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As relações de trabalho no Brasil: um enfoque a partir da OIT e das convenções de trabalho

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Academic year: 2021

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PAULO MARCELO SCHERER

As relações de trabalho no Brasil: um enfoque a partir da OIT e das

convenções de trabalho

Ijuí 2014

(2)

UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – UNIJUÍ

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO

MESTRADO EM DIREITOS HUMANOS

PAULO MARCELO SCHERER

As relações de trabalho no Brasil: um enfoque a partir da OIT e das

convenções de trabalho

Dissertação final do curso de Mestrado em Direitos Humanos da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí. Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais (DCJS).

Orientadora: Doutora Vera Lucia Spacil Raddatz Coorientador: Doutor Gilmar Antonio Bedin

Ijuí 2014

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S326r Scherer, Paulo Marcelo.

As relações de trabalho no Brasil : um enfoque a partir da OIT e das convenções de trabalho / Paulo Marcelo Scherer. – Ijuí, 2014. – 107 f. ; 29 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí). Direitos Humanos.

“Orientadora: Vera Lucia Spacil Raddatz”.

1. Trabalhadores. 2. OIT. 3. Dignidade. 4. Convenções. 5. Tratados. I. Raddatz, Vera Lucia Spacil. II. Título. III. Título: Um enfoque a partir da OIT e das convenções de trabalho.

CDU: 331(81)

Catalogação na Publicação

Aline Morales dos Santos Theobald CRB10/1879

(4)

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Programa de Pós-Graduação em Direito

Curso de Mestrado em Direitos Humanos

A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação

A

ASSRREELLAAÇÇÕÕEESSDDEETTRRAABBAALLHHOONNOOBBRRAASSIILL::UUMMEENNFFOOQQUUEEAAPPAARRTTIIRRDDAAOOIITTEE D

DAASSCCOONNVVEENNÇÇÕÕEESSDDEETTRRAABBAALLHHOO

elaborada por

PAULO MARCELO SCHERER

como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito

Banca Examinadora:

Profª. Drª. Vera Lucia Spacil Raddatz (UNIJUÍ): ___________________________________

Prof. Dr. Florisbal de Souza Del’Olmo (URI): ______________________________________

Prof. Dr. Gilmar Antonio Bedin (UNIJUÍ): ________________________________________

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AGRADECIMENTO

A Deus pelas bênçãos.

À minha família pela paciência e carinho. Aos meus orientadores pela capacidade.

(6)

Tá vendo aquele edifício moço Ajudei a levantar

Foi um tempo de aflição, era quatro condução Duas pra ir, duas pra voltar

Hoje depois dele pronto Olho pra cima e fico tonto Mas me vem um cidadão E me diz desconfiado

"Tu tá aí admirado ou tá querendo roubar"

Meu domingo tá perdido, vou pra casa entristecido Dá vontade de beber

E pra aumentar meu tédio

Eu nem posso olhar pro prédio que eu ajudei a fazer

Tá vendo aquele colégio moço Eu também trabalhei lá Lá eu quase me arrebento

Fiz a massa, pus cimento, ajudei a rebocar Minha filha inocente veio pra mim toda contente "Pai vou me matricular"

Mas me diz um cidadão:

"Criança de pé no chão aqui não pode estudar" Essa dor doeu mais forte

Porque que é que eu deixei o norte Eu me pus a me dizer

Lá a seca castigava, mas o pouco que eu plantava Tinha direito a colher

Tá vendo aquela igreja moço, onde o padre diz amém

Pus o sino e o badalo, enchi minha mão de calo Lá eu trabalhei também

Lá foi que valeu a pena, tem quermesse, tem novena

E o padre me deixa entrar Foi lá que Cristo me disse:

"Rapaz deixe de tolice, não se deixe amedrontar Fui eu quem criou a terra

Enchi o rio, fiz a serra, não deixei nada faltar Hoje o homem criou asas e na maioria das casas Eu também não posso entrar"

(7)

RESUMO

Este estudo apresenta elementos das relações de trabalho, especialmente a condição e as regras impostas aos trabalhadores na História brasileira. O período Colonial, a Primeira República, a Revolução de 1930 e a Constituição de 1988 são parâmetros para estabelecer os direitos dos trabalhadores. Neste contexto é considerada também a Organização Internacional do Trabalho – OIT –, organismo internacional criado em 1919 que, por suas normas, convertidas principalmente em Convenções, estabelece o trabalho em condições dignas. A forma de criação destas Convenções, a sua incorporação no ordenamento interno do País e os procedimentos de renúncia, também são observados. Estabelecidas as regras internacionais e concluído o processo de recepção interna, verifica-se na pesquisa os efeitos que estas orientações produzem nas relações de trabalho do País. Do mesmo modo, busca-se estabelecer os prejuízos que podem advir da não recepção das Convenções, ou de sua renúncia, sempre na perspectiva da efetivação dos direitos humanos no trabalho.

(8)

RESUMEN

Este estudio presenta elementos de las relaciones de trabajo, especialmente la condición y las reglas impuestas a los trabajadores en la historia brasilena. El periodo Colonial, la Primera República, la Revolución de 1930 y la Constitución de 1988 son parámetros para establecer los derechos de los trabajadores. En este contexto es considerada igualmente la Organización Internacional del Trabajo – OIT –, órgano internacional creado en 1919 que, por sus normas, convertidas principalmente en Convenciones, establece el trabajo en condiciones dignas. La forma de creación de estas Convenciones, su incorporación en el ordenamiento interno del país y los procedimientos de renuncia, son también observados. Establecidas las reglas internacionales, y concluido el proceso de recepción interna, se verifica en la pesquisa los efectos que estas orientaciones producen en las relaciones de trabajo del país. Además, se busca establecer las pérdidas que pueden venir de la no recepción de las Convenciones, o de su renuncia, siempre en la perspectiva de la eficacia de los derechos humanos en el trabajo.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1. A ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT) E OS DIREITOS HUMANOS DOS TRABALHADORES ... 13

1.1. Origens da OIT ... 13

1.2. Estrutura da OIT como Espaço de Criação de Direitos ... 21

1.3. Principais Resoluções da OIT ... 30

2. AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DE DIREITO .. 40

2.1. As Relações de Trabalho no Período Colonial ... 41

2.2. As Relações de Trabalho na Primeira República ... 47

2.3. As Relações de Trabalho e a Efetivação de Direito Após a Revolução de 30 ... 53

2.4 As Relações de Trabalho Pós-Constituição de 88 ... 60

3. AS CONVENÇÕES DA OIT E AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL NA CONSECUÇÃO DE DIREITOS ... 66

3.1. A Sistemática da Recepção dos Tratados no Brasil ... 67

3.2. As Resoluções da OIT na Consecução dos Direitos dos Trabalhadores no Brasil .... 75

3.3. A OIT no Brasil e sua Influência no Mundo do Trabalho ... 85

CONCLUSÃO ... 93

REFERÊNCIAS ... 97

(10)

“A paz universal e permanente só pode estar baseada na justiça social”

(ORGANIZAÇÃO..., 1919).

INTRODUÇÃO

A qualificação das relações de trabalho tem sido impulsionada por vários fatores e iniciativas. Neste processo ocupam um lugar de destaque as atividades e, em especial, as resoluções da Organização Internacional do Trabalho – OIT, organismo internacional fundado em 1919, que tem como propósito a busca da justiça social através de estudos sobre o mundo do trabalho.

A Organização Internacional do Trabalho tem sido referência na regulação das relações trabalhistas buscando a efetivação dos direitos dos trabalhadores, entendidos como direitos humanos fundamentais. Esta função é exercida, de forma concreta, por meio da adoção de Convenções.

