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As representações da Língua Inglesa no discurso de jovens carentes = um estudo crítico

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Academic year: 2021

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PEDRO LAZARO DOS SANTOS

AS REPRESENTAÇÕES DA LÍNGUA INGLESA NO

DISCURSO DE JOVENS CARENTES:

um Estudo Crítico.

Dissertação apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem, da Universidade Estadual de Campinas, para obtenção do Título de Mestre em Lingüística Aplicada.

Orientadora: Profª Drª Maria Viviane do Amaral Veras

CAMPINAS 2011

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Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do IEL - Unicamp

Sa59r

Santos, Pedro Lazaro dos.

As representações da língua inglesa no discurso de jovens carentes : um Estudo Crítico / Pedro Lazaro dos Santos. -- Campinas, SP : [s.n.], 2011.

Orientador : Maria Viviane do Amaral Veras.

Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

1. Língua portuguesa. 2. Análise crítica do discurso. 3. Globalização. 4. Identidade cultural. I. Veras, Maria Viviane do Amaral. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

tjj/iel

Título em inglês: Representations of english in the discourse of social vulnerable youngsters: a Critical Study.

Palavras-chave em inglês (Keywords): English Language; Critical Discourse Analysis; Globalization; Culture identity.

Área de concentração: Língua Estrangeira. Titulação: Mestre em Lingüística Aplicada.

Banca examinadora: Profa. Dra. Maria Viviane do Amaral Veras (orientadora), Prof. Dr. Kanavillil Rajagopalan e Profa. Dra. Claudiana Nogueira de Alencar. Suplentes: Profa. Dra. Terezinha de Jesus Machado Maher e Profa. Dra. Lenita Maria Rimoli Esteves. Data da defesa: 25/03/2011.

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Dedico este trabalho a minha mãe Maria da Glória e ao meu pai José Carlinhos (z”l).

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, ao Eterno, bendito seja, que é dono de toda a sabedoria e que me deu forças em todos os momentos dessa jornada.

Ao meu companheiro Daniel Knoll, que foi quem mais me incentivou e ajudou a realizar este trabalho e que me sustentou em todos os momentos com amor, carinho e paciência. A você, meu eterno amor.

À minha mãe Maria da Glória, que sempre me aconselhou e que sempre me incentivou com meus estudos. Estou onde estou por sua culpa!

À minha amiga Nívea Gracio Perez, que sempre me motiva com suas palavras e sempre está ao meu lado quando preciso.

À minha família, minha irmã Cleide, meu irmão Magno, meus tios Júlio e Zélia, meus sobrinhos e meus sobrinhos-netos, pelas lições que aprendi com vocês e pelo carinho com que me tratam.

À minha amiga Marina Keiko, que sempre me motivou e sempre teve um tempinho para mim.

À minha amiga Sharlene Campanelli, pelos conselhos e pelo carinho.

À Maria Cristina Knoll, pela ajuda em todos os sentidos, pelo carinho e pelo pensamento positivo.

À Profª Drª Viviane Veras, por não me abandonar e pelo desafio de me orientar, além de toda a ajuda que sempre me ofereceu ao longo de meu mestrado.

Ao Prof° Dr° Kanavillil Rajagopalan pelas conversas, dicas, textos e o imenso apoio, além da leitura desse texto.

À Profª Drª Claudiana Nogueira, pelas conversas, o incentivo, a leitura desse texto e pelo trabalho de se deslocar de lá do Ceará para a minha banca.

À Profª Drª Terezinha Maher, pela leitura de meu texto e pelas valiosíssimas contribuições durante a qualificação.

Às Profªs Drªs Maria José Coracini, Roxane Rojo e Carmen Zink pelas aulas fantásticas ao longo do curso.

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À Profª Drª Deusa Pinheiros-Passos, pelo apoio. Você é o modelo de professora ideal.

A algumas pessoas que me incentivaram muito e que são muito especiais em minha vida: Eliete Chacon, Sueli Melo, Walkyria Buzuto, Patrícia Diniz, Rita Felippi, Romualdo Moura, Luciana Lima e Ricardo Almeida (da Viza Brazil), Vanderléia Gabriel de Souza, Rabino Alexandre Leone, e todos que me apoiaram.

Ao grupo de Identidade e da Nova Pragmática, pelas informações valiosíssimas e almoços divertidíssimos.

Aos funcionários da Secretaria da Pós-Graduação da Unicamp, especialmente Rose, Cláudio e Miguel, pela ajuda durante esses dois anos.

Aos meus amigos de Pyros, pela torcida.

Aos meus colegas de classe na Unicamp – todos vocês são ótimos! A todos aqueles que, de certa forma, contribuíram para o meu mestrado. Ao CNPQ, pela bolsa de Mestrado, processo 136235/2009-3.

À United Way Brasil e às pessoas que “vivem unidas” por um mundo melhor: Paula Pisaneschi, Sandra Carvalho, Rogério Arns, Fernanda Vidigal e Diana Caroline, que me acompanharam no início do trabalho com a United Way, e aos voluntários que atuaram como mentores na turma de inglês.

E especialmente aos jovens da turma de inglês, que foram ótimos em seus argumentos a favor e contra a hegemonia da língua inglesa. Sem vocês, esse trabalho não teria nenhum valor.

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RESUMO

A presente dissertação de mestrado trata das representações acerca da língua inglesa feitas por jovens em situação de vulnerabilidade social participantes de um curso de inglês como língua estrangeira oferecido por uma ONG internacional na cidade de São Paulo. Para este estudo crítico, discorremos, primeiramente, a respeito dos programas de educação de ONGs para jovens carentes e como tais programas estão ligados à formação de mão-de-obra. Refletimos, então, sobre as identidades do jovem pós-moderno e como suas identidades lingüísticas são afetadas pela língua inglesa e pela globalização. Como base teórica, utilizamos a Análise de Discurso Crítica, como concebida por Fairclough (2001, 2003), e os Estudos Culturais, que nos guiaram na análise dos dados coletados através de um questionário de ingresso no curso, uma redação sobre o futuro do jovem, e um grupo focal com os jovens participantes do curso de inglês. Através da seleção e transcrição desses dados e sua posterior análise, que se focou nos Significados Acional, Representacional e Identificacional, concluímos que o discurso do inglês como língua essencial para o mercado de trabalho e como representante do neocolonialismo estadunidense é latente na fala dos jovens, que ora confirmam e sustentam esse caráter hegemônico da língua inglesa, e ora advogam uma valorização da língua e da cultural nacionais como uma forma de resistência.

Palavras-chave: Língua Inglesa; Análise Crítica do Discurso; Globalização; Discurso dos mais necessitados.

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ABSTRACT

This dissertation deals with representations of the English language made by at-risk young people who take part of a course of English as a foreign language offered by an international NGO in Sao Paulo. For this critical study, we firstly discuss about the educational programs of NGOs for disadvantaged youth and how these programs are linked to the training of skilled manpower. We then reflect about the identities of the post-modern youngsters and how their language identities are affected by the English language and globalization. As a theoretical basis, we use the Critical Discourse Analysis, as conceived by Fairclough (2001, 2003), and Cultural Studies, which led us to analyze the data collected through an entry questionnaire to the course, an essay on the future of the youngsters and a focus group with the young people who participate in the English classes. Through selection and transcription of data and its subsequent analysis, which focused on the Actional, Representational and Identificational Meaning, we conclude that the discourse of English as an essential language to the job market and as a representative of North American neocolonialism is latent in the discourse of the youngsters, who sometimes confirm and support this hegemonic character of the English language, and other times advocate an appreciation of language and national culture as a form of resistance.

Key words: English Language; Critical Discourse Analysis; Globalization; Discourse of those in need.

