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A utópica ideia de ressocialização do apenado e a função do cárcere no Brasil

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

JOSIANE COSTA BEBER BONAMIGO

A UTÓPICA IDEIA DE RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO E A FUNÇÃO DO CÁRCERE NO BRASIL

Ijuí (RS) 2017

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JOSIANE COSTA BEBER BONAMIGO

A UTÓPICA IDEIA DE RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO E A FUNÇÃO DO CÁRCERE NO BRASIL

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso – TC.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Patricia Marques Oliveski

Ijuí (RS) 2017

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Quero agradecer, primeiramente, a Deus, que iluminou o meu caminho durante essa jornada. Dedico esta conquista à minha família, pelo incentivo e apoio. E, finalmente, à excelente mestre Patricia Oliveski, pela paciência na orientação e confiança na minha competência.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus por nunca me deixar sozinha e desamparada, por Ele guiar e iluminar o meu caminho e me permitir viver este momento, me encorajando a crescer e concretizar todos meus sonhos e objetivos de vida. À minha família, por todo o trabalho, horas extras e orações que fizeram para me proporcionar a oportunidade de cursar a faculdade, por toda dedicação a minha educação e carinho e puxões de orelha para que eu me tornasse a pessoa que eu sou hoje. Essa conquista é em grande parte de vocês, muito obrigada pela torcida.

À ilustre Mestre Patricia Oliveski por ter me aceitado como orientanda e por ter me depositado tamanha confiança e fé, principalmente nos

momentos de insegurança. Pela paciência

infindável, pela compreensão e dedicação, pelo

incentivo contínuo, pelo encorajamento e

entusiasmo todas as vezes que recebia uma parte desta monografia para correção, eu serei para sempre grata. Não conseguiria sem a tua orientação e carinho.

Finalmente, ao meu companheiro Felipe, por toda paciência durante esse semestre interminável, por todo carinho e por sempre acreditar em mim mais do que eu mesma.

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“Na realidade, todos falamos da falência da pena de

prisão, de seus efeitos criminógeno, da

impossibilidade de se recuperar alguém, mas se atribui, sem maiores questionamentos, a culpa pela

reincidência ao condenado exclusivamente,

inclusive punindo-o novamente pelo crime anterior, ao aumentar-lhe a nova punição. Ignora-se que, na verdade, o condenado encarcerado é o menos culpado pela recaída na pratica criminosa. Continuamos à espera de políticas dessa natureza em nosso caótico sistema penitenciário, na tentativa não de solucioná-lo definitivamente, mas, pelo menos, minimizando grande parte de sua dramática realidade.”

(Cezar Roberto Bitencourt em Nota para 4ª Edição do livro “Penas Alternativas)

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RESUMO

Na atual conjuntura do ordenamento jurídico nacional, o sistema carcerário padece de incontáveis problemas, que influenciam de maneira incisiva na reinserção do preso a sociedade. O propósito desta pesquisa é a busca por métodos mais eficientes para a diminuição da criminalidade no país, indagando sobre o confronto entre adoção de medidas ainda mais punitivas do que as utilizadas atualmente ou medidas alternativas que tenham como foco a reintegração do preso na sociedade. Visa-se encontrar medidas que venham aplacar o sentimento de impunidade da população e ao mesmo tempo propiciar a diminuição nos índices de reincidência e superlotação dos presídios. Neste sentido, sob o ponto de vista da criminologia crítica questiona-se acerca da função do cárcere e se a pena de prisão tem efetivamente cumprido seu papel ressocializador ou se são necessários novos mecanismos de cumprimento da sanção e métodos menos rigorosos da execução da pena.

Palavras-chave: Ressocialização. Falência da Pena de Prisão. Execução da Pena. Medidas Alternativas. Função do Cárcere.

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ABSTRACT

At the present juncture of the national legal system, the prison system suffers from countless problems, which strongly influence the reintegration of prisoners into society. The purpose of this research is the search for more efficient methods to reduce crime in the country, investigating the confrontation between adopting even more punitive measures than those currently used or socio-educational measures that focus on reintegrating the prisoner into society. It is intended to find measures that will alleviate the feeling of impunity of the population and at the same time to reduce the rates of recidivism and overcrowding of prisons. In this sense, from the point of view of critical criminology, the real function of the prison is questioned and whether the prison sentence has effectively fulfilled its resocializing role or if new mechanisms of sanction compliance are necessary, with less rigorous methods of execution of the sentence.

Keywords: Resocialization. Collapse of the prison sentence. Execution of the sentence. Alternative measures. Prison function.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 A LEGITIMIDADE DA PENA DE PRISÃO COMO EXPRESSÃO DO DIREITO DE PUNIR DO ESTADO ... 10

1.1 Aspectos históricos da pena de prisão como sanção penal ... 12

1.2 A legitimidade das penas de prisão e suas teorias ... 18

1.2.1 Teoria retributiva ... 18

1.2.2 Teoria preventiva ... 21

1.2.3 Teoria mista ... 23

2 A FUNÇÃO DO CÁRCERE E A IDEIA DE RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO . 27 2.1 A crise do sistema penitenciário brasileiro na contemporaneidade... 28

2.2 A função do cárcere e a ideia de ressocialização do apenado ... 31

2.3 A execução penal no Brasil e os direitos do preso: uma busca pela reintegração do apenado ... 36

CONCLUSÃO ... 42

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como principal finalidade expor e analisar a situação atual do sistema carcerário brasileiro, buscando entender o grande “porquê” de se estar encarcerando cada vez mais sem que com isso se diminua os altos índices de criminalidade do Brasil.

O objetivo principal desta pesquisa é a busca por métodos mais eficientes para a diminuição da criminalidade no país. A questão central paira sobre o confronto entre adoção de medidas ainda mais punitivas do que as utilizadas atualmente ou medidas alternativas que tenham como foco a reintegração do preso na sociedade, uma vez que estas podem propiciar condições dignas para a pessoa humana.

No primeiro capítulo serão estudados os aspectos históricos da pena de prisão e os discursos legitimadores das teorias da pena, reconhecer qual o seu papel perante a sociedade, como ela foi implementada e quais eram seus meios e finalidades em cada época.

Visa-se demonstrar, no segundo capítulo, que a atual crise da pena de prisão impede que se sustente qualquer ideia de ressocialização e reinserção do apenado à sociedade, uma vez que as condições carcerárias do nosso sistema penitenciário são precárias, devido ao alto nível de reincidência e a superlotação das mesmas. O apenado sofre um tratamento muitas vezes desumano, sem um mínimo de higiene básica, tornando inviável sequer a ideia de ressocialização.

O sistema prisional brasileiro não é eficiente como deveria ser, ele é seletivo e cruel, pois não têm como meta a ressocialização do condenado, nem oferece oportunidades de reintegração na sociedade. Para que isso não aconteça, há necessidade urgente de mudanças.

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A sociedade por sua vez, não compreende a importância da ressocialização desse encarcerado para que o mesmo seja reinserido no convívio social. Em razão dos altos índices de violência que dominam o país inteiro, os cidadãos sentem-se inseguros e consequentemente acreditam que o melhor caminho a seguir será o que se referir à punição mais severa possível. Ignora-se o fato de que esse indivíduo algum dia retornara a sociedade e, se depender da situação atual de que se encontram as prisões, saíra pior do que quando entrou.

O fato de que, segundo o “Mapa do Encarceramento – Os Jovens do Brasil”, o Brasil país está em 4° lugar no ranking mundial de população prisional, ocupando o 1° lugar entre os países da América do Sul, juntamente com os índices de reincidência muito acima do ideal, só comprovam a falência do sistema de execução penal nacional (http://juventude.gov. br/articles/participatorio/0010/1092/Mapa_do_Encarceramento_-_Os_jo vens_do_brasil.pdf).