Sabe-se que o Brasil não tem recepcionado, integralmente, as resoluções da OIT, prejudicando a incorporação de todas as normas que asseguram os direitos fundamentais dos trabalhadores. Pode-se identificar que, das convenções recepcionadas, algumas não conseguem a efetividade necessária para a plena integração dos trabalhadores brasileiros ao patamar recomendado pela Organização Internacional. Por estas razões a OIT, não obstante seu papel nas relações internacionais, ainda não está totalmente integrada ao cotidiano trabalhista brasileiro, o que pressupõe prejuízos a estes trabalhadores.

O objetivo principal da pesquisa fundamentada pelas normas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) é observar suas Convenções, na perspectiva de sua incorporação no ordenamento brasileiro, estabelecendo como base desta análise

(11)

interna, além da sua presença direta pelo ato de incorporação, a absorção de seus preceitos na Constituição Federal Brasileira. A partir deste exame pretende-se compreender o tipo de impacto que isto provoca nas normas das relações de trabalho.

A metodologia utilizada é a análise de pesquisa bibliográfica, com abordagem dedutiva e de natureza qualitativa.

Na primeira parte deste estudo apresenta-se a Organização Internacional do Trabalho e a sua atuação para efetivar os direitos dos trabalhadores. Faz-se um resgate histórico das relações de trabalho, incluindo o período anterior a sua criação, bem como as razões que a influenciaram e o ato de sua fundação em 1919. Autores como Alban Bonilla Sandí e Nicolas Valticos afirmam esta importância histórica da OIT na efetivação da dignidade.

A estrutura da OIT também é objeto de análise, a forma democrática e descentralizada em que foi constituída pelos Estados Membros, mas com estrutura interna tripartite, com a participação dos governos destes estados membros, e também de empresários e trabalhadores, pode trazer maior representatividade aos envolvidos.

O resultado dos debates produz diversas orientações, sendo as Convenções os expoentes deste debate e, portanto, o objeto de análise mais específico no estudo. Algumas destas convenções ganharam destaque quando passaram a ser entendidas, pela OIT como fundamentais, na perspectiva de convenções vinculadas diretamente com os direitos essenciais dos trabalhadores.

O segundo capítulo analisa as relações de trabalho no Brasil. Neste capítulo a história do trabalho no país se divide em quatro momentos históricos importantes. O período inicial ocorre com a primeira forma de trabalho brasileiro, a escravidão, que surge logo após o ato de descobrimento e segue por um longo período, perpassando por três séculos em que pouco ou nada se falará acerca de direitos ou dignidade dos trabalhadores por conta do sistema escravocrata.

O fim da escravidão e o surgimento da Primeira República significa o efetivo início do trabalho livre no país. A dimensão desta mudança e o surgimento, ainda tímido – especialmente pela manutenção da mesma elite no poder – de normas que permitam o trabalho em melhores condições também serão discutidos.

(12)

Neste período histórico ocorre a criação da OIT e os desdobramentos deste novo cenário internacional – existência de um órgão supranacional sobre o trabalho. A formação da OIT em um período pós-trabalho escravo e de fortalecimento do proletariado e afirmado por autores como Boris Fausto e Amauri Mascaro Nascimento.

Momento seguinte a ser considerado, inicia-se em 1930, quando por um rompimento político assume o cargo de Presidente da República, Getúlio Vargas. A denominada Revolução de 30 traz consigo ampla regulamentação do trabalho no país. A pesquisa discute as relações entre estas normas e as primeiras Convenções da OIT que são recepcionadas naquela época.

O último momento histórico apresentado neste capítulo tem como marco a promulgação da Constituição Federal de 1988, que efetiva no Brasil um processo anteriormente ocorrido em outros países, a constitucionalização dos direitos trabalhistas. A carta magna efetiva a condição do trabalho como direito social e busca ampliar a dignidade em sua realização. A afirmação de organismos internacionais e a força da Constituiçâo é referenciado por autores como Flávia Piovesan. A absorção dos valores presentes na OIT pela Constituição também é objeto de verificação neste capítulo.

Por fim, no terceiro capítulo, as Convenções da OIT são observadas a partir de sua recepção, ou não, no ordenamento brasileiro. Entendendo-se a condição que o trabalho tem em constituir-se como um dos maiores segmentos a que se vinculam as pessoas, ressalta-se a importância da incorporação destas Convenções por afirmarem o trabalho em condições dignas, tendo como um dos referenciais desta lógica Ingo Wolfgang Sarlet.

Também é abordada a sistemática de recepção dos tratados no Brasil. A importância da recepção – ou renúncia – de um tratado, inclusive quanto a sua forma, considerando-se a condição universal que possui, adquire importância por se constituir em um momento de ampliação de direitos e demonstra o interesse do país em integrar-se com os organismos internacionais, argumento utilizado, dentre outros, por Wagner Giglio.

(13)

A importância da construção de direitos fundamentais nas relações sociais do trabalho – como forma de efetivação da dignidade da pessoa humana – e que estão presentes nos tratados internacionais, podem constituir-se em um marco civilizatório, sendo a adesão às Convenções uma aproximação ao ideal do trabalho digno.

O propósito desta pesquisa é apresentar elementos sobre a forma de trabalho no Brasil na perspectiva do respeito aos direitos humanos e a importância da OIT neste processo. Considera-se o pressuposto que está em curso no país um processo histórico de ampliação dos direitos fundamentais dos trabalhadores que permitem o trabalho em condições dignas pela afirmação de normas e recepção dos tratados internacionais que buscam estabelecer esta condição.

(14)

1 A ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT) E OS DIREITOS HUMANOS DOS TRABALHADORES

A Organização Internacional do Trabalho, órgão vinculado à Organização das Nações Unidas, criada em 1919 e com sede em Genebra, na Suíça, foi, durante o século 20, uma das instituições de referência na regulação das relações entre o capital e o trabalho e no fomento ao reconhecimento e à proteção dos direitos dos trabalhadores.

Em sua origem, no ano de 1919, teve por objetivo a estruturação de um conjunto de normas a ser praticado em todos os países e que estabeleceu um patamar mínimo de direitos aos trabalhadores. Para permitir que os principais agentes envolvidos neste processo fossem contemplados, foi estruturada de forma descentralizada e seus membros estabeleceram resoluções que regulamentam as relações de trabalho.

O impacto que as normas da OIT provocaram no ordenamento interno brasileiro e a efetividade que a recepção das Convenções produziu nas relações de trabalho estão entre as questões analisadas neste estudo.

1.1 Origens da OIT

A história é feita da moldagem do homem e de seu ambiente ao longo do tempo. O trabalho faz parte desta história. Pode-se dizer que o trabalho existe desde que o primeiro homem habitou a Terra e que não há como dissociar a linha de evolução da humanidade sem demonstrar como ocorriam as relações de trabalho.

O trabalho é condição do ser humano. Pelo trabalho pode-se posicionar uma pessoa e sua condição social, intelectual, financeira, moral, enfim, a valoração que se dá ao trabalho que uma pessoa realiza é significativa em nossa sociedade.

(15)

A história da realização de ser social, muitos já o disseram, objetiva-se através da produção e reprodução de sua existência, ato social que se efetiva pelo trabalho. Este, por sua vez, desenvolve-se pelos laços de cooperação social existentes no processo de produção material. Em outras palavras, o ato de produção e reprodução da vida humana realiza-se pelo trabalho.1

Esta relação histórica não é, entretanto, em regra, pacífica. Aliás, o trabalho tem como referência histórica a condição de um fardo. A própria origem do termo mostra – do latim tripaliu: instrumento de tortura de três paus ou uma canga que pesava sobre os animais.2

Na referência bíblica acerca do trabalho, primeiro Deus deu ao homem a terra para dela cuidar: “Tomou, pois, o Senhor Deus ao Homem e o colocou no Jardim do Éden para cultivar e guardar”3 e, adiante, impõe o trabalho nela como castigo pelo descumprimento de sua ordem: “No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás”.4

As primeiras formas de trabalho não eram senão pelo objetivo de sobrevivência do homem. Segundo Marx (1986, p. 5) a alimentação, abrigo, proteção contra as intempéries e os inimigos, determinavam a necessidade de se trabalhar.