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LISTA DE QUADROS

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Concepção tridimensional do Discurso ... 63 Figura 2 – Esquema representativo das redações ... 97

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Respostas dos questionários de seleção dos jovens – “Quais as suas expectativas sobre o curso de inglês?” ... 90 Tabela 2 – Trechos da redação “Seus planos para os próximos 5 anos” ... 99 Tabela 3 – Motivos de desistência do curso de inglês. ... 104

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SUMÁRIO

LISTA DE QUADROS ... xiii

LISTA DE FIGURAS ... xv

LISTA DE TABELAS ... xvii

1 INTRODUÇÃO ... 23

1.1 A motivação para o trabalho ... 25

1.2 Nossos objetivos ... 26

1.3 Nossas perguntas ... 27

1.4 Panorama da dissertação ... 27

2 SOBRE AS ONGS E OS PROGRAMAS PARA A JUVENTUDE URBANA ... 29

2.1 Estudando os jovens em situação de vulnerabilidade social ... 31

2.2 As ONGs e a Juventude no mundo globalizado ... 34

3 LÍNGUA INGLESA: DISCUSSÕES SOBRE GLOBALIZAÇÃO E IDENTIDADE 37 3.1 Considerações sobre identidade e diferença ... 38

3.2 O fenômeno da globalização e suas consequências para as identidades culturais. ... 41

3.3 Globalização, identidade e aprendizagem de língua inglesa. ... 46

3.4 Breve histórico do ensino de inglês no Brasil ... 50

4 ANÁLISE DE DISCURSO CRÍTICA E TEORIA SOCIAL DO DISCURSO ... 55

4.1 Um estudo crítico do discurso ... 55

4.2 A Análise de discurso crítica ... 57

4.3 A proposta da ADC ... 60

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4.4.1 Intertextualidade, ordens do discurso e interdiscursividade ... 66

4.4.2 Poder e hegemonia ... 68

4.4.3 Ideologia ... 70

4.5 A linguística sistêmico-funcional na ADC ... 73

4.6 Aplicação da ADC na presente pesquisa ... 76

5 AS REPRESENTAÇÕES DA LÍNGUA INGLESA NO DISCURSO DE JOVENS CARENTES ... 79

5.1 Os percalços metodológicos ... 79

5.1.1 A ONG em questão ... 80

5.1.2 O curso de inglês como língua estrangeira ... 82

5.1.3 Os jovens participantes de nossa pesquisa ... 84

5.2 Análise dos dados ... 85

5.2.1 Primeira parte: textos coletados no processo de seleção ... 87

5.2.1.1 Significado acional: intertextualidade e crenças no processo seletivo ... 87

5.2.1.2 Significado representacional: modos de representar a língua inglesa ... 93

5.2.1.3 Significado identificacional: pressuposições, modalidade e ethos ... 96

5.2.1.4 Ideologias no discurso dos jovens ... 101

5.2.2 Segunda parte: análise do grupo focal ... 103

5.2.2.1 Significado acional: a legitimação da hegemonia da língua inglesa ... 105

5.2.2.2 Significado representacional: sobre a importância da língua inglesa ... 108

5.2.2.3 Significado identificacional: metáforas e diferentes identidades ... 111

5.2.3 Terceira parte: focos de resistência e valorização da língua nacional ... 116

5.3 Conclusões sobre a análise dos dados ... 124

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REFERÊNCIAS ... 135

ANEXO 1 ... 141

ANEXO 2 ... 143

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INTRODUÇÃO

As oportunidades de educação e inserção para jovens provenientes de comunidades menos favorecidas no Brasil não são muito abundantes. Esses jovens, normalmente, dependem da educação pública e de iniciativas de empreendimento social realizadas, em grande parte, por empresas multinacionais, organismos internacionais e organizações não-governamentais, que geralmente trazem ajuda na forma de cursos de capacitação, para que os jovens consigam um bom emprego ou uma vaga em uma universidade, por exemplo. Algumas Organizações Não-Governamentais (doravante, ONGs), por exemplo, são patrocinadas por empresas estrangeiras ou multinacionais, e fornecem cursos de inglês como Língua Estrangeira (doravante LE) como uma opção de curso preparatório para o mercado de trabalho. O objetivo desses cursos é, então, que esses jovens possam se preparar para conseguir um emprego melhor, ou até mesmo o seu primeiro emprego em uma empresa onde a língua inglesa seja necessária.

Além de serem incitados a promover mudanças, seja através da replicação do conhecimento adquirido no curso, seja através de sua participação ativa na sua comunidade, os participantes dessas iniciativas também são motivados, pelas próprias ONGs que ministram as aulas, a estudar uma língua estrangeira, para que possam mudar suas vidas e sua condição socioeconômica. A viabilização dessa mudança através do curso da ONG é ainda promovida pelos jovens que já terminaram o curso: aqueles que obtiveram inserção profissional são convidados a dar palestras para os jovens ingressantes. Por isso, antes mesmo de ingressar no curso de inglês, esses jovens talvez tenham uma idéia da língua estrangeira como a solucionadora de seus problemas, como a porta para se obter êxito profissional e como uma maneira de mudar sua condição social. Esse discurso ainda é reiterado pela mídia, que mostra a entrada em institutos de idiomas como passaporte para uma atuação profissional e pessoal bem sucedida. Toda essa história pode ainda ser reforçada pela experiência do jovem cujo ambiente escolar, e mesmo familiar e

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comunitário, muitas vezes não colabora para o aprimoramento educacional: a escola pública não tem um bom ensino, a família não tem boa estrutura e a comunidade pode às vezes não ser o lugar mais seguro para se viver.

Acreditamos que os jovens participantes de tais programas tenham constante contato com a língua inglesa, além da escola regular e do curso da ONG, através de músicas, da internet, dos jogos eletrônicos e até mesmo de seu modo de vestir e de falar. Ou seja, a LE já não é tão estrangeira assim para esses jovens que vivem numa sociedade pós-moderna e globalizada como a da Grande São Paulo do século XXI. A exemplo do que diz Hall (2001), eles vivem num mundo que tem suas fronteiras locais burladas pelo global, pois já não vivem isoladamente em seu país sem ter contato com pessoas e produtos de outras nacionalidades. Assim, justificaríamos a procura desses jovens por um curso gratuito de inglês como sendo uma ação natural, dada a exposição aos elementos dessa LE mesclados ao português. Por outro lado, devemos considerar o pensamento crítico e a resistência por parte desses jovens em relação à aprendizagem de inglês, pois essa língua ainda é estigmatizada por algumas pessoas que a consideram representante do imperialismo econômico dos Estados Unidos (CANAGARAJAH, 1999; PENNYCOOK, 1994).

Tendo o exposto acima em mente, o presente trabalho analisa as representações da língua inglesa na fala dos alunos do curso de inglês gratuito promovido por uma ONG internacional, dirigindo seu foco para a maneira como esses alunos encaram a aprendizagem dessa LE como parte de suas vidas e de seus planos para o futuro. Contrastamos as relações do fenômeno da globalização – que torna indivíduos cidadãos do mundo – com as políticas linguísticas do inglês – incluindo o discurso do inglês como língua internacional e necessária no mundo de hoje – e com os vários discursos sobre o ensino de LE, tais como os documentos oficiais do governo federal (os Parâmetros Curriculares Nacionais, doravante PCNs). Essa análise se dá à luz dos Estudos Críticos do Discurso, dos Estudos Culturais e da Filosofia da Linguagem.

