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Caderno de Sociologia Jurídica

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Academic year: 2021

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Texto

(1)

Prof. Eduardo Faria

Por Giselle Viana

Contibuições de Erica Makiyama

Sala XII - 185

(2)

A

ULA

1

C

ONFLITOS NA

F

ORMAÇÃO DO

D

IREITO

... 3

A Industrialização Brasileira ... 3

A Crise do Petróleo e os novos conflitos ... 3

A Sociologia do Direito ... 5

Dimensões da Norma ... 6

Conflitos na Origem do Direito ... 6

Objeto da Sociologia Jurídica ... 7

S

EMINÁRIO

1

A

S TRANSFORMAÇÕES

C

ONTEMPORÂNEAS NO

U

NIVERSO

J

URÍDICO

... 8

A

ULA

2

V

ISÕES DO

D

IREIT

... 9

Visões do Direito ... 9

Desengate Estrutural ... 11

Explosão de Litigiosidade ... 12

S

EMINÁRIO

2

O

BJETO

,

P

ROBLEMAS E

D

ILEMAS DA

S

OCIOLOGIA

J

URÍDICA

... 12

A

ULA

3

F

UNÇÕES DO

D

IREITO E

T

IPOS DE

N

ORMA

... 13

Funções do Direito e Tipos de Norma ... 13

As Normas ao longo da História ... 16

Direito e Sociedade no Brasil ... 18

O Capitalismo Tardio ... 20

O Direito e o Autoritarismo ... 21

Consequências do Capitalismo Tardio na Sociedade Brasileira ... 22

Problemas de Governabilidade ... 24

S

EMINÁRIO

3

-

A

S

OCIOLOGIA

J

URÍDICA E O

P

LURALISMO

N

ORMATIVO

... 24

A

ULA

4

A

F

ORMAÇÃO DOS

L

ITÍGIOS NO

B

RASIL

... 25

Problemas do Modelo Varguista e o Fim da Ditadura ... 27

Desemprego e Justiça do Trabalho ... 32

As novas gerações: desemprego e violência ... 33

O Cidadão Brasileiro e o Direito ... 34

A

ULA

5:

E

STRUTURA DO

P

ODER NO

B

RASIL

... 35

Política e Moralidade ... 35

A Premissa Varguista: Medidas e Repercussões ... 36

Presidencialismo de Coalisão ... 39

S

EMINÁRIO

5–

O

J

UDICIÁRIO E A RESPOSTA ÀS DEMANDAS SOCIAIS

... 40

A

ULA

6:

A

S

OCIEDADE COMO

S

ISTEMA

... 41

Subsistemas Sociais ... 41

(3)

Efeitos da Inflação nos Sistemas Sociais ... 43

O Enfrentamento da Crise: Pacotes Econômicos ... 44

A

ULA

7

A

T

RANSIÇÃO PARA O

N

OVO

P

ARADIGMA

... 46

Ações Sociais ... 46

Reformas do Estado: o Novo Paradigma ... 47

S

EMINÁRIO

7

A

R

ECONSTRUÇÃO

E

CONÔMICA E AS

T

RANSFORMAÇÕES DO

E

STADO

... 50

A

ULA

08

-

C

ONSEQUÊNCIAS DA

T

RANSIÇÃO PARA A

S

OCIEDADE

I

NFORMACIONAL

... 51

Consequências da Transição ... 51

Mudança no Perfil do Trabalho ... 53

A

ULA

09

-

O

P

ROFISSIONAL DO

F

UTURO

... 56

O Tempo e o Direito ... 56

O Espaço e o Direito ... 57

A Destruição Criadorea ... 57

Problemas ... 61

A

ULA

10

-

O

D

IREITO DO

S

ÉC

.

XXI ... 62

Papel do Direito no Séc. XXI ... 62

A Questão das Normas e Princípios ... 64

O Custo dos Direitos e o Mercado Internacional ... 64

Sindicalismo ... 67

(4)

Aula 1 – Conflitos na Formação do Direito

A

I

NDUSTRIALIZAÇÃO

B

RASILEIRA

A industrialização brasileira, que começa nos anos 30, foi muito acelerada e desenvolveu-se com base no setor siderúrgico e automobilístico. Essa industrialização provocou um enorme deslocamento populacional e um brutal processo de urbanização. Isso porque, com a industrialização e as altíssimas taxas de crescimento econômico, cresceu a necessidade de mão de obra, tanto qualificada quanto não qualificada, e isso funcionou como um fator de aceleração do processo migratório.

