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Territorialidade dos flanelinhas/guardadores de carros: discussões sobre a apropriação do espaço público nos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA. TERRITORIALIDADE DOS FLANELINHAS/GUARDADORES DE CARROS: DISCUSSÕES SOBRE A APROPRIAÇÃO DO ESPAÇO PÚBLICO NOS BAIRROS CIDADE ALTA, PETRÓPOLIS E TIROL DE NATAL-RN. CLÁUDIA EUGÊNIA LOPES DA SILVA. NATAL-RN 2017.

(2) CLÁUDIA EUGÊNIA LOPES DA SILVA. TERRITORIALIDADE DOS FLANELINHAS/GUARDADORES DE CARROS: DISCUSSÕES SOBRE A APROPRIAÇÃO DO ESPAÇO PÚBLICO NOS BAIRROS CIDADE ALTA, PETRÓPOLIS E TIROL DE NATAL-RN. Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de PósGraduação e Pesquisa em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Anelino Francisco da Silva. NATAL-RN 2017 1.

(3) Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA. Silva, Claudia Eugenia Lopes da. Territorialidade dos flanelinhas/guardadores de carros: discussões sobre a apropriação do espaço público nos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN / Claudia Eugenia Lopes da Silva. - 2017. 123f.: il. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-graduação e Pesquisa em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Anelino Francisco da Silva. 1. Espaço público. 2. Territorialidade. 3. Flanelinhas/guardadores de carros. 4. Apropriação. 5. Natal (Rio Grande do Norte). I. Silva, Anelino Francisco da. II. Título. RN/UF/BS-CCHLA. CDU 341.221(813.2). 2.

(4) COMPOSIÇÃO DA BANCA DE DEFESA DA DISSERTAÇÃO. PROF. DR. ANELINO FRANCISCO DA SILVA Orientador. PROF. DR. JOSÉ ERIMAR DOS SANTOS Membro. PROF. DR. JOSÉ LACERDA ALVES FELIPE Membro. 3.

(5) À minha família, que sempre me deu força, coragem e um apoio incondicional em todos os momentos. Amo vocês! 4.

(6) AGRADECIMENTOS. Primeiramente a Deus, por mais uma realização e por derramar tantas bênçãos e maravilhas em minha vida! Por ser minha fortaleza nos momentos de dificuldade e minha luz nos momentos de incerteza. Agradeço pelo dom da vida e pela graça da saúde e coragem para seguir firme na caminhada, mesmo diante dos obstáculos e dificuldades, tornando, assim, o meu fardo mais leve. Aos meus pais, que sempre foram os meus maiores incentivadores. Vocês são os meus maiores exemplos! Obrigada por acreditarem em mim, e mais que isso, por possibilitar a minha dedicação integral aos estudos e por me permitir alcançar conquistas como esta. Obrigada pela torcida, pelas palavras de carinho, conforto e encorajamento. Pela companhia nas noites em claro, por toda preocupação, pelo apoio, carinho, amor... Pela fé depositada em mim! Não há palavras para descrever minha gratidão e o meu amor por vocês. A minha irmã, Heloisa, por toda ajuda, pelo apoio, por torcer e vibrar com as minhas conquistas... Orgulho-me de ser sua irmã e agradeço pelo orgulho que sei que também tens de mim. Ao meu namorado, amigo e companheiro de todas as horas, Igor, por todos os momentos compartilhados. Agradeço por ter tido você junto a mim em mais essa etapa de nossas vidas. Mais uma conquista juntos! Obrigada pela imensa ajuda e pela compreensão. Pelos momentos de carinho, amor e afeto, que tornaram a caminhada mais leve. Agradeço pelo incentivo, pela cumplicidade e, principalmente, por acreditar em mim. (Amo você!) A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), pela formação de qualidade e por todas as oportunidades concedidas. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela oportunidade e pelo auxílio durante o desenvolvimento da pesquisa. Ao meu orientador, o Professor Dr. Anelino Francisco da Silva, pela acolhida, por todos os diálogos, pela solicitude, pela paciência, por me proporcionar experiências enriquecedoras e por conduzir essa orientação e nossa pesquisa com tanta tranquilidade. Agradeço pelas ricas contribuições, pela atenção, pela amizade e pela confiança depositada.. 5.

(7) A minha turma, por todos os momentos compartilhados durante esses dois anos. A todos os professores, desde a educação básica até aqui, que contribuíram de forma positiva com a minha formação. Por fim, não há como listar o nome de todas as pessoas que fazem parte dessa conquista. Agradeço a todos que direta ou indiretamente contribuíram para minha formação acadêmica, profissional e pessoal e a todos que torceram e vibraram com mais essa vitória.. 6.

(8) A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu, mas pensar o que ninguém ainda pensou sobre aquilo que todo mundo vê. (Arthur Schopenhauer) 7.

(9) RESUMO Atualmente, é cada vez mais evidente a presença de flanelinhas/guardadores de carros na paisagem urbana das cidades brasileiras. Esses sujeitos se apropriam de parcelas do espaço público, definindo seu uso e organização, com o intuito de exercer uma atividade que lhes garanta renda. Encontram nesta atividade, uma maneira de subsistência (no trabalho por conta própria), que se realiza no âmbito do setor informal da economia urbana. Como decorrência dessa apropriação do espaço público, verificamos o desencadeamento de diversos conflitos de ordem social, econômica, política e cultural. Nesse sentido, este trabalho objetiva analisar a territorialidade expressa pelos flanelinhas/guardadores de carros através da apropriação de parcelas do espaço público dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN. Essa reflexão pauta-se na discussão acerca dos conceitos de espaço, território e territorialidade, entre outros elementos teóricos que dão suporte à compreensão da dinâmica espacial estabelecida por estes sujeitos no espaço público.. Leva. em. consideração. a. influência. e. controle. que. os. flanelinhas/guardadores de carros têm sobre o espaço apropriado, a organização que os mesmos estabelecem no seu território, bem como os conflitos instituídos entre os sujeitos que atuam nessa atividade e os demais indivíduos afetados por esta. Para o desenvolvimento da pesquisa, realizaram-se alguns procedimentos teórico-metodológicos, como: revisão bibliográfica (sobretudo a partir de Sack (1986), Raffestin (1993), Haesbaert (1997, 1999, 2007), Saquet (2009, 2011, 2015), Valverde (2007), Albagli (2004), Idalino (2012), Cacciamali (1982, 2000), Araújo (2009), Freire (2005), Fernandes (2005, 2009), dentre outros); pesquisa de campo (observação e realização de entrevistas estruturadas), pesquisa documental e produção fotográfica. Tais procedimentos nos possibilitaram compreender que a territorialidade dos flanelinhas/guardadores de carros dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN se constitui de materialidades e imaterialidades que podem ser percebidas a partir das formas de apropriação, organização, influência e controle que estes sujeitos estabelecem no seu território.. Palavras-chave: territorialidade; flanelinhas/guardadores de carros; apropriação; espaço público; Natal-RN.. 8.