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1.1 A motivação para o trabalho

A pesquisa que deu origem a este trabalho foi motivada por nossa experiência voluntária na docência e coordenação do curso gratuito de inglês para jovens em situação de vulnerabilidade social oferecido pela organização United Way Brasil na cidade de São Paulo. Para ingressar no curso, os interessados devem passar por um processo de seleção, composto de entrevista com os funcionários da ONG, de um teste de português e matemática, e de uma redação, na qual os jovens devem escrever sobre suas vidas no futuro. Ao ler o material que compunha o processo seletivo dos jovens, vimos que expressavam um desejo de aprender inglês movido pela crença na importância dessa língua para o mundo moderno, globalizado, e para sua carreira profissional. Após o ingresso no curso, conversamos regularmente com os jovens, que continuavam com comentários de exaltação da língua inglesa, frisando sempre a sua importância para o futuro e para o trabalho. A repetição dessa cena foi o ponto de partida para o projeto de pesquisa, que teve como objeto de estudo a língua inglesa ensinada para jovens que vivem em situação de vulnerabilidade social alta.

Pensar a respeito do ensino e aprendizagem de inglês como LE em contextos sociais segue a agenda ética de investigação defendida por Moita Lopes (2008), que possibilita re-narrar e re-descrever a vida social, possibilitando, assim, sua compreensão. De acordo com o pesquisador, o linguista aplicado deve:

preocupar-se com a vida social de modo que possa situar seu trabalho no mundo, em vez de ser tragado por ele ao produzir conhecimento que não responda às questões contemporâneas em um mundo que não entende ou que vê como separado de si como pesquisador: a separação ente teoria e prática é o nó da questão. (MOITA LOPES, 2008, p. 90)

A Filosofia da Linguagem e os Estudos Culturais contribuem para o saber em outras áreas que atuam nos estudos sociais e socioculturais, e acabam por usar a Linguística Aplicada em seus trabalhos. Decidimos, então, utilizar uma abordagem multidisciplinar em

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nosso trabalho, buscando fundamentos teóricos nessas disciplinas, baseando-nos, por exemplo, no pensamento de Signorini (1998):

Como área de investigação, a Lingüística Aplicada (LA) tem se configurado também, e cada vez mais, como uma espécie de interface que avança por zonas fronteiriças de diferentes disciplinas, não somente na área de estudos da linguagem, como também na da Psicologia, da Sociologia, da Antropologia, da Pedagogia, da Psicanálise, entre outras. Nesse sentido, tem-se também constituído como uma área feita de margens, de zonas limítrofes e bifurcações, onde se tornam móveis as linhas de partilha dos campos disciplinares e são deslocados, reinscritos, reconfigurados, os constructos tomados de diferentes tradições e áreas do conhecimento. (SIGNORINI, 1998, p. 99)

Finalmente, a escolha da pesquisa com jovens em situação de vulnerabilidade como participantes baseia-se na idéia de que devemos nos preocupar com o “discurso que vem de classes menos favorecidas, de países periféricos ou semiperiféricos como o nosso”, porque nesses países somos mais facilmente vulneráveis devido à globalização e à mudança social (BOAVENTURA SANTOS, 2001, apud MOITA LOPES, 2008, p. 94).

1.2 Nossos objetivos

O objetivo geral deste trabalho é contribuir para a construção do conhecimento a respeito da língua inglesa como língua estrangeira no Brasil. Como objetivo específico, busca analisar as representações que jovens em situação de vulnerabilidade social fazem da língua inglesa. Refletimos sobre a influência da globalização na vida e nas identidades desses jovens carentes – encarados como “mão-de-obra” que deve ser preparada para ser utilizada – e sobre a sua visão a respeito da língua inglesa.

Para atingir esses objetivos, a pesquisa propôs algumas questões que devem ser levantadas em conjunto com os sujeitos envolvidos no processo de aprendizagem.

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1.3 Nossas perguntas

A questão principal a ser respondida pelo presente trabalho é:

- Quais são as representações dos jovens a respeito da língua inglesa?

Essa questão mais geral desdobra-se nas seguintes perguntas de pesquisa:

- Como o jovem representa a língua inglesa em sua vida no presente e no futuro?

- Quais discursos influenciam a visão dos jovens a respeito da língua inglesa e, consequentemente, suas identidades?

- De que modo as ideologias operam nas falas dos jovens quando opinam sobre o inglês? - Quais são os focos de resistência em relação à aprendizagem dessa língua estrangeira?

De modo a responder a essas perguntas, decidimos levantar uma bibliografia a respeito das ONGs, dos programas para a juventude, e dos estudos sobre Identidade e Diferença, que se encontram discutidos nos próximos capítulos. Além deles, baseamo-nos nos pressupostos teóricos de estudos sobre a língua inglesa e a globalização, e definimos a Análise de Discurso Crítica como base para a análise dos dados gerados por nossa pesquisa.

1.4 Panorama da dissertação

Esta dissertação compõe-se de 6 capítulos. No primeiro capítulo descrevemos os objetivos gerais da pesquisa e expomos as razões de sua relevância para a Linguística Aplicada. Salientamos aqui que essa pesquisa se somará aos trabalhos que têm como base os Estudos Críticos do Discurso e, em particular, a Análise de Discurso Crítica, como definida por Fairclough (1995, 2001). O segundo capítulo discorre brevemente sobre o

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papel das organizações não-governamentais no mundo globalizado e sobre os estudos da sociologia a respeito da juventude brasileira.

O fenômeno da globalização e suas consequências para a construção das identidades das pessoas no mundo todo, em especial as dos jovens, é o foco do terceiro capítulo, no qual também estudamos as identidades no mundo globalizado e o discurso da língua inglesa como lingua franca desse processo, o fenômeno dos World Englishes, além de traçarmos um breve histórico do ensino de língua inglesa no Brasil.

O quarto capítulo expõe os fundamentos teóricos da Análise de Discurso Crítica. Em função de nossos objetivos, a Teoria Social do Discurso, definida por Fairclough (2001) e mais tarde desenvolvida em Fairclough (2003), servirá de base teórica para a análise dos dados gerados com a pesquisa.

A descrição dos participantes e da metodologia utilizada na pesquisa, bem como a análise dos dados coletados através de questionários, redações e o grupo focal com alguns os jovens do programa de ensino de inglês compõe o quinto capítulo, que ainda discorre sobre a forma como se dão as representações da língua inglesa entre os jovens através da análise do significado Acional, Representacional e Identificacional em seu discurso.

Finalizando a dissertação, traçamos as considerações finais a respeito da pesquisa e do trabalho em geral.

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SOBRE AS ONGS E OS PROGRAMAS PARA A JUVENTUDE

URBANA

O presente capítulo discorre, breve e inicialmente, sobre as ONGs, sua definição, seu papel no mundo globalizado e sua organização no Brasil, abordando a estrutura dos programas para a juventude urbana.

Chamam-se ONGs uma variedade de grupos e instituições, independentes ou não do governo, que se caracterizam por seus objetivos humanitários ou cooperativos. Além disso, as ONGs podem realizar atividades de auxílio em casos de tragédias, serviços sociais básicos de auxílio a populações carentes e de desenvolvimento comunitário. O trabalho das ONGs realiza-se, em grande parte, pelo resultado das ações voluntárias de indivíduos (CARLIGEANU, 2010).

Embora tenham sua atuação mais conhecida e reconhecida atualmente, as ONGs existem, de diferentes maneiras, desde a antiguidade. Porém, somente após o início do século XIX é que se estabeleceram no modelo que conhecemos atualmente, e somente em 1968 foram reconhecidas pela Organização das Nações Unidas e qualificadas como concernentes ao domínio do desenvolvimento econômico e social. O desenvolvimento das ONGs modernas acompanha a história mundial em geral, particularmente após a Revolução Industrial: desde 1850, mais de 100.000 organizações privadas sem fins lucrativos foram fundadas – apenas uma média de 10 por ano, passando a cerca de 90 ONGs internacionais após a Segunda Guerra Mundial. Cerca de 30% das organizações criadas conseguem sobreviver e se manter com recursos próprios provenientes de suas iniciativas ou com doações ou apoio de fundações e empresas (CARLIGEANU, 2010).

