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A supranacionalidade e a questão da soberania dos estados

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Academic year: 2021

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DANIELLA FERNANDA DE OLIVEIRA FELIZ

A SUPRANACIONALIDADE E A QUESTÃO DA SOBERANIA DOS ESTADOS

Palhoça 2009

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A SUPRANACIONALIDADE E A QUESTÃO DA SOBERANIA DOS ESTADOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. João Batista da Silva, MSc.

Palhoça 2009

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DANIELLA FERNANDA DE OLIVEIRA FELIZ

A SUPRANACIONALIDADE E A QUESTÃO DA SOBERANIA DOS ESTADOS

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Palhoça, 25 de novembro de 2009.

______________________________________________________ Professor e orientador João Batista da Silva, MSc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Deisi Cristini Schveitzer, MSc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Jamila Samantha Jakubowsky Garcia, MSc.

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Aos meus pais e ao meu irmão. À minha avó, in memorian.

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LISTA DE SIGLAS

AIEA – Agência Internacional para a Energia Atômica ALADI – Associação Latino-Americana de Integração CAN – Comunidade Andina de Nações

CECA – Comunidade Européia do Carvão e do Aço CEE – Comunidade Econômica Européia

CEEA – Comunidade Européia de Energia Atômica

FAO – Fundo das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura FMI – Fundo Monetário Internacional

MERCOSUL – Mercado Comum do Sul

NAFTA – North American Free Trade Agreement ou Acordo de Livre Comércio da América do Norte

NCM – Nomenclatura Comum do Mercosul

OCDE – Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico OEA – Organização dos Estados Americanos

OIT – Organização Internacional do Trabalho OMC – Organização Mundial do Comércio OMS – Organização Mundial da Saúde ONU – Organização das Nações Unidas

OPEP – Organização dos Países Exportadores de Petróleo OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte

OUA – Organização da Unidade Africana SEBC – Sistema Europeu de Bancos Centrais TEC – Tarifa Externa Comum

TJCE – Tribunal de Justiça das Comunidades Européias

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TERMO DE INSENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

A SUPRANACIONALIDADE E A QUESTÃO DA SOBERANIA DOS

ESTADOS

Declaro para todos os fins de direito que se fizerem necessários que assumo total responsabilidade pelo porte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Palhoça/SC, 11 de novembro de 2009.

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RESUMO

Esta monografia analisa a supranacionalidade em face do modelo do Estado soberano, visto que o conceito clássico de soberania está se tornando cada vez mais relativizado em decorrência desse fenômeno. A globalização também teve importante papel para a intensificação dos processos de integração, que, por sua vez, estão transformando o mundo em uma verdadeira aldeia global. Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar os efeitos causados à soberania dos Estados, decorrentes de sua participação em organizações internacionais. Como objetivos específicos, busca verificar as mudanças ocorridas no conceito de soberania desde o seu surgimento até o advento do processo de internacionalização, identificar o papel da globalização no processo de intensificação da cooperação internacional e integração regional, e diferenciar a limitação da soberania dos Estados participantes de organizações internacionais de caráter intergovernamental daquela resultante da participação em organizações internacionais de caráter supranacional. Esta análise parte de uma pesquisa bibliográfica de natureza exploratória e da utilização do método dedutivo. Após a análise dos resultados, verificou-se que a supranacionalidade é uma realidade e que emerge como um fenômeno necessário na atualidade. O conceito clássico de soberania precisa ser revisto e reformulado, pois a soberania não pode ser estática, tem que acompanhar as mudanças ocorridas na sociedade contemporânea. Além disso, está se tornando cada vez mais imprescindível a união de países em organizações internacionais, justamente por uma questão de sobrevivência neste mundo cada vez mais globalizado e competitivo.

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RÉSUMÉ

Cette monographie analyse la supranationalité devant le modele de l’État souverain, une fois que le concept classique de souveraineté est en train de devenir relativisé à cause de ce phénomène. La mondialisation a joué un rôle important pour l’intensification des processus d’intégration que, à leur tour, sont en train de transformer le monde en une vrai village global. Cet étude a comme but principal analyser les effets causés à la souveraineté des États, résultants de leur participation en organisations internationales. Comme objectifs spécifiques, cet étude vise vérifier les changements produits dans le concept de souveraineté depuis son émergence jusqu’à l’avènement du procès d’internationalisation, identifier le rôle de la mondialisation dans les processus d’intensification de la cóoperation international et intégration régionale, et differéncier la limitation de la souveraineté des pays participants d’organisations internationales supranationales de celle résultant de la participation dans les organisations internationales intergouvernementales. Cette analyse a comme base une recherche bibliographique exploratoire et de l’utilisation de la méthode deductive. Après l’analyse des résultats, il a été constaté que la supranationalité est une réalité et que emerge comme um phénomème indispensable dans ce moment. Le concept classique de souveraineté doit être revisé et reformulé, une fois que la souveraineté ne peut pas être statique, elle doit accompagner les changements dans la societé contemporaine. En plus, l’union des pays en organisations internationales est chaque fois indispensable, juste pour une question de survie dans ce monde plus en plus globalisé et concurrentiel.

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1 INTRODUÇÃO...9

2 SOBERANIA...11

2.1 HISTÓRICO...11

2.2 CONCEITO...18

2.3 EVOLUÇÃO...21

3 A GLOBALIZAÇÃO E AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS ...26

3.1 CONCEITO E PERSPECTIVA HISTÓRICA DA GLOBALIZAÇÃO ...26

3.2 A EVOLUÇÃO E O PAPEL DA GLOBALIZAÇÃO NO PROCESSO DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL E INTEGRAÇÃO REGIONAL ...32

3.3 AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS...42

4 SUPRANACIONALIDADE...50

4.1 GENERALIDADES ...50

4.2 SUPRANACIONALIDADE VERSUS INTERGOVERNABILIDADE ...56

4.3 OS EFEITOS DA SUPRANACIONALIDADE SOBRE A SOBERANIA DOS ESTADOS ...65

5 CONCLUSÃO ...72

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O tema em estudo “A supranacionalidade e a questão da soberania dos Estados” é de extrema importância e contribui para o debate jurídico acerca dos efeitos que a participação dos Estados em organizações internacionais têm sobre a autonomia destes.

O direito internacional tem um papel fundamental na formação da soberania de um Estado. Este, por sua vez, somente é considerado soberano quando os demais Estados passam a reconhecê-lo como tal.

O processo de internacionalização está alterando o conceito de soberania absoluta, pela limitação que vem sendo imposta a esta. E um conceito está advindo desse processo: o de supranacionalidade.

Em tempos de globalização, cada vez se torna mais imprescindível a união de países em organizações internacionais, sejam organizações de cooperação, sejam organizações de integração regional, até mesmo por uma questão de sobrevivência no mercado global. Aqueles que resistirem a esse processo de integração, poderão acabar se sujeitando aos interesses das grandes potências mundiais.

A participação em organizações internacionais não significa que o Estado esteja abrindo mão de sua soberania. O que ocorre é apenas uma delegação de parte de suas competências visando a um objetivo comum de todos os participantes. Embora a transferência de parcela de sua soberania em prol do direito internacional limite, de certa forma, a autonomia dos Estados, estes passam a ter uma forma de atuação muito mais eficiente e abrangente no cenário internacional.

Diante do exposto levanta-se a seguinte questão-problema: qual o impacto da participação em organizações internacionais sobre a autonomia dos Estados?