As primeiras referências da forma como o trabalho apresentava-se aos homens e como estes trabalhavam eram comuns. O homem primitivo tinha estes mesmos objetivos básicos e se adaptava às condições que possuía. Influências econômicas, sociais, políticas e religiosas não o distinguia naquele momento.

A primeira configuração de distinção do trabalho que se estabeleceu ao homem primitivo faz referência ao gênero. Enquanto o homem, por ter condições físicas adequadas, se dedicava à caça e à proteção, a mulher cuidava da prole, o que lhe colocava em uma situação de menor prestígio, pois a condição física é que determinava a posição social.

1 ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho? Ensaios sobre as Metamorfoses e a Centralidade do

Mundo do Trabalho. Campinas, SP: Cortez, 1995.

2 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

3 BÍBLIA. Bíblia Sagrada. Tradução Centro Bíblico Católico. 34. ed. rev. São Paulo: Ave Maria, 1959.

Gênesis, capítulo 2, versículo 15.

(16)

Tendo ultrapassado a fase de sobrevivência, volta-se o homem para a vida em conjunto, quando se associa em comunidades urbanas: uma necessidade, conforme Aristóteles,5 que afirma ser o homem um ser social por natureza.

Nesta condição social surgem as diferenças de maneira mais acentuada. O trabalho deixa de ser o de subsistência e passa a ser escravo, essencial para as civilizações antigas, entendido como natural e inerente àquele grupo de pessoas. A escravidão era compreendida como uma situação legítima (ARISTÓTELES, 2002, p. 16), tendo sido relatada já na Antiguidade, 4.000 anos antes de Cristo.

A etapa posterior à escravidão não é a liberdade do indivíduo, mas a servidão, quando a prisão que amarrava o homem passa a ser a terra onde trabalhava, não sendo dono de sua produção. Cria-se uma situação intermediária entre o escravo e o operário.6 O trabalho e o lar eram um mesmo espaço físico, com a participação da família inteira, e o trabalho ocupava todo o tempo que a luz natural permitia.

Pode-se estabelecer um terceiro momento histórico para esta análise como sendo o do surgimento das corporações de ofício, como expõe Segadas Vianna:

A identidade de profissão, como força de aproximação entre homens obrigava-os, para assegurar direitos e prerrogativas, a se unir, e começaram a apontar, aqui e ali, as corporações de ofício ou “Associações de Artes e Misteres”. O homem que, até então, trabalhava em benefício exclusivo do senhor da terra, tirando como proveito próprio a alimentação, o vestuário e a habitação, passara a exercer sua atividade, sua profissão em forma organizada, se bem que ainda não gozando da inteira liberdade. É que, senhor da disciplina, não só profissional, mas também pessoal do trabalhador, surgia a figura do “mestre.7

5 “A cidade é uma criação natural, e que o homem é por natureza um animal social, e que é por

natureza e não por mero acidente, não fizesse parte de cidade alguma, seria desprezível ou estaria acima da humanidade [...] Agora é evidente que o homem, muito mais que a abelha ou outro animal gregário, é um animal social. Como costumamos dizer, a natureza não faz nada sem um propósito, e o homem é o único entre os animais que tem o dom da fala”. Disponível em: <http://projetophronesis.com/2009/01/10/o-homem-e-um-animal-social-aristoteles/>.

6 O trabalho humano. Disponível em <http://www.cefuria.org.br/doc/cartilha2trabalhohumano.pdf>.

Acesso em: 12 abr. 2012.

7 VIANNA, Segadas. Antecedentes históricos. In: MARANHÃO, Délio et al. Instituições de Direito do Trabalho.16. ed. São Paulo: LTr, 1996. p. 31 V. I.

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Neste processo de transformação da sociedade e das estruturas de produção, o Feudalismo, no século 13, dá espaço a uma forma mais avançada de produção que libertou o trabalhador das amarras da sujeição do campesinato8 e criou uma nova classe social – os assalariados – conforme Weber:

A racionalização econômica levou à dissolução de formas produtivas do feudalismo, formulando uma mentalidade empresarial moderna, baseada no planejamento e contabilidade. O fim do feudalismo libertou a força de trabalho, facilitando a constituição do trabalho assalariado.9

Estas alterações não ocorrem apenas nas condições e relações da forma de produção; impactam também os modos de poder, apontando para o surgimento do Estado, conforme Bedin:

Assim, tendo submetido os poderes locais – senhores feudais e autoridades eclesiásticas inferiores – e fragilizado os poderes supranacionais Igreja e Sacro Império Romano-Germânico, as monarquias modernas e, em conseqüência, o Estado Moderno vão, aos poucos, tornando-se as principais unidades políticas da nova etapa da trajetória da humanidade (Romano; Tenenti, 1989; Van Dulmen, 1984). Com isso, vai-se afirmando o conceito de Estado como seria reconhecido nos próximos séculos do mundo moderno.10

Enfim, tem-se a passagem de um sistema político e a inclusão do Estado, ressaltando-se a importância deste ente político, que passa a se constituir como regulador social e garantidor de direitos, inclusive na perspectiva da constituição de direitos para a classe operária.

Consolidado o estado moderno e compreendido este processo de transformação das formas de produção e do próprio controle no mundo do trabalho, que antes era também espaço de intervenção da Igreja e passa a ser gerido por este novo ente, associa-se o surgimento da Revolução Industrial, ocorrida entre o século 17 e 18, fato determinante para as relações de trabalho no estado moderno11 e pós-moderno.

8 BEDIN, Gilmar Antonio. A Idade Média e o nascimento do Estado moderno: aspectos históricos e

teóricos, 2008. p. 29.

9 WEBER, Max apud ROUANET, S. P. Mal estar na modernidade. São Paulo: Companhia das Letras,

1993.

10 BEDIN, Gilmar Antonio, 2011, p. 81.

11 O Estado Moderno compreendeu o período entre os anos de 1648 e 1948, quando surge o Estado

(18)

Tendo como marco referencial de alteração na forma de operacionalização do trabalho e, por consequência, das relações entre empresários e operários, a Revolução Industrial trouxe aos países ocidentais, a divisão do trabalho, A especialização12 e o aparecimento do proletariado, com jornadas de 14 a 16 horas diárias e sem perspectivas de desenvolvimento, conforme Nascimento:

A imposição de condições de trabalho pelo empregador, a exigência de excessivas jornadas de trabalho, a exploração das mulheres e menores, que constituíam mão-de-obra mais barata, os acidentes ocorridos com os trabalhadores no desempenho de suas atividades e a insegurança quanto ao futuro e aos momentos nos quais fisicamente não tivessem condições de trabalhar foram as constantes da nova era no meio proletário, às quais podem-se acrescentar também os baixos salários.13

Neste momento os trabalhadores, além de todas as mazelas sociais impostas, não tinham o controle do processo de produção, da matéria-prima e nem do lucro. Ficavam expostos aos interesses dos empregadores praticamente sem controle ou limites. Esta situação se dava de forma mais efetiva primeiramente na Inglaterra, berço da Revolução Industrial e, posteriormente, nos países que assumiam este processo de industrialização.

