas: O indivíduo não pode decidir independentemente da estrutura na qual se encontra inserido, e a estrutura, por sua vez, não existe involuntariamente ao indivíduo. Um dos exemplos mais claros da fusão das duas abordagens pode ser percebido no crescimento das redes de migração (networks), onde um pioneiro auxilia aos demais seguidores a obterem sucesso. A emergência dessas redes sugere teoria ainda mais abrangente - a de sistemas, que inclui além das próprias redes e das decisões individuais baseadas nas estruturas, outras vertentes, como as de capital e bens combinadas às influências culturais e políticas. Isso, em princípio, poderia auxiliar na natureza integrada e complexa da migração, principalmente em nível regional.

Relembrando que cada migrante possui motivações distintas e que termina por enfrentar as mais diversas circunstâncias, STALKER (2010) menciona três das várias razões por que migrar: Diferenças salariais (busca por melhores remunerações e possibilidade de expandir horizontes); necessidade de trabalhadores migrantes (seguindo o mercado dual, que se submetam ou estejam capacitados a determinado tipo de função); transtornos de desenvolvimento (causados pelas disparidades socioeconômicas e culturais, podendo criar ou desestimular oportunidades migratórias). Aqui, acrescentar-se-á ainda a manutenção de laços de afeto como grande impulsionador na migração colonizadora. Os migrantes, teoricamente,

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seguiriam para qualquer país que pudesse admiti-los; na prática, entretanto, STALKER (2010) elucida que tendem a seguir caminhos bem traçados e trilhados, estabelecidos tanto pelo fluxo histórico quanto pelas redes migratórias.

Igualmente, STALKER (2010) analisa como migrar através de sete itens:

a) Caminhos coloniais: Por influência do processo de colonização em determinados países, certos migrantes apresentam destinações previsíveis como escolhas: Moçambicanos que partem à África do Sul; bolivianos à Argentina; neozelandeses à Austrália; argelianos à França. Esta, ao lado do Reino Unido, iniciou o processo de recrutamento de trabalhadores de suas colônias iniciais, e a Alemanha, carecendo de colônias, utilizou o recrutamento como forma de trazer trabalhadores da Turquia e Iugoslávia; no caso norte-americano, a influência militar e econômica sobre outras nações em desenvolvimento foi de suma importância – os mexicanos, a título de exemplo, não possuíam interesse em ir aos Estados Unidos nos idos de 1900; desse modo, os fazendeiros e companhias ferroviárias americanas enviaram recrutadores ao México – de 1940 a 1964, em um esquema nomeado bracero. STALKER (2010) completa que os países industrialmente desenvolvidos de hoje são os que iniciaram no passado os fluxos de migração internacional. b) Laços familiares: Reforçando os padrões coloniais estão os programas de

reunificação familiares, onde alguns dos Estados receptores atribuem preferência a parentes próximos de residentes – isso se dá não apenas como uma forma de respeitabilidade aos Direitos Humanos, mas, além, pelos governos saberem que o trabalhador apoiado pela família torna-se ainda mais produtivo. Exemplos são a Austrália, o Canadá, a Holanda e o Japão. Por outro lado, países como a França e a Alemanha são restritivos, estuda STALKER (2010).

c) Redes: Contatos pré-existentes facilitam o progresso, seja no auxílio teórico (relatando experiências e compartilhando informações) ou prático. Comunidades de migrantes, conforme formula STALKER (2010), ofereceram através dos anos valiosas ajuda, acomodação e sugestão para migrantes; tais redes também significam que certas nacionalidades contam com uma concentração gradual em nichos de empregos, particularmente. Criam-se, em suma, comunidades transnacionais.

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