(10) ABSTRACT. Nowadays, the presence of flanelinhas/car keepers in the urban landscape of Brazilian cities is increasingly evident. These subjects appropriated portions of the public space, defining their use and organization, in order to exercise an activity that guarantees them income. They find in this activity a way of subsistence (in selfemployment), which takes place within the informal sector of the urban economy. As a consequence of this appropriation of the public space, we have seen the unleashing of various conflicts of a social, economic, political and cultural order. In this sense, this work aims to analyze the territoriality expressed by flanelinhas/car keepers through the appropriation of portions of the public space of the Cidade Alta, Petrópolis and Tirol districts of Natal-RN. This reflection is based on the discussion about the concepts of space, territory and territoriality, among other theoretical elements that support the understanding of the spatial dynamics established by these subjects in the public space. It takes into account the influence and control that the flanelinhas/car keepers have on the appropriate space, the organization that they establish in their territory, as well as the conflicts established between the subjects that work in this activity and the other individuals affected by it. For the development of the research, some theoretical and methodological procedures were carried out, such as: bibliographical review (mainly from Sack (1986), Raffestin (1993), Haesbaert (1997, 1999, 2007), Saquet (2009, 2011, 2015), Valverde (2007), Albagli (2004), Idalino (2012), Cacciamali (1982, 2000), Araújo (2009), Freire (2005) and Fernandes (2005, 2009). Field research (observation and application of structured interviews), documentary research and photographic production. These procedures enabled us to understand that the territoriality of the flanelinhas/car keepers of the Cidade Alta, Petrópolis and Tirol districts of Natal-RN is constituted of materialities and immaterialities that can be perceived from the forms of appropriation, organization, influence and control that these subjects establish Territory. Keywords: Territoriality. Flanelinhas/Car keepers. appropriation. Public space. NatalRN.. 9.

(11) LISTA DE FOTOGRAFIAS. Fotografia 1. Fotografia 2. Fotografia 3. Fotografia 4. Meio de transporte e objetos pessoais do flanelinha/guardador de carros na Rua Campos Sales (Tirol) Instituto de radiologia localizado entre a Avenida Afonso Pena e a Rua Jundiaí (Tirol): apontado como um dos estabelecimentos que promove elevada rotatividade de automóveis nas proximidades da sua localização. Cardioclínica localizada na Rua Jundiaí (Tirol): apontado como um dos estabelecimentos que promove elevada rotatividade de automóveis nas proximidades da sua localização. Espaço público da Rua Rodrigues Alves (Petrópolis) constituído por área de estacionamento e amenidades (árvores-sombra).. 77. 77. 78. 79. Fotografia 5. Instalação clandestina e improvisada de água em 79 espaço público da Rua Campos Sales (Tirol).. Fotografia 6. Espaço público amplo na Rua Afonso Pena (Petrópolis) 80 destinado a estacionamento.. Fotografia 7. Caçamba de lixo demarcando limite do território de 83 flanelinha/guardador de carros na Rua Jundiaí (Tirol).. Fotografia 8. Poste demarcando limite do território de 83 flanelinha/guardador de carros da Rua Jundiaí (Tirol).. Fotografia 9. Flanelinha/guardador de carro em seu território na Rua 84 Floriano Peixoto (Petrópolis). Fotografia 10. Objetos que remontam a presença flanelinha/guardador de carros neste espaço.. Fotografia 11. Fotografia 12. Fotografia 13. Fotografia 14. Fotografia 15. do. Amenidade presente em território de flanelinha/guardador de carros na Rua Afonso Pena (Tirol). Flanelinha/guardador de carros recebendo “pagamento” pela utilização de seu serviço e de vaga de estacionamento no seu território na Rua Coronel Bezerra (Cidade Alta). Território de flanelinha/guardador de carros delimitado a partir da apropriação de espaço público destinado a estacionamento na Rua Jundiaí (Tirol). Flanelinha/guardador de carros vigiando os carros estacionados em seu território na Avenida Afonso Pena (Tirol). Flanelinha/guardador de carros auxiliando na manobra de um carro para estacionar em seu território na Rua Floriano Peixoto (Petrópolis).. 85 103. 104. 105. 106. 106 10.

(12) Fotografia 16. Flanelinha/guardador de carros lavando carro em seu 107 território na Rua Açu (Tirol).. Fotografia 17. Flanelinha/guardador de carros presente e vigilante em 108 seu território na Rua Floriano Peixoto (Petrópolis).. Fotografia 18. Flanela e cadeira remetendo a presença flanelinha/guardador de carros na Rua Açu (Tirol).. de. 108. 11.

(13) LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1. Percentual de trabalhadores empregados com carteira assinada (ou militares e estatuários), segundo os anos de estudo – 2000.. 45. Gráfico 2. Faixa etária dos flanelinhas/guardadores de carros. 72. Gráfico 3. Participação na renda familiar. 73. Gráfico 4. Grau de instrução dos flanelinhas/guardadores de carros. 73. Gráfico 5. Tempo na atividade de flanelinha/guardador de carros. 74. Gráfico 6. Atribuição à escolha pela flanelinha/guardador de carros. Gráfico 7. Atribuição à escolha da área para desenvolvimento da atividade de flanelinha/guardador de carros. 81. Gráfico 8. Posicionamento dos condutores a respeito da atividade dos flanelinhas/guardadores de carros. 87. atividade. de. 75. 12.

(14) LISTA DE MAPAS. Mapa 1. Mapa 2 Mapa 3. Localização dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, com destaque para as ruas que compõem nosso lócus de pesquisa. Quantidade de estabelecimentos, por tipologia, nos bairros de Natal-RN Concentração e distribuição dos flanelinhas/guardadores de carros dos/nos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN. 20. 21 101. 13.

(15) LISTA DE TABELAS Tabela 1 Tabela 2 Tabela 3 Tabela 4. Densidade demográfica dos munícipios que compõem a região metropolitana de Natal-RN - 1970/2000. Densidade dos tipos socioespaciais em relação às categorias sócio-ocupacionais em Natal-RN e região metropolitana – 2000. Indicadores do mercado de trabalho de Natal-RN (1991/2000). Pessoas com 10 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência da pesquisa (censo 2000) por posição na ocupação e grupos de anos de estudo.. 38 41 43 44. 14.

(16) LISTA DE SIGLAS. ASG – Auxiliar de Serviços Gerais DENATRAN – Departamento Nacional de Trânsito DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos DP – Delegacia de Polícia DRT – Delegacia Regional do Trabalho FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia Estatística SEADE – Sistema Estadual de Análise de Dados SEMOB – Secretaria de Mobilidade Urbana SEMTHAS – Secretaria Municipal de Trabalho, Habitação e Assistência Social. 15.

(17) SUMÁRIO. 1 INTRODUÇÃO. 18. 2 FLANELINHAS/GUARDADORES DE CARROS NO ESPAÇO PÚBLICO: PRESSUPOSTOS DO SURGIMENTO DA ATIVIDADE NO CONTEXTO SOCIOECONÔMICO E POLÍTICO DAS CONDIÇÕES E RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL. 29. 2.1 Precarização das condições e relações de trabalho no Brasil – (1970 a 1990). 30. 2.2 Setor informal da economia urbana: um abrigo para os trabalhadores por conta própria. 34. 2.3 O contexto do mercado de trabalho de Natal-RN. 38. 2.4 A regulamentação e criminalização da atividade dos flanelinhas/guardadores de carros. 47. 3 DO ESPAÇO AO TERRITÓRIO: SOBRE O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO ESPACIAL. 53. 3.1 Espaços públicos: da origem à definição da noção. 58. 3.2 O espaço público na perspectiva das Ciências Sociais e da Geografia. 63. 3.3 Apropriação de parcelas do espaço público dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN por flanelinhas/guardadores de carros. 71. 3.3.1 Perfil dos flanelinhas/guardadores de carros que se apropriam de parcelas do espaço público dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN 73 3.3.2 Características da apropriação de parcelas do espaço público dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN pelos flanelinhas/guardadores de carros. 76. 4 TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE: SOBRE AS DINÂMICAS TERRITORIAS E ESTRATÉGIAS DE INFLUÊNCIA E CONTROLE NO TERRITÓRIO. 90 16.

(18) 4.1 Território e relações de poder. 91. 4.2 Influência e controle no território: sobre a definição e teoria da territorialidade humana. 95. 4.3 A configuração e organização territorial dos flanelinhas/guardadores de carros dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN 100 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. 112. REFERÊNCIAS. 114. APÊNDICE A. 119. APÊNDICE B. 121. ANEXO A. 122. ANEXO B. 123. 17.