Por fim, o presente trabalho propõe-se a analisar, a partir da Constituição Federal, a possibilidade de aplicação de novos métodos ou medidas de cumprimento de pena e se serão capazes de aumentar se a pespectiva de reintegração do preso e então, com isso, a consequente diminuição da criminalidade na sociedade. Concluindo que as penas alternativas às restritivas de liberdade podem influir de forma positiva na sociedade atual, na qual o sistema carcerário encontra-se falido, sem condições de cumprir a sua real finalidade.

Quanto aos objetivos gerais, a pesquisa será do tipo exploratória. Utiliza no seu delineamento a coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede de computadores. Na sua realização foram utilizados métodos de abordagem hipotético-dedutivo, observando a seleção bibliográfica e documentos, refletindo sobre o material selecionado e expondo os resultados obtidos através deste texto monográfico.

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1 A LEGITIMIDADE DA PENA DE PRISÃO COMO EXPRESSÃO DO DIREITO DE PUNIR DO ESTADO

As penas restritivas da liberdade são as sanções mais dolorosas a que a pessoa humana pode ser submetida. Apesar de serem consideradas um mal necessário, atualmente se vê imprescindível a busca por penas alternativas que tenham como foco principal a reeducação e reinserção do preso, invés da punição e sofrimento.

Acabando de cumprir a sua pena e regressando para a sociedade, o sujeito se vê sem perspectiva de vida, uma vez que as oportunidades de reinserção são mínimas. Diante deste descaso da sociedade, muitos indivíduos perdem as esperanças e se revoltam, regressando ao mundo do crime, por falta de oportunidade, gerando um ciclo vicioso de marginalização.

Baratta (2011), em sua obra “Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal”, reconhece que a prisão jamais reabilitou pessoas na prática, exceto por vontade própria ou por princípios individuais do sujeito. Ao contrário do que se imaginava, a “prisionalização” dos internos, encorajou-os a absorver e adotar hábitos típicos do ambiente penitenciário, que, por si só, caracteriza o aumento da criminalidade.

De acordo com dados de 2014, divulgados no dia 26 de abril de 2016 pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça, o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) aponta que a população carcerária do Brasil chegou ao número de 622.202 presos, 54% dos detentos brasileiros são jovens, 61,6% são negros e apenas 8% concluiu o Ensino Médio. Boa parte das pessoas privadas de liberdade têm ou tiveram familiares próximos presos. Assim, penitenciárias continuam sendo o retrato de um país marcado pela desigualdade (RELATÓRIO DEPEN, 2017).

Com esses números, o Brasil é o quarto país com maior número absoluto de detentos no mundo, atrás somente dos Estados Unidos, China e Rússia. Porém, enquanto esses outros países têm-se conseguido reduzir suas taxas de encarceramento nos últimos anos, o Brasil segue aumentando sua população prisional em média 7% ao ano.

Ainda de acordo com a Infopen, entre os anos de 1990 e 2014, o número de detentos no Brasil passou de 90 mil para mais de 600 mil. A sociedade brasileira tem a cadeia como

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sinônimo de segurança pública e com base nestes dados, era de se esperar que todos se sentissem mais seguros hoje do que há 25 anos, mas não é isso que a realidade nos indica, pois apesar do número de população carcerária aumentar, o número de criminalidade não diminuiu (LEVANTAMENTO NACIONAL DE INFORMAÇÕES PENITENCIÁRIAS – INFOPEN, 2017).

O “Mapa do Encarceramento – Os Jovens do Brasil” (2017), lançado pela Secretaria-Geral da Presidência da República juntamente com a Secretaria Nacional de Juventude, foi criado com a finalidade de estipular um diagnóstico sobre o perfil da população carcerária brasileira, para que assim o governo possa idealizar e colocar em prática ações que reduzam a vulnerabilidade da população jovem ao sistema prisional, já que, de acordo com dados fornecidos pelo Mapa, os mesmos representam 54,8% da população carcerária brasileira.

O Mapa do Encarceramento relata a ocorrência do crescimento de 74% na população prisional brasileira durante o período de 2005 a 2012. Em 2005 o número absoluto de presos no país era de 296.919, em 2012 esse número cresceu consideravelmente para 515.482 presos. Outro dado interessante apresentado é referente ao tempo de prisão, foi constatado que dentre os encarcerados, 29,2% estavam cumprindo de quatro a oito anos de prisão, sendo que outros 18,7% cumpriam, em 2012, pena de até quatro anos de prisão. Assim sendo, quase metade dos presos brasileiros recebeu pena de até oito anos. Em um sistema falido e superlotado, 18,7% dos presos não precisariam estar cumprindo pena restritiva de liberdade, pois de acordo com o Código de Processo Penal eles se encaixariam no perfil estipulado para cumprir penas alternativas (MAPA DO ENCARCERAMENTO – OS JOVENS DO BRASIL, 2017).

Não se trata de não penalizar os autores de crimes menos violentos, mas sim de aplicar uma pena cujos resultados sejam melhores para a sociedade, visando diminuir os índices de violência e criminalidade no país, estabelecendo segurança para população, e também para o próprio apenado, que terá mais chances de se reinserir. Atualmente, os que cometem crimes contra o patrimônio e que poderiam ser punidos com penas alternativas são mantidos presos, enquanto os crimes graves, como os homicídios e outros crimes contra a pessoa, na maioria das vezes não são solucionados, deixando inúmeros processos em aberto.

Até que ponto vale à pena se discutir a respeito de aplicação de penas mais severas se os dados oficiais da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública comprovam que

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consegue se solucionar em média apenas 6% dos homicídios dolosos do país, deixando milhares de assassinos impunes? É uma discussão que não faz o menor sentido em um país com índices tão baixos de esclarecimento de crimes graves. Mesmo assim, cada vez que há um crime de maior repercussão midiática, em que o povo se revolta e cobra medidas extremas, o Poder Público responde com propostas de aumento das penas, de endurecimento das leis (CERQUEIRA et al, 2017).

O sistema prisional brasileiro não é eficiente como deveria, pois, ele é seletivo e cruel, pois não têm como meta a ressocialização do condenado, nem oferece oportunidades de reintegração na sociedade. Os dados do Mapa do Encarceramento aqui expostos, comprovam que está se encarcerando mais e por mais tempo, sem com isso reduzir-se as taxas de criminalidade.

A principal consequência do aumento e da severidade das penas não têm sido a segurança do povo, mas sim o sofrimento do encarcerado, pois visa apenas que ele pague caro pelo crime que cometeu e acredita-se, equivocadamente, que por meio deste martírio, teoricamente, o condenado não cometerá os mesmos erros que o colocaram naquela situação.

Para se compreender melhor esta problemática, imprescindível a compreensão da forma como se estabeleceu a pena de prisão no mundo e no Brasil, tal como será apresentado a seguir.

1.1 Aspectos históricos da pena de prisão como sanção penal

A história do Direito Penal em si é caracterizada por uma evolução constante, na qual cada época possui sua marca e suas particularidades, de modo inicial a aplicação das penas era utilizada como forma de vingança e atualmente a pena é vista com tripla finalidade: Retributiva, Preventiva e Ressocializadora. Ainda que a construção doutrinária de um tempo pareça estar completa, algo novo surge. Nos dias atuais denota-se a necessidade de uma nova reforma no sistema carcerário, pois a pena não cumpre com o seu papel ressocializador, servindo apenas como forma de castigar o indivíduo.