No Brasil, conforme definição do IBGE (BRASIL, 2004), as ONGs devem ser:

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- sem fins lucrativos, isto é, não distribuem eventuais excedentes entre seus proprietários ou diretores, e não têm como razão primeira de existência a geração de lucros e, se os gerarem, eles devem ser aplicados nas suas atividades;

- legalmente constituídas, ou seja, terem registro no CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas;

- auto-administradas;

- voluntárias, na medida em que podem ser constituídas livremente por qualquer grupo de pessoas.

Ainda segundo dados do IBGE (BRASIL, 2004), em 2002 havia 17.493 organizações não-governamentais sem fins lucrativos atuando em Educação e Pesquisa no Brasil, do total de 275.895. Desse total, 44% estavam na região sudeste, sendo 21% só no estado de São Paulo. Das que atuam em Educação e Pesquisa, 1.685 são organizações que atuam em ensino de cursos extracurriculares, como os cursos profissionalizantes livres e os cursos de idiomas. Comparativamente, até o ano de 1970 havia apenas 10.998 organizações sem fins lucrativos constituídas.

Economicamente, as ONGs podem ter um papel importante no mundo globalizado quando atuam internacionalmente, desenvolvendo estratégias para ajudar as pessoas em situação de vulnerabilidade a adaptarem suas realidades ao mercado global e a reestruturarem sua força econômica. Teoricamente, esse papel se daria, primeiramente, dotando os mais necessitados de ferramentas para competirem com segurança e com mais eficácia e com igualdade de direitos, pois, assim, eles poderiam dar continuidade ao trabalho tradicional dessas ONGs, que seria o de desenvolver habilidades, construir capacidades e instituições, e aumentar o acesso ao crédito e às oportunidades econômicas. As iniciativas de educação financeira e de cursos livres para jovens seriam um exemplo dessas ferramentas, porém, na realidade, observamos que nem sempre o fato de ser beneficiário de um programa da ONG resultará em igualdade de direitos: há outros fatores envolvidos nesse processo. Em segundo lugar, as ONGs articulam suas atividades de modo a dar condições de virar as forças econômicas a favor dos mais pobres ao eliminar os intermediários nas transações econômicas, auxiliando grupos de indivíduos a negociarem

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os produtos produzidos pela comunidade diretamente com grandes empresas, por exemplo (OFOSU-APPIAH, 2008, p.3). No Brasil, as ONGs focam-se mais em cursos para a formação profissional de jovens e em programas de geração de renda que também têm os jovens como o seu público-alvo.

2.1 Estudando os jovens em situação de vulnerabilidade social

Os jovens têm sido o objeto de diversos estudos, iniciativas e projetos, especialmente de ONGs atuantes na área de educação e geração de renda. Primeiramente, precisamos definir os termos utilizados pelas ONGs quando se referem aos seus programas e aos jovens.

Segundo Maria Virgínia de Freitas, existem atualmente no Brasil dois termos utilizados concomitantemente: adolescência e juventude (FREITAS, 2005, p.6). Uma definição inicial para juventude, segundo a socióloga, seria a do período que se inicia com as mudanças físicas da puberdade, que ocorrem ao mesmo tempo em que as transformações intelectuais e emocionais, terminando na fase de “inserção no mundo adulto”.

Como referência para análises demográficas e definições políticas, alguns critérios foram definidos para limitar o período anterior à vida adulta. No Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE localiza essa faixa etária entre os 15 e os 24 anos, mas considera a variação de acordo com exemplos concretos.

O uso corrente dos termos no Brasil é diferenciado da seguinte forma: quando psicólogos se referem aos processos que marcam a fase anterior à adulta, eles usam o termo adolescência. Quando sociólogos, demógrafos e historiadores se referem à categoria social, como um segmento da população, como atores no espaço público, o termo usado é juventude (FREITAS, 2005, p.7). Para nosso estudo, utilizaremos o termo juventude, ou jovens, pois tomamos esse público como atores e como uma categoria social.

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Partindo, então, para um estudo do papel dos jovens e do fato de eles serem os sujeitos de projetos e iniciativas sociais, vemos na afirmação de Costa (2007, p. 30) a justificada preocupação com essa população:

No que diz respeito à juventude popular urbana, não temos dúvida de que a maneira de ver, sentir, entender, decidir, agir, interagir e reagir – que os jovens adquirem no convívio familiar, escolar e comunitário –, somada à influência dos meios de comunicação, é decisiva na formação dos valores que definem suas relações consigo mesmos, uns com os outros e com o mundo do trabalho em sua inteireza e complexidade.

Essa afirmação encontra respaldo nas definições das visões e missões das várias ONGs brasileiras de maneira geral. No caso da United Way Brasil, a ONG na qual ocorreu nossa pesquisa, sua definição, missão e valores são:

Definição

A United Way Brasil é uma organização não governamental de empresas e seus funcionários, atuando para e com a juventude e as organizações comunitárias.

Missão

Mobilizar recursos humanos, financeiros e materiais da comunidade empresarial para a melhoria da educação, geração de renda e trabalho da juventude das comunidades de base.

Valores

• Transparência nos investimentos.

• Competência técnica na gestão de projetos. • Comunicação fluida com todos os stakeholders.

• Participação do indivíduo e das organizações por meio do investimento social e do voluntariado.

• Inclusão dos jovens no mundo do trabalho.1

(grifos nossos)

O foco das ONGs na juventude também pode ser associado, segundo Abramo (2005, p.24), à criação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, que colocou a questão da infância e da adolescência na Constituinte no final dos anos 1980 e promoveu o desenvolvimento de políticas e programas. De fato, o ECA tem sido o norteador dos

1 United Way Brasil. Missão e Valores. Disponível em: <http://www.unitedwaybrasil.org.br/

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programas desenvolvidos pelas ONGs. Através de levantamento com ONGs brasileiras no início de 1996, observou-se que

a maior parte dos programas desenvolvidos [...] para esse público tinham como foco os adolescentes em situação de risco e carência, e se estruturavam como serviços de atendimento de resgate e salvamento, com objetivos como: tirar meninos da situação de rua; dar reforço escolar; propiciar alguma geração de renda; promover a salvaguarda de direitos, buscando garantir a aplicação do ECA (ABRAMO, 2005, p.24).

Os serviços citados acima acabam se articulando em duas linhas principais: a educação alternativa e a organização comunitária. A primeira linha era fruto da preocupação com a juventude dos anos 90, que tinha problemas vinculados à crise econômica e social e, consequentemente, à dificuldade de inserção no mercado de trabalho, com taxas de desemprego altíssimas atingindo jovens na faixa etária dos 16 aos 24 anos (ABRAMO, 2005, p.24). Questões públicas como as doenças sexualmente transmissíveis, a AIDS, a violência, o uso de drogas, a gravidez precoce, o envolvimento de jovens na criminalidade e no narcotráfico fizeram que, ainda nos anos 1990, os jovens fossem vistos como “foco grave de problemas, para si próprios e para a sociedade,” privando-os de certos serviços e direitos. Já no início dos anos 2000, as ONGs buscavam desenvolver programas para mudar esse cenário, fazendo que os jovens pudessem “viver a juventude”, através de ações voltadas para a diminuição, o resgate ou a prevenção dos problemas causados pela vulnerabilidade social. Essas ações se davam, basicamente, nas áreas da saúde, educação e cultura, transformando os jovens de vítimas em atores sociais. As ONGs, as fundações e as empresas passam, então, ainda segundo Abramo, a apoiar iniciativas de protagonismo juvenil – os jovens atuando de maneira ativa em sua comunidade como agentes transformadores – e de empreendedorismo – jovens desenvolvendo atividades econômicas para gerar sua própria renda. Essas idéias irão definir os programas de organizações, conceituando o jovem como parte da solução, e não como parte do problema. A presença dos jovens é analisada por Costa (2007) em três níveis:

- o jovem como destinatário: os programas para jovens têm como suporte o Plano Nacional de Juventude, do projeto de Lei 4.530/2004 da Comissão Especial da Câmara dos

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Deputados, “que sintetiza o quadro da Educação Básica e Profissional e das condições de acesso dos jovens ao trabalho” (p. 187). Ao eleger a juventude carente brasileira como público-alvo, as ONGs elencam “diversas formas de transição entre o mundo da educação e o mundo do trabalho” (p.193);

- o jovem como interlocutor: os jovens participam ativamente no processo decisório de suas organizações, promovendo a liderança juvenil, o cooperativismo e o protagonismo juvenil (p.193-6);

- o jovem como parceiro: participação ativa dos jovens com seus educadores, promovendo a integração da comunidade, das famílias e da sociedade em geral (p.197-213).