A presente pesquisa tem como objetivo geral analisar os efeitos causados à soberania dos Estados decorrentes de sua participação em organizações internacionais, e como objetivos específicos verificar as mudanças ocorridas no conceito de soberania desde o seu surgimento até o advento do processo de internacionalização, identificar o papel da globalização no processo de intensificação da cooperação internacional e integração regional, e diferenciar a limitação da soberania dos Estados participantes de organizações internacionais de caráter

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intergovernamental daquela resultante da participação em organizações internacionais de caráter supranacional.

A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, de natureza exploratória, com base em livros, artigos científicos e sites especializados, e o método de abordagem utilizado foi o método dedutivo. É cabível salientar que, em determinados momentos, algumas obras se destacaram mais (como Matias, Furlan, Stelzer etc.), porém, isso ocorreu por se tratar de um tema ainda pouco abordado pelos autores em geral.

Esta monografia se divide em três capítulos. O primeiro capítulo trata da soberania, seu histórico, conceito e evolução. O segundo capítulo aborda a globalização e as organizações internacionais, explicando o conceito e a perspectiva histórica da globalização, bem como sua evolução e papel no processo de cooperação internacional e integração regional, além de discorrer sobre as organizações internacionais. O terceiro capítulo trata da supranacionalidade, que abrange suas generalidades, bem como traça um paralelo entre esta e a intergovernabilidade, analisando por fim os seus efeitos sobre a soberania dos Estados.

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2 SOBERANIA

2.1 HISTÓRICO

A noção de soberania identifica-se com o surgimento do Estado moderno. Para Husek (2000, p. 104), “a noção de soberania está intimamente ligada ao Estado, à plenitude do poder público, ao exercício do mando”.

Conforme Matias (2005, p. 31), essa noção sempre esteve ligada à luta pelo poder e servia para justificar tanto a dominação quanto o questionamento de tal dominação, o que fez com que seu significado estivesse sempre no centro do debate político.

Segundo Kerber (2001, p. 72), o conceito clássico de soberania possui origem francesa, pois decorre das lutas entre os reis da França e os barões feudais, em âmbito interno, assim como da emancipação buscada em relação ao papado e ao Santo Império Romano, em âmbito externo, pela necessidade de unificação desse poder.

De acordo com Stelzer (2004, p. 82), até o século XII existiam duas soberanias que concorriam, a senhorial e a feudal. No século seguinte, o monarca ampliou suas competências por cima dos barões, declarando-se como poder supremo. Buscando a máxima unidade sobre determinado território, passou o monarca a figurar como titular do poder soberano.

Carvalho (2006, p. 460) afirma que a noção de soberania apareceu durante o século XVI, visando justificar o Estado absolutista que estava emergindo com a decadência dos poderes intermediários dos senhores feudais. Com o surgimento do Estado moderno soberano, falava-se que a soberania seria uma característica essencial do Estado.

Para Lupi (2001, p. 24), o papado e o Sacro Império Romano representavam o caráter universalista na Idade Média. O papado era o chefe das questões espirituais e o Sacro Império Romano era uma instituição política temporal. O imperador detinha a plenitudo potesta e era consagrado pelo papa. O papa, por

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sua vez, detinha a autorictas pontificum, e o catolicismo era considerado a religião universal do mundo civilizado.

Com o tempo, conforme Matias (2005, p. 33), ocorreu a separação entre Igreja e Estado, o que possibilitou o exercício do poder político, fixando as bases do Estado moderno.

De acordo com Ocampo (2008, p. 45), no decorrer da história, grandes pensadores colaboraram para definir o conceito de Estado, como este surgiu e qual a sua finalidade. Nos tempos modernos, verificou-se a interação entre os conceitos de Estado e soberania, visto que a soberania foi crucial para o surgimento dos Estados nacionais, “definindo suas potestades não apenas para dentro do próprio Estado (ordem jurídica interna), mas também para fora (ordem jurídica internacional), hierarquizando-os como únicos atores da cena internacional”, o que deu origem ao surgimento do direito internacional público.

A evolução do conceito de soberania, segundo Matias (2005, p. 31), acompanhou a história das mudanças no poder político. Em alguns momentos, os termos soberania e soberano se confundiam, uma vez que uma das acepções da soberania relacionar-se-ia com aquele que detém o poder supremo dentro do Estado.

Matias (2005, p. 34) afirma que foi o francês Jean Bodin, em sua obra “Os Seis Livros da República”, de 1576, quem popularizou o conceito de soberania e que se tornaria elemento fundamental do Estado. Entretanto, no que concerne à doutrina, alguns autores conferem a Maquiavel a formulação da primeira concepção de poder supremo e unificado do Estado.

De acordo com Kerber (2001, p. 73), o caráter absoluto do poder do Estado defendido por Jean Bodin deve ser compreendido com base no contexto histórico dentro do qual foi preconizado. Era um período de afirmação do poder estatal, de lutas pela independência, e a monarquia, muitas vezes, era associada como representante da noção de Estado, o que ligava a idéia de soberania à figura do monarca.

Para Soares (1999, p. 21), o conceito clássico de soberania, formulado por Bodin, pressupunha a inexistência de uma comunidade internacional ou de direito internacional que ligasse os Estados uns aos outros.

Conforme Moon Jo e Sobrino (2004, p. 9), Jean Bodin viveu na França, na segunda metade do século XVI, em um período de muita desordem devido a guerras

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entre religiões. Foi quando publicou sua obra “Os Seis Livros da República”, em que argumentava que a restauração da ordem somente seria possível através da tolerância religiosa e do estabelecimento da monarquia soberana. Para ele, a monarquia soberana absoluta era crucial para que o Estado tivesse condições de se organizar. Desse modo, a soberania seria um poder absoluto, perpétuo e originário, ao passo que o Estado soberano concentraria todos os poderes sociais, transformando-se na autoridade última e inapelável.

De acordo com Furlan (2004, p. 20), Bodin, no século XVII, estabeleceu que a soberania era elemento essencial do Estado e que o Estado moderno precisava se impor. Hobbes, por sua vez, procedeu à teorização do poder soberano, buscando legitimá-lo em relação aos súditos, afirmando a sua supremacia.

Para Furlan (2004, p. 20), ao buscar sua afirmação e consolidação, o Estado moderno suscitou a idéia de que possuiria a capacidade de concentrar em torno de si as aspirações morais dos homens em certo território.

No entender de Moon Jo e Sobrino (2004, p. 9), a teoria da soberania, desenvolvida no século XVI por Jean Bodin e Thomas Hobbes, foi aceita por países da Europa no século XVII. Na realidade, nesse período, os Estados levavam em consideração tal teoria tanto para a sua formação quanto para sua manutenção.

Conforme Furlan (2004, p. 20), a justificação jurídica dessa realidade econômica, política e social estruturou-se em torno da noção de soberania e razão de Estado. O objetivo estratégico do conceito de soberania elaborado por Jean Bodin e Thomas Hobbes era fortalecer a territorialidade do Estado. Apenas a habilidade e a capacidade de governar limitariam de forma efetiva o poder do soberano em seu território. Disso decorre também, em âmbito internacional, o surgimento do princípio da razão do Estado, elaborado por Maquiavel, e que se traduziria no não-reconhecimento de uma ordem superior, transcendente, como instância de suas manifestações.

O poder interno dos monarcas, segundo Matias (2005, p. 35) não poderia firmar-se sem que tal poder fosse reconhecido externamente. Foi com os tratados de Westfália que esse reconhecimento se deu, em 1648. Os Estados concordaram em criar regras e instituições obrigatórias, bem como mantê-las, visando a um interesse comum. Com isso, se estabeleceu a igualdade jurídica entre os Estados e fortaleceu a aceitação do princípio da soberania estatal, marcando assim a origem da atual sociedade internacional.