(19) 1 INTRODUÇÃO Diariamente milhares de pessoas circulam em seus automóveis pelo centro das cidades brasileiras, por motivos diversos, como: ida ao trabalho, realização de negócios, compras, lazer, entre outros. As áreas centrais e/ou aquelas que apresentam uma grande quantidade de serviços e de estabelecimentos comerciais são sempre áreas que atraem e concentram essa circulação. Dessa forma, quando transitamos por esses locais, por diversas vezes encontramos dificuldades para estacionar devido à grande quantidade de automóveis e à precária e/ou inadequada estrutura e organização das vias públicas no que tange às vagas. de. estacionamento. Não bastasse isso, nos deparamos, ainda, com outra situação (que acaba por agravar a problemática): a apropriação de áreas nas vias públicas por flanelinhas/guardadores de carros 1 - sujeitos que se apropriam de parcelas do espaço público com intuito de exercer uma atividade que lhes garanta renda. Grande parte desses sujeitos se concentra no centro das cidades, ou em outros espaços que comportem um relevante número de serviços bem consolidados e de estabelecimentos comerciais, devido à dinâmica suscitada por estes locais que proporcionam a eles, tendo em vista a atividade que exercem2, auferir maior renda, visto que essa atividade está diretamente ligada à circulação de pessoas em seus automóveis. Essa forma de utilização do espaço público, caracterizada pela ação dos flanelinhas/guardadores de carros, que se apropriam de áreas nas vias públicas e nelas definem suas próprias regras e normas, tem sido alvo de diversos conflitos com as pessoas que fazem uso destes espaços, pois estas se dizem “obrigadas” a pagar por um “serviço” não solicitado, por medo de sofrer algum tipo de retaliação por parte do flanelinha/guardador de carros. Ou seja, ao utilizar o espaço público – gerido pelo Estado e de uso livre pela sociedade – faz-se necessário o pagamento de uma “contribuição”, gorjeta ou, em muitos casos, valor fixado pelos flanelinhas/guardadores de carros. 1. O termo “flanelinha” advém do objeto simbólico de representação deste grupo: um “certo tecido de lã” denominado “flanela”, e remete-se a “pessoa que, em troca de gorjeta, vigia veículos estacionados nas ruas”. (FERREIRA, 2010, p. 353). 2 Os flanelinhas/guardadores de carros apontam vagas para os condutores, manobram e/ou auxiliam na baliza dos automóveis, vigiam e lavam os carros, além de prestarem tantos outros serviços para as pessoas que transitam em seus automóveis nas imediações de sua ação.. 18.

(20) Nessa perspectiva, percebemos a relevância do estudo da territorialidade dos flanelinhas/guardadores de carros, quando verificamos a presença, cada vez mais crescente destes sujeitos no cenário das cidades brasileiras e, sobretudo, quando observamos a dinâmica cotidiana estabelecida no espaço público entre estes sujeitos e aqueles afetados por esta atividade, pois trata-se de uma dinâmica de caráter dual – ora negativa, ora positiva – que varia de acordo com inúmeros fatores, dentre eles a originalidade do grupo, que está intimamente relacionada à intensão por trás da ação desses sujeitos. Isto porque, por se tratar de um grupo que se encontra à margem da sociedade, ou seja, um grupo social excluído, os flanelinhas/guardadores de carros são muitas vezes discriminados pela sociedade da qual fazem parte, diante de um estereótipo de criminalidade, visto que vez ou outra a imprensa noticia a prática de delitos e furtos por “flanelinhas/guardadores de carros” (anexo A). Aliado a isso, outro fator que contribui para esta condição é o fato de criminosos. e. vândalos. se. aproveitarem. do. discurso. dos. “verdadeiros”. flanelinhas/guardadores de carros, na condição de “trabalhadores”, para se denominarem muitas vezes como “flanelinhas/guardadores de carros”, porém com outras motivações e interesses – cometer crimes como: extorsão, roubo, vandalismo, agressão, entre outros. Isto porque, apesar da atividade ser embasada pelo decreto nº 79.797, de 8 de junho de 1977, que regulamenta o exercício das profissões de guardador e lavador autônomo de veículos automotores, a que se refere a lei nº 6.242, de 23 de setembro de 1975 e dá outras providências (SOLEIS, 2015), não há uma fiscalização efetiva. Por outro lado, acreditamos que, mesmo não possuindo respaldo nas leis trabalhistas. e. se. apropriando. de. espaços. públicos,. os. “verdadeiros”. flanelinhas/guardadores de carros acabam, por vezes, contribuindo de forma positiva para o bom funcionamento do espaço público, uma vez que organizam o território, exercendo um papel que cabe ao Estado, mas que é, por vezes, negligenciado ou inadequadamente executado. Assim, em certa medida, beneficiam as pessoas que fazem uso deste espaço cotidianamente ou, pelo menos, minimizam as dificuldades encontradas pelos condutores de automóveis diante da precariedade estrutural das vias públicas.. 19.

(21) A escolha dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN como dimensão empírica do nosso estudo (mapa 1), decorre do fato destes apresentarem uma presença maciça de flanelinhas/guardadores de carros e por apresentarem características semelhantes e de fundamental importância para a atividade destes sujeitos, principalmente a grande quantidade de estabelecimentos comerciais e de serviços, a presença de diversos órgãos e estabelecimentos públicos, de esfera municipal, estadual e federal, dentre outros (mapa 2), os quais suscitam a característica primordial para a atividade destes sujeitos: a intensa circulação de pessoas em seus automóveis e parada momentânea nestes espaços. Além disso, esses bairros estão interconectados por importantes vias e avenidas da cidade que cortam seus territórios. Desse modo, se constituem como uma das principais áreas de atração e interesse dos flanelinhas/guardadores de carros da/na cidade.. 20.

(22) Mapa 1: Localização dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, com destaque para as ruas que compõem nosso lócus de pesquisa.. Fonte: Pesquisa de Campo, 2016. Elaboração cartográfica: Cláudia Silva e Luiz Perônico, 2017.. 21.

(23) Mapa 2: Quantidade de estabelecimentos, por tipologia, nos bairros de Natal-RN. Fonte: CNEFE, 2010. Elaboração cartográfica: Cláudia Silva e Luiz Perônico, 2017.. 22.

(24) Com base no mapa 2, percebemos que o bairro Cidade Alta se destaca, principalmente pelo elevado número de bancos e serviços financeiros, além dos estabelecimentos comerciais e de serviços diversos. Enquanto isso, Petrópolis e Tirol se destacam pela elevada concentração dos serviços de saúde da cidade em seu território. Dessa forma, esses bairros apresentam um considerável fluxo de capital, pessoas e veículos, posto que tratam-se de lugares de trabalho, realização de negócios, serviços, compras, entre outros. Contudo, a expansão e o crescimento dos referidos bairros não têm acontecido em consonância com a aplicação de investimentos, por parte do poder local, em infraestruturas que atendam à dinâmica lhes suscitada. Com isso, estes bairros apresentam diversos problemas relacionados à intensa circulação de pessoas e veículos em seu território, dentre os quais destacamos os problemas referentes às vagas de estacionamento e ao transporte público urbano. De acordo com dados do Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN), em 2001 a Cidade de Natal-RN possuía uma frota de 100.988 automóveis. Em 2004 eram 116.884. Já em 2010 esse número subiu para 171.467 e em 2016 já somavam 218.403. automóveis.. Ou. seja,. em. 15. anos,. houve. um. aumento. de,. aproximadamente, 53,76% na frota de automóveis de Natal-RN. Até dezembro de 2016, os automóveis que circulavam na cidade de Natal somavam quase a metade (42,80%) do total de automóveis de todo o Rio Grande do Norte, que corresponde a 489.097. Em contrapartida, a quantidade de ônibus e micro-ônibus circulando em Natal era de, respectivamente: 1.448 e 983 em 2001; 1.681 e 993 em 2004; 2.142 e 1106 em 2010; e 2.622 e 1.322 em 2016. Ou seja, em 15 anos houve um aumento de, aproximadamente, 44,77% na quantidade de ônibus e 25,64% no número de micro-ônibus de Natal (DENATRAN, 2016). Assim, podemos considerar que esse aumento considerável da frota de automóveis de Natal-RN a cada ano, deve-se, em parte, à ineficiência e/ou precariedade do sistema de transporte público local, tanto pela questão de números de veículos quanto pela qualidade destes. Isto porque, apesar do relativo crescimento da frota de ônibus e micro-ônibus a cada ano, este ainda não supre, satisfatoriamente, a dinâmica cotidiana da cidade, o que, por sua vez, intensifica o sentimento de necessidade do automóvel particular e, consequentemente, ocasiona. 23.