Como resultado das condições precárias a que eram submetidos os trabalhadores, algumas vozes e atos governamentais surgiram em defesa destes operários,14 e com elas atos que buscavam garantir melhores condições na vida.

Tratando dos antecedentes da OIT, Sandi (1993, p. 62), considera a criação da organização resultado de um processo que foi construído por um longo período:

Pensamos que no es suficiente decir que la O.I.T. fue creada em 1919 al amparo del Tratado de Versalles, que puso fin a la Primera Guerra Mundial, junto con la Sociedad de Naciones, a la que sobrevivió, y que fue fundada por 45 países.

12 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do trabalho; história e teoria geral do direito do

trabalho: relações individuais e coletivas do trabalho. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

13 Ibidem, p. 15.

14 O inglês Robert Owen foi precursor na defesa de reformas sociais significativas, além de aplicar

essas novas ideias em sua fábrica de tecidos. No ano de 1818, esteve à frente de um manifesto na defesa da classe trabalhadora aos governantes da Santa Aliança. Sua proposta era de uma ampla reforma da sociedade mediante a cooperação mundial. Lê Grand, francês, por inúmeras vezes encaminhou ao governo Francês e aos principais dirigentes de países europeus, entre os anos de 1840 e 1853, proposta de criação de um acordo internacional para a legislação trabalhista que era fundamentada na proteção dos trabalhadores, opondo-se ao então trabalho prematuro e jornadas excessivas (NASCIMENTO, 2003, p. 31).

(19)

En realidad podemos ubicar claramente tres momentos de su historia, a saber: antecedentes, creación y evolución posterior. Por eso es que reseñaremos estos tres momentos.

O autor considera três momentos: o período prévio à criação, o próprio ato fundador e sua evolução. Anterior ao surgimento da OIT salientam os atos de Robert Owen e de Daniel Le Grand, já citados, além de Eduardo Duopétiaux15 sempre em defesa de regras nas relações de trabalho. Além destas intervenções pessoais que ocorreram no século 19, a de Marx, quando da criação da Associação Internacional dos Trabalhadores,16 foi importante para a instituição de um organismo internacional que pautasse as relações de trabalho.

Ainda segundo Sandi (1993, p. 62), também em 1880 a manifestação de Albert de Mun17 no parlamento francês ampliou o apoio à criação de uma legislação internacional. Neste período, a Alemanha de Bismark tomava a iniciativa de convocar a Conferência de Berlin,18 e a Suíça, que naquele momento estava adiantada com esta discussão, propôs a vários Estados Europeus uma conferência que tratasse do tema, restando aprovados seis itens.

Esta conferencia propuso seis puntos: prohibición del trabajo dominical, fijación de edad minima laboral, fijación de jornada laboral máxima para jóvenes, prohibición de emplear mujeres en labores dañinas a la salud, restricción del trabajo nocturno de niños y mujeres y modos de ejecución de convenios (SANDI, 1993, p. 63).

Em sequência ocorre a Conferência de Berlin, em 1890, porém apenas Alemanha e Suíça se dispuseram a adaptar suas normas aos tratados internacionais. No ano seguinte, o Papa Leão XIII promulga a Encíclica Rerum

15 Eduardo Duopétiaux, jornalista belga, formado em Direito, dedicou-se entre outras coisas para a

criação de Sindicatos e defesa da classe trabalhadora. Defendia o cargo até então inexistente de ministro de assuntos trabalhistas.

16 Fundada em 28 de setembro de 1864, em St. Martin's Hall de Londres, posteriormente conhecida

como Primeira Internacional. O Comitê provisório contou com Karl Marx entre seus membros. A mensagem inaugural centrava a ideia da tomada do poder político pelos trabalhadores e união fraterna entre os operários de diferentes países.

17 Adrien Marie Albert de Mun, francês, político, defensor de reformas sociais. Fundou o Clube

Operário Católico que se espalhou por toda a França.

18 A Conferência de Berlim ocorre entre 1884 e 1885 e tem como propósito tratar a questão das

Colônias Africanas. Foi convocada pelo chanceler Alemão Otto von Bismarck e teve a participação, além do país organizador, da Grã-Bretanha, França, Espanha, Itália, Bélgica, Holanda, Dinamarca, Estados Unidos, Suécia, Áustria-Hungria e do Império Otomano.

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Novarum.19 Em 1897, em Bruxelas, ocorre o 1° Congresso Internacional de Legislação do Trabalho, com caráter acadêmico, mas que influenciou significativamente as relações laborais posteriores. O Congresso ocorre novamente em Paris no ano de 1900.

Finalmente em 1901, em Basileia, na Suíça, ocorre o encontro seguinte, que pauta a criação da Assembleia Constitutiva da Associação Internacional para Proteção Legal dos Trabalhadores.20 Apesar de ser entidade privada, contava com forte apoio governamental. Participaram do ato de fundação a França, Itália, Países Baixos, Suíça, Alemanha, Áustria e Bélgica.

Em 1905 a Suíça provoca o debate entre os países, tendo como principal ponto os danos à saúde causados pelo uso e impacto do fósforo nos trabalhadores21 e o trabalho noturno das mulheres, sendo ratificado por dez países em 1908 e entrando em vigor em 1912. Estes dois pontos foram embrionários dos tratados internacionais. Em 1914 estava prevista nova conferência para estabelecer tratados entre estes países, porém a 1ª Guerra Mundial não permitiu sua realização.

Antes disso, em 1864, na Inglaterra, é criada a Associação Internacional dos Trabalhadores e, conforme Abendroth (1977, p. 35) teve a presença de representantes ingleses, franceses e alemães, entre estes Karl Marx, relator do projeto de estabelecimento da Associação, que apresentava como propósito debater acerca das mazelas sofridas pela classe operária. Posteriormente a Associação foi denominada Internacional Socialista.

Em 1919 é produzido o tratado de Versalhes, que oficializou o fim da I Guerra Mundial, cujas batalhas haviam encerrado em 1918. Deste Tratado de 440 artigos, 13 versam sobre a Organização Internacional do Trabalho22 e foram redigidos no

19 A Carta Encíclica Rerum Novarum trata sobre a condição dos operários. Apoiava a luta dos

trabalhadores não obstante condenar o socialismo. Criticava a ausência de valores à época e atribuía a esta condição parte dos problemas sociais vividos. Fazia referência à justiça na vida social e distribuição de riquezas.

20 Associação Internacional para Proteção Legal dos Trabalhadores com sede em Basiléia, na Suíça.

Importante salientar que desta Associação surgiu o primeiro tratado bilateral entre a França e a Itália, de 1909, e as primeiras convenções internacionais em 1906, resultando na realização das Conferências de Berna a partir de 1905 Disponível em: <http://fdc.br/Arquivos/Mestrado/Revis-tas/Revista09/Artigos/Zoraide.pdf>

21 O fósforo é causador de doenças profissionais, tendo sido proibido seu uso na Alemanha em 1903

e nos Estados Unidos em 1912. Disponível em: <www.ebah.com.br>. Acesso em 20 mar. 2014.

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período de janeiro a abril de 1919 pela Comissão de Legislação Internacional do Trabalho. Formaram a Comissão representantes da Bélgica, Cuba, Checoslováquia, Estados Unidos, França, Japão, Polônia e Reino Unido, cabendo ao representante americano a coordenação das atividades.

A primeira sessão desta parte do Tratado apresenta o propósito de justiça social nas relações de trabalho.