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Matias (2005, p. 36), considera a igualdade entre todos os Estados uma conseqüência lógica do próprio conceito de soberania, e estes, sendo soberanos, possuem um poder supremo e independente, dotados de direitos e obrigações equivalentes ao se relacionarem entre si. Logo, a soberania seria um poder incondicionado, não subordinado a nenhum outro.

Com a paz de Westfália, de acordo com Matias (2005, p. 39), a soberania adquirida recentemente pelos Estados na Europa “vinha acompanhada de um poder ilimitado, uma autocracia rígida no regime interior dos Estados”.

Conforme Matias (2005, p. 40), a doutrina da época do absolutismo afirmava que para existir a soberania era necessário que um “sujeito” a incorporasse e a colocasse em funcionamento. A soberania não existiria fora da monarquia, uma vez que o soberano deveria ser um único sujeito e não dois ou mais, pois, nesse caso, teria de submeter-se ao governo de outros, deixando de ser soberano. Assim, a soberania passou a refletir a idéia de que o monarca detinha um poder absoluto e ilimitado para fazer o que bem entendesse.

Na época dos contratualistas, Matias (2005, p. 44) afirma que as idéias de John Locke e Jean-Jacques Rousseau iniciaram o processo de contestação do poder do monarca, difundindo na sociedade as noções de valorização da nação e do indivíduo.

Segundo Moon Jo e Sobrino (2004, p. 10), Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau compreendiam que a natureza da sociedade estava em um acordo contratual estabelecido entre todos os seus membros. Os homens formaram a sociedade pela necessidade de se protegerem contra os perigos advindos do “estado de natureza”. Essa concepção formou a base da soberania popular, visto que esta nasce da idéia de que o consentimento direto ou indireto dos sujeitos envolvidos torna legítima qualquer lei ou regra da sociedade.

Para Moon Jo e Sobrino (2004, p. 10), Thomas Hobbes, em sua obra “O Leviatã” (1651), afirmava que a única função da sociedade política era a de designar um indivíduo ou um grupo de indivíduos como soberano. Este, por sua vez, deteria um poder absoluto, devendo cada cidadão comprometer-se em obedecer a esse soberano de modo absoluto. Seu entendimento era de que a soberania popular existe momentaneamente e uma única vez. A unidade do poder possui caráter absoluto, não existindo qualquer autoridade superior à autoridade política, e toda autoridade social depende imediatamente do poder político.

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De acordo com Moon Jo e Sobrino (2004, p. 10), John Locke, em sua obra “O Segundo Tratado sobre o Governo” (1790), salientava que o contrato social era algo permanente e irrevogável. Entretanto, era papel do poder legislativo legislar visando o bem comum. Se tal confiança atribuída pelo povo fosse desrespeitada, este, pelo fato de reter tal poder, poderia substituir o legislativo por um novo legislativo. Porém, neste ponto, o entendimento de Locke é obscuro, não sendo possível distinguir o seu real pensamento, isto é, se a soberania é conferida ao povo ou ao legislativo. Dessa forma, para ele, a soberania não era tão absoluta como na visão de Hobbes.

Segundo Moon Jo e Sobrino (2004, p. 10), Jean-Jacques Rousseau, em sua obra “O Contrato Social” (1762), defendia que a lei somente poderia revelar a vontade comum dos membros da sociedade. Entretanto, ele não esclareceu o que poderia ou deveria ocorrer em caso de violação dessas condições. Rousseau também criou alguns mecanismos pelos quais seria possível desvendar a real vontade do povo, bem como entender de forma clara que o poder legislativo era um poder atribuído pelo povo.

Conforme Adolfo (2001, p. 22), o “Contrato Social”, de Jean-Jacques Rousseau, deu ênfase à noção de soberania e atribuiu ao povo sua titularidade. A soberania, que estava concentrada nas mãos do monarca, deslocou-se e foi consubstanciada no povo, limitando-se no conteúdo do contrato originário do Estado.

Para Matias (2005, p. 45), com o tempo, a soberania popular ou nacional baseada nas idéias de Rousseau, substituiu a idéia do monarca e se consolidou com a Revolução Francesa. A soberania passou a ser pensada como atributo da “coletividade unificada”, constituindo uma “identidade com individualidade e poder superiores e independentes dos de seus membros, e se personifica no Estado”, cujos poderes e direitos são os mesmos da própria nação.

O desenvolvimento histórico da noção de soberania, segundo Adolfo (2001, p. 22), teve continuidade, atribuindo-se primeiro à burguesia, à nação, para, no século XIX, manifestar-se como decorrente do poder político. Em seguida, foi o próprio Estado quem se apossou de sua titularidade, acrescentando-a como um de seus elementos.

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A origem desse entendimento, para Adolfo (2001, p. 22), se deu na Alemanha, com a teoria da personalidade jurídica do Estado, que finalmente foi considerado o verdadeiro titular da soberania.

Com a Revolução Francesa, de acordo com Matias (2005, p. 46), também se consolidou a idéia de liberdade, fundamental ao modelo de Estado soberano, afirmada no primeiro artigo da Declaração de 1789: “Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos”. Isso significa que nenhum homem poderia sobrepor o seu poder aos demais sem que estes consentissem expressamente, o que pôs em xeque o poder do monarca e da aristocracia. As pessoas somente se submeteriam ao soberano por vontade própria, visando preservar seus direitos. No artigo segundo da referida Declaração está disposto que “o objetivo de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem”.

Adolfo (2001, p. 23) afirma que a anterior concepção de soberania atribuída à nação sofreu grande influência da Revolução Francesa. Em tal concepção, a nação surgiu como depositária única e exclusiva da autoridade soberana. Povo e Nação constituíam uma só entidade, entendida como ser novo, distinto, abstratamente personificado e com vontade própria, superior aos anseios individuais que a compunham. O artigo 1º, título III, da Constituição Francesa de 1791 dispunha que a soberania era una, indivisível, inalienável e imprescritível. Pertencia à Nação; nenhuma seção do povo, nenhum indivíduo poderia atribuir-se-lhe o exercício.

Para Matias (2005, p. 47), o reconhecimento dos direitos do homem e do cidadão ratificaria o princípio de que o indivíduo vem antes do Estado e de que o governo é feito para o indivíduo e não o contrário, o que denotaria uma revolução no relacionamento entre governantes e governados.

Immanuel Kant, por sua vez, conforme cita Matias (2005, p. 49), iniciou uma tradição na doutrina alemã, seguida por Hegel anos depois, na qual a soberania seria atribuída ao Estado. Kant dividiu a soberania em três pontos: como legislador, o Estado é irrepreensível em suas leis; como executor, irresistível em seus mandados; e como julgador, inapelável em suas sentenças. Essa noção resiste até os dias atuais, e, embora se afirme que o poder do Estado deriva do povo ou dos indivíduos, quando se trata da soberania, comumente se pensa no Estado como seu titular.

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Para Georg Friedrich Hegel, segundo salienta Matias (2005, p. 50), a soberania teria um aspecto absoluto e ilimitado. Já George Jellinek desenvolveu a teoria da autolimitação do Estado, ou seja, os Estados, visando o bem comum, aceitam de forma voluntária uma limitação à sua soberania pela aprovação do direito internacional como regra obrigatória de conduta. A soberania, de acordo com Jellinek (1954 apud MATIAS, 2005, p. 50), seria “a propriedade do poder de um Estado, em virtude da qual corresponde exclusivamente a este a capacidade de determinar-se juridicamente e de obrigar-se a si mesmo”. Na medida em que o Estado se impõe algumas limitações, ele não perde a “competência de sua competência”, pelo contrário, declara por isso mesmo que a possui.