(25) esse grande fluxo de automóveis nos bairros mais movimentados da cidade, como é o caso de Cidade Alta, Petrópolis e Tirol. Apesar desse aumento da frota e do fluxo de automóveis nestes bairros, não se verifica investimentos significativos, seja no sistema de transporte público, para diminuir a quantidade de automóveis que circulam pela cidade, seja no ordenamento territorial destes bairros, que apresentam diversas ruas e avenidas exclusivas para a circulação de veículos, porém não apresentam um satisfatório número de espaços reservados a estacionamentos, sejam públicos ou privados, o que faz com que na hora de estacionar os automóveis, os condutores encontrem bastante dificuldade. Nesse contexto, os flanelinhas/guardadores de carros se aproveitam dessa dificuldade que os condutores de automóveis enfrentam cotidianamente, para exercer uma atividade que lhes garanta o sustento. Nos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, esses sujeitos se apropriam, demarcam e até loteiam parcelas das vias públicas que se destinam ao estacionamento – as quais, cabe ressaltar, já são insuficientes –, tomando para si, através da sua territorialidade, o controle, domínio e até mesmo o “direito” sob o referido espaço. Assim, os condutores. que. já. encontram. dificuldade. para. estacionar. ficam,. ainda,. condicionados aos serviços e ao “pedaço” 3 dos flanelinhas/guardadores de carros para conseguir uma vaga de estacionamento. Apesar de se tratar de um tema facilmente perceptível em nosso cotidiano, ainda são poucas as discussões relativas a essa temática. Em nossas pesquisas, raros trabalhos científicos referentes a essa problemática – a esse grupo especificamente – foram encontrados. Nesse sentido, o nosso estudo tem o intuito de iniciar/enfatizar o debate acerca desse tema, sob o viés geográfico, abrindo espaço para futuras discussões e abordagens sobre o referido assunto. Desse modo, acreditamos estar contribuindo para a discussão e/ou desenvolvimento científico de um tema ainda pouco explorado, porém empiricamente vivenciado por toda a sociedade que compõe o espaço urbano brasileiro. Sendo assim, pretendemos com o desenvolvimento da pesquisa, responder alguns. questionamentos. e. inquietações. referentes. à. territorialidade. dos. flanelinhas/guardadores de carros dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, tais como: Em que contexto socioeconômico e político surge a atividade 3. Os flanelinhas/guardadores de carros utilizam este termo para designar a sua área de atuação e controle, ou seja, o seu território.. 24.

(26) dos flanelinhas/guardadores de carros? Como esse grupo se apropria do espaço público e quais os conflitos gerados em decorrência disso? Como se organizam no território? Que influência e controle têm sobre os espaços apropriados? Nesse sentido, nosso objetivo é analisar a territorialidade expressa pelos flanelinhas/guardadores de carros através da apropriação e controle de parcelas do espaço público dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, buscando discutir o contexto socioeconômico e político em que surge essa atividade, caracterizar o processo de apropriação de parcelas do espaço público por estes sujeitos e os conflitos gerados em decorrência desse processo, caracterizar, ainda, a configuração/organização. que. adotam. no. território. apropriado,. bem. como. compreender a influência e o controle que estabelecem nesse processo de apropriação e organização de parcelas do espaço público. Para a realização desse trabalho, adotamos alguns procedimentos teóricometodológicos, tais como: revisão bibliográfica, pesquisa de campo e levantamento (visando à coleta de dados), pesquisa documental e produção fotográfica. Realizamos a revisão bibliográfica, que visa “[...] colocar o pesquisador em contato com o que já se produziu a respeito do seu tema de pesquisa” (PÁDUA, 2005, p. 55), que nos possibilitou aprofundar os conhecimentos acerca da temática escolhida para a presente pesquisa, bem como para construir o aporte teórico necessário para a realização desse estudo. Desta forma, esse procedimento significa para aquele que pesquisa: [...] revisar todos os trabalhos disponíveis, objetivando selecionar tudo o que possa servir em sua pesquisa [...] afinar suas perspectivas teóricas, processar e objetivar seu aparelho conceitual. Aproveita para tornar ainda mais conscientes e articuladas suas intenções [...] (LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 112).. Posteriormente, prosseguimos com a pesquisa de campo que, conforme aponta Marconi e Lakatos (2004), é utilizada com o objetivo de conseguir informações e/ou conhecimentos sobre um determinado problema (a territorialidade dos flanelinhas/guardadores de carros dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN). Consiste, ainda, na observação, de fatos e fenômenos tal como ocorrem espontaneamente, na coleta de dados a eles referentes e no registro de variáveis que se presume relevantes para analisá-los. Assim, através da pesquisa de campo,. 25.

(27) tornou-se possível, sobretudo, nos familiarizarmos com a nossa dimensão espacial e as relações estabelecidas neste. Realizamos o primeiro momento da pesquisa de campo, na qual procedemos com. a. identificação,. delimitação. e. mapeamento. da. concentração/distribuição/organização dos flanelinhas/guardadores de carros no nosso recorte empírico, bem como a realização de levantamento com esses sujeitos, visando à obtenção de dados prévios e de um diagnóstico sobre a nossa problemática. Para isso, percorremos os bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, em diferentes dias e horários, objetivando a realização dos procedimentos anteriormente citados, como também a observação de aspectos que consideramos importantes para esta pesquisa. Cabe salientar que, durante todo o processo de desenvolvimento da pesquisa, trabalhamos com a observação, visto que o nosso recorte empírico faz parte do nosso cotidiano e nos possibilitou diariamente diversas constatações, pois A observação é uma técnica de coleta de dados para conseguir informações e utiliza os sentidos na obtenção de determinados aspectos da realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas também em examinar fatos ou fenômenos que se desejam estudar (MARCONI; LAKATOS, 2004, p. 190).. Ressaltamos, ainda, que a técnica de pesquisa de campo a qual adotamos, neste primeiro momento, foi a do tipo exploratória, visto que os estudos exploratórios são: (...) investigações de pesquisa empírica cujo objetivo é a formulação de questões ou de um problema, com tripla finalidade: desenvolver hipóteses, aumentar a familiaridade do pesquisador com um ambiente, fato ou fenômeno, para a realização de uma pesquisa futura mais precisa ou modificar e clarificar conceitos. [...] Obtém-se freqüentemente descrições tanto quantitativas quanto qualitativas do objeto de estudo, e o investigador deve conceituar as inter-relações entre as propriedades do fenômeno, fato ou ambiente observado (MARCONI; LAKATOS, 2004, p. 187).. Depois do primeiro momento da pesquisa de campo, demos continuidade ao trabalho com a pesquisa documental em fontes estatísticas, como o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) e na legislação brasileira, em busca de referencias à atividade dos flanelinhas/guardadores de carros; tendo em vista a produção de uma base de dados desse amparo a nossa análise. Por conseguinte, concretizamos o segundo momento da pesquisa de campo, no qual realizamos as entrevistas estruturadas junto aos flanelinhas/guardadores de carros e aos condutores de automóveis dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de 26.