[...] a Liga das Nações tem por objetivo o estabelecimento da paz universal, e essa paz só pode ser constituída se for baseada na justiça social. As condições de trabalho, entretanto, existem envolvendo injustiça social, sofrimento e privações para um grande número de pessoas. Tal fato produz uma perturbação tão grande que leva a paz e a harmonia do mundo ao perigo. Dessa forma, uma melhoria das condições de trabalho seria urgentemente necessária.23

Não eram, entretanto, apenas sentimentos de apoio à classe operária que motivavam a inclusão e aceitação da OIT imediatamente após a sua criação. O momento histórico comportava ainda a Revolução Russa, de 1917, e suas influências, e, portanto, a aceitação por outros países também tinha como propósito evitar o crescimento da organização da classe trabalhadora por si mesma.24

Desta forma, o processo de criação da OIT emerge pela existência do Estado e resultado da difícil situação a que estavam expostos os trabalhadores durante o século 19 e início do século 20, gerando um grande conjunto de operários expostos a condições quase miseráveis. Também pelo processo de finalização de uma guerra que expôs mais mazelas sociais, principalmente aos menos favorecidos, como os trabalhadores, e do impacto da revolução proletária russa e o receio de sua proliferação em outros países.

Enfim, em 1919, em Paris, surge a Organização Internacional do Trabalho, que traz em seu preâmbulo:

Considerando que só se pode fundar uma paz universal e duradoura com base na justiça social;

Considerando que a não adoção, por parte de qualquer nação, de um regime de trabalho realmente humano se torna um obstáculo aos esforços de outras nações empenhadas em melhorar o futuro dos trabalhadores nos seus próprios países;

[...]

23 Como consta no Tratado de Versalles, artigos 387-399, parte XIII, sessão I. 1919.

24 FERRERAS, Norbert Osvaldo. Entre a expansão e a sobrevivência: a viagem de Albert Thomas ao

Cone Sul da América. Antíteses, v. 4, n. 7, p. 127-150, jan./jun. 2011. Disponível em: <http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/antiteses>. Acesso em: 10 nov. 2013.

(22)

As Altas Partes Contratantes, movidas por sentimentos de justiça e de humanidade, assim como pelo desejo de assegurar uma paz mundial duradoura, e tendo em vista alcançar os objetivos enunciados neste preâmbulo, aprovam a presente Constituição da Organização Internacional do Trabalho:25

Os propósitos da OIT estão vinculados ao pleno emprego e melhorias nas condições de vida dos trabalhadores, conforme Valticos (1996, p. 518)

La Declaración destaca sobre todos los objetivos del pleno empleo y del aumento de los niveles de vida. Aboga por una concepción amplia de la seguridad social y, además del logro del progreso material y de la seguridad económica, afirma la importáncia de los valores de libertad, dignidad e igualdad, en especial la igualdad de oportunidades. La Declaración abarca a todos los seres humanos y define los objetivos sociales de manera muy ampliada, manifestando el interés de la OIT por las cuestiones económicas que pueden influir en los problemas sociales.

Destaca-se a afirmação do autor quanto aos valores da liberdade, dignidade e igualdade, especialmente a igualdade de oportunidades, valores maiores de todas as relações sociais, mas entendidos aqui na perspectiva do mundo do trabalho.

É preciso reconhecer que o homem deve ser a medida de todas as coisas e que para esta condição a OIT foi criada. Sua estrutura e forma de participação deve espelhar esta condição.

1.2. Estrutura da OIT Como Espaço de Criação de Direitos

A dignidade não existe de forma fatiada: o ser humano não possui esta condição senão dentro de todas as relações em que está inserido. O entendimento contemporâneo de que todos os homens devem ser tratados de forma digna extrapolou os Estados e determinou a criação de referências internacionais de direitos humanos.

Considerando que o trabalho existe onde está o homem, pode-se definir que são os laboradores um dos mais abrangentes grupos para efetivação de direitos ou para espera de sua efetivação. Se no trabalho o homem pode encontrar um espaço social, também por meio dele pode se deparar com mazelas e condições indignas, situações precárias ou até trabalho forçado.

25 Organização Internacional do Trabalho – Documentos fundamentais.

(23)

Esta condição também se apresenta nas relações entre os agentes do capital e do trabalho. Inúmeros são os relatos históricos de confrontos que tiveram origem nestas relações.

A imposição de condições de trabalho pelo empregador, a exigência de excessivas jornadas de trabalho, a exploração das mulheres e menores, que constituíam mão-de-obra mais barata, os acidentes ocorridos com os trabalhadores no desempenho de suas atividades e a insegurança quanto ao futuro e aos momentos nos quais fisicamente não tivessem condições de trabalhar, foram as constantes da nova era no meio proletário, às quais podem-se acrescentar também os baixos salários.26

Fazendo-se a análise da abrangência dos direitos humanos e também do trabalho, é possível entender a necessidade da efetivação dos direitos humanos nas relações de trabalho, quando o embate é permanente, o que cria a necessidade de legislação que permeie o tema. Nesta perspectiva de criar valores internacionais para o tema direitos humanos, inserem-se as normatizações acerca das relações de trabalho e a OIT.

É possível afirmar que o propósito da OIT seja instituir uma linguagem universal, em se tratando de normas de trabalho ou direito dos trabalhadores, fundamentada na igualdade, conforme citam Pamplona Filho e Marco Antonio Villatore:

O objetivo da OIT é o de proporcionar melhoria das condições de trabalho e das condições humanas, buscar igualdade de oportunidades, a proteção do trabalhador em suas condições de trabalho, enfim, a cooperação entre os povos para promover o bem comum e a primazia do social em toda a planificação econômica é a finalidade social do desenvolvimento econômico (2001, p. 68).

Para que este objetivo seja atingido, faz-se necessária a participação dos Estados, dos empregados e dos empregadores. Tem-se, portanto, que uma das especificidades da OIT é a descentralização de suas estruturas. A descentralização é entendida por Bobbio, Matteucci e Pasquino (2004, p. 332) como uma forma de democracia e de respeito à autonomia:

(24)

É afirmação constante e generalizada que existe uma estreita conexão entre os conceitos de Descentralização e de democracia, também em relação ao fato de que a luta pela Descentralização constitui, principalmente a luta pelas autonomias locais a fim de perseguir. Além da Descentralização, objetivos de democratização[...] A Descentralização seria o meio para poder chegar, através de uma distruição da soberania, a uma real liberdade política.

Além desta visão de democracia, a descentralização se torna imperativa na perspectiva da possibilidade de regulamentar o tema proposto. “Um dos principais motivos para a descentralização é precisamente o fato de que ela fornece esta possibilidade de se regulamentar a mesma matéria de modo diferente para diferentes regiões” (KELSEN, 2005, p. 435).

Ainda tratando da q uestão que vincula a descentralização com a democracia, Kelsen afirma que “[...] A democracia pode ser descrita como um método descentralizado de criação de normas, já que, numa democracia, as normas jurídicas são criadas pela pluralidade dos indivíduos cujo comportamento elas regulamentam” (2005, p. 433).

Referindo-se aos organismos internacionais, Sandi (apud MONTIEL ARGÜELLO, 1982, p. 161) afirma que “asociaciones voluntarias de sujetos de Derecho internacional que crean una institución estable dotada de órganos propios mediante los cuales realiza sus funciones en el campo que le ha sido designado.”27 Estas organizações, portanto, constituem-se em estruturas estáveis que auxiliam no processo de formalização dos atos para os quais foram criadas.

Referindo-se de forma específica à OIT, a descentralização se apresenta por intermédio de sua estrutura pulverizada em inúmeros países com escritório regional, escritório de zona, escritório de enlace e equipe consultiva multidisciplinar, e com a particularidade de que as suas delegacões não são organismos apenas estatais, mas também privados, e pela participação de patrões e empregadores, que associados ao Estado, formam a estrutura tripartite, conforme Sandi:

[...] y coloca a la OIT como organismo especializado de la ONU y cuya particularidad es que las delegaciones ante ella no son solo organismos estatales sino también, constituidos por patronos y trabajadores (apud MONTIEL ARGÜELLO, 1982, p. 161).