Essa postura busca resguardar a teoria da soberania absoluta do Estado, de acordo com Matias (2005, p. 51) e, além disso, constata a existência do direito internacional, ao qual o Estado se submete, mesmo que voluntariamente. Com o passar dos anos, a noção de soberania absoluta e limitada foi perdendo força, o que favoreceu a idéia de uma soberania relativa, isto é, de uma soberania estatal limitada pelo direito internacional.

Para Matias (2005, p. 51), Hans Kelsen foi o autor que melhor sintetizou a noção de soberania ilimitada, ao destacar que o Estado possuiria uma “supremacia de competência”, ou seja, sua ordem teria a capacidade de determinar os objetos de sua regulamentação. O poder equivaleria à autoridade ou ao poder legal, mais precisamente, à competência para atribuir direitos e impor obrigações. Para Kelsen, a soberania de um Estado denota uma autoridade relativa e não suprema. No sentido do direito internacional, a soberania representa “a autoridade legal ou competência de um Estado limitada e limitável somente pelo direito internacional, e não pelo direito nacional de qualquer outro Estado”.

Neste sentido, para Matias (2005, p. 52), a soberania muda conforme as regras do direito internacional, às quais os Estados se sujeitam, vão se modificando. A soberania depende da ordem jurídica internacional e, com isso, os limites ao seu exercício podem ser ampliados ou restringidos.

Segundo Furlan (2004, p. 20), desde a época em que Jellinek chegou à conclusão de que é falsa a noção de soberania com algo absoluto, poucos autores continuaram a vê-la, no plano do direito internacional, como um elemento essencial do Estado. Com isso, grande parte da doutrina concluiu que, em âmbito externo, a

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soberania é somente qualidade do poder, que pode ou não ser ostentada, a critério do Estado.

De acordo com Matias (2005, p. 71), a soberania surgiu como um poder de dominação dos soberanos, confundindo-se, dessa forma, com o próprio titular do poder estatal. Com a paz de Westfália, a igualdade entre os Estados se fortaleceu, tendo cada um, a partir de então, concordado em respeitar as suas independências de forma mútua. Assim, a soberania passou a ser uma liberdade, um direito à supremacia e à independência e não somente um poder, reconhecido internacionalmente.

2.2 CONCEITO

De acordo com Carvalho (2006, p. 460), a palavra soberania advém do latim super omnia, superanus ou supremitas, e corresponde ao poder de mando de última instância em uma sociedade politicamente organizada. Em âmbito interno, equivale à supremacia ou superioridade do Estado em relação às demais organizações. No plano externo, significa independência de um Estado em relação aos outros.

Conforme Matias (2005, p. 71), a soberania é o conjunto de poderes compreendidos no poder do Estado, sendo sinônimo deste último, que pode se referir ao caráter supremo de um poder independente de modo pleno, e, em particular, do poder Estatal. Possui duas acepções principais: soberania como poder e soberania como supremacia e independência. A primeira seria o próprio conjunto de poderes ou competências que um Estado tem, interna e externamente; a segunda seria o poder supremo que o Estado tem dentro de suas fronteiras e que equivale à idéia de soberania interna, podendo ser interpretada como “independência”.

Como poder estatal, Matias (2005, p. 72) afirma que a soberania “se caracterizaria como o conjunto de atribuições positivas do Estado, seja de impor internamente as medidas que julgar necessárias, seja de agir exteriormente conforme o interesse nacional”. A soberania seria a soma dos direitos que o Estado

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possui. Em outras palavras, seria uma simples “soma de competências”, um conjunto de poderes.

Como supremacia e independência do Estado, segundo Matias (2005, p. 73), a soberania seria o mais elevado grau do poder estatal, isto é, se refere à posição do poder estatal com relação aos demais tipos de poder. Assim, ela seria o caráter supremo do poder estatal, não admitindo nenhum outro poder nem acima e nem em concorrência com ele.

De acordo com Matias (2005, p. 74), a soberania, no direito internacional, é definida como a supremacia do poder do Estado sobre sua população e seu território, e a independência desse com relação a qualquer autoridade exterior. Portanto, entende-se a existência de duas soberanias, uma interna e outra externa. Internamente, a soberania refere-se à existência de uma autoridade suprema dentro de certo território. Externamente, a soberania consiste na independência do Estado para com autoridades a ele exteriores, ou seja, o Estado possui um poder independente, não se admitindo nenhuma subordinação a qualquer outro poder. Em âmbito externo, para Matias (2005, p. 75), a soberania seria “uma conseqüência direta do próprio direito internacional e do ideal de igualdade jurídica entre os Estados”. Seria também uma qualidade do poder estatal que resguarda cada Estado da intervenção em seus próprios assuntos por parte de outros Estados, bem como impede que cada um interfira nos assuntos internos do outro.

Para Kerber (2001, p. 75), além do imperium do Estado sobre o território e a população, a soberania interna corresponde também à superioridade do poder político perante aos demais poderes sociais, que lhes ficam sujeitos, de maneira mediata ou imediata. A soberania externa, por sua vez, refere-se à manifestação independente do poder do Estado diante das demais nações.

De acordo com Moon Jo e Sobrino (2004, p. 11), o direito internacional apenas decide se o Estado é soberano ou não, atribuindo à lei interna a incumbência de escolher quem deve exercer a soberania. Por essa razão, a soberania de Estado, em direito internacional, corresponde à independência deste nas relações entre os Estados, o que não significa que ele se sobrepõe à lei. A independência da soberania estatal é uma garantia dentro do direito internacional.

Segundo Moon Jo e Sobrino (2004, p. 11), o entendimento contemporâneo do conceito de soberania ainda está relacionado a uma concepção de poder. Nesse sentido, a soberania seria conceituada como “o poder de decidir em

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última instância sobre a atributividade das normas, ou seja, sobre a própria eficácia do direito”.

Tradicionalmente, a soberania, de acordo com Adolfo (2001, p. 38), possui os seguintes atributos: é una, indivisível, inalienável e imprescritível. É una, pois, em um mesmo território, não se admite a coexistência de duas soberanias ou de mais de um poder superior no mesmo plano. É indivisível, visto que é aplicável à universalidade dos fatos que se sucedem no Estado, não sendo crível a existência de diversas e distintas partes da mesma soberania, ademais das razões que impõem sua unidade. É inalienável porque quem a detém desaparece quando ficar sem ela, seja o Estado, a nação ou o povo. É imprescritível, pois jamais seria efetivamente superior se tivesse prazo de duração determinado, uma vez que todo poder soberano aspira a existir de modo permanente e somente desaparece quando forçado por uma deliberação superior.

Além desses atributos mencionados, Kerber (2001, p. 74) ainda acrescenta mais um, o conceito negativo de soberania, que corresponde à impossibilidade de o Estado ter seu poder limitado ou reduzido por outro poder, tanto nas relações internas como naquelas com outros Estados.

Adolfo (2001, p. 38) salienta que a soberania ainda é tida como um poder originário, exclusivo, incondicionado e coativo. É originário, pois surge no momento em que nasce o Estado, como seu atributo inseparável. É exclusivo porque apenas o Estado o detém. É incondicionado devido ao fato de somente encontrar limites impostos pelo próprio Estado. É coativo em conseqüência do poder coativo do Estado para fazer cumprir suas ordens.

Para Matias (2005, p. 78), as duas acepções da soberania mencionadas anteriormente são reconhecidas pelo direito internacional e, conseqüentemente, pelos próprios Estados, não sendo questionadas formalmente. Elas representam o que a soberania deveria ser, portanto são denominadas “soberania de direito”. Por outro lado, se uma das acepções da soberania equivale a um conjunto de poderes ou competências, deve-se verificar até que ponto o Estado consegue exercer tal soberania de modo efetivo, ou seja, se este possui uma “soberania de fato”.