(28) Natal-RN. Esse recurso nos possibilitou respostas imediatas para as informações desejadas no trabalho, admitindo tudo aquilo que não pode ser revelado por escrito e propiciando um diálogo aberto entre o entrevistador e o entrevistado. Ademais, a produção fotográfica também foi utilizada como procedimento de pesquisa, visto que nos possibilitou registrar e analisar particularidades do comportamento e das características desse grupo social no território. “[...] as fotografias que podem ser utilizadas em investigação educacional qualitativa podem ser separadas em duas categorias: as que foram feitas por outras pessoas e aquelas que o investigador produziu” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 184). Nessa perspectiva, trabalhamos, no presente estudo, com os dois tipos de fotografias, visando à captura e expressão daquilo que é do nosso interesse. Por fim, prosseguimos com a organização e análise dos dados coletados, que, aliados às leituras realizadas, são a base para as discussões apresentadas a seguir. Visto isso, estruturamos o presente trabalho em 5 (cinco) seções, a saber: . Seção 1 – Introdução: Esta seção apresenta e contextualiza a temática. referente à territorialidade dos flanelinhas/guardadores de carros dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, indicando, assim, o nosso objeto de estudo; a relevância do tema tratado; conta ainda com a justificativa, as questões e objetivos de pesquisa, os pressupostos teóricos, o percurso metodológico de desenvolvimento do trabalho e a apresentação de sua estrutura. . Seção 2 – Flanelinhas/guardadores de carros no espaço público:. pressupostos do surgimento da atividade no contexto socioeconômico e político das condições e relações de trabalho no Brasil: Esta seção apresenta o referencial teórico e metodológico que norteia a discussão apresentada sobre: precarização das condições e relações de trabalho (IDALINO, 2012); (MATTOSO, 1999); (NORONHA, 2003); (SANTOS, 2005); (SANTOS, 2008); setor informal da economia urbana e trabalhadores por conta própria (CACCIAMALI, 1982 e 2000); (FERREIRA, 2007); (LIMA; SOARES, 2002); mercado de trabalho de Natal-RN (ARAÚJO, 2009); (FREIRE, 2005); (PESSOA, 2015); e regulamentação e criminalização da atividade dos flanelinhas/guardadores de carros (HORTA, 2010); e (PAULA, 2013).. 27.

(29) Seção 3 – Do espaço ao território: sobre o processo de apropriação espacial: Esta seção apresenta a discussão acerca da apropriação do espaço público e baseia-se na literatura construída sobre a noção de espaço público, principalmente as contribuições que tratam desde a sua origem até a maneira como esse se traduz nos dias de hoje. Apresentamos, também, contribuições acerca da dicotomia conceitual do público versus o privado, visando ampliar a nossa compreensão referente às apropriações conferidas. aos espaços. públicos.. Caracterizamos, ainda, o modo como os flanelinhas/guardadores de carros se apropriam dos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN, bem como os conflitos que são decorrentes de tal prática socioespacial. Nesse sentido, recorremos, principalmente, a autores como: (VALVERDE, 2007); (CERQUEIRA, 2013); (ANDRADE; JAYME; ALMEIDA, 2009); (INDOVINA, 2002); (GOMES, 2012); (SERPA, 2004); (LOPES, 2012); (CARLOS, 1996); (SOBARZO, 2006); (LOBODA, 2009); (SAQUET, 2011); (CASTRO, 2002). . Seção 4 – Território e territorialidade: sobre as dinâmicas territoriais e. estratégias de influência e controle no território: Esta seção apresenta a discussão sobre o território e as dinâmicas que lhe são inerentes. Baseia-se nos estudos de (FERNANDES, 2005 e 2009); (RAFFESTIN, 1993); (CUNHA; SILVA, 2007); (SILVA, 2009); (SACK, 1986); (ALBAGLI, 2004); (SAQUET, 2015); (FOUCAULT, 1988); (HAESBAERT, 2007); (SOUZA, 2000). Apresentamos uma caracterização do território dos flanelinhas/guardadores de carros e a organização que estes adotam nos seus territórios nos bairros Cidade Alta, Petrópolis e Tirol de Natal-RN. Ademais, discute-se, ainda, sobre a territorialidade e as formas de influência e controle, que estes sujeitos estabelecem em seus territórios. . Seção 5 – Considerações finais: Esta seção apresenta nossas. conclusões e considerações a respeito do trabalho e da discussão aqui posta. Não pretende encerrar o assunto, pelo contrário, busca dar margem para novas discussões e possibilidades de estudo desta problemática.. 28.

(30) 2 FLANELINHAS/GUARDADORES DE CARROS NO ESPAÇO PÚBLICO: PRESSUPOSTOS. DO. SOCIOECONÔMICO. E. SURGIMENTO POLÍTICO. DA. DAS. ATIVIDADE. CONDIÇÕES. E. NO. CONTEXTO. RELAÇÕES. DE. TRABALHO NO BRASIL Os flanelinhas/guardadores de carros são trabalhadores excluídos e marginalizados, tanto pelo mercado – sob a égide capitalista – quanto pela sociedade da qual fazem parte, e se constituem em um grupo social que expressa no espaço público da cidade, transformado em território, a sua territorialidade e, a partir desta, suas aspirações, enquanto classe trabalhista não reconhecida. Essa atividade situa-se, frequentemente, na fronteira entre o informal e o ilegal, pois refere-se a uma atividade, na maioria da vezes, não classificada legalmente enquanto emprego ou trabalho – apesar da existência de uma lei e decreto federais 4 que dispõem sobre a regulamentação dessa atividade – e, que se realiza num contexto de condições extremamente precárias. Esses sujeitos são vistos, pela grande maioria da população, como trabalhadores informais de rua que oferecem um serviço desqualificado, isto é, “não demandado pela sociedade” (IDALINO, 2012, p. 19-20). Consideramos que esses trabalhadores informais encontram na atividade, uma maneira de subsistência (no trabalho por conta própria), que se realiza no âmbito do setor informal da economia urbana. Entretanto, antes de analisarmos, mais especificamente, esse setor da economia urbana que serve de “abrigo” para o trabalho dos flanelinhas/guardadores de carros e a classificação que lhes é dada neste, faz-se necessária uma contextualização acerca das condições e relações de trabalho no Brasil, principalmente a partir da década de 1970 – período no qual o país passou por profundas transformações que refletiram diretamente no seu mercado de trabalho –, para compreender os possíveis fatores e/ou processos que conduziram esses trabalhadores para fora do mercado de trabalho formal, ou seja, do setor formal da economia urbana.. 4. A saber, Lei nº 6.242/1975 e Decreto nº 79.797/1977.. 29.