Assim, as organizações que mantêm programas para a juventude atualmente consideram os jovens atores no processo de modificação social, consideram a diversidade desses atores juvenis, bem como suas demandas, e as diferentes formas de participação desses jovens na composição da pauta e das estruturas de formulação de políticas sociais (ABRAMO, 2005, p.28). O que nos interessa desse processo é o foco que a educação alternativa para jovens carentes tem na preparação ao mercado de trabalho, fato que também é compartilhado pelo curso de inglês do qual os jovens de nossa pesquisa participam. A preocupação com a formação profissional e com o mercado de trabalho é uma característica da pós-modernidade e da globalização, e pensamos que a questão assistencial das ONGs, nesse caso, acaba se voltando apenas para a geração de renda e para o incentivo à busca de um emprego. Sendo assim, o jovem que participa de um programa de educação é levado a pensar no êxito profissional como a solução de seus problemas. Em nossa pesquisa, investigamos se os jovens acreditam que o êxito se dê através da língua inglesa.

2.2 As ONGs e a Juventude no mundo globalizado

Um ponto a ser considerado nos programas assistenciais é a forma como as organizações articulam sua ajuda. A criação de programas de educação e formação

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profissional para os jovens é motivada, em grande parte, pela globalização e pela noção do jovem como um modelo de trabalhador do mundo pós-moderno. Nesse sentido, acreditamos que há diversos interesses envolvidos em um único programa assistencial. A exemplo de nosso programa, o fato de ele ser patrocinado por empresas multinacionais nos leva a crer que essas empresas acreditam na hegemonia da língua inglesa e perpetuam essa ideologia ao financiar um curso de inglês gratuito e ao ajudar a organização a divulgar essa iniciativa. O investimento de empresas internacionais no ensino de língua inglesa através de ONGs, apesar de ser rotulado como “assistencial”, não é feito de maneira imparcial, visando apenas o bem estar da comunidade ou do jovem. Qual empresa não quer ter sua marca ligada a ações sociais e educacionais? Financeiramente, esse tipo de auxílio é lucrativo: há isenções fiscais para empresas que fazem doações a instituições sociais e filantrópicas. Como discorre Saviani (2005),

Os dispêndios com educação passaram a ser considerados desejáveis, não apenas por razões sociais ou culturais, mas especificamente por motivos econômicos, e transformam-se num investimento de retorno ainda mais compensador do que outros tipos de investimento ligados à produção material. A educação passou, pois, a ser concebida como dotada de um valor econômico próprio e considerada um bem de produção (capital) e não apenas de consumo (SAVIANI, 2005, p.22)

Além disso, aproveitando a tendência de apenas consumir o que é “politicamente correto”, o público deverá preferir adquirir produtos de uma empresa que “ajuda” ONGs e que “investe” na educação de jovens pobres. As estratégias utilizadas pelas grandes empresas para a promoção de suas marcas e, consequentemente, mais vendas, são as mais variadas possíveis, além de serem uma marca característica do mercado competitivo globalizado da atualidade. Além disso, as ONGs também se aproveitam dessa “ajuda” como uma forma de se manterem financeiramente, promovendo iniciativas que acabam sendo mais comerciais do que assistenciais, uma vez que há um interesse econômico por trás das suas ações. Ou seja, às vezes a organização não deixa de ser uma empresa, no sentido comercial do termo, visando um lucro que não pode existir, conforme a definição de ONGs vista anteriormente, mas usando os programas assistenciais para a promoção de seu nome, ou de sua “marca”.

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Por outro lado, para que essa relação entre as ONGs que oferecem cursos profissionalizantes e as empresas que os patrocinam possa existir, é necessário que haja uma demanda desses cursos, a qual fica a cargo dos jovens. Primeiramente, a organização divulga e promove suas ações em locais de vulnerabilidade social alta ou, como é o caso da ONG analisada, em conjunto com organizações de base que atuam em comunidades carentes. As organizações encontram, então, o jovem que deve buscar um programa assistencial motivado pela sua própria condição social e pela busca da mudança dessa condição. Ao ter contato com a ONG, ele é apresentado a várias opções de cursos oferecidos ou programas já estabelecidos pela ONG. A escolha pelo curso de inglês ficaria a cargo do incentivo da ONG e da autopromoção do inglês, a “língua da globalização”, que é necessária ao trabalho. Adicione-se a isso o fato de que os jovens vivem num mundo globalizado e têm contato com diferentes culturas através da internet, por exemplo, usando a língua inglesa para efetivar esse contato. A sociedade globalizada faz com que eles desenvolvam uma noção de jovem trabalhador como o modelo perfeito de profissional, que tem formação profissional adequada, que trabalha com várias tarefas ao mesmo tempo e que fala uma língua estrangeira. Essa noção é sustentada pelas empresas, dado seu interesse na mão-de-obra, e pelos Aparelhos Ideológicos de Estado, nesse caso, a mídia e a escola, que atuarão através das ideologias na formação da identidade desses jovens. O jovem pós-moderno é o que muitos chamam de “cidadão do mundo”, pois não se limita às fronteiras físicas de seu local, mas, ao mesmo tempo, é marcado pelo modelo de jovem e de trabalhador estabelecido pela sua sociedade, e não impõe uma marca característica da sua juventude.

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LÍNGUA INGLESA: DISCUSSÕES SOBRE GLOBALIZAÇÃO E

IDENTIDADE

Neste capítulo, tecemos, primeiramente, algumas considerações a respeito da pós-modernidade, articulando nossa discussão em dois pontos: algumas considerações sobre identidade, diferença e o sujeito pós-moderno como base para a discussão sobre a globalização e o deslocamento das identidades; e o fenômeno da globalização como um elemento constituinte da (re)construção da(s) identidade(s) da juventude pós-moderna, sua influência no Brasil, mais especificamente, nos jovens brasileiros. A globalização, como uma das consequências da pós-modernidade (ou modernidade tardia, conforme alguns autores) e como sinônimo de imperialismo capitalista, vem sendo estudada com afinco no campo das Ciências Sociais, principalmente nos Estudos Culturais, e diversos são os estudiosos desse fenômeno. Tomamos os estudos de Hall (2000, 2001, 2003), Silva (2000), Woodward (2000) e Giddens (1991) como base para nossas considerações sobre identidade e globalização.

Num segundo momento, mas em diálogo constante com os estudos da primeira parte, falamos sobre a universalização da língua inglesa e as definições que lhe são atribuídas. Tida como representante do imperialismo econômico estadunidense e como a língua da globalização, a língua inglesa deve ser estudada como um fenômeno mundial e em sua relação com os aprendizes que, por sua vez, estão inseridos num mundo globalizado. Esse será o ponto norteador de nossas discussões. Para tanto, retomamos as discussões de Rajagopalan (2003, 2005, 2006, 2009), Rajagopalan e Silva (2004), Canagarajah (1999) e Pennycook (1996).