Matias (2005, p. 78) afirma que a supremacia interna e a independência externa somente são válidas se o Estado detém uma real “autonomia”, isto é, se possui capacidade de resistência em relação às pressões internas e externas na adoção e condução de suas políticas. O poder equivale à capacidade de impor sua

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própria vontade aos outros, e a efetividade corresponde a uma medida dessa capacidade. A efetividade do poder é essencial ao reconhecimento do próprio Estado como tal. Assim, tanto o poder do Estado quanto a efetividade do poder estatal são fundamentais para a soberania. Além disso, a autonomia, isto é, a capacidade de o Estado agir de forma livre, nos planos interno e externo, também é imprescindível à idéia de soberania.

2.3 EVOLUÇÃO

De acordo com Matias (2005, p. 32), a soberania não é um conceito absoluto e imutável, pelo contrário, seu valor é relativo, uma vez que se formou sob influência de aspectos históricos, além de ser uma criação humana que nem sempre existiu. Portanto, não pode evidenciar uma realidade permanente.

Conforme Paupério (1958 apud STELZER 2004, p. 83), “a soberania do Estado não pode ser estática: tem que ser dinâmica, no sentido de se tornar capaz de se adaptar à variedade de circunstâncias que se abrem, constantemente, na vida dos povos”.

O conceito de soberania, para Stelzer (2004, p. 83), evoluiu e dividiu a soberania em qualitativa e quantitativa. A primeira equivale à idéia de personalidade jurídica e a segunda relaciona-se à capacidade jurídica de exercício de direitos. Essas recentes teorias procuraram explicar que a soberania não é mais uma atribuição própria e exclusiva dos Estados, uma vez que permitiram a transferência de parcelas soberanas para instituições chamadas supranacionais. O surgimento da globalização enfraqueceu o conceito clássico de soberania, que passou a ser pensado em termos relativos.

Segundo Stelzer (2004, p. 86), o conceito de soberania como plenitude do poder estatal, enquanto sujeito único e exclusivo de mando sobre um território e povo, entrou em forte declínio no final do século XX, em virtude da globalização e das idéias integracionistas na Europa.

Como o advento da globalização, segundo Moon Jo e Sobrino (2004, p. 12), o conceito de soberania, embora possua um caráter flexível e independente nas

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relações internacionais, vem perdendo o seu significado, visto que a interdependência é uma realidade. Por esse motivo, o próprio termo soberania continuamente vem perdendo a sua utilidade, a não ser no plano interno. As tendências de integração regional, como o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a União Européia, impõem certa dificuldade à tentativa de explicar logicamente o conceito tradicional de soberania. Dispensar esse termo do direito internacional, substituindo-o por outros critérios, como igualdade compensatória, seria algo mais apropriado nesta sociedade internacional contemporânea.

De acordo com Kerber (2001, p. 73), a soberania como conceito histórico que compõe a qualidade do Estado, vem gradativamente experimentando atenuações em virtude da crescente noção de integração dos Estados em grupos regionais, cujo objetivo é fomentar seus negócios no âmbito interno do próprio grupo e, especialmente, no contexto global.

Conforme Carvalho (2006, p. 460), verifica-se que o conceito de soberania está passando por uma crise no mundo contemporâneo, devido à superação do Estado nacional por outros modos de convivência social. Para Verdu (2004 apud CARVALHO, 2006, p. 460), a crise do Estado nacional soberano exige a criação e o fortalecimento de estruturas e instituições supranacionais, de forma que a soberania se redimensione, sobretudo, no âmbito das relações exteriores.

Segundo Furlan (2004, p. 21), a crise contemporânea do conceito de soberania abrange aspectos como a dificuldade de conciliar a idéia de soberania do Estado com a ordem internacional, de forma que a ênfase na soberania estatal acarreta um sacrifício maior ou menor do ordenamento internacional e vice-versa. A ênfase neste é feita com restrições de grau variável aos limites da soberania, que, outrora, ainda era tomada em termos absolutos.

Adolfo (2001, p. 111) destaca que:

A soberania não é mais interpretada em sentido absoluto, mas como dependente da ordem jurídica internacional. Então, o Estado soberano deve ser entendido aquele que se encontra subordinado de maneira direta ou indireta a esta ordem.

Furlan (2004, p. 53) afirma que a soberania, vista pela ótica da integração e formação de mercados comuns, inevitavelmente acarretará uma sensível mudança nas regras dos Estados, visto que as decisões a serem adotadas se referem à unidade dos Estados integrados e não mais ao Estado em si.

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De acordo com Bastos (1997 apud FURLAN, 2004, p. 53), os Estados integrados, ao se associarem, criam bases para o que poderá vir a se tornar uma Federação ou Confederação, levando a um progressivo avanço que suplantará o reduto da soberania estatal.

Para Furlan (2004, p. 54), “a imbricação dos poderes soberanos na ordem internacional implica uma revisão em muitos dos seus postulados, favorecendo uma revisão de seu conceito mais tradicional como poder superior”. Embora o conceito de soberania esteja ligado à idéia de insubmissão, independência e poder supremo juridicamente organizado, é preciso se ater às novas realidades, que lhe impõem diferentes nuances.

Conforme Furlan (2004, p. 54), a interdependência que se firma entre as nações nos dias atuais, aponta para uma relação crescente entre as noções de soberania e de cooperação jurídica, econômica e social, uma vez que abala de forma drástica a pretensão à soberania. Ainda que haja discussões acerca do fato de que esta colaboração somente é possível em virtude da própria soberania, a qual permitiria a um Estado associar-se a outros em questões de seu interesse ou para defrontar situações paradigmáticas, o que se verifica, na realidade, é a revisão radical dos postulados centrais do conceito.

Segundo Ocampo (2008, p. 53), em relação à evolução do conceito de soberania, pouco permaneceu na sociedade contemporânea desde a afirmação original de Bodin de que o Estado ou a soberania representa o poder perpétuo e absoluto de uma república, “que se exerce nesses termos tanto para dentro de um Estado, em relação a seus habitantes, como para fora e em relação a outros Estados nacionais, sem ser limitado nem em poder, nem em responsabilidade, nem no tempo”.

Para Ocampo (2008, p. 53), esse conceito, em sentido literal, presume, de uma parte, a inexistência de uma comunidade internacional e de um direito internacional público que estabeleça regras nas relações entre os Estados (conceito externo de soberania), e, de outra, implica desconhecer os processos de integração regional ou de globalização.

Furlan (2004, p. 58) salienta que o conceito de soberania é polêmico, relativo, histórico e é continuamente posto em discussão, em virtude das condições políticas ocidentais da atualidade. Hodiernamente, os atributos da soberania

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possuem mais importância, visto que é o exercício democrático do poder popular que detém caráter soberano.

Segundo Furlan (2004, p. 59), desde o final do século XIX e durante o século passado, especialmente, nota-se uma relativização cada vez maior do conceito de soberania, devido a alguns fatores, como as idéias anarquistas e marxistas que começaram a negá-la; a internacionalização de aspectos econômicos, políticos, sociais e culturais que determinaram afinidades entre nações; a coordenação de políticas públicas; e a presença de organizações internacionais de caráter não-governamental que se apresentam como participantes da experiência política de Estados diversos. Portanto, é incontestável o fato de que o conceito de soberania vem sofrendo certa restrição nos últimos anos.

Conforme Ocampo (2008, p. 54), no século XXI, o conceito de soberania se desvincula da pessoa do monarca e perde suas características de absoluto, em decorrência da idéia de que o Estado se despersonaliza e se constitucionaliza, simultaneamente, criando um crescente número de restrições para a admissão da noção de soberania absoluta ou de poder absoluto.