De acordo com o dicionário Aurélio, pena significa “Punição ou castigo imposto por lei a algum crime, delito ou contravenção”. Nucci (2011, p. 391) descreve a pena como:

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[...] A sanção imposta pelo Estado, através da ação penal ao criminoso, cuja finalidade é a retribuição ao delito perpetrado e prevenção a novos crimes. O caráter preventivo da pena desdobra-se em dois aspectos, geral e especial, que se subdividem em outros dois. Temos quatro enfoques: a) geral negativo, significando o poder intimidativo que ela representa a toda a sociedade, destinatária da norma penal; b) geral positivo, demonstrando e reafirmando a existência e eficiência do Direito Penal; c) especial negativo, significando a intimidação ao autor do delito para que não torne a agir do mesmo modo, recolhendo-o ao cárcere, quando necessário e evitando a prática de outras infrações penais; d) especial positivo, que consiste na proposta de ressocialização do condenado, para que volte ao convívio social, quando finalizada a pena ou quando, por benefícios, a liberdade seja antecipada.

Beccaria (2015, p. 22) justifica a origem das penas, pois

os primeiros homens, até então selvagens, se viram forçados a reunir-se. Formadas algumas sociedades, logo se estabeleceram novas, [...] e assim viveram essas hordas, como tinham feito os indivíduos, num contínuo estado de guerra entre si. As leis foram as condições que reuniram os homens, a princípio independente e isolados, sobre a superfície da terra.

Segundo Telles (1998), antes da constituição do Estado moderno, tido como detentor do poder de punir, a sociedade já se organizava em grupos, desde então se consta a existência de meios de punição, pois havia a necessidade de disciplinar os indivíduos que desrespeitavam as normas da vida coletiva.

Nos tempos primitivos a única penalização das atitudes vistas como ilícitas era a vingança, prevalecia-se a força física do indivíduo ou da tribo que ele pertencia. Nas palavras de Chiaverini (2009, p. 2): “o homem primitivo não pergunta: como isso ocorreu? Pergunta apenas: quem fez?”. Sendo a vingança privada o meio para reparar o dano causado.

Ainda de acordo com Chiaverini (2009), a característica mais marcante da época, que pode ser observada na atualidade, reflete-se na reação da sociedade que retribuía o mal causado, sendo que a sanção era utilizada com a finalidade de vingar-se do mal feitor.

A influência religiosa tomou força na Idade Antiga, neste rumo leciona Caldeira (2009, p. 260) que:

[...] a pena possuía uma dupla finalidade: (a) eliminar aquele que se tornara um inimigo da comunidade e dos seus deuses e forças mágicas, (b) evitar o contágio pela mácula de que se contaminara o agente e as reações vingadoras dos seres sobrenaturais. Neste sentido, a pena já começa a ganhar os contornos de retribuição, uma vez que, após a expulsão do indivíduo do corpo social, ele perdia a proteção do grupo ao qual pertencia, podendo ser agredido por qualquer pessoa. Aplicava-se a

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sanção como fruto da liberação do grupo social da ira dos deuses em face da infração cometida, quando a reprimenda consistia, como regra, na expulsão do agente da comunidade, expondo-o à própria sorte. Acreditava-se nas forças sobrenaturais – que, por vezes, não passavam de fenômenos da natureza – razão pela qual, quando a punição era concretizada, imaginava o povo primitivo que poderia acalmar os deuses. Por outro lado, caso não houvesse sanção, acreditava-se que a ira dos deuses atingiria a todo o grupo.

Desta forma, entende-se que as penas eram aplicadas de acordo com emoções e sentimentos. Também eram levados em consideração os fenômenos naturais como raios e trovões, tidos naquela época como sinais de Deus.

De acordo com Telles (1998), com o avanço da vingança privada e divina, surge a Lei do Talião, pela qual se define a proporção entre a ofensa e a reparação, ou seja, um castigo que consiste em fazer sofrer ao delinquente o que ele fez sofrer à vítima, sendo assim “olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé”. É a lei, registrada de forma escrita, mais antiga da história da humanidade.

Nas palavras de Chiaverini (2009), com a evolução social e diante da necessidade de evitar a dizimação das tribos com as vinganças coletivas, surgiu o talião, que limitava a reação à ofensa a um mal idêntico ao praticado (sangue por sangue, olho por olho, dente por dente).

O Código de Hamurabi (Babilônia), o Êxodo (Hebreus) e a Lei das XII Tábuas adotavam o Talião como forma de punição e castigo pelo mal praticado. Essas antigas codificações apresentavam uma série de punições, como variadas formas de pena de morte e mutilação.

De acordo com o entendimento de Mirabete (2014), Lopes Jr. (2013) e Bitencourt (2011a), na época pré-moderna (Idade Média), não existia a pena privativa de liberdade como sansão penal, existia, no entanto, salas de suplícios para a pena de morte, chamadas de Prisão de Custódia. A prisão existia apenas como instalação na qual eram detidas pessoas acusadas de crimes que ficavam à espera de sentença, sob custódia, também eram mantidas lá doentes mentais e pessoas privadas do convívio social por condutas consideradas desviantes na época (prostitutas, mendigos, etc.), ou até mesmo por questões políticas. Na prisão canônica se encontram os princípios de uma “pena medicinal”, que buscava levar o “pecador” ao arrependimento, tendo a finalidade de melhorar e não destruir o condenado.

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Ainda de acordo com os referidos autores, até então, entre os séculos XVI e XVII, o corpo humano era o grande foco das sanções penais. A pena de morte era comum, outros métodos de torturas físicas também eram generalizados, a dor e a exposição pública eram as grandes aliadas dos “carrascos”. No período Medieval, a Lei Penal tinha como principal objetivo provocar o medo coletivo, nesta época a pena continuava com a finalidade de custódia, aplicável aqueles que seriam submetidos aos mais terríveis tormentos exigidos por um povo ávido de distrações bárbaras e sangrentas. Os penalizados eram publicamente torturados como modelo punitivo para toda sociedade (LOPES JR., 2013).

Durante séculos a prisão era utilizada com a finalidade de contenção e custódia do preso, que esperava em condições subumanas a sua execução ou era usada como meio de reter os devedores até que pagassem suas dívidas, assim o devedor ficava à disposição do credor como seu escravo a fim de garantir o seu crédito, eram chamadas de Detenção Temporal, sendo essas perpétuas ou até receber o perdão real. Desta forma, nasceram as primeiras considerações e questionamentos a respeito da organização dessas casas de detenção e também sobre as condições de vida de um encarcerado (BITENCOURT, 2011a).

Leciona Bitencourt (2011a) que durante a idade moderna, a pobreza se estendeu por toda Europa, sendo as guerras religiosas um dos principais motivo, pois acabaram com parte da riqueza da França. As vítimas dessa insuficiência sobreviviam de esmolas, roubo e assassinatos. O problema se espalhou por toda Europa, e isso apenas evidenciava que, devido a tanta delinquência, a pena de morte não era uma solução adequada, já que era impossível ser aplicada a tanta gente.

Ainda segundo Bitencourt (2011a), em toda parte, a população ia para as ruas protestar contra os suplícios, na segunda metade do século XVI, tornando-se intolerável pelo povo. Essa crise da pena de morte acabou dando origem a pena privativa de liberdade, que demonstrava ser o meio mais eficiente de controle social. A pena passou ser a prisão de reclusão, trabalho forçado, a servidão, interdição de domicílio e a deportação, com a finalidade de reformar os delinquentes.

Somente no final do século XVII a pena privativa de liberdade foi oficializada como principal sansão penal, desta maneira a prisão passou a ser o local da execução das penas. Em Amsterdam em 1596, foi criada uma casa de correção para homens, chamada de Rasphuis,

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destinada a tratar de pequenas delinquências. Para os crimes mais graves ainda eram aplicadas outras penas, como açoite. Criaram-se também a chamada Spinhis, inicialmente para mulheres e a partir 1600 possuindo uma seção especial para jovens (BITENCOURT, 2011a).