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3.1 Considerações sobre identidade e diferença

Estudar os conceitos de Identidade e Diferença é importante para nosso trabalho porque esses conceitos, além de participarem da discussão sobre os efeitos da globalização, também constituem o fundamento para a discussão sobre representação. Ao examinarmos os efeitos que a aprendizagem de língua inglesa tem sobre os aprendizes, devemos ter em mente que esse processo se dará principalmente no nível cultural e no nível social. De acordo com Woodward (2000, p.17), só “podemos compreender os processos envolvidos [nos sistemas de representação] se tivermos alguma idéia sobre quais posições-de-sujeito eles produzem e como nós, como sujeitos, podemos ser posicionados em seu interior.” A autora complementa que as práticas de significação e os sistemas simbólicos fazem parte da representação, e é por meio deles que os significados são produzidos e, assim, nos posicionam como sujeitos. Através dos significados produzidos pelas representações é que damos sentido à nossa experiência e àquilo que somos, pois são os sistemas simbólicos que possibilitam aquilo que somos e aquilo que podemos nos tornar – um ponto fundamental em nossa pesquisa. Discutimos, então, as questões de identidade e diferença como base para a próxima seção, sobre globalização, e voltamos a essas questões no capítulo 5, que traz a análise de dados.

Vejamos, inicialmente, três concepções de identidade, conforme Hall (2001, pp.10-13):

- do sujeito do Iluminismo: nessa concepção, o sujeito nascia com uma identidade central e essencial que se mantinha a mesma ao longo de sua existência. É uma concepção mais individualista do sujeito e de sua identidade, além de propor a fantasia da identidade completa, unificada, segura e coerente;

- do sujeito sociológico: nessa concepção, a identidade é formada na interação entre o eu e a sociedade, ou seja, a relação do sujeito com outras pessoas é importante para ele, pois medeiam os valores, símbolos e sentidos dos mundos que o sujeito vivia. Nessa concepção sociológica clássica da identidade, o sujeito ainda tem um núcleo ou essência interior, o eu real, mas ele é formado e modificado através do diálogo entre os mundos culturais

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exteriores e as identidades fornecidas por esses mundos. A crítica a esse pensamento provém do fato de que as identidades prendem o sujeito à estrutura, estabilizando seus mundos culturais e eles mesmos, tornando-os previsíveis e unificados;

- do sujeito pós-moderno: nessa concepção, o sujeito se torna fragmentado, composto por várias identidades, que podem ser contraditórias ou não-resolvidas, formadas e transformadas continuamente em relação às maneiras como somos representados. As identidades assumidas pelo sujeito em diferentes momentos são definidas historicamente, e não biologicamente, e elas são constantemente deslocadas. Elas serão modificadas ou trocadas na medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam. Essa última concepção é a mais adequada para nosso estudo e é a que mais condiz com o fenômeno da globalização que acontece na atualidade.

Nosso próximo passo é buscar definir os conceitos de identidade e diferença. De acordo com Silva (2000, p.74), Identidade é aquilo que se é: “sou brasileiro”, “sou judeu”, “sou homossexual”. Assim, a identidade tem características positivas e independentes, ela é autocontida e autossuficiente, um fato autônomo. A diferença, complementa Silva, também é entendida como uma entidade independente, mas ela é aquilo que o outro é: “ele é negro”, “ele é velho”, “ele é heterossexual”. A diferença também é autorreferenciada e remete a si própria. Porém, “identidade e diferença estão numa relação de estreita dependência” (SILVA, 2000, p.74). Cada uma das afirmações acima faz parte de uma cadeia de negativas de identidade, ou seja, de diferenças. Se digo “sou brasileiro”, devemos também ler isso como “não sou argentino”, “não sou inglês”, etc., numa relação quase infinita. Esse mesmo processo acontece com a diferença. Por esse motivo, identidade e diferença são inseparáveis, apesar de a identidade ser normalmente tida como referência ou como ponto original, graças à tendência de tomar o que somos como a norma. Silva, no entanto, parte da diferença como origem, uma vez que ela é entendida como “ato ou processo de diferenciação” (SILVA, 2000, p.76).

A identidade e a diferença são criações sociais e culturais na medida em que são ativamente produzidas e não são elementos naturais, ou seja, elas são fabricadas por nós no contexto das relações culturais e sociais nas quais estamos inseridos. Assim, elas são resultado de atos de linguagem, de criação linguística, e têm que ser nomeadas: quando eu

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digo “sou brasileiro”, eu também digo “não sou chileno”. Segundo Silva (2000, p.77), a “definição da identidade brasileira, por exemplo, é o resultado da criação de variados e complexos atos linguísticos que a definem como sendo diferente de outras identidades nacionais”. Além disso, falamos antes que a identidade e a diferença são elementos que só fazem sentido numa cadeia de negativas, e essa cadeia pode ser considerada uma cadeia de diferenciação linguística num processo que se assemelha ao conceito de signo linguístico definido por Saussure: o conceito de “vaca” só faz sentido numa cadeia infinita de conceitos que não são “vaca”. Jacques Derrida retoma esse conceito em sua crítica ao signo como um sinal, uma marca, um traço que está no lugar de outra coisa concreta ou abstrata, mas não coincide com essa coisa, ou seja, a coisa não está presente no signo. Derrida chama essa ilusão necessária de “metafísica da presença”: há uma promessa da presença da coisa no signo, uma presença que é indefinidamente adiada. É esse processo que marca a dependência do signo em relação a sua diferença, e que ocorre também com a identidade. Derrida, porém, adiciona a isso a idéia de traço: um signo carrega consigo, além do traço daquilo que ele representa, também um traço daquilo que ele não é. Ou seja, o signo é caracterizado pelo diferimento ou adiamento da presença e pela diferença relativa a outros signos, conforme o conceito de différance em Derrida (apud SILVA, 2000, pp.79 e 80). Nas falas dos jovens de nossa pesquisa, verificamos que o traço da identidade e da diferença estão marcados: “sou brasileiro”, “não sou estadunidense”. Porém, nos preocupamos em pensar a respeito do processo de aprendizagem (re)constituindo a(s) identidade(s) desses jovens: “sou brasileiro”, “não sou estadunidense”, mas tenho necessidade de falar a língua de um estadunidense.

Outra característica do processo de identificação e diferenciação é o poder. A relação entre a diferença e a identidade é uma relação social, ou seja, sua relação está sujeita a relações de poder e elas não convivem harmoniosamente, elas são disputadas, não só no nível do indivíduo, mas também no nível da sociedade. A identidade e a diferença não são simplesmente definidas, elas são impostas e nunca são inocentes. Assim, as definições de identidade e diferença serão utilizadas como atos de significação para confirmar a presença do poder e para definir fronteiras através de marcas de inclusão/exclusão (“os que pertencem” e “os que não pertencem”); de demarcação de

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fronteiras (“nós” e “eles”); de classificação (“bons e maus”, “impuros e puros”, “desenvolvidos e primitivos”, “racionais e irracionais”); e de normalização (nós somos normais, eles são anormais). Essa classificação binária se estrutura em duas classes polarizadas, e uma delas sempre será a positiva, em relação a uma negativa. Como critica Derrida, na relação “nós” e “eles”, por exemplo, não precisamos dizer qual é a carga positiva e qual é a negativa (SILVA, 2000, pp. 81-83).