De acordo com Ocampo (2008, p. 55), verifica-se uma forte tendência entre a grande maioria dos doutrinadores em considerar a soberania como relativa e plenamente compatível com o direito internacional, sem que seja preciso suprimir essa noção.

Para Ocampo (2008, p. 55), a nova ordem internacional se caracteriza, sobretudo, pela erosão do conceito de soberania, em benefício do aumento das competências de organismos internacionais. A nova era de convivência internacional impõe regras e rechaça decisões de caráter individual e autoritário. Na sociedade contemporânea, “conforme demonstraram Kelsen e Jellinek há muitos anos, a concepção clássica de soberania como poder ilimitado não pode ocorrer nem no aspecto interno, nem no externo”.

Sem dúvida, segundo Furlan (2004, p. 60), a soberania não pode persistir como conceito que se ponha como obstáculo às modificações que a nova ordem internacional anseia, aos novos meios de cooperação entre os povos e à experiência de universalização e mundialização dos direitos fundamentais propostos pelo homem.

Na visão de Furlan (2004, p. 61), o mais importante é o fortalecimento da soberania, pois o cidadão é que é soberano e não o Estado, e a cidadania, por seu

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turno, está se tornando cada vez mais supranacional. O direito de participar do poder político não está mais somente restrito ao território de um Estado, mas está se expandindo, sobretudo, pelo fato de que ele se exerce para garantir a dignidade da pessoa humana, princípio fundamental de qualquer ordenamento.

Para Furlan (2004, p. 59), ainda que o conceito tradicional e hermético de soberania já não predomine tanto quanto no passado, uma vez que não atende mais aos anseios da sociedade contemporânea, é correto afirmar que ele ainda é proclamado, principalmente pelas Constituições, por resguardar o direito de cada povo de deliberar o seu modo político de ser e de fazer-se construir em sua história de forma a não se submeter às vontades das potências estrangeiras.

Conforme Furlan (2004, p. 61), na interconexão entre direito interno e direito internacional, a limitação das competências do Estado pela atribuição concedida aos órgãos que criam as normas de caráter supranacional, constitui, indubitavelmente, uma limitação à própria soberania do Estado, considerada esta em sua concepção mais vinculada à idéia de capacidade suprema de produzir, por si e internamente, uma ordem jurídica. Ainda que se estabeleça que o constitucionalismo contemporâneo beneficie a produção heterógena de normas que visem a tornar possível uma maior composição de interesses dos povos integrados ou reunidos em comunidades, é certo que se pode considerar a manutenção daquele conceito e, inclusive, o seu fortalecimento.

De acordo com Moon Jo e Sobrino (2004, p. 12), a soberania não deve ser entendida como um conceito estático e sim como um processo, uma vez que possui um caráter fortemente histórico e também por ter a sua interpretação variado amplamente no tempo e no espaço, de acordo com a realidade e as necessidades do Estado, primeiramente, e, em seguida, de toda a sociedade internacional. Atualmente, a soberania é na verdade compreendida com dependente de modo absoluto em relação à ordem jurídica internacional. Soberano é o Estado que se encontra sujeito de forma direta e imediata à ordem internacional, sem que haja entre ele e o direito internacional qualquer outra coletividade de permeio, constituindo, desse modo, o principal sujeito de direito internacional.

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3 A GLOBALIZAÇÃO E AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS

3.1 CONCEITO E PERPECTIVA HISTÓRICA DA GLOBALIZAÇÃO

Para Matias (2005, p. 108), o movimento de internacionalização da economia, embora esteja no centro das atenções mundiais atualmente, não representa algo novo. Esse processo remonta à expansão da civilização européia, ocorrida por volta do século XV.

No entender de Soares Filho (2003, p. 155), a globalização ou mundialização da economia surgiu na época do Império Romano, pondo fim à feudalização política e comercial. Após um longo período de retração, ressurgiu por volta dos séculos XIV e XV, época em que o comércio internacional se expandiu, principalmente nos países situados na periferia do mar Mediterrâneo e na Península Ibérica, em virtude das expedições às Índias, de onde se importava especiarias e outros artigos. Para regular esse comércio, foram criadas normas transnacionais, incluídas nos chamados regulamentos do mar. Em seguida, foi a vez da Holanda se destacar no mercado internacional, com as famosas Companhias das Índias, as Orientais e as Ocidentais, que tiveram grande atuação no Novo Mundo, sobretudo no Brasil.

Segundo Soares Filho (2003, p, 155), uma terceira globalização começou a se revelar no século XIX, após as guerras napoleônicas, contribuindo para a supremacia do liberalismo sobre o mercantilismo. Entretanto, o fenômeno da globalização se retraiu novamente, em decorrência da Primeira Guerra Mundial e dos ideais fascistas e comunistas, contrários ao livre comércio e a favor do sistema de autarquia, que corporificou a intervenção estatal no domínio econômico. E devido à depressão de 1930, que enfraqueceu o capitalismo, surgiram políticas protecionistas em relação à economia.

De acordo com Soares Filho (2003, p. 155), uma quarta globalização despontou após a Segunda Grande Guerra, alcançando seu apogeu com o colapso do regime socialista, por volta de 1990. Com lugar de destaque na atual economia

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denominada economia de mercado, a globalização está se expandindo cada vez mais nos últimos anos.

No período de 1870 até a Primeira Guerra Mundial, segundo Matias (2005, p. 108), vigeu um sistema econômico aberto, com base em comunicações eficientes de longa distância (cabos submarinos telegráficos intercontinentais) e em meios de transporte industrializados (ferrovias e navios a vapor), semelhantes aos existentes nos dias atuais.

De acordo com Matias (2005, p. 109), dois aspectos fundamentais concorreram para que esse sistema de economia internacional aberta se fortalecesse. O primeiro foi o equilíbrio de poder que se verificava no período, que assegurava estabilidade e segurança aos investimentos, em um mundo relativamente eurocêntrico. O segundo foi o surgimento do padrão-ouro, que possibilitou o aumento das trocas internacionais. As diversas moedas, permanecendo em uma cotação estável em relação ao ouro e umas em relação às outras, permitiu que o fluxo de capitais e de comércio se tornasse mais fácil.

Conforme Matias (2005, p. 109), foi nesse período que se estruturou uma ordem internacional de fato, no âmbito do comércio, dos fluxos de investimento e no sistema monetário. No entender de Sato (1997 apud MATIAS, 2005, p. 109), “foi somente a partir de meados do século XIX que as trocas internacionais se expandiram em volume e organização a ponto de tornarem-se um sistema relevante para as economias nacionais”. O comércio mundial de mercadorias, ao longo daquele período, se intensificou de forma fantástica.

Matias (2005, p. 104) salienta que a economia mundial, apesar de existir desde o século XVI e de o modo de produção capitalista estar cada vez mais se expandindo, somente teve condições de adquirir um caráter global no final do século XX, graças à nova infra-estrutura proporcionada pelas tecnologias de informação e comunicação. Assim, fica clara a diferença entre economia global e economia mundial.

Segundo Olsson (2003, p. 90), no final do século XX, o mundo foi palco de consideráveis mudanças que redefiniram a economia, a política e a sociedade contemporânea.

Conforme Olsson (2003, p. 90), as distâncias entre os continentes e seus centros políticos, econômicos e culturais eram consideradas de difícil transposição e atravessá-las representava enfrentar uma realidade desconhecida. Contudo, com o

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passar do tempo, essa realidade foi se alterando com uma velocidade impressionante, o que possibilitou uma série de mudanças, como atravessar um continente de forma mais rápida e mais barata do que antigamente; as culturas consideradas exóticas tornaram-se mais populares devido aos meios de comunicação em massa; os mercados qualificados como restritos passaram a se abrir para além das fronteiras, com uma quantidade infinita de novos consumidores reais e potenciais, com necessidades diversas; entre outras. Todo esse processo caracteriza o fenômeno da globalização.