No ano de 1697 surgem casas de trabalho na Inglaterra, com notável êxito alcançado em pouco tempo, a implementação das casas de trabalho se estenderam por vários lugares. No fim do século XVIII já havia vinte e seis prisões. No século XIX a pena de prisão se torna o principal meio de punição, substituindo progressivamente as demais. Contudo, não se pode afirmar que a prisão surgiu com o impulso de um ato humanitário, com o objetivo exclusivo de obter a reforma do delinquente. Uma das principais causas foi a razão econômica, com a crise da época, o confinamento adquiriu outro sentido. Usando a mão-de-obra dos reclusos para a prosperidade geral, uma vez que a pena consistia em trabalho pesado, visando alcançar a maior produtividade possível (BITENCOURT, 2011a).

Fazendo-se necessária uma reforma desse sistema punitivo, juristas e filósofos moralistas, criticaram abertamente a legislação penal vigente na época, defendendo e protegendo o princípio da liberdade e o da dignidade da pessoa humana. Foram grandes reformadores como Cesare Beccaria, John Howard e Jeremy Bentham que contribuíram para a transformação do sistema punitivo.

Bitencourt (2011a) leciona que Beccaria construiu um sistema criminal que substituiria o desumano, obscuro, confuso e, principalmente, abusivo sistema. Seus princípios marcam o início da Escola Clássica de Criminologia, e o da Escola Clássica de Direito Penal, tendo como recomendação mais significativa a que afirma que “é melhor prevenir o crime do que castigá-lo”.

O referido autor ainda ensina sobre a obra “Dos Delitos e das Penas” de Beccaria, explicando que a mesma fala sobre um acordo entre os homens, que se reuniram e livremente criaram uma sociedade civil, assim com as leis impostas poderia assegurar a proteção da sociedade, onde o indivíduo que violou o pacto, justificadamente sofreria uma pena, como em um contrato social. Essa teoria do contrato pressupõe a igualdade absoluta entre todos os homens (BITECNOURT, 2011a).

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Beccaria (2015, p. 51) afirma que:

O fim, pois, não é outro que impedir o réu de causar novos danos a seus cidadãos e afastar os demais do cometimento de outros iguais. Consequentemente, devem ser escolhidos aquelas penas e aquele método de impô-las, que, respeitada a proporção causem uma impressão mais eficaz e mais durável sobre o ânimo dos homens e que seja a menos dolorosa para o corpo do réu.

Beccaria (2015) defendia que a prevenção não precisava ser obtida através do terror, mas sim da certeza de ser punido e se semelhando com os objetivos da criminologia moderna, que buscam a recuperação e ressocialização do recluso para a sociedade.

Telles (1998) aduz sobre a história das penas no Brasil, dizendo que com a primeira Constituição, outorgada em 25 de Março de 1824, deu-se início a uma nova ordem jurídica, incorporando princípios importantes: a lei penal não terá efeitos retroativos; todos são iguais perante a lei; nenhuma pena passará da pessoa do delinquente; e também determinou a abolição das torturas, açoites, penas cruéis em geral, ainda que remanescendo a pena de morte. Com essa nova ordem jurídica, a prisão deixou de ser apenas um instrumento de castigo e de custódia para as futuras execuções e passou a ser a mais usual forma de punição e de reforma moral dos presos.

Em 1830, surge o Código Criminal do Império, com bases de justiça e equidade, o qual integrava os princípios da responsabilidade moral e do livre arbítrio, segundo o qual não há criminoso sem conhecimento do mal e sem a intenção de praticá-lo. Esse Código teve como uma das principais características a eliminação das penas cruéis e infamantes, a diminuição das hipóteses de incidência das penas capitais, e por fim, a pena de prisão que passou a ser a sanção penal principal, em substituição à sanção corporal.

De acordo com Telles (1998) e Mirabete (2014), em 1890, em razão da abolição da escravidão e com a proclamação da República, foi criado o Código Penal, sendo alvo de várias críticas pelas falhas que apresentava. Neste foi abolida a pena de morte e instalado o regime prisional de caráter correcional. Ele sofreu inúmeras modificações, até que na Segunda República (1930 a 1937), foi promulgada nova constituição. Essa constituição trazia novos preceitos, tais como: “a lei penal só retroagirá para beneficiar o réu”; “não será concedida ao Estado estrangeiro a extradição por crime político ou de opinião, nem em caso de algum brasileiro”.

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Ainda, de acordo com os referidos autores, em face das diferenças de princípios do Código Penal de 1890 e a Constituição de 1934, foi proposta a edição de um novo Código, que surgiu em 1940, o qual apesar do autoritarismo da Constituição então em vigor, incorpora as bases de um direito punitivo democrático liberal. O novo Código define a privação da liberdade como pena principal, a reclusão e a detenção, para os crimes, e prisão simples para as contravenções penais, e as medidas de segurança para os incapazes e perigosos. A Constituição Federal de 1998 estipulou em seu artigo 5º, XLVI, as penas que seriam adotadas pelo Brasil, consagrando em suas alíneas “a” a pena privativa de liberdade.

O Brasil adotou a teoria mista ou eclesiástica, a qual reconhece que a finalidade da pena deve ser, ao mesmo tempo, um castigo pela prática do crime e uma forma de reeducar o preso, tal como se verá a seguir.

1.2 A legitimidade das penas de prisão e suas teorias

No decorrer dos tempos várias foram as teorias formadas a respeito da finalidade das penas privativas de liberdade, dentre as quais três se destacam: a teoria retributiva, relativa e a mista, que agora serão objetos de análise.

Inicialmente convém apenas observar que os defensores da Teoria Retributiva ou Absolutista pregavam que a finalidade da pena privativa de liberdade era o castigo pelo mal provocado, o condenado estaria apenas pagando pelo seu crime; para essa teoria a pena tinha caráter retributiva. Já a Teoria Relativa pregava que a pena deveria ser utilizada como meio de reeducar o preso para que assim ele pudesse ser reintegrado ao convívio social. E a Teoria Mista ou Eclesiástica defendia a ideia de que a pena privativa de liberdade deveria ao mesmo tempo ser uma retribuição pelo mal praticado, mas sem excluir a necessidade de reeducação do preso, de sua eficaz reintegração à sociedade.

1.2.1 Teoria retributiva

Para a teoria retributiva então, a existência da pena se justifica pela sua necessidade, uma vez que a mesma é indispensável para tornar viável a vida em sociedade. Vive-se em um mundo regido por leis e normas, e estas, para serem respeitadas e seguidas, necessitam de uma forma repressiva de punição, um castigo, com a finalidade de manter a ordem e

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possibilitar a convivência entre os homens, com isso a pena é considerada um “mal necessário”. Dessa maneira, Bitencourt (2011a, p. 505) menciona que:

A prisão é uma exigência amarga, mas imprescindível. A história da prisão não é a de sua progressiva abolição, mas a de sua reforma. A prisão é concebida modernamente como um mal necessário, sem esquecer que as mesmas guardas em sua essência contradições insolúveis.

Segundo Bitencourt (2011a), os principais aspectos do Estado Absolutista eram: a unificação entre a moral e o Direito e entre o Estado e a religião, a identidade entre o soberano e o Estado, além da certeza do povo de que o poder do soberano lhe era concedido diretamente por Deus. A teoria do Direito divino pertence a um período em que a religião, a teologia e a política confundiam-se entre si, uma época em que para tudo precisava buscar um fundamento religioso. Todo o poder legal e de justiça concentrava-se na pessoa do rei.