Essa explosão demográfica leva a novos fatores, a novas cláusulas morais. Com a mudança do perfil social brasileiro, modificam-se também os valores que pautam a vida social, que passa a ser majoritariamente urbana.

Como dito, toda a lógica do desenvolvimento brasileiro vai se dar em torno do setor automobilístico, acompanhando portanto sua matriz energética. Aliás, toda a própria lógica da recuperação do capitalismo após o término da segunda guerra mundial, toda a lógica desse capitalismo “atlântico” vai se dar em torno do setor automobilístico. Este setor permite agregar tecnologia, gera mão de obra, permite a expansão do sistema financeiro, etc. Essa opção se deu a partir de uma matriz energética que naquele momento era muito barata: o petróleo. Portanto, enquanto ele for barato, temos um padrão de crescimento em cima de uma matriz energética atrelada à oferta de óleo no mercado.

A

C

RISE DO

P

ETRÓLEO E OS NOVOS CONFLITOS

Por volta dos anos 70 e 80, em países como a Venezuela, México, Irã, mas sobretudo na Arábia Saudita, começou-se a perceber que o petróleo é um recurso não renovável, e quanto mais o capitalismo crescesse atrelado a essa matriz energética, mais rápido as reservas iriam se esgotar. Decidem, portanto,

1930

Industrialização brasileira Acelerado crescimento econômico e

urbanização

Advento de novos valores morais

1980 Crise do petróleo Queda nas taxas de crecimento

Processo de exclusão Advento de novos tipos de conflitos

(5)

diminuir a oferta e aumentar o preço do barril, e com isso rompem com a matriz energética e geram uma crise de acumulação do capitalismo.

Qual é a consequência disso para o Brasil? De 1980 pra cá, temos uma queda abrupta das taxas de crescimento. Assim, não há crescimento econômico capaz de absorver a população imigrante, e começamos a perceber uma urbanização desenfreada mas não acompanhada de um processo simultâneo de inclusão. O resultado desse descompasso, na prática, é a proliferação de ocupações ilegais de terras, de bairros pobres, de camelos, etc. Começamos então a perceber um processo de exclusão.

Começamos então a perceber não mais novos valores, mas novos tipos de conflitos, novos movimentos sociais, que colocam em pauta a necessidade de novos direitos sociais e de democratização do acesso ao poder. Temos um aumento quantitativo e uma mudança qualitativa nos conflitos: ficam mais complexos, mais coletivos e mais massivos, sobrecarregando assim o judiciário.

Até 1980 prevalecia nas faculdades de direito a ideia de que os conflitos são interindividuais. Assim, com o advento desses novos tipos de conflitos, surgem três grandes problemas no judiciário:

1) O arcabouço do Processo Civil no Brasil era pensado em cima do litígio interindividual.

Como o artigo 6o do CPC pode ser usado para tutelar a entrada no judiciário de conflitos coletivos?

2) Esses novos conflitos colocam questões relativas à segunda geração de direitos fundamentais. Não se trata mais da liberdade de iniciativa, da liberdade de opinião, etc., agora o que se quer são direitos sociais.

3) Juízes mais jovens, com uma visão mais arejada estavam tendo suas sentenças revogadas por tribunais mais conservadores, compostos de juízes mais tradicionais que não estavam mais em sintonia com os anseios populares.

Fluxo demográfico

Capacidade de

absorção pela economia

1930

1980

Excedente

Populacional!

Processo de

Exclusão social

Novos

CONFLITOS

(6)

A

S

OCIOLOGIA DO

D

IREITO

Começamos a perceber nesse período, portanto, uma série de problemas, e é nesse momento que a sociologia do direito entra.

A sociologia do direito quando surge no Brasil surge com duas vertentes: uma vertente fática e uma teórica. A vertente fática, por sua vez, se divide em 3 outras vertentes, que buscam responder:

1) O que são esses movimentos sociais? Até então a política se fazia em cima dos sindicatos e dos cidadãos, agora temos movimentos coletivos.

2) Temos uma crise da justiça: será que conseguimos dar conta de tantos conflitos? Será que a justiça está aparelhada para um aumento significativo das demandas sociais? Como ela administra o seu orçamento? Como ela lida com as questões coletivas e conflitos de classe?

3) Temos também uma crise fiscal: é um conceito da economia política que denota a ideia de um Estado que gasta mais do que arrecada, gerando um déficit público. Em um primeiro momento, ele preenche esse déficit através do endividamento - mas chega um momento que o mercado financeiro internacional não tem mais segurança pra financiar o Brasil. Há uma escassez de divisas e de recursos, e não conseguimos mais empréstimos. Começa-se a emitir dinheiro, o que gera inflação. Não tínhamos poder aquisitivo, havia uma crise monetária: essa abre caminho para um grande debate relaciono à reforma do Brasil.