A hierarquização das identidades e diferenças de acordo com as relações de poder leva a uma tendência à fixação de identidades que ocorre de diversas formas, de acordo com o contexto em discussão. Então, vemos que os mitos fundadores são formas de fixar a identidade nacional de determinado local, assim como a língua pode ter esse papel em determinada comunidade. Mas há um movimento contrário à fixação das identidades, que é chamado de hibridismo, um movimento de deslocamento e de cruzamento de fronteiras (SILVA, 2000, p. 86; HALL, 2001; WOODWARD, 2000). Uma das causas desse deslocamento nas identidades é a globalização, que traz mudanças globais na economia, cultura e política para o nível local, promovendo uma “crise de identidade”.

3.2 O fenômeno da globalização e suas consequências para as identidades

culturais.

Em sua discussão sobre modernidade, Giddens (1991, p.69) afirma que a “modernidade é inerentemente globalizante”, o que é evidente, considerando-se as características das sociedades modernas e sua ação de desencaixe e reflexividade. Se compararmos as sociedades mais antigas e as sociedades atuais, veremos que, na era moderna, o nível de distanciamento tempo-espaço é maior, e as relações entre formas sociais e eventos locais tornam-se “alongadas”.

Giddens considera que a “globalização se refere essencialmente a esse processo de distanciamento”, visto que as conexões entre diferentes regiões ou contextos sociais ocorrem pela superfície de nosso planeta como um todo (GIDDENS, 1991, p.69).

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A globalização, então, é definida como “a intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distância e vice-versa” (GIDDENS, 1991, p.69). Stuart Hall, citando Anthony McGrew, professor do Centro de Cidadania e Democracia da Universidade de Southampton, concorda que o termo “globalização” pode ser definido como o conjunto de: “processos, atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades e organizações em novas combinações de espaço-tempo, tornando o mundo, em realidade e em experiência, mais interconectado” (HALL, 2001, p. 67).

A respeito do início desse processo, num contexto sócio-histórico, concordamos com Mignolo que diz que a globalização teria tido seu marco inicial com a expansão ocidental após o ano de 1500, com a missão “civilizatória” cristã e eurocentrista (MIGNOLO, 2003, p.32), e as consequências desses processos globais são diversas e podem ocorrer nas esferas da vida econômica, política e social, alterando a idéia clássica de “sociedade” como um sistema bem delimitado por uma perspectiva que vê como a vida social está ordenada ao longo do tempo e do espaço, as relações “alongadas” que mencionamos antes.

Para Hall (2001), as consequências da globalização sobre as identidades culturais podem ser assim consideradas:

- A desintegração das identidades nacionais como resultado da homogeneização cultural e da globalização pós-moderna. Para alguns, a globalização ameaça exterminar as identidades e a unidade das culturas nacionais. No entanto, Hall acredita que há três contratendências a respeito desse pensamento: a primeira seria a de que a globalização traz consigo um interesse pela diferença e pelo local e, na verdade, promoveria a diferenciação local e a mercantilização da etnia e da “alteridade”. Então, não se deve pensar o global como uma substituição do local, mas uma articulação entre o global e o local que não provocará a destruição das identidades nacionais, mas irá produzir novas identificações globais e novas identificações locais. A segunda contratendência da homogeneização global das identidades seria a desigual distribuição da globalização pelo mundo, afetando diferentes estratos da

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população dentro das regiões, provocando uma “geometria do poder” da globalização. A terceira contratendência é que, devido a fatores históricos e econômicos, a globalização pode ser vista como um fenômeno exclusivamente Ocidental. De fato, as imagens, artefatos e as identidades da modernidade que dominam as redes globais são produzidos pelas sociedades ocidentais. Essa “ocidentalização” produz uma imagem do centro global como o protagonista das mudanças, e as periferias, como sujeitos e subalternos do mundo ocidental;

- O reforço das identidades nacionais e locais como uma resistência à globalização. Sempre houve uma tensão entre o global e o local na transformação das identidades, entre identificações nacionais, com vínculos a lugares, eventos, símbolos e histórias particulares, e identificações mais universalistas, como uma identificação maior com a humanidade do que com sua comunidade local. A tensão reside no fato de que o crescimento das economias locais, dos estados-nação e das culturas nacionais faz com que haja um foco maior nas identidades nacionalistas e locais, e até uma valorização do local. Porém, a expansão do mercado mundial e da modernidade como um sistema global pede um foco mais universal dessas mesmas economias, estados-nação e culturas nacionais para que participem do sistema global. Outro resultado da tensão seria uma reação defensiva dos membros étnicos dominantes ameaçados pela presença de outras culturas em sua localidade, provocando racismo cultural e de exclusão. Hall sugere que o ressurgimento do nacionalismo na Europa Oriental e o crescimento do fundamentalismo sejam exemplos dessas resistências à globalização;

- O declínio das identidades nacionais, com a criação de novas identidades híbridas em seu lugar. Por exemplo, comunidades menores que apreendem uma identidade dominante não se tornam essa outra identidade, mas a cultura dominante faz com que elas sejam vistas e tratadas como uma comunidade híbrida. Essa apreensão produz novas identidades que não anulam completamente a anterior, mas adiciona elementos de diferentes tradições culturais às mesmas pessoas, provocando um entrelaçamento de identidades diferentes. As identidades culturais que emergem por todo o mundo em conseqüência da globalização “não são fixas, mas que estão suspensas, em transição” (p. 88), retirando recursos de

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diferentes tradições culturais que são o resultado do contato com outras culturas que ocorre graças à globalização. Um exemplo desse processo dado por Hall é o de pessoas que foram dispersas para sempre de sua terra natal. Apesar de reterem fortes vínculos com seu local de origem e suas tradições, essas pessoas não têm a ilusão do retorno, sendo obrigadas a negociar com as novas culturas nas quais estão inseridas, sem serem assimiladas e sem perderem completamente suas identidades. Elas nunca serão unificadas no sentido tradicional do termo, dado que são produtos de várias histórias e culturas interconectadas. Essas pessoas, segundo Salman Rushdie (apud HALL, 2001, p. 89), são “traduzidas”, pois pertencem a dois mundos ao mesmo tempo.

O deslocamento das identidades afeta todos num nível global e acaba tornando indivíduos de cada localidade cidadãos do mundo, modificando seu espaço e o espaço do seu outro. Os jovens participantes de nosso estudo, por exemplo, demonstraram ter o desejo de falar inglês para ter contato com novas culturas, de cuja existência eles souberam graças à internet e à globalização das informações. Sobre isso, podemos destacar as três escolas de pensamento a respeito da globalização cultural, de acordo com Kumaravadivelu (2008, pp.132-134):

- Barber, Ritzer e outros que acreditam que a cultura norte-americana de consumo constitui o centro dominante da homogeneização cultural que ocorre através da globalização. Ritzer (1993) criou o termo “mcdonaldinação” para descrever os “processos socioculturais pelos quais os princípios básicos da indústria de comida rápida – a criação de produtos de consumo homogeneizado e a imposição de padrões uniformes – dão forma à paisagem cultural dos Estados Unidos e de outras partes do mundo”. (apud KUMARAVADIVELU, 2008, p.132) Para eles, as ideias do individualismo e do consumismo norte-americano circulam mais livremente e são mais bem aceitas pelo fato de vermos jovens usando calças Levi‟s, tênis Nike, bonés de times de beisebol; jovens que assistem a videoclipes de música da Music Televison (MTV) e aos sucessos de Hollywood; e que comem nas redes McDonald‟s e Pizza Hut em todas as partes do mundo. Kumaravadivelu também aponta as empresas norte-americanas, como At&T, Sony, Disney, General Electric, entre outras,

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como responsáveis por mais de dois terços da renda anual mundial na indústria de comunicação;