A pena era entendida como sendo instrumento de retribuição e tem fundamento exclusivamente moral e ético, era um castigo com o qual se redimia do mal cometido, o importante era retribuir o mal com o mal praticado, punindo com justiça o infrator. De certa forma, no regime do Estado absolutista, impunha-se uma pena a quem, agindo contra o soberano, rebelava-se também contra o próprio Deus. Ou seja, a teoria absolutista baseia-se numa exigência de justiça, em que ao mal do crime, deve-se aplicar o mal da pena, imperante entre eles a igualdade (BITENCOURT, 2011a).

Bitencourt (2011a, p. 74) ensina que a teoria absoluta da pena, além de buscar a justiça, tem por finalidade devolver o mal causado pelo delito, e que o homem é livre para agir, e se optou pelo crime, deve auferir uma penalidade maldosa como foi sua conduta:

Segundo este esquema retribucionista, é atribuída à pena, exclusivamente, a difícil incumbência de realizar a justiça. A pena tem como fim fazer justiça, nada mais. A culpa do autor deve ser compensada com a imposição de um mal, que é a pena, é o fundamento da sanção estatal está no questionável livre-arbítrio, entendido como a capacidade de decisão do homem para distinguir entre o justo e o injusto. Isto se entende quando lembramos da substituição do divino homem operada neste momento histórico, dando margem à implantação do positivismo legal.

Para Mirabete (2014), de acordo com as teorias retributivas, o fim da pena é o castigo, sendo ele o pagamento pelo mal causado. Nesta visão, o castigo compensa o mal e dá reparação a moral, a punição tem fundamentação exclusiva na moral e na ética. A pena é tida

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como justa, e a sua aplicação é dada sem qualquer preocupação quanto a sua utilidade, ou seja, não se vislumbra qualquer conotação ideológica. Não havia qualquer preocupação com a pessoa que delinquiu, pois, a sanção tinha como função restabelecer a ordem pública quebrada pelo delito.

Ainda, Mirabete (2005, p. 244) afirma que a teoria relativa da pena atribuía um fim à mesma, e que a pena não era uma consequência do delito, mas sim o momento oportuno para sua aplicação, para o autor: “nas teorias relativas (utilitárias ou utilitaristas), dava-se à pena um fim exclusivamente prático, em especial o de prevenção. O crime não seria causa da pena, mas a ocasião para ser aplicada”.

Bitencourt (2011a) destaca Kant e Hegel como primeiros pensadores da teoria retribucionista. Ele afirma que segundo Kant, a lei penal é um imperativo que deve ser respeitado, desta forma, a pena jamais poderia ter a finalidade de melhorar ou corrigir o homem, sob risco de tornar-se imoral. O réu deve ser castigado pela única razão de haver delinquido, sem nenhuma consideração sobre a utilidade da pena para ele ou para os demais integrantes da sociedade. Para ele, se a sociedade se dissolvesse, ainda assim, o último assassino deveria ser penalizado, a fim de pagar pelo mal cometido, sendo o castigo um “fim em si mesmo.”

Por outro lado, Bitencourt (2011a) aduz que Hegel estrutura o seu raciocínio primeiramente pela vontade racional do homem, entendendo que a pena, razão do direito, anula o crime, razão do delito. Conferindo à sanção, uma reparação de natureza jurídica. A pena vem retribuir ao delinquente pelo fato praticado, proporcionalmente, de acordo com a intensidade da negação do direito também será a intensidade da pena.

Mirabete (2005, p. 244) afirma que esta teoria tem por fundamento a justiça, e utilizando dos ensinamentos de Kant, o jurista ainda afirma que o castigo compensa o mal:

As teorias absolutas (de retribuição ou retribucionista) têm como fundamentos da sanção penal a exigência da justiça: pune-se o agente porque cometeu o crime. Dizia Kant que a pena é um imperativo categórico, consequência natural do delito, uma retribuição jurídica, pois ao mal do crime impõe-se o mal da pena, do que resulta a igualdade e só está igualdade traz a justiça. O castigo compensa o mal e dá reparação à moral.

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O delito representaria a vontade irracional e particular do agente, uma vez que o Direito é composto da vontade racional e geral da sociedade, sendo aquela uma contradição a esta, exigindo-se desta forma uma punição compensatória, um castigo que restabelecesse a ordem jurídica afetada ou desrespeitada.

1.2.2 Teoria preventiva

Além desta característica punitiva, a pena possui também um caráter preventivo e reeducativo, tendo em vista que busca reprimir a prática de novos crimes e reforça a ideia de um Direito Penal eficaz, pois se sabe que a prática de determinado ato ilícito expresso em lei caracteriza o cometimento de um crime, acarretando eventualmente uma sanção penal.

As teorias relativas se voltam para o futuro, buscando alcançar o delinquente para que este não volte a delinquir, também como incentivo para que outros não o façam pelo seu mau exemplo, tendo como base a proteção da sociedade. Assim, pode-se dizer, segundo Nucci (2011, p. 401), que a pena é:

Sanção do Estado, valendo-se do devido processo legal, cuja finalidade é a repressão ao crime perpetrado e a prevenção a novos delitos, objetivando reeducar o delinquente, retirá-lo do convívio social enquanto for necessário, bem como reafirmar os valores protegidos pelo direito penal e intimidar a sociedade para que o crime seja evitado.

Mirabete (2005) afirma que a teoria relativa da pena atribuía um fim à mesma, e que a pena não era uma consequência do delito, mas sim o momento oportuno para sua aplicação. Para o autor: “nas teorias relativas (utilitárias ou utilitaristas), dava-se à pena um fim exclusivamente prático, em especial o de prevenção. O crime não seria causa da pena, mas a ocasião para ser aplicada” (2005, p. 244).

Ao contrário das teorias absolutas que fundamentam a punição como uma questão de ética baseada na retribuição do mal pelo mal, de acordo com Mirabete (2014, p. 6), as teorias preventivas têm finalidade prática, em que a prevenção especial busca a recuperação do delinquente para que este não volte a delinquir, e a prevenção geral têm este mesmo delinquente como exemplo para que outros não sigam o mesmo caminho.

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Na Prevenção Geral a pena tem o caráter ameaçador, pois, segundo Bitencourt (2011a, p. 76) “com a ameaça de pena, avisando os membros da sociedade quais as ações injustas contra as quais se reagirá; e, por outro lado, com a aplicação da pena cominada, deixa-se patente a disposição de cumprir a ameaça realizada”.

A pena é tratada como uma coação psicológica, pois é forma de ameaça aos cidadãos que se recusam a observar e obedecer às ordens jurídicas da sociedade, motivando os indivíduos à não prática de novos delitos. Bitencourt (2011a, p. 77) afirma que para a teoria relativa da pena, o objetivo primordial é a prevenção:

A formulação mais antiga das teorias relativas costuma ser atribuída a Sêneca, que, se utilizando de Protágoras de Platão, afirmou: “nenhuma pessoa responsável castiga pelo pecado cometido, mas sim para que não volte a pecar. Para as duas teorias a pena é considerada um mal necessário. No entanto, para as teorias preventivas, essa necessidade da pena não se baseia na ideia de realizar justiça, mas na função, já referida, de inibir, tanto quanto possível, a pratica de novos fatos delitivos”.

A pena já não seria mais vista como um castigo e retribuição, e sim como uma oportunidade para ressocializar o criminoso e evitar o crime, pelo temor que impõem, assim, evitando novas práticas ilícitas.

No que se refere à prevenção geral é importante destacar os ensinamentos de Prado (2005, p. 554):

[...] a concepção preventiva geral da pena busca sua justificação na produção de efeitos inibitórios a realização de condutas delituosas, nos cidadãos em geral, de maneira que deixarão de praticar atos ilícitos em razão do temor de sofrer a aplicação de uma sanção penal. Em resumo, a prevenção geral tem como destinatária a totalidade dos indivíduos que integram a sociedade, e se orienta para o futuro, com o escopo de evitar a pratica de delitos por qualquer integrante do corpo social.