(31) 2.1 Precarização das condições e relações de trabalho no Brasil – (1970 a 1990) Nas últimas décadas do século XX, o Brasil passou por intensas transformações sociais, políticas e econômicas que contribuíram profundamente para o atual cenário da estrutura econômica do país e do seu mercado de trabalho, sobretudo no que concerne à geração e distribuição de empregos. Essas transformações dizem respeito, principalmente, a processos e fenômenos, como a modernização. do. campo,. a. urbanização. acelerada,. a. desregulamentação. econômica, a acentuada concentração de renda, dentre outros. Percebemos que ao longo do século XX, o processo de urbanização brasileira demonstra uma crescente aproximação com o processo da pobreza, no qual o locus passa a ser, cada vez mais, as cidades. Estas, por sua vez, tornam-se o lugar de todos os capitais e trabalhos, isto é, o palco de numerosas atividades “marginais” do ponto de vista tecnológico, organizacional, financeiro, previdenciário, fiscal e comercial (SANTOS, 2005). Na. América. Latina,. a. discussão. sobre. “marginalidade”. decorre,. principalmente, das análises a respeito da modernização como sinônimo de urbanização acelerada e metropolização nos países desta região, as quais se mostravam dominantes nos anos 1960 e 1970. No Brasil, particularmente, inúmeros centros urbanos apresentaram um acelerado crescimento, que acabou por agravar a situação de marginalização social, que se manifestou, de forma mais clara, no tecido urbano das grandes cidades através do crescimento das favelas, da violência urbana e das atividades informais (LIMA; SOARES, 2002). Segundo Mattoso (1999), ao longo do século XX, o Brasil teve uma história de crescimento econômico, mobilidade social, geração de empregos e concentração de renda. Viabilizou-se no pós-guerra – a partir de uma ampla inserção internacional qualificada por meio do processo de substituição de importações – um dos mais intensos processos de industrialização e urbanização, que culminou na sua transformação, em poucas décadas, de um país de base agrário-exportadora, para uma das maiores e mais dinâmicas economias do mundo. Essa transformação na estrutura econômica do Brasil, de agrário-exportadora para industrial-urbana, se caracterizou pela elevada geração de empregos formais, com efetiva capacidade de incorporar ao mercado de trabalho urbano, parcelas 30.

(32) significativas de uma população constituída por uma elevada taxa de crescimento demográfico, e um significativo contingente de pessoas expulsas do campo (MATTOSO, 1999). Entretanto, vale ressaltar que, essa mudança ocorrida na base econômica do Brasil – decorrente da expansão do sistema capitalista de produção – esteve atrelada à crescente modernização e mecanização do campo, que acabou resultando na expulsão da população rural para os grandes centros urbanos. Nesse sentido, à medida que esse fenômeno tornava-se mais intenso, fez-se perceptível o descompasso entre o crescimento demográfico e as oportunidades de empregos geradas nos grandes centros urbanos, que, por sua vez, não comportavam uma infraestrutura que atendesse a essa significativa massa populacional (HORTA, 2010). Dessa forma, na década de 1980 verificou-se uma mudança na dinâmica do mercado de trabalho brasileiro, que experimentou pela primeira vez com intensidade, o surgimento do desemprego urbano, da deterioração das condições e relações de trabalho, bem como a ampliação da informalidade. No entanto, o desemprego e a precarização observadas nesse período foram relativamente baixas devido à preservação das estruturas industriais e produtivas, além do fato de estarem vinculadas ao processo inflacionário e às intensas oscilações do ciclo econômico desta década (MATTOSO, 1999). Conforme verificado por Pessoa e Dias (2015), nesse período os países de capitalismo desenvolvido enfrentaram uma grave crise que se traduziu no que, convencionalmente denomina-se “crise estrutural do capital”. Essa crise, inicialmente verificada por volta da década de 1970 e aprofundada, sobretudo, na década de 1980, obrigou a realização de uma profunda reestruturação da economia e do Estado, visando restabelecer a dinamicidade e estabilidade econômica e social experimentada por esses países no segundo pós-guerra. No Brasil, essas mudanças refletiram tanto na retração do trabalho formal, como também na acentuação das inúmeras formas de “trabalhos atípicos”, onde ganharam destaque a terceirização, a precarização e a informalidade. Segundo Noronha (2003) até o final da década de 1980 a “informalidade” era percebida pela maioria dos especialistas como um problema endêmico. Ou seja, prevalecia a ideia de que essa “informalidade” era herança de uma economia semi31.

(33) industrializada e, desta forma, o seu fim tratava-se de uma questão de tempo e desenvolvimento. Todavia, este autor supõe que, em termos de mercado de trabalho, o início da década de 1990 representou uma ruptura crescente no movimento de formalização do trabalho, verificado nas décadas anteriores. Nos anos 1990, o baixo crescimento econômico aliado à racionalização, à modernização da produção e à liberalização comercial-financeira refletiu ainda mais no nível de emprego. Neste período, verificou-se uma diminuição na criação de novos postos de trabalho e um significativo aumento do desemprego e de outras formas de trabalho, ligadas à economia não formal e ao setor de serviços (SANTOS, 2008). Constatou-se que nos últimos anos da década de 1990, a performance produtiva não foi somente “medíocre” e decorrente dos efeitos das oscilações do ciclo econômico sobre o mercado de trabalho. A geração de emprego também sofreu [...] as conseqüências profundamente desestruturantes de um processo de retração das atividades produtivas acompanhado do desmonte das estruturas preexistentes, sem que se tenha colocado no lugar outras capazes de substituí-las (MATTOSO, 1999, p. 11-14).. Diante dessas mudanças na estrutura econômica do Brasil, Idalino (2012, p. 44) ressalta como consequência negativa para os trabalhadores a ocorrência, considerável, do aumento do desemprego estrutural. Este tipo de desemprego não é fruto de recessões ou depressões transitórias, decorre, sim, “da própria estrutura socioeconômica criada e mantida pelo sistema de produção capitalista globalizado. O desemprego estrutural, assim, tende a se estender por longos prazos” (IDALINO, 2012, p. 44). Aponta Mattoso (1999), que o Brasil nunca havia convivido com um desemprego tão elevado, quanto o verificado na década de 1990. Muito menos com um grau crescente de precarização das condições e relações de trabalho, que culminou no crescimento vertiginoso do trabalho temporário, precário, por tempo determinado, terceirizado, sem renda fixa, em tempo parcial, enfim, de milhares de bicos que se difundiram por todo o país. Então, “a cidade, onde tantas necessidades emergentes não podem ter resposta, está [...] fadada a ser tanto o teatro de conflitos crescentes como o lugar geográfico e político da possibilidade de soluções” (SANTOS, 2005, p.11). Assim, a cidade, em seu modelo econômico e a sua estrutura física, torna-se geradora e 32.

(34) mantedora da pobreza, evidenciando os contrastes econômicos e sociais a ela inerentes, como é o caso da problemática que se efetiva com as práticas dos flanelinhas/guardadores de carros. Mattoso (1999) aponta ainda, com base nas pesquisas do IBGE e do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), que no final da década de 1990 no Brasil, mais de 50% das pessoas ocupadas das grandes cidades se encontravam em algum tipo de informalidade, boa parte sem registro e garantias mínimas como: aposentadoria; Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. (FGTS); seguro. desemprego; dentre outros. Dessa forma, o desemprego verificado nesse período é, ainda, acompanhado por uma nítida redução dos salários e pela precarização das condições e relações de trabalho5, que se dão, sobretudo, com o aumento de práticas trabalhistas flexíveis, sem estabilidades e, muito menos, garantias sociais (SANTOS, 2008). Como consequência desse processo de flexibilização das práticas trabalhistas, por sua vez, [...] tem-se a expansão e a intensificação do trabalho informal que, sob a lógica de um discurso transformador, propaga a alternância de função no processo produtivo, ou seja, o empregado de hoje pode tornar-se o empregador de amanhã. Este processo, no entanto, tende a obscurecer as relações de exploração e marginalização a que são submetidos os trabalhadores que, movidos por um discurso utópico de tornar-se patrão, investem todos os seus bens e sua força de trabalho e de sua família, em busca da ideia de trabalho autônomo, livre e por conta própria (IDALINO, 2012, p. 48-49).. Como consequência desse conjunto de mudanças ocorridas no mundo do trabalho, o fenômeno da informalidade se intensifica e passa a transformar, cada vez mais, trabalhadores formais em informais, ou seja, “realizadores de atividades em que as funções são precarizadas e, consequentemente, os precariza na condição de força produtiva do sistema” (IDALINO, 2012 p. 17). Nessa perspectiva, Idalino (2012) enfatiza que as condições e relações de trabalho além de sofrerem uma reformatação, também reproduzem e transformam formas antigas. Desse modo, os trabalhos e as atividades – reproduzidas, criadas e 5. Neste trabalho, entendemos a precarização do trabalho, assim como Mattoso (1999, p. 8), enquanto o aumento do cunho precário das condições de trabalho, com expansão do trabalho assalariado sem carteira e do trabalho por conta própria. Já a precarização das relações de trabalho dizem respeito ao “processo de deterioração das relações de trabalho, com a ampliação da desregulamentação, dos contratos temporários, de falsas cooperativas de trabalho, de contratos por empresa ou mesmo unilaterais” (MATTOSO, 1999, p. 8).. 33.