- Giddens e Tomlinson, que acreditam que há certa heterogeneização cultural global pelo fortalecimento da cultura local e das identidades religiosas. Para eles a imagem que se tem hoje em dia é a de um mundo em descontrole, com a globalização se tornando cada vez mais descentrada, e sugerem que o “reverso da colonização” está acontecendo se pensarmos na latinização da área de Los Angeles, nos Estados Unidos; na produção de alta tecnologia na Índia; e na distribuição de novelas brasileiras em Portugal. Eles também apontam o fundamentalismo religioso como produto da tensão no mundo globalizado – como já discutimos antes. Apesar de indicarem o declínio da força do Ocidente, eles reconhecem sua hegemonia e sua posição de “dirigentes do desenvolvimento cultural global”;

- Appadurai, Robertson e outros, que apontam a tensão entre a homogeneização cultural e a heterogeneização cultural, que ocorrem ao mesmo tempo, resultando num processo chamado por Robertson de “glocalização”: o local está globalizado, e o global está localizado; o global está em conjunção com o local, e o local é modificado para acomodar o global. Eles apontam a micromercantilização como um exemplo de glocalização, que seria a modelação de produtos para se adequar às exigências étnicas, culturais e religiosas, como a remodelagem do cardápio da rede McDonald‟s por todo o mundo, servindo comida

kosher em Israel, de acordo com os preceitos do judaísmo; comida halal em países

islâmicos, seguindo as restrições que estão no Corão; e comida vegetariana na Índia, onde a maioria da população não come carne.

A terceira escola, no entanto, alerta para o fato de que os educadores devem preparar seus alunos para o desafio da globalização cultural, buscando alternativas para enfrentar o mundo globalizado. Além de concordar com eles, Kumaravadivelu (2008, p. 135) chama a atenção dos linguistas aplicados para a língua inglesa, que se tornou a “lingua

franca do mundo”. Para o autor, além de termos que lidar com a língua inglesa como uma

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linguístico. Concordamos que uma forma de se integrar à economia globalizada é através da língua inglesa e que a aprendizagem de inglês como LE tornou-se uma necessidade constante hoje em dia, fazendo parte da vida de todas as pessoas, principalmente dos jovens. Mas, indagamos, nesse ponto, como nós, linguistas aplicados, podemos tratar disso, quando nos deparamos com um grupo de jovens em situação de vulnerabilidade social que aprende inglês num programa de uma organização norte-americana patrocinada por empresas norte-americanas?

3.3 Globalização, identidade e aprendizagem de língua inglesa.

A língua inglesa está no centro da discussão da globalização. O mundo está mais globalizado do que nunca graças, principalmente, à comunicação entre os participantes desse processo, que se dá, na maioria das vezes, em inglês. A língua inglesa é hoje mais usada por falantes não-nativos do que por falantes nativos – cerca de 80% das interações não envolvem os nativos (SEIDLHOFER, 2003). O problema maior que a língua inglesa enfrenta é sua associação ao imperialismo econômico dos Estados Unidos, que teve maior avanço principalmente depois da Segunda Guerra Mundial. Discutimos, então, a questão da língua inglesa como língua da globalização, o fenômeno World English, a influência dessa discussão e sua relação com a juventude brasileira.

Geopoliticamente, como nos diz Jean-Marie Le Breton (2005), a língua inglesa está presente em todos os lugares do mundo de duas maneiras: como língua materna e como língua não-materna. No entanto, devemos considerar sua atuação nos países do mundo todo de maneiras diferentes, fazendo uma nova divisão em quatro núcleos:

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- o primeiro núcleo é composto por países que têm o inglês como sua língua materna. Os principais países desse núcleo são o Reino Unido, os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália, a Nova Zelândia e a África do Sul;

- o segundo núcleo é composto em sua maioria por ex-colônias britânicas e não tem o inglês como língua materna, pelo menos para a maioria de sua população. Mas, nesses países, o inglês é considerado língua do poder nos negócios, nas instituições políticas, no comércio, na indústria e na cultura. É o caso do Paquistão, de Bangladesh e da Índia. Nesse núcleo também estão os países que mantiveram a língua inglesa mesmo após sua independência, como alguns países da África;

- o terceiro núcleo é composto por países que não foram colônias britânicas, mas que entraram em sua órbita de influência, como a China, o Egito, e alguns países do Golfo Pérsico;

- o quarto núcleo é composto por países que são completamente independentes da Inglaterra, mas, por terem uma língua pouco difundida, utilizam o inglês como língua de comunicação com o exterior. Países como a Holanda e os países escandinavos têm uma língua estabelecida, porém pouco difundida internacionalmente, por isso lançam mão do inglês. Mas, nesse núcleo, devemos pensar em países cuja língua é de grande difusão, como o árabe, o português e o espanhol, mas que cada vez mais se valem do inglês como segunda língua. Incluímos o Brasil nesse grupo.

O francês teve seu lugar como língua internacional até o final do século XIX e começou a disputar o seu lugar com o inglês desde o início do século XX. O bilinguismo dessas duas línguas é marca característica dessa época, no que diz respeito a tomadas de decisões que afetariam o mundo, como o Tratado de Versalhes, que foi assinado tanto em inglês quanto em francês. Porém, após a Segunda Guerra Mundial, o inglês não parou de se difundir, principalmente através do avanço e da influência política e cultural dos Estados Unidos. A difusão mundial de equipamentos americanos levou consigo a difusão da língua inglesa para que seus operadores entendessem o modo de operar dessas máquinas. Com a abertura de fábricas americanas em diversos países, a necessidade de “aprender inglês” tornou-se uma obrigação, mesmo na Europa. O progresso na aviação e o desenvolvimento

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do turismo também se tornaram motivadores da difusão da língua inglesa (LACOSTE, 2005, p.10).

De maneira indireta, a difusão do inglês também acontece, segundo Yves Lacoste (2005), principalmente por meio de fenômenos culturais de certa forma associados uns aos outros como os filmes e a música, que contribuem para a perpetuação no mundo de tudo o que é americano por meio do cinema, do rádio, da televisão e da internet. Além da cultura de massa, o inglês tem uma posição dominante nos setores da pesquisa científica e da comunicação. De fato, os avanços tecnológicos e na comunicação são relacionados com a língua inglesa – ela “se impõe como a língua da inovação” (LE BRETON, 2005, p.23). Desse modo, empresas que antes se viam apenas como monolíngues passam a adotar uma política bilíngue dentro de seus departamentos, fazendo que seus funcionários tenham que se adaptar às mudanças e à nova língua. Assim, aprender inglês passa a ser uma forma de promoção, de aumento de salário e de ascensão profissional. Esse ponto é fundamental para analisar o discurso dos jovens participantes do curso, que afirmam a necessidade do inglês para ter um “bom emprego”.

A influência global da língua inglesa traz consigo pontos que precisam de uma reflexão maior. Como vimos na seção anterior, há o deslocamento de identidades por causa da globalização, gerando ou o fortalecimento das identidades nacionais ou uma nova identidade híbrida. Isso se refletirá na identidade linguística, que também terá mudanças em decorrência da influência da língua inglesa. Rajagopalan (2003, p. 59) comenta que “nunca na história da humanidade a identidade linguística das pessoas esteve tão sujeita como nos dias de hoje às influências estrangeiras”. Para o autor, nossas vidas são invadidas a cada dia por informações provenientes de fontes de todos os tipos, algumas bem-vindas, outras nem tanto, principalmente pela Internet, que nivelou o acesso às informações, grande parte das quais estão em língua inglesa. Alguns estudiosos, preocupados com as consequências desse avanço nas línguas do mundo todo, criaram termos como “genocídio linguístico”, “glotofagia”, “linguicídio”, “canibalismo linguístico”, entre outros (RAJAGOPALAN, 2003, p. 61). Contudo, vemos como a identidade linguística do cidadão do mundo reage à influência do inglês através dos exemplos de resistência e enfrentamento. Canagarajah (1999) fala sobre os focos de resistência formados no mundo todo, principalmente nas

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