27 MONTIEL ARGUELLO, Alejandro. Manual de Derecho Internacional Público y Privado. Guatemala:

(25)

Confirmando que a formatação desta estrutura tripartite é referencial histórico da Organização, Gunther considera:

O tripartismo é a base institucional da OIT. Entende-se por tripartismo a participação em pé de igualdade dentro dos trabalhos da OIT, não somente dos representantes governamentais, mas, também, dos empregadores e dos trabalhadores dos respectivos Estados-membros da Organização. O tripartismo demonstrou ser um sistema eficaz de ação dentro da OIT e uma garantia de viabilidade na aplicação prática dos seus acordos. O tripartismo conferiu, além disso, à OIT, um ambiente de uma ativa e permanente negociação (2011, p. 42).

O autor ainda lembra do discurso do Papa Paulo VI, referindo-se à tripartição de decisões como elemento permanente da OIT (MONTT BALMACENA apud GUNTHER, 2011, p. 42).

Vossa Carta original e orgânica faz concorrer as três forças que se movem na dinâmica humana do trabalho moderno: os homens do governo, os empregadores e os trabalhadores. O vosso método consiste em harmonizar estas três forças; não fazê-las opor-se, senão que concorrer em uma colaboração valente e fecunda através de um constante diálogo ao estudo e solução de problemas sempre emergentes e sem cessar renovadas.28

É inegável que este processo de tripartição nos espaços da Organização permite, além da democratização de suas decisões, conforme já citado, também a possibilidade do estudo dos problemas, um dos papéis institucionais da OIT, de forma mais efetiva, uma vez que os atores envolvidos no processo estão diretamente vinculados nos espaços de discussão e tomada de decisão.

Analisando a importância desta formatação, considera Tapiola (2001, p. 66):

Debemos recordar la finalidad que tenía el modelo de cooperación tripartita y lo que se suponía que éste debía evitar. Su finalidad consistía en crear relaciones armoniosas en la sociedad y, en particular, en los lugares de trabajo, donde se crea y redistribuye la riqueza nacional. Se pretendía con este modelo alcanzar normas laborales decentes, lo que implica que no se debía forzar la competitividad a costa de la salud, la seguridad y los derechos básicos de los trabajadores y trabajadoras. El modelo estaba a favor de una cooperación participativa para las personas directamente implicadas, lo que representaba una parte esencial de la democracia.

28 No ano de 1982 o Papa João Paulo II pronunciou as mesmas palavras na 68ª Reunião da

(26)

Lembra também o mesmo autor o avanço que isto representou na época:

Partiendo de un modelo que ya en 1919 era bastante avanzado, la promoción de los principios y derechos fundamentales en el trabajo, una labor central de la OIT, ha evolucionado tomando en cuenta e inclusive anticipándose a las evoluciones que se fueron produciendo en el mundo. Esta formatação está pacificada dentro do organismo, tornando-se inclusive referência em sua forma de atuação e dando-lhe maior credibilidade, conforme Barros:

O sistema tripartite sobreviveu e hoje constitui a pedra angular da OIT, sendo sua verdadeira força motriz. Suas decisões têm maior autoridade, visto serem aprovadas pela maioria dos representantes da delegação e, por isso mesmo, têm maior eficácia, sobretudo quando se analisa o sistema de supervisão e controle de aplicação de suas normas (2008).

Para que este propósito de universalização dos direitos dos trabalhadores fosse atingido, a estrutura da OIT foi descentralizada, prevista já na sua fundação, conforme o artigo 38829 do Tratado de Versalhes:

Art. 388 – A organização permanente inclui:

1 – A conferência geral de representantes dos membros;

2 – Um escritório internacional do trabalho, sob a direção do conselho previsto no artigo 393.

O artigo 393 do Tratado em referência confirmava que a OIT deve ser colocada sob a direção de um conselho de administração que, à época, era composto por 24 pessoas. Destas, 12 representavam os governos, 6 os trabalhadores e 6 representavam os empregadores, constituindo um espaço democrático já na estrutura administrativa da entidade.

A formatação e funcionamento da OIT foi estabelecida em sua Constituição aprovada na 29ª Reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Montreal, no ano de 1946, e traz em seu Preâmbulo:30

29 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1976. p. 72. 30 Constituição da Organização Internacional do Trabalho. Disponível em:

(27)

Considerando que a paz para ser universal e duradoura deve assentar sobre a justiça social;

Considerando que existem condições de trabalho que implicam, para grande número de indivíduos, miséria e privações, e que o descontentamento que daí decorre põe em perigo a paz e a harmonia universais, e considerando que é urgente melhorar essas condições no que se refere, por exemplo, à regulamentação das horas de trabalho, à fixação de uma duração máxima do dia e da semana de trabalho, ao recrutamento da mão-de-obra, à luta contra o desemprego, à garantia de um salário que assegure condições de existência convenientes, à proteção dos trabalhadores contra as moléstias graves ou profissionais e os acidentes do trabalho, à proteção das crianças, dos adolescentes e das mulheres, às pensões de velhice e de invalidez, à defesa dos interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro, à afirmação do princípio "para igual trabalho, mesmo salário", à afirmação do princípio de liberdade sindical, à organização do ensino profissional e técnico, e outras medidas análogas;

Considerando que a não adoção por qualquer nação de um regime de trabalho realmente humano cria obstáculos aos esforços das outras nações desejosas de melhorar a sorte dos trabalhadores nos seus próprios territórios.

AS ALTAS PARTES CONTRATANTES, movidas por sentimentos de justiça e humanidade e pelo desejo de assegurar uma paz mundial duradoura, visando os fins enunciados neste preâmbulo, aprovam a presente Constituição da Organização Internacional do Trabalho:

A participação dos estados-membros conserva os participantes de sua criação e os membros que forem integrados às Nações Unidas, desde que informem oficialmente sua intenção de aceitar integralmente as obrigações decorrentes da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, conforme artigo 1º da Constituição da OIT.

A organização está prevista no artigo 2º da norma e estabelece uma organização permanente composta da Conferência geral, constituída pelos representantes dos estados-membros; um Conselho de Administração composto por 28 representantes dos governos, 14 representantes dos empregados e 14 representantes dos empregadores, totalizando 56 membros,31 e uma Repartição Internacional do Trabalho sob a direção de um Conselho de Administração.

No Conselho de Administração os postos governamentais são ocupados por vagas transitórias e permanentes. As vagas permanentes são ocupadas pelos países considerados de maior importância industrial, dentre eles o Brasil.32

31 Artigo 7 da Constituição da OIT. Disponível em:

<http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/to-pic/decent_work/doc/constituicao_oit_538.pdf>. Acesso em: 11 set. 2013.

32 Artigo 7, 2 da Constituição da OIT. Além do Brasil, têm assento permanente no Conselho a

(28)

Os demais representantes governamentais são eleitos a cada 3 anos pelos delegados da Conferência respeitando a lógica da distribuição geográfica. Os representantes dos empregados e dos empregadores são eleitos diretamente por seus pares.33

Este Conselho de Administração, que desempenha papel executivo e administrador, reune-se três vezes ao ano em Genebra, na Suíça, e tem como atribuições a elaboração e o controle da execução das políticas e programas da OIT, a eleição do diretor-geral e a elaboração do programa e orçamento bienal. É sua incumbência, também, definir o local, data e pauta das discussões da Assembleia Geral.