(35) recriadas – que estão fora dos modelos do período antecedente, se apresentam com baixos rendimentos e com a ausência de vínculo trabalhista e de contribuições sociais. Todavia, são de fundamental importância para a manutenção e reprodução do capital. Entendemos que independente da denominação empregada – flanelinha, guardador, pastorador ou vigia de carros –, é indiscutível o fato de que o surgimento da atividade exercida por esses sujeitos se insere nesse amplo contexto social, econômico, político e porque não dizer cultural, que envolve as diversas transformações ocorridas, sob a lógica capitalista, no espaço urbano e no mercado de trabalho dos países subdesenvolvidos, principalmente aquelas advindas da industrialização, da migração rural-urbana, de uma urbanização combinada e desigual, do desemprego estrutural, da precarização do trabalho e das relações de trabalho e do processo de informalização do trabalho. 2.2 Setor informal da economia urbana: um abrigo para os trabalhadores por conta própria O. mercado. de. trabalho. brasileiro,. no. contexto. da. urbanização. e. industrialização, se formou sob uma perspectiva dual, onde de um lado temos um segmento limitado a trabalhadores mais qualificados, com vínculos estáveis, melhor remunerados – setor formal –, e do outro um segmento constituído pela maioria dos trabalhadores, no qual predominam os vínculos precários, o subemprego e o trabalho por conta própria – setor informal (IDALINO, 2012). Contudo, esse dualismo inicial, foi sendo gradativamente substituído pela ideia de “complementaridade desse informal em relação às atividades formais, como produto da expansão do capitalismo em áreas periféricas” (LIMA; SOARES, 2002, p. 163-64). Assim, passou a ser visto não mais como algo marginal, mas sim necessário ao processo de acumulação. Desse modo, segundo Lima e Soares (2002), para os trabalhadores, não se tratava mais de uma reserva ao emprego industrial – urbano/formal – mas um modo de inserção num mercado que mantinha relações estruturais de funcionalidade com a formalidade, uma vez que, [...] o mercado formal de trabalho é responsável por alimentar suas próprias “franjas”, pois ao excluir indivíduos em idade de trabalho os projeta para as margens, restando-lhes como saída única reinventar formas de sobrevivência dentro do mesmo sistema que os “vomita”. As condições de. 34.

(36) “flanelinhas” e lavadores de carro é uma espécie de regurgitar que o sistema capitalista, em sua modalidade contemporânea, finda por promover. (IDALINO, 2012, p. 132). Nessa perspectiva, entendemos que a origem do trabalho informal no Brasil não se deu de forma tão diferente dos outros países da América Latina, onde a migração do campo para os centros urbanos contribuiu para a consolidação do excedente de mão-de-obra urbana que, acabou por desencadear o desemprego em massa e, por consequência, a disseminação da informalidade (IDALINO, 2012). A ideia de informalidade foi explicitada pela primeira vez em 1970, em um estudo sobre a economia do Quênia. Desde então, o termo “informalidade” passou por inúmeras qualificações, ao longo dos anos, constituindo-se enquanto um termo polêmico, dotado de inúmeras interpretações, significações e usos que variam, principalmente, de acordo com a compreensão e intenção de cada um que se dispõe a estudá-lo (FILGUEIRAS; DRUCK; AMARAL, 2004). Nesse sentido, desde a sua origem, o conceito de “informalidade” abrange um enorme. leque. de. situações. profundamente. distintas,. que. comungam. da. desregulação estatal na sua organização e funcionamento, tais como economia informal, mercado informal, setor informal, trabalho informal, dentre outros (LIMA; SOARES, 2002). Entretanto, cada termo deste representa uma situação diferente, marcada por características semelhantes – advindas da informalidade – porém com enfoques e usos diferenciados. A noção “economia informal”, por exemplo, corresponde ao conjunto de trabalhos,. atividades,. relações. econômicas. e. rendas. que. se. realizam. desconsiderando a legislação vigente específica. Pode representar, ainda, fenômenos muito diferentes, como: terceirização; microempresas; evasão e sonegação fiscais; contratação ilegal de trabalhadores assalariados; comércio de rua ou. ambulante;. trabalho. em. domicílio;. trabalho. temporário;. entre. outros. (CACCIAMALI, 2000). Ou seja, trata-se de um termo de enfoque amplo, que engloba todos os aspectos econômicos que se realizam à margem da legislação. O setor informal, por sua vez, se constitui enquanto um dos segmentos dessa economia. Este abriga em si uma série de atividades, ocupações e trabalhos informais. É aqui, mais especificamente, que os flanelinhas/guardadores de carros – através da “criação” ou “recriação” de uma atividade tida pela maioria das pessoas como desnecessária – encontram uma forma de sobreviver e participar de um 35.

(37) mercado de trabalho que, regido pelo sistema capitalista, é cada vez mais competitivo e excludente. De acordo com Ferreira (2007), um dos fatores que distinguem o setor formal do informal é a concepção de que este último é composto por atividades econômicas que se desenvolvem a margem da lei, ou seja, a organização do trabalho se dá fora das formas contratuais legais. Logo, o setor informal não organiza sua produção com base no trabalho assalariado. Este diz respeito ao “[...] conjunto de produtores que, de posse dos meios de trabalho, desenvolvem suas atividades baseadas na própria força de trabalho” conforme interpretou Cacciamali (1982, p. 5). Segundo Ferreira (2007), dois enfoques se destacam quando se trata da informalidade, um de caráter econômico e outro de caráter social. O econômico – concebe o setor informal como uma alternativa precária, no qual os trabalhadores aqui inseridos perderam seus empregos no mercado de trabalho formal e, por não ter uma qualificação adequada, se veem obrigados a buscar, através de uma atividade informal, a sua sobrevivência/sustento. Sob esse enfoque, o setor informal é visto como resultado do desenvolvimento capitalista, uma vez que este é o gerador de um exército industrial de reserva que impossibilita, desta forma, a inserção de todos os trabalhadores em atividades formais. Já o enfoque social – considera que o ingresso do trabalhador no setor informal não acontece, necessariamente, por falta de qualificação ou opção no mercado de trabalho formal, mas sim pela escolha consciente da maioria daqueles que compõem esse setor. Sob esse enfoque, o setor informal é concebido enquanto um setor heterogêneo, constituído por sujeitos motivados pela estratégia de sobrevivência, mas também por uma alternativa de vida (FERREIRA, 2007). Nessa concepção, o setor informal é o conjunto daqueles que, ao perderem seus empregos no mercado formal, não tiveram alternativa senão migrar para a informalidade (tendo esta atividade como única estratégia de sobrevivência). Além disso, há aqueles que já trabalharam formalmente e optaram por ingressar no setor informal pelos mais diversos motivos (por exemplo: desejo de autonomia em relação a horário, patrões; impedimentos familiares - como relação a maridos e filhos -; possibilidade de obter maiores rendimentos em relação ao mercado formal) [...] (FERREIRA, 2007, p. 15).. Diante do exposto, entendemos que a informalidade e o termo “informal”, refere-se não a um objeto de estudo, mas sim à análise de um processo de mudanças estruturais em curso na economia e na sociedade. Este, o qual 36.