No entender de Santos (1995 apud ADOLFO, 2001, p. 53):

Mesmo admitindo que exista uma economia-mundo desde o século XVI, é inegável que os processos de globalização se intensificaram enormemente nas últimas décadas. Isto é reconhecido mesmo por aqueles que pensam que a economia internacional não é ainda uma economia global, em virtude da continuada importância dos mecanismos nacionais de gestão macro-econômica e da formação de blocos comerciais.

Para Matias (2005, p. 105), o mundo presencia o surgimento de uma autêntica economia global, marcada por um elevado nível de integração dos mercados, bem como pelo predomínio de atividades transnacionais. Essa realidade é diferente daquela existente em uma economia internacional, pois esta última se caracteriza pelo intercâmbio entre economias nacionais diversas, com predominância das atividades econômicas internas. A globalização nasce com o surgimento de uma nova era econômica, com características que a torna diferente do movimento anterior de internacionalização da economia, cujo ápice se deu antes da Primeira Grande Guerra. Dessa forma, conclui-se que a recente evolução da economia internacional explicaria o emprego do termo “globalização”.

A globalização, para Olsson (2003, p. 98), é um fenômeno inerente ao desenvolvimento do capitalismo, desde os seus primórdios, e resulta de uma longa, lenta e quase imperceptível evolução da sociedade moderna.

Olsson (2003, p. 95) salienta que o fenômeno da globalização se revelou um processo de caráter capitalista que foi se espalhando por todo o mundo, com a premissa de maximização do lucro e suas próprias leis de desenvolvimento.

Segundo Faria (1999 apud OLSSON, 2003, p. 95), o processo de globalização resulta “da convergência de distintas e importantes transformações institucionais, políticas, organizacionais, comerciais, financeiras e tecnológicas ocorridas ao longo das décadas de 70, 80 e 90”, sobretudo as de ordem econômica.

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Na visão de Tiujo (2003, p. 230), a idéia de globalização somente tornou-se popular a partir dos anos 90. Isto porque as pessoas nunca tornou-se tornou-sentiram tão interligadas com outras partes do mundo e nunca as relações foram tão próximas. A tecnologia e a crescente redução de seus custos foram as grandes responsáveis pela intensificação dos intercâmbios das mais diversas espécies.

Para Amartya Sen (2001 apud COUTINHO, 2003, p. 61), “a globalização é resultado das viagens, do comércio, da navegação, da expansão da influência cultural e da disseminação do conhecimento”. No seu entendimento, a globalização não é algo novo, ela vem avançando há centenas de anos e explodiu nos últimos dez ou doze anos, em virtude do incrível desenvolvimento da tecnologia, que é predominante na conjunção de forças poderosas.

Gonçalves (1999 apud ADOLFO, 2001, p. 49) define a globalização como: A interação de três processos distintos, que têm ocorrido nos últimos vinte anos, e afetam as dimensões financeira, produtivo-real, comercial e tecnológica das relações econômicas internacionais. [...] Esses processos são a expansão extraordinária dos fluxos internacionais de bens, serviços e capitais; o acirramento da concorrência nos mercados internacionais; e a maior integração entre os sistemas econômicos nacionais.

Segundo Adolfo (2001, p. 54), a globalização equivale a processos atuantes em nível global, que transpõem as fronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades e organizações. É uma “ordem econômica e tecnológica transnacional, à qual todos devem se integrar, sob pena de sofrer um processo de seleção natural, no sentido evolucionista do século XIX”.

De acordo com Soares Filho (2003, p. 156), o fenômeno da globalização corresponde a um progresso tecnológico, ao acúmulo financeiro de capitais, à internacionalização da vida econômica, política, social e cultural, com a queda dos obstáculos ao desenvolvimento das atividades dos grandes grupos econômicos, das barreiras comerciais e não-comerciais, devido à liberalização e à desregulamentação, apoiado na teleinformática e nos satélites de comunicação.

Segundo Olsson (2003, p. 96), alguns fatores e seus desdobramentos nos campos político, social, jurídico e cultural formam o atual quadro da globalização: a) a crescente desregulamentação dos mercados financeiros, a contínua revogação dos monopólios estatais e a rápida abertura do comércio mundial de informação e serviços; b) o destaque dado à racionalização das estruturas organizacionais, dos

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procedimentos decisórios e das atividades produtivas; e c) a progressiva conversão das ciências humanas, exatas e biomédicas em técnicas produtivas.

Conforme Hesse (1997 apud ADOLFO, 2001, p. 48), “globalização da economia significa que as fronteiras entre os países perdem importância, quando se trata de decisões sobre investimentos, produção, oferta, procura e financiamentos”.

A globalização econômica, conforme Matias (2005, p. 107), é aquela que advém do crescente aumento das trocas comerciais e dos fluxos financeiros entre os povos. Esse aumento conduz à criação de um mercado mundial que substitui os vários mercados existentes.

Hesse (1997 apud ADOLFO, 2003, p. 48) afirma que:

As conseqüências são uma rede cada vez mais densa de entrelaçamentos das economias nacionais, uma crescente internacionalização da produção, [...] e a criação de mercados mundiais integrados para inúmeros bens, serviços e produtos financeiros.

Matias (2005, p. 106) salienta que diversos fatores contribuíram para levar o mundo à sua atual conjuntura, o que fez com que a globalização adquirisse também um aspecto tecnológico, político, institucional e cultural. Ademais da globalização econômica, verifica-se, pelo menos, outras três vertentes desse processo: a) o avanço da informática e o surgimento de grandes redes de computadores e a evolução veloz dos transportes e das telecomunicações, denominada revolução tecnológica; b) o crescente intercâmbio de informações e a intensificação da interação entre os povos, que resulta em conseqüências sociais e culturais, e está na origem do nascimento da denominada sociedade transnacional; e c) a intensificação da cooperação entre os Estados e o incremento do direito internacional e das organizações internacionais.

Para Olsson (2003, p. 94), a globalização também adveio do recente avanço tecnológico, nos campos da informática e das telecomunicações, sob o pano de fundo do modo de produção capitalista e no esforço de expandi-lo. De uma parte, investiu-se em pesquisas e no desenvolvimento de tecnologias para suplantar as dificuldades encontradas nas comunicações, no transporte e no processamento de dados em larga escala, imprescindíveis para intensificar a produção e aumentar os mercados. De outra, os instrumentos utilizados a partir desses avanços reavivaram o capitalismo, propiciando a sua expansão de forma rápida para os locais mais distantes, em curtos espaços de tempo, com ênfase para o capital financeiro.

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Segundo Neutzling (1997 apud SOARES FILHO, 2003, p. 156), um aspecto essencial da grande transformação socioeconômica é o nascimento de uma economia transnacional dominante, que se caracteriza, em menor potencial, pela transação de bens e serviços, e, em maior escala, pelos elevados fluxos monetários perante os quais as economias nacionais se tornaram secundárias, mesmo aquelas dos países mais influentes. Isto porque “o poder econômico real cada vez mais se transfere das autoridades públicas e democráticas para os mercados financeiros anônimos e incontrolados”, diminuindo o âmbito da soberania estatal.

Conforme Stelzer (1999, p. 101), uma das principais características da globalização diz respeito ao alcance desse fenômeno, ou seja, a globalização não é um movimento isolado por fronteiras nacionais ou continentais, mas um processo com dimensões globais. Isso significa que as mudanças ocorridas por causa desse processo possuem amplo alcance, atingindo a todos em escala planetária.