A Conferência Internacional do Trabalho ocorre sempre no mês de junho de cada ano em Genebra, na Suíça, com a participação de todos os estados-membros. A delegação destes Estados é formada por quatro representantes de cada um dos membros, dos quais dois são delegados do governo e os outros dois representam, respectivamente, os empregados e os empregadores, conforme determinado no artigo 3º.

A Conferência trata dos diversos temas do trabalho, adota e revisa normas internacionais do trabalho, orienta as políticas públicas gerais e programa os trabalhos e orçamentos. O orçamento tem origem em recursos financiados pelos estados-membros.

A estrutura da Organização conta ainda com a Repartição Internacional do Trabalho, que contempla o Secretariado Geral que permanece em Genebra, na Suíça, sede principal da OIT, sob a direção do Conselho de Administração, conforme previsto no artigo 2º da Constituição da OIT.

A Repartição Geral, conforme o artigo 8º 1, terá um “Diretor-Geral, designado pelo Conselho de Administração, responsável, perante este, pelo bom funcionamento da Repartição e pela realização de todos os trabalhos que lhe forem confiados.”34

33 Conforme a Constituição da OIT, artigo 7.4: os representantes dos empregadores e os dos

empregados serão, respectivamente, eleitos pelos delegados dos empregadores e pelos delegados dos trabalhadores à Conferência.

(29)

A função da Repartição Internacional do Trabalho está definida no artigo 10º

da Constituição:

1. A Repartição Internacional do Trabalho terá por funções a centralização e a distribuição de todas as informações referentes à regulamentação internacional da condição dos trabalhadores e do regime do trabalho e, em particular, o estudo das questões que lhe compete submeter às discussões da Conferência para conclusão das convenções internacionais assim como a realização de todos os inquéritos especiais prescritos pela Conferência, ou pelo Conselho de Administração.

É de competência da Repartição a parte administrativa da estrutura que organiza, analisa e operacionaliza as questões vinculadas às condições dos trabalhadores. Trata da organização de suas operações, tais como as pesquisas administrativas, produção de estudos, publicações, reuniões tripartites setoriais e reuniões de comissões e comitês.

Referindo-se à importância da Repartição para a estrutura da OIT, De La Cueva (apud GUNTHER, 2011, p. 48) afirma: “é o motor da instituição, a força que impulsiona seus fins e realiza uma parte importante deles”.

Também é de competência da Repartição o recebimento de reclamações quanto ao descumprimento das diretrizes pelos países signatários, importante espaço para a formalização de denúncias por condições inadequadas de trabalho.

Por ter sua estrutura descentralizada, a OIT possui cinco Escritórios Regionais, sendo localizados de forma estratégica em cada continente.35 Além dos Escritórios Regionais, a estrutura contempla 26 escritórios de área, um dos quais encontra-se no Brasil, e 12 equipes técnicas multidisciplinares de apoio aos escritórios.

Ademais desta estrutura, conta a organização da OIT com 11 correspondentes nacionais, que sustentam a administrtação dos programas, projetos e atividades de cooperação técnica e de reuniões regionais, sub-regionais e nacionais.

35 Na América do Sul a sede do escritório regional é em Lima, no Peru. Além do escritório na América

do Sul, a OIT possui, ainda no Continente Americano um escritório junto a sede das Nações Unidas em Nova Iorque e o Escritório da OIT para os Estados Unidos em Washington, ambos nos Estados Unidos. Nos demais continentes encontram-se escritórios para a Europa e Ásia Central em Genebra na Suíça, para o Continente Africano em Adis Abeba, Etiópia, na Ásia para o Pacífico em Bangkok na Tailândia e escritório também em Beirute no Líbano. Disponível em: <www.ilo.org/global/regions/lang--en/index.htm>. Acesso em: 10 out. 2013.

(30)

As despesas financeiras são custeadas, de acordo com a sua Constituição, entre os estados-membros.36 Eventuais dívidas podem inibir a participação do Estado devedor das atividades da Organização, conforme previsto também em sua Constituição.

Além de ser a única repartição das Nações Unidas que conta com estrutura tripartite, a sua descentralização permite a presença dos envolvidos diretamente nas ações, conforme cita Pamplona Filho:37

Em contraponto aos demais direitos sociais, os direitos trabalhistas exigem também a participação de terceiros para a sua implementação. Aqui se recorre às lições de Abrantes, para quem os direitos sociais se caracterizam não só por serem exigíveis apenas contra o Estado, mas através dele [...] Por esse motivo, o mecanismo adotado pela OIT foi a inclusão da sociedade civil no seu foro de discussão, conferindo-lhe voz ativa. Tal qual se prevê a participação governamental nas deliberações, também os agentes econômicos de cada país foram convidados a tomar as decisões que irão lhe afetar diretamente.

Ainda segundo Pamplona Filho, salienta-se a participação de representantes da sociedade civil, empregados e agentes econômicos por meio dos empregadores, que, mesmo não sendo os únicos destinatários das normas da OIT, que são fundamentos para toda a humanidade, têm como princípio aprimorar as relações sociais pela valorização do trabalhador.38

Logo, não teria qualquer sentido alijar do processo de deliberação das normas internacionais do trabalho justamente os trabalhadores. E de fato foi contemplada a participação destes enquanto delegados dos Estados Membros que compõem a OIT. Mas a sociedade civil não estaria corretamente representada sem a participação também dos empregadores, especialmente porque serão estes que deverão realizar as normas de direitos sociais trabalhistas previstas pelo Estado. Deve ser frisado que a meta de aprimoramento das relações de trabalho não implica em reconhecer tão somente a proteção do trabalhador, mas sim a construção de um sistema normativo que se adapte às demandas sociais e econômicas. Portanto, necessária se faz a participação dos empregadores, também representados por delegados.

36 Constituição da OIT. Artigo 13. Ítem 3. As despesas da Organização Internacional do Trabalho

serão custeadas pelos estados-membros, segundo os acordos vigentes, em virtude do parágrafo 1º ou do parágrafo 2º letra c do presente artigo.

37 PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Estrutura da Organização Internacional do Trabalho: aspectos

histórico-Institucionais e conômicos. Disponível em: <http://www.editoramagister.com/dou-trina_24301422_ESTRUTURA_DA_ORGANIZACAO_INTERNACIONAL_DO_TRABALHO_ASPEC TOS_HISTORICO_INSTITUCIONAIS_E_ECONOMICOS.aspx>. Acesso em: 10 out. 2013.

(31)

Este processo de estrutura participativa demonstra-se eficiente, pois representa a sociedade civil quando elege os dois segmentos diretamente envolvidos e, desta forma, permite a construção de um sistema de proteção ao trabalhador que, conforme o autor, se adapta também às demandas sociais e econômicas.

Com esta formatação, a Organização Internacional do Trabalho está presente em todos os continentes, por intermédio de seus escritórios e equipes técnicas. O resultado desta descentralização e da estrutura tripartite surge especialmente em suas conferências internacionais pela elaboração de um conjunto de resoluções, com o objetivo de estabelecer parâmetros comuns aos povos sobre as relações entre o capital e o trabalho.

1.3 Principais Resoluções da OIT

A OIT busca como fundamento a justiça e a felicidade nas relações de trabalho, e a noção de justiça, tal como a noção de Direitos Humanos, está em constante expansão, conforme Valticos (1996, p. 517):

La OIT aspira fundamentalmente y sobre todo a conseguir más justicia y felicidad en este mundo. La noción misma de justicia, al igual que la de derechos humanos, está en expansión constante a largo plazo, independientemente de las pausas que pueden registrarse. Por consiguiente, las normas de la OIT, que deben atender esa exigencia, no pueden sino progresar, por desigual que sea su desarrollo.