No que diz respeito à Prevenção Especial, esta é direcionada ao próprio indivíduo, na busca de um convencimento subjetivo para que o mesmo não volte à prática do ilícito, medindo-se a pena por meios preventivos especiais, os quais visam ressocializar e reeducar o infrator da ordem jurídica intimidando os demais integrantes da coletividade a não praticar o ilícito, demonstrando as consequências e sanções legais pela prática infratora.

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Em relação à preventiva especial, Bitencourt (2011a, p. 81) afirma que “a pena deveria concretizar-se em outro sentido: o da defesa da nova ordem, a defesa da sociedade. O delito não é apenas a violação à ordem jurídica, mas, antes de tudo, um dano social; e o delinquente é um perigo social (um anormal) que põe em risco a nova ordem.”

Bitencourt (2011a) enquadra a prevenção especial como a que diz respeito ao sujeito que já delinquiu, a fim de que ele não volte a delinquir, e opera por diferentes formas, seja através da intimidação pessoal do condenado, da sua neutralização, decorrente da segregação compulsória e da sua ressocialização ou reintegração social.

A intimidação pessoal do condenado relaciona-se com a aplicação e execução das diversas penas, inclusive as não privativas de liberdade.

A neutralização do condenado refere-se apenas à execução das sanções penais privativas de liberdade. Consiste em impedir fisicamente o condenado à pena privativa de liberdade de voltar a delinquir, em virtude do seu encarceramento. Assegura-se, assim, a sociedade a não ocorrência de novas violações do ordenamento jurídico por parte do recluso.

A função da reintegração social refere-se à aplicação e execução da sanção penal imposta priorizando a recuperação do indivíduo, criando estímulos para que ele não volte a delinquir após o cumprimento da pena.

Para ambas as teorias retributiva e preventiva a pena é considerada um mal necessário, porém, para a teoria preventiva essa necessidade não se baseia na ideia de realizar justiça, mas sim na função de inibir, o máximo possível, a prática de novos fatos delitivos. Ou seja, a sua função não é retribuir o prejuízo causado, mas sim, prevenir que novos prejuízos aconteçam.

1.2.3 Teoria mista

Para Bitencourt (2011a), na teoria mista ou eclética a pena é tanto uma retribuição ao condenado pela realização de um delito, como uma forma de prevenir a realização de novos delitos. É uma mescla entre as duas teorias anteriores, sendo a pena uma forma de punição ao criminoso, devido ao fato do mesmo desrespeitar as determinações legais. Esta teoria busca a unificação dos pontos mais importantes e fundamentais das teorias anteriormente expostas,

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porque qualquer uma destas, atuando em sentido próprio, são insuficientes para atingir e solucionar os problemas sociais, garantindo a proteção e os direitos dos cidadãos. Para essa teoria, a prevenção é tratada como fim do Direito Penal, no qual o papel atuante da retribuição é apenas de limitar a aplicação daquela.

Como se pode observar, as teorias absolutas têm como fundamento da pena a retribuição e as teorias relativas têm como fundamento da pena a prevenção. Na teoria mista, a pena, por sua natureza, é retributiva, tem seu aspecto moral, mas a sua finalidade não é simplesmente prevenção, mas um misto de educação e correção.

De acordo com Ferreira (1995, p. 31),

O direito brasileiro optou claramente pela teoria mista, como bem se observa pela redação que deu ao art. 59 do Código Penal onde determina que a pena aplicada seja aquela necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Contudo, ele é mais retribucionista do que prevencionista. É o que se deflui do dispositivo no § 5º, do art. 121 (também no § 8, do art. 129), onde, no crime culposo, faculta ao juiz deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. Aqui, o legislador foi única e exclusivamente retribucionista: se a retribuição foi alcançada pelas consequências do próprio fato, não há nenhuma razão para se falar em aplicar a pena.

Bitencourt (2011a, p. 88) afirma que as teorias mistas, também denominadas por ele como unificadoras, buscam um único conceito de pena, retribuição do delito cometido, e a prevenção geral e especial ensinando que:

As teorias mistas ou unificadoras tentam agrupar em um conceito único os fins da pena. Esta corrente tenta escolher os aspectos mais destacados das teorias absolutas e relativas. Merkel foi, no começa do século, o iniciador desta teoria eclética na Alemanha, e, desde então, é a opinião mais ou menos dominante. No dizer de Mir Puig, entende-se que a retribuição, a prevenção geral e a prevenção especial são distintos aspectos de um mesmo e complexo fenômeno que é a pena.

Mirabete (2005, p. 245) se refere à terceira teoria dizendo que: “já para as teorias mistas (ecléticas) fundiram-se as duas correntes. Passou-se a entender a pena, por sua natureza, é retributiva, tem seu aspecto moral, mas sua finalidade é não só a prevenção, mas também um misto de educação e correção”.

A Teoria Mista tenta agrupar em um conceito único a ideia de retribuição jurídica da pena com os fins de prevenção geral e de prevenção especial. Essa corrente tenta recolher os

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aspectos mais importantes das teorias absolutas e relativas e superar as deficiências de cada uma. A possibilidade de reinserção social daquele que sofre a sanção penal é uma característica básica desse sistema. Esse modelo adotado pelo Brasil prega que para se conseguir alcançar uma pena proporcional e justa, não se deve fundamentar a racionalidade da pena em apenas uma teoria. No primeiro momento, a pena deve ter a função de proteger os bens jurídicos, sendo um instrumento dirigido a coibir delitos, e em um segundo momento, a determinação judicial, em que o juiz deverá individualizar a pena conforme as características do delito e do autor. Por fim, pretendem-se as finalidades sociais preventivas.

A partir do reconhecimento do caráter preventivo da pena, o Brasil passa a reconhecer a necessidade de “reabilitar e ressocializar” o criminoso, não bastando a pena unicamente em seu aspecto punitivo.

De tudo o que foi mencionado pode-se dizer que apesar de o Brasil reconhecer o modelo misto, apenas recentemente percebeu-se a importância do estudo da execução da pena privativa de liberdade à medida que a mesma não tem apenas função retributiva e preventiva, mas também, essencialmente, a reintegração do detento na sociedade, o que na prática não acontece. Por isso é necessária a distinção entre ressocializar e reintegrar ou reinserir, enquanto finalidades da pena de prisão.

Segundo o dicionário Aurélio (2017), a palavra “socializar” significa tornar social ou sociável um indivíduo. Ainda de acordo com o mesmo, “sociável” é aquele indivíduo que pode associar-se, que tende por natureza ou instinto, a se associar, que convive bem com os outros; amável; educado; cortês. Portanto, pressupõe-se que o criminoso, ao cometer um ilícito, perde sua identidade social, marginalizando-se e isolando-se, cabendo a pena a função de resgatar a sua “amabilidade” e “cortesia”, tornando-o social novamente, sendo essa a real ideia de ressocializar. O seu significado é direto e objetivo: reinserir na sociedade alguém que, como consequência de um crime cometido, foi privado da convivência no meio social a fim de ser punido.

Assim, diante desta exposição teórica sobre a função e finalidade da pena, conclui-se que o caráter utilitário da pena faz-se necessário, não apenas como retribuição ao criminoso pelo mal praticado, mas também propiciar ao delinquente a reeducação e reabilitação ao convívio em sociedade, como forma de redução da violência e criminalidade, gerando,

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consequentemente, segurança social e eficácia na atividade estatal de executar a pena e recuperar o criminoso. Todavia, atualmente as penitenciárias brasileiras padecem de incontáveis problemas, que influenciam de forma incisiva na reintegração do apenado. A superlotação é apenas um dos diversos problemas que culminam na violação dos direitos humanos do preso, demonstrados no “Mapa do Encarceramento”. Desta forma, a grande função da pena acaba não sendo concretizada na prática.