De acordo com Matias (2005, p. 106) verificam-se dois aspectos inerentes ao conceito de globalização, quais sejam: a idéia de interdependência, em que acontecimentos locais passam a ter repercussões no ambiente internacional, e vice-versa; e a intensificação dessa interdependência nos últimos anos.

Stelzer (1999, p. 101) possui o mesmo entendimento de Matias, pois outra característica da globalização, na sua concepção, é a desterritorialização, isto é, todos os acontecimentos que possuíam anteriormente alcance local, regional ou nacional, passam a envolver todas as nações indistintamente.

Além disso, para Stelzer (1999, p. 101), somam-se também a força do capitalismo, que se expande em bases globais, a revolução da informática, que conectou pessoas, territórios e nações, formando uma imensa rede de comunicação constante, entre outros fatores, que, juntos, fortaleceram a interdependência dos povos. Para Soares (1999, p. 73), a globalização da economia e o progresso das tecnologias acentuam cada vez mais a interdependência das nações.

Matias (2005, p. 107) salienta que os mercados financeiros também estariam atravessando a mesma situação, dando origem à idéia de uma globalização financeira. Para Maia (2001, p. 70), a globalização financeira é conseqüência da intercomunicação dos mercados globais, que está promovendo a fusão das bolsas de valores.

Dessa forma, no entender de Soros (2003 apud MATIAS, 2005, p. 107), a globalização corresponde ao “desenvolvimento dos mercados financeiros globais, de

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crescimento das empresas transnacionais e do crescente domínio destas sobre as economias nacionais”.

Segundo Maia (2001, p. 70), existe também a globalização produtiva, que é a internacionalização da produção, bem como o acirramento da concorrência internacional.

Conforme Matias (2005, p. 108), é visível o sentido econômico da globalização, verificado pelo crescente intercâmbio entre os povos de bens, serviços, capitais e informação, e pela conseqüente unificação dos mercados nacionais em um único grande mercado global.

De acordo com Stelzer (1999, p. 134), a configuração do mundo como um sistema global é um acontecimento político, econômico e social de suma importância nos últimos vinte anos. O mundo se tornou um lugar único para todos os povos, no qual os principais problemas e alguns de seus interesses de maior importância passaram a ter um caráter global ou mundialmente interdependente.

Para Bedin (2003, p. 506), a globalização “constitui um momento de grande transformação do mundo atual, em que há a unificação do planeta e a ampliação do ‘sistema-mundo’ para todos os lugares e para todos os indivíduos, embora com intensidade e graus diversos”.

A globalização do mundo, segundo Stelzer (1999, p. 135), “é um fenômeno que constitui a nossa realidade e a nossa percepção, desafiando um grande número de pessoas em todo o mundo com seus problemas e possibilidades”, e tudo isso está presente no modo como se define o novo mapa mundial.

3.2 A EVOLUÇÃO E O PAPEL DA GLOBALIZAÇÃO NO PROCESSO DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL E INTEGRAÇÃO REGIONAL

Segundo Maia (2001, p. 70), a globalização fez aumentar a interdependência das nações. A interdependência é um fenômeno de longa data, e, em conseqüência do progresso dos meios de transportes e de comunicações verificado nas últimas décadas, tornou-se algo bastante significativo. O mundo recebeu a denominação de Aldeia Global, justamente pelo fato de as nações

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estarem cada vez mais interdependentes. Os países não dispõem de todos os recursos necessários para sua sobrevivência.

Conforme Matias (2005, p. 202), ser dependente equivale à idéia de estar subordinado ou de ser atingido de forma significativa por influências externas. Ser interdependente significa ser dependente de forma mútua, e isso faz com que acontecimentos locais tenham influência de eventos ocorridos em lugares distantes. A interdependência no âmbito das relações internacionais corresponde, portanto, à situações caracterizadas pelos efeitos recíprocos entre os países ou entre atores em países diversos.

De acordo com Di Sena Júnior, (2003, p. 188), a interdependência, além de se referir à idéia de dependência mútua, evidencia a noção de teia de interesses que se interpenetram e que se completam. É um fenômeno assimétrico, uma vez que as nações não são dotadas do mesmo nível de desenvolvimento socioeconômico e não possuem o controle dos mesmos recursos naturais, financeiros, geográficos e militares.

Para Tiujo (2003, p. 232), o “globalismo”, como alguns autores preferem denominar o fenômeno da globalização, envolve as relações de interdependência. À essa interdependência, deve-se se somar dois aspectos essenciais. Primeiro, o globalismo, que acarreta uma rede de interconexão de forma que intercâmbios singulares não funcionem como padrão ou como meras relações entre países, não podem ser denominadas de “globalismo”; são relações de “interdependência”. Segundo, o globalismo deve envolver relações “globais” e não meramente regionais. Assim, o “globalismo” abarca a “interdependência”.

Segundo Keohane e Nye (1989 apud IANNI, 2000, p. 80), na política mundial, interdependência se refere à situações qualificadas pelos efeitos recíprocos entre os países ou entre atores de países diversos. Tais efeitos costumam ter como conseqüência transações internacionais, como fluxos de dinheiro, pessoas, mercadorias e mensagens por meio das fronteiras. As relações de interdependência sempre envolvem custos, uma vez que a interdependência limita a autonomia.

A interdependência se relaciona com a autonomia, pois, conforme Matias (2005, p. 202), equivale à idéia de que a capacidade de um Estado alcançar certos objetivos também depende de atividades ocorridas fora desse Estado. Isso significa que um Estado mais interdependente é um Estado menos autônomo.

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Di Sena Júnior (2003, p. 188) afirma que onde há efeitos de custo recíproco na relação entre duas ou mais nações, existe a interdependência, a qual não necessariamente proporcionará vantagem para todos os envolvidos, visto que não existe nada que garanta que as chamadas relações interdependentes sejam caracterizadas pelo beneficio mútuo.

De acordo com Ianni (2000, p. 79), a interdependência das nações concentra-se, sobretudo, nas relações exteriores, diplomáticas e internacionais. Abrange Estados igualmente soberanos, não obstante suas desigualdades, diversidades e hierarquias. Essa interdependência se refere às vantagens e responsabilidades dos países dominantes (ou superpotências) e dos países dependentes, subordinados ou alinhados.

Ianni (2000, p. 80) destaca que:

A tese da interdependência das nações é bem uma elaboração sistêmica de como se desenvolve a problemática mundial. Diz respeito a um cenário em que a maior parte dos problemas aparece nas razões, estratégias, táticas e atividades de atores principais e secundários...

Matias (2005, p. 205) salienta que a interdependência representa um aspecto inerente do sistema internacional, e, por isso, não se trata de um fenômeno recente. Com o crescimento das relações entre os Estados, surgiu a necessidade de se institucionalizar essas relações. O mundo passou da era da competição à era da cooperação ou da integração.

Segundo Matias (2005, p. 206), no período após a Segunda Grande Guerra, ocorreu uma intensificação das relações internacionais, destacando-se dois aspectos fundamentais. O primeiro se refere à consciência por parte dos Estados de que ninguém é auto-suficiente, de que isolar-se corresponde a um retrocesso e de que o crescimento está ligado à cooperação. O segundo aspecto está relacionado à coexistência de diversos Estados independentes. Dessa forma, com o objetivo de disciplinar a vida dos Estados, surgiu a necessidade de se criar diversos tratados internacionais. A interdependência passou por um processo de cristalização e se tornou um fenômeno fundamental para o direito internacional contemporâneo.

Com a crescente necessidade de cooperação entre os povos nesse mundo globalizado e a expansão do direito internacional, de acordo com Matias (2005, p. 230), evidenciou-se a necessidade de uma globalização jurídica, isto é, de uma institucionalização cada vez maior da interdependência das nações. A

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