(38) Cacciamali (2000) denomina “Processo de Informalidade”, incide, por sua vez, na redefinição das formas de inserção dos trabalhadores na produção, das relações de produção e dos processos de trabalho e de instituições. Em decorrência desse processo de informalidade, temos, ainda, ao menos dois fenômenos principais: O primeiro diz respeito à reorganização do trabalho assalariado, ao evolver das relações de trabalho criadas, ampliadas ou recriadas nesse âmbito. [...] Essas relações freqüentemente são apreendidas através de [...] formas de trabalho assalariado não registrado junto aos órgãos da seguridade social, mas também podem revelar contratações (legais ou consensuais) sob outros modos [...]. Apresentam, entretanto, uma característica comum: sua vulnerabilidade, ou seja, a insegurança da relação de trabalho e na percepção da renda; a ausência muitas vezes de qualquer regulamentação laboral e de proteção social [...]; o uso flexível do trabalho (horas e múltiplas funções); e freqüentemente menores salários, principalmente para os menos qualificados (CACCIAMALI, 2000, p. 163-164).. O segundo fenômeno, se refere ao trabalho por conta própria e a outras estratégias de sobrevivência pelas quais as pessoas que apresentam dificuldades para ingressar no mercado de trabalho, se reempregar ou mesmo por opção, obtém renda. Cabe ressaltar que esses grupos estão, geralmente, inseridos em ocupações de baixa produtividade (CACCIAMALI, 1982). Em outras palavras, esse “Processo de Informalidade pode ser representado e acompanhado por duas categorias de trabalhadores que são predominantes no processo: os assalariados sem registro e os trabalhadores por conta própria” (CACCIAMALI, 2000, p. 166). Nessa perspectiva, Cacciamali (2000) assinala que no caso da categoria dos trabalhadores por conta própria – da qual consideramos pertencente à atividade desempenhada pelos flanelinhas/guardadores de carros –, os trabalhadores estão criando uma ocupação, relacionada, sobretudo, à prestação de serviços, com o intuito de se auto-empregar.. Esse grupo se caracteriza pelo baixo nível de. produtividade com o qual operam e compreende indivíduos, que dispõem de um baixo nível de capital físico e humano. Esses sujeitos são simultaneamente patrões e empregados e trabalham diretamente na produção – ou como no caso dos flanelinhas/guardadores de carros – na prestação de um serviço. Nesse processo, podem ainda se utilizar de familiares ou ajudantes assalariados enquanto uma extensão do seu próprio trabalho. Aqui, não há a pretensão de acumulação ou obtenção de uma rentabilidade equiparada a de mercado, mas sim a obtenção de um montante que lhes possibilite a sua subsistência e da sua família (CACCIAMALI, 2000). A inserção nessa categoria decorre, principalmente, 37.

(39) [...] da escassez de empregos aderentes às características da força de trabalho, em especial seu capital humano, e pode constituir-se, em determinadas situações, uma alternativa à miséria. É uma forma de trabalho que se estende através de indivíduos motivados por dificuldades de reemprego, ou de ingresso no mercado de trabalho, ou que se encontram inativos em famílias com renda familiar baixa, podem ser aposentados que auferem pensões insuficientes, ou até podem ser indivíduos que optaram por essa forma de inserção diante das dificuldades de se adaptarem em trabalhos assalariados (CACCIAMALI, 2000, p. 167).. Portanto, o processo de informalidade deve ser associado aos diferentes modos de inserção no trabalho que decorrem dos processos de reformatação das economias em escalas mundial, nacional e local. Assim, para que entendamos melhor. o. contexto. que. permeia. o. surgimento. da. atividade. dos. flanelinhas/guardadores de carros na cidade de Natal-RN, faz-se necessária uma caracterização da reformatação da economia nesse âmbito local, assim como das transformações ocorridas no espaço urbano e no mercado de trabalho da cidade. 2.3 O contexto do mercado de trabalho de Natal-RN A instabilidade econômica verificada no Brasil no período compreendido a partir dos anos 1970 e, aprofundada, principalmente, entre as décadas de 1980 e 1990, contribuiu, profundamente, para o agravamento de problemas relacionados à estrutura econômica do país, que reflete, sobretudo, no mercado de trabalho – seja nacional, regional ou local – através do elevado crescimento do desemprego e de novas formas de trabalhos, que se realizam de forma desregulamentada e precarizada. Nesse sentido, [...] é importante reportar-se ao fato de que nos anos [19]90 ocorreu na economia brasileira, e na de Natal em particular, um processo de modernização tecnológica com conseqüências nefastas para o mercado de trabalho. Nesse sentido, os investimentos realizados pelas empresas foram, em grande parte, destinados à modernização tecnológica, com impactos expressivos na produtividade e no emprego. Assim, por exemplo, o processo de modernização do parque industrial da Região Metropolitana de Natal, notadamente do parque têxtil, bem como do setor bancário, de telecomunicações e de distribuição de energia elétrica, com geração de desempregados ou de empregos terceirizados, foram responsáveis, em parte, pelo desempenho do mercado de trabalho da cidade na década passada (FREIRE, 2005, p. 35).. Nessa perspectiva, Araújo (2009) pontua que, em decorrência das mudanças ocorridas neste período, na esfera internacional e nacional, a cidade de Natal, capital do Estado do Rio Grande do Norte, também passou por profundas transformações. Estas dizem respeito, principalmente, à reprodução de algumas 38.

(40) tendências análogas às ocorridas nas grandes cidades, como por exemplo: o acelerado crescimento demográfico; o desemprego; a marginalização social; a precarização do trabalho; e a expansão das atividade informais. Até meados da década de 1950, Natal-RN exibia um processo de urbanização incipiente e em desenvolvimento, o qual era impulsionado, sobretudo, pela concentração populacional e de serviços. A instalação da base americana – durante a Segunda Guerra Mundial – em Parnamirim, causou significativas mudanças nas feições da cidade de Natal e na dinâmica populacional e econômica. Desse período em diante, a cidade passou por outros surtos de urbanização, principalmente entre as décadas de 1970 e 1980, seguindo a tendência nacional de industrialização e crescimento urbano (PESSOA, 2015). Conforme aponta Araújo (2009), no que concerne à densidade demográfica, Natal/RN cresce de forma assustadora. Em 1970 havia atingido a soma de mais de 1.500 hab./km². Já em 1991, somavam-se mais de 3.500 e, em 2000, atingiu a marca de mais de 4.200 hab./km² (Tabela 2). Tabela 1: Densidade demográfica dos munícipios que compõem a região metropolitana de Natal-RN - 1970/2000. Período. Municípios 1970. 1980. 1991. 2000. Ceará Mirim. 52,22. 55,22. 71,81. 85,95. Extremoz. 66,75. 65,3. 110,92. 145,30. Macaíba. 59,47. 63,84. 88,71. 112,05. Monte Alegre. 52,02. 65,77. 75,54. 89,83. Natal. 1.563,45. 2.465,36. 3.588,92. 4.212,40. Nísia Floresta. 30,15. 31,97. 44,63. 60,99. Parnamirim. 115,00. 209,06. 502,08. 988,82. São G. do Amarante. 72,27. 118,22. 174,51. 266,55. São J. do Mipibu. 59,07. 69,74. 96,05. 119,11. RMN. -. -. -. 383,31. Fonte: ARAÚJO, 2009.. 39.

Referências

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