Segundo Mirabete (2014, p. 8),

A ressocialização não pode ser conseguida numa instituição como a prisão. Os centros de execução penal, as penitenciárias, tendem a converte-se num microcosmo no qual se produzem e se agravam as contradições que existem no sistema social exterior. [...] A pena privativa de liberdade não ressocializa, ao contrário, estigmatiza o recluso, impedindo sua plena reincorporarão ao meio social. A prisão não cumpre uma função ressocializadora. Serve como instrumento para a manutenção de estrutura social de dominação.

Assim sendo, se faz imprescindível a reflexão dos fatores acima mencionados e em como as penas alternativas à pena privativa de liberdade podem influir de forma positiva na sociedade atual, na qual o sistema carcerário encontra-se falido e sem condições de cumprir a sua finalidade de reinserção do detendo à sociedade. Tendo como propósito a busca pela concretização da reinserção do preso à sociedade, no próximo capítulo, vai-se trabalhar com a premente questão da utópica ideia de ressocialização do preso.

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2 A FUNÇÃO DO CÁRCERE E A IDEIA DE RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO

Como apresentado no capítulo anterior, a pena de prisão foi o meio pelo qual se buscou a punição e recuperação dos indivíduos entendidos como corrompidos, nela se aspirou uma forma ideal de punição, visando corrigir o cidadão que não age de acordo com o esperado para a vida em sociedade, para que este, depois de castigado, esteja pronto para retornar à comunidade como um “novo homem”, readequado para o convívio social.

Neste capítulo, serão apresentadas as principais teses, que buscam entender e explicar o grande “porquê” destas imensuráveis falhas no sistema prisional, que impedem a efetiva e concreta reinserção do indivíduo no período que antecede o retorno do mesmo a sociedade.

Têm-se aqui a finalidade de reverter a compreensão que a população detém de que a solução para o problema generalizado de insegurança é a prisão. Na situação em que os cárceres se encontram atualmente, qualquer indivíduo que for condenado a uma pena privativa de liberdade, por qualquer crime, terá uma única certeza: a de que ele sairá do sistema prisional catastroficamente pior do que como entrou.

Para a sociedade, falta a compreensão de que melhor do que a utilização do dinheiro público para a construção de mais prisões, seria a utilização desta mesma verba como investimento nas áreas de saúde e educação pública. Neste sentido, teria que se explorar formas mais eficientes de reinserção desse indivíduo, para que o mesmo retorne à sociedade de forma produtiva, assim reduzindo os índices de reincidência e consequentemente tornando as cadeias desnecessárias.

Como será visto a seguir, o Brasil é responsável por uma das mais elevadas taxas de reincidência criminal no mundo todo. Quando se reflete sobre o “Por quê?” destes dados, têm-se como contraponto o “Por que não?”. O que têm-se pode esperar de um sistema que apenas têm-se propõe a reabilitar e reinserir aqueles que cometerem algum tipo de crime, e que nada oferece para que essa situação de fato aconteça.

Presídios em estado de depredação total, pouquíssimos programas educacionais e laborais para os detentos, praticamente nenhum incentivo cultural, e uma cultura geral do país inteiro de que bandido bom é bandido morto.

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Para se entender melhor essa problemática, passa-se a seguir a analisar a questão da crise da pena de prisão na atualidade, para que se tenha um diagnóstico inicial do sistema penitenciário brasileiro.

2.1 A crise do sistema penitenciário brasileiro na contemporaneidade

O ano de 2017 se iniciou com uma rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, na cidade de Manaus, capital do estado do Amazonas, que resultou em 56 mortos. Ainda no mês de janeiro, na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte, duas semanas de rebelião que teve por consequência 26 mortos. Incontáveis são as rebeliões que já ocorreram por todo país, estas só comprovam a completa falência do sistema de execução penal nacional (HENRIQUES; GONÇALVES; SEVERIANO, 2017; TAVARES et al, 2017).

Em fevereiro, a crise na Polícia Militar no Espírito Santo disparou um alerta em todo Brasil, levando pânico a toda população, demonstrando o quão frágil é o equilíbrio em torno da paz social. Esse é o cenário atual do país, a crise na segurança pública, que vem se agravando durante os anos, abre o espaço público para um espaço de guerra, que conta como resultado incontáveis homicídios perpetrados contra civis e também policiais (WELLE, 2017).

A publicação “Atlas da Violência” analisa os dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, em 2015. Nele foi exposto que o número de homicídios no país no ano de 2015 foi de 59.080 mortes, um número demasiadamente elevado. Foi feita comparação que demonstra que o número de assassinados no país em apenas três semanas supera a quantidade de pessoas que foram mortas em todos os ataques terroristas no mundo, nos cinco primeiros meses de 2017, que resultaram em 3.314 indivíduos mortos. O Atlas também conclui que o perfil das vítimas fatais permanece o mesmo: homens, jovens, negros e com baixa escolaridade (CERQUEIRA et al, 2017).

Segundo Bitencourt (2011b), durante muitos anos, prevaleceu-se a convicção de que a prisão poderia ser um meio apto e competente para realizar todas as finalidades da pena e, com isso, reabilitar o delinquente. Porém, atualmente, diante da situação em que se encontra o sistema carcerário, é praticamente impossível se obter algum efeito positivo. Essa crise abrange também o objetivo ressocializador da pena restritiva de liberdade, são inúmeras as

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deficiências do sistema prisional, uma vez que a prisão não reeduca, sem antes corromper; não reprime a reincidência, mas ao contrário, a incentiva.

A ineficácia da pena privativa de liberdade foi resumida por Bitencourt (2011b, p. 162) em duas premissas:

a) Considera-se que o ambiente carcerário, em razão de sua antítese com a comunidade livre, converte-se em meio artificial, antinatural, que não permite realizar nenhum trabalho reabilitador sobre o recluso. Não se pode ignorar a dificuldade de fazer sociais aos que, de forma simplista, chamamos de antissociais, se os dissocia da comunidade livre e ao mesmo tempo se associa a outros

antissociais. Neste sentido manifesta-se Antonio Garcia-Pablos y Molina (Régimen

abierto y ejecución penal, REP, n. 240, 1988, p. 40), afirmando que “a pena não ressocializa, mas estigmatiza, que não limpa, mas macula, como tantas vezes se tem lembrado aos ’expiacionistas’; que é mais difícil ressocializar a uma pessoa que sofreu uma pena do que outra que não teve essa amarga experiência; que a sociedade não pergunta por que uma pessoa esteve em um estabelecimento penitenciário, mas tão somente se lá esteve ou não. Seguindo raciocínios como esse, chega-se a posturas tão radicais como a de Stanley Cohen (Un escenario para el sistema previdenciário futuro, NPP, 1974, p. 412), que considera que é tão grande a ineficácia da prisão que não vale a pena sua reforma, pois manterá sempre seus paradoxos e suas contradições fundamentais. Por isso, Cohen chega ao extremo de sugerir que a verdadeira solução o problema da prisão é a sua extinção pura e simples.

b) Sob outro ponto de vista, menos radical, porém igualmente importante, insiste-se que na maior parte das prisões do mundo as condições materiais e humanas tornam inalcançável o objetivo reabilitador. Não se trata de uma objeção que se origina na natureza ou na essência da prisão, mas que se fundamenta no exame das condições reais em que se desenvolve a execução da pena privativa de liberdade.