As resoluções da OIT buscam, portanto, estabelecer a medida e a forma do trabalho para o homem e, além de questões como justiça e felicidade, a liberdade e as relações sociais estão presentes em toda sua esfera de atuação. Conforme salienta o mesmo autor (1996, p.15), o homem deve ser a medida de todas as coisas:

Decir que el hombre es la medida de todas las cosas, que la justicia y la libertad han de regir las relaciones sociales, que la economía ha de estar al servicio de la condición humana y que la paz requiere la justicia entre los hombres equivale a decir verdades evidentes que, sin embargo, no se sienten y creen realmente, por lo menos de manera general; es más, algunos medios, tanto gubernamentales como privados, parece que las consideran fórmulas vacías de contenido o, como escribió Albert Thomas, “frontispicios pomposos y sin alcance real”, o como máximo “piadosas esperanzas”. La verdad es que esos principios constituyen la base de la OIT. Por supuesto, es también una organización técnica en la esfera sociolaboral, pero sujeta a unos objetivos globales que, como se ha dicho, son de carácter más general.

(32)

Para formalizar estas perspectivas, a OIT tem atuação em âmbito internacional. As normas por ela produzidas têm o propósito de criar um patamar mínimo de regramento nas formas de trabalho. Esta elaboração ocorre principalmente pelas Convenções, Resoluções e Regulamentos, aprovados em Assembleia Geral.

A Constituição da OIT estabelece a forma como uma proposta poderá ser constituída, conforme seu artigo 19:

1. Se a Conferência pronunciar-se pela aceitação de propostas relativas a um assunto na sua ordem do dia, deverá decidir se essas propostas tomarão a forma: a) de uma convenção internacional; b) de uma recomendação, quando o assunto tratado, ou um de seus aspectos não permitir a adoção imediata de uma convenção.

2. Em ambos os casos, para que uma convenção ou uma recomendação seja aceita em votação final pela Conferência, são necessários dois terços dos votos presentes.

Quando a proposta apresentada pressupõe maior importância, ela é convertida em Convenção Internacional, que estabelece regras gerais e possui caráter obrigatório para os Estados, que a recepcionam em seus ordenamentos jurídicos. Esta distinção da Convenção em relação a outras orientações é apresentada por Cesarino Júnior (1980, p. 83):

As convenções internacionais do trabalho não têm, por si mesmas, efeito obrigatório; é por suas ratificações que um estado assume a obrigação de pô-las em execução. Sua promulgação já na órbita do direito interno introduz as disposições da convenção na ordem jurídica nacional. Para cada convenção, específicas regras relativas à sua entrada em vigor estão contidas em suas cláusulas finais. Há instrumentos idênticos às convenções quanto à sua forma e à sua elaboração, mas que não devem, obrigatoriamente, como as convenções, ser submetidas à sua ratificação. Tratam-se das resoluções, que são meros convites aos Estados para seguirem certas regras.

A Recomendação não é revestida da mesma importância e passa a ser uma sugestão para que os Estados a analisem de forma facultativa. Estas recomendações têm o sentido de orientação ou são meramente indicativas. Cabe ressaltar que, não obstante às orientações da OIT, a obrigatoriedade na recepção de Convenções não é regra, pois se sobrepõe à legislação de cada país membro quanto à forma de aprovação, recepção e condição que esta resolução irá adquirir. Assim, asseveram Fontoura e Gunther (2001, p. 144)

(33)

Assim, o artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho dispõe certas obrigações específicas de comportamento dos Estados com relação às convenções ou recomendações e que não implicam obrigatoriedade alguma a respeito de seus conteúdos.

A OIT, por meio da Declaração de Princípios Fundamentais e Direitos no Trabalho,39 ocorrida em 1998, sedimentou as suas Convenções Fundamentais que devem ser ratificadas e aplicadas por todos os seus estados membros. Segundo Tapiola (2001, p. 68), este debate surge pela consciência de que os mercados e a democracia não são suficientes para resolver os problemas da classe trabalhadora. “El debate de las normas fundamentales del trabajo de los años noventa se inició al tomarse consciencia de que los mercados y la democratización por sí solo no podían resolver los males del mundo y, más especialmente, de su clase trabajadora.” Estas convenções, em número de oito, são parte do conjunto de Convenções historicamente aprovadas nas Conferências Internacionais do Trabalho.

O texto desta declaração apresenta a forma de divisão das Convenções,40

Declara que todos os Membros, ainda que não tenham ratificado as convenções aludidas, têm um compromisso derivado do fato de pertencer à Organização de respeitar, promover e tornar realidade, de boa fé e de conformidade com a Constituição, os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto dessas convenções, isto é:

a) a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva;

b) a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; c) a abolição efetiva do trabalho infantil; e

d) a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação. Além desta classificação, outras quatro Convenções também sinalizam condições de especial importância e são classificadas como prioritárias. As demais são agrupadas pelos temas que afirmam. Sobre os princípios e direitos fundamentais, considera Cecato (2007, p. 11):

39 Em 1998, após o fim da guerra fria, foi adotada a Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos

Fundamentais no Trabalho e seu Seguimento. O documento é uma reafirmação universal do compromisso dos estados membros e da comunidade internacional em geral, de respeitar, promover e aplicar de boa-fé os princípios fundamentais e direitos no trabalho. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/node/294>. Acesso em: 20 mar. 2014.

40 Declaração da OIT Sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho. Disponível em:

(34)

A Declaração sobre princípios e direitos fundamentais no trabalho, adotada pela OIT, em 1998, e reconhecida, no nível mundial, como paradigma dos direitos humanos do trabalhador, tem conteúdo de oito Convenções adotadas ao longo da existência da Organização. O texto estabelece quatro temas como rol mínimo dos direitos fundamentais laborais: eliminação do trabalho forçado (Convenções n. 29 e 105); a erradicação do trabalho infantil (Convenções n. 138 e 182); a não discriminação no trabalho e no emprego (Convenções n. 100 e 111) e a liberdade sindical (Convenções n. 87 e 98). Tratando das Convenções afirmadas como fundamentais, a mais antiga data de 1930. Foi a 29º Convenção da OIT e versa sobre o Trabalho Forçado, na perspectiva de eliminar esta forma de trabalho assim como o trabalho obrigatório, ressalvado o serviço militar e situações de emergência.

O entendimento do que seja o trabalho escravo, no atual período, também difere da caracterização do escravo de séculos anteriores. Para o doutrinador Amauri Mascaro Nascimento, o trabalho escravo ou o trabalho em condição análoga ao de escravo, é uma “força específica de trabalho forçado. Caracteriza-se pelo cerceamento real da liberdade de uma pessoa” (2010, p. 924).

Pela ausência de um conceito pronto, Nascimento estabelece as condições para a confirmação desta forma de trabalho:

o constrangimento no recrutamento, o trabalho forçado no seu desenvolvimento, a restrição à liberdade do prestador de se desligar da situação que se formou, direta por meios físicos ou morais, ou indireta em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto com o fim de retê-lo no retê-local de trabalho, pela apreensão de documentos ou objetos pessoais do empregador, para mantê-lo, contra a sua vontade, na situação subjugada em que ele ou seus familiares se encontram (2010, p. 926).

Também tratando do tema trabalho forçado, a Convenção 65, de 1957, proíbe esta forma de trabalho como meio de coerção ou de educação política, como castigo para quem expressa opiniões políticas ou ideológicas, como medida de discriminação e inclusive como punição por participação em greves.

Trata-se de um dos quatro eixos que compõem estas Convenções, entendidas como fundamentais por compreenderem os paradigmas que devem nortear os trabalhadores nas relações laborais pela perspectiva de inibir qualquer forma de trabalho que não contemple a livre-opção do trabalhador na sua realização.

Referências

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