Bitencourt (2011b) aponta as deficiências do sistema prisional que atingem penitenciárias existentes na maior parte dos países do mundo inteiro, apresentando diversas características semelhantes: elevado índice de reincidência; maus tratos verbais e físicos, nos quais a crueldade é injustificada e são utilizados vários métodos de fazer o recluso sofrer sem incorrer em evidente violação do ordenamento; condições deficientes de trabalho, que podem significar exploração dos reclusos ou o ócio completo; superpopulação carcerária, reduzindo a privacidade do recluso e tornando as condições de vida e de higiene precárias; negação de acesso à assistência jurídica e de atendimento médico, dentário e psicológico aos reclusos; regime alimentar deficiente; elevado índice de consumo de drogas, muitas vezes originado mediante a corrupção de alguns funcionários penitenciários que permitem e até realizam o tráfico ilegal; além dos efeitos sociológicos e psicológicos negativos produzidos pela prisão, a mesma é um ambiente propício à violência sexual e física, no qual se impera a utilização de meios brutais, em que sempre se impõem o mais forte.

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As exigências mínimas de uma cela estão previstas no artigo 88 da Lei de Execução Penal de 1984, mas não estão de acordo com a atual realidade de superlotação do sistema:

Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório.

Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:

a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana;

b) área mínima de 6,00 m2 (seis metros quadrados). (BRASIL, 1984).

O estado em que se encontram as penitenciárias do país e a indiferença do governo e da população quanto a isso, só comprova a crise que o sistema prisional enfrenta. A situação dos reclusos é precária, eles vivem em condições inumanas e isso inequivocamente já se tornou natural.

Outra comprovação de que a pena privativa de liberdade não se revelou eficaz para reintegrar o homem está nos elevados índices de reincidência, uma vez que uma das finalidades da pena privativa de liberdade é recuperar o recluso para que ele seja reinserido na sociedade.

Não existe uma análise completa e atual sobre os índices de reincidência no país, porém uma pesquisa nomeada como “Reincidência Criminal no Brasil”, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em cinco unidades da federação (Alagoas, Minas Gerais, Pernambuco, Paraná e Rio de Janeiro) no ano de 2015, revelam que a cada quatro ex-condenados, um reincide por algum crime no prazo de cinco anos, o que perfaz uma taxa de 24,4%. Essa realidade é um reflexo direto do tratamento e das condições a que o apenado foi submetido no ambiente prisional, aliadas ainda ao sentimento de rejeição e de indiferença sob o qual ele é tratado pela sociedade e pelo próprio Estado ao readquirir a sua liberdade.

Baratta (2011, p. 90) discorre sobre o afastamento do preso da sociedade, tendo como foco seus efeitos negativos, afirmando que “não se pode segregar pessoas e ao mesmo tempo pretender reintegrá-las”. Baratta (2011, p. 90) ainda afirma que:

[...] a intervenção do sistema penal, especialmente as penas detentivas, antes de terem um efeito reeducativo sobre o delinquente determinam, na maioria dos casos, uma consolidação da identidade desviante do condenado e o seu ingresso em uma verdadeira e própria carreira criminosa.

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O referido autor ainda afirma que a seleção do criminoso tem início antes mesmo da intervenção penal, com a discriminação social. A infâmia do delinquente se inicia antes mesmo do encarceramento, sendo este um sentimento já entranhado na sociedade. Baratta (2011, p. 169) aponta como principal causa deste problema a socialização primária:

O elemento realista é dado pela consciência de que, na maior parte dos casos, o problema que se coloca em relação ao detido não é, propriamente, o de uma ressocialização ou de uma reeducação. Na base do atual movimento de reforma penitenciária se encontra, antes, a representação realista de que a população carcerária provém, na maior parte, de zonas de marginalização social, caracterizadas por defeitos que incidem já sobre a socialização primária na idade pré-escolar. Observando-se bem, o que parecia uma simples matriz filológico na definição do fim do tratamento (“socialização” ou “ressocialização”) revela ser uma mudança decisiva do seu conceito. Isto muda a relação entre a instituição carcerária e o complexo de instituições, privadas e públicas, prepostas para realizar a socialização e a instrução. O cárcere vem a fazer parte de um continuum que compreende família, escola, assistência social, organização cultural do tempo livre, preparação profissional, universidade e instrução dos adultos. O tratamento penitenciário e a assistência pós-penitenciária prevista pelas novas legislações são um setor altamente especializado deste continuum, dirigido a recuperar atrasos de socialização que prejudicam indivíduos marginalizados, assim como as escolas especiais tendem a recuperar os menores que se revelaram inadaptados à escola normal. Ambas são instituições especializadas para integração de uma minoria de sujeitos desviantes. Não restam dúvidas de que o real problema do apenado se inicia na sua socialização e educação, mais precisamente na falta delas, esses fatores acabam, consequentemente, tornando o indivíduo mais suscetível à delinquência. Infelizmente, não seria possível reintegrar ou reeducar um sujeito que sequer integrou-se em algum momento com os padrões sociais ou que sequer foi educado neste sentido.

Diante do exposto, resta claro que uma das principais razões da falência do sistema carcerário é a falta de assistência do Estado, que não cumpre com algumas exigências indispensáveis para o cumprimento de penas que restringem a liberdade do indivíduo, como por exemplo, a superlotação dos presídios, falta de higiene básica, entre outros fatores, que impossibilitam assim a reintegração do apenado.

2.2 A função do cárcere e a ideia de ressocialização do apenado

Nos dias atuais, a pena restritiva de liberdade representa o centro do sistema penal. No capítulo inicial do presente trabalho foi objeto de análise, as diversas teorias sobre a legitimidade da pena de prisão, buscando apresentar qual a finalidade da pena privativa de liberdade ou com qual intuito ela foi criada. Dentre essas teorias, apresentamos defensores da

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Teoria Retributiva ou Absolutista que pregavam que a finalidade da pena tinha caráter retributivo, onde a prisão deveria ser o castigo pelo mal provocado, concluindo que o apenado estaria apenas pagando pelo seu crime.

Na Teoria Relativa, era pregado que a pena deveria ser um meio de reeducação do apenado, para que consequentemente, o mesmo pudesse ser reintegrado ao convívio social. Finalizando com a teoria adotada pelo Código Penal Brasileiro, em seu artigo 59, chamada de Teoria Mista, que defende a ideia de que a pena restritiva de liberdade deveria ser uma retribuição pelo mal praticado, mas sem excluir essa necessidade de reeducação do preso, necessária para sua reintegração ao convívio social.

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. (BRASIL, 1940).

No livro “Penas Alternativas”, Bitencourt (2013, p. 110) confirma que “os altos índices de reincidência têm sido, historicamente, invocados como um dos fatores principais da comprovação do efetivo fracasso da pena privativa de liberdade, a despeito da presunção de que, durante a reclusão, os internos são submetidos a um tratamento ressocializador”. Independente da dificuldade de apresentação de dados confiáveis, que acabam por dificultar a realização de uma verdadeira política criminal, é inquestionável o fato de que a delinquência não diminui e que o sistema penitenciário tradicional não reabilita, “ao contrário, constitui uma realidade violenta e opressiva e serve apenas para reforçar os valores negativos do condenado”.

Analisando os dados ora expostos, constata-se que a prisão, ao invés de conter a violência, tem lhe servindo de estímulo, sendo assim um instrumento que oportuniza toda espécie de desumanidade, demonstrando a ineficácia da pena de prisão, uma vez que a sua função reabilitadora não está sendo executada.

O “Mapa do Encarceramento – Os Jovens do Brasil” (2017) informa que, de acordo com os dados atuais do “International Centre for Prison Studies” – organização não

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