Como lidamos conceitualmente com essas situações? Do ponto de vista teórico a filosofia do direito busca uma interface com a antropologia urbana, que sofria uma forte expansão. A partir dessa

Gênese da Sociologia do

Direito

Vertente Fática

O que são esses movimentos

sociais? A justiça dará

conta desses conflitos? Como lidar com

a crise fiscal? Vertente Teórica Antropologia urbana Ciência política sistêmica Controle da gestão pública

(7)

expansão surge um estudo clássico: do Souza Santos. Ele estuda o começo das ocupações ilegais pelos imigrantes, estuda o Rio de Janeiro, contrapõe o direito civil, burguês, e os usos e costumes dos favelados. Esse estudo gera uma série de subprodutos, como a “sociologia na primeira pessoa” e o “direitos dos oprimidos”. Essas teses abrem caminho pra antropologia urbana, abrem caminho pra uma ciência política sistêmica: devemos nos perguntar como é o sistema politico, como ele funciona na prática, e não como ele deve ser. Isso nos leva a tentar entender como vamos perceber a titularidade das politicas administrativas, por exemplo.

Aparece também a necessidade de começarmos a ter uma formação maior em matéria de economia, principalmente em matéria de finanças públicas e macroeconomia, de gestão e administrativas.

Nesse momento a sociologia do direito está consolidada.

D

IMENSÕES DA

N

ORMA

A norma tem uma dimensão de interatividade. Essa tem três elementos, dimensões: retórica; burocracia e violência.

1. Componente de retórica: as normas comunicam uma conduta com base num valor.

2. Componente de burocracia: as normas se encaixam em outras normas e formam um ordenamento, um sistema legal.

3. Componente de violência: as normas são impostas.

Todas as normas jurídicas tem em maior ou menor grau esses três elementos. Algumas normas são excessivamente burocratizadas, algumas tem um grande peso de comunicação retorica (as constitucionais, por exemplo), etc.

C

ONFLITOS NA

O

RIGEM DO

D

IREITO

Há momentos em que as partes em conflito não conseguem encontrar uma alternativa. Diante disso, percebemos que:

I

MPORTÂNCIADASESTRUTURASDEPODER

1. Nós vivemos em uma sociedade

conflitiva;

2. Sem um mecanismo de controle do exercício da violência (estruturas de poder)

não conseguimos manter a estrutura e estabilidade social;

3. Essa autoridade central detém o monopólio da violência e é vital para a resolução

(8)

No processo de criação da norma, primeiramente o poder faz um mapeamento dos conflitos, hierarquizando-os de acordo com sua importância, e depois seleciona os conflitos com os quais vai trabalhar. Essa seleção dos conflitos mais relevantes se dá porque o sistema jurídico político não tem condições de lidar com todos os conflitos da sociedade. A partir daí, faz-se uma avaliação das alternativas em jogo para resolver o conflito – avaliar A x B x C – e opta-se por uma delas, priorizando um valor em detrimento dos outros. Esse valor escolhido converter-se-á em um comportamento obrigatório.

Essa opção é a resposta do poder aos conflitos, é uma resposta normativa. Ela torna-se o direito posto. Em outras palavras, nesse momento aquele valor que foi escolhido converte-se em conduta obrigatória, que deve ser cumprida sob pena de inserção no sistema jurídico repressivo.

A partir disso, há a ideia de que o direito não nasce do vazio da historia, nasce a partir de questões concretas: a norma é uma resposta a conflitos historicamente concentrados. Isso nos leva a discutir: quem

pode produzir direito? Há normas de diferente grandeza, daí vem a ideia de hierarquia das leis, a ideia de

controle da constitucionalidade, de interpretação do direito (secundo legem, literal; ou preter legem, captativa).

O

BJETO DA

S

OCIOLOGIA

J

URÍDICA

A pergunta da sociologia jurídica é justamente se esse ordenamento, uma vez entrando em vigência, cumpre o papel para o qual foi criado. Ele responde com eficácia aos conflitos da sociedade? Em suma, o direito é ou não é eficaz? Esse é o campo da sociologia jurídica.

Mapeamento

dos conflitos

•  Quais são esses conflitos?

Hierarquização

e seleção dos

conflitos

•  Quais são os mais importantes? Quais devem ser tutelados?

Avaliação das

alternativas

•  Contrapõe-se as alternativas possíveis para solucionar o conflito, selecionando-se uma delas

Resposta

normativa

•  O valor escolhido converte-se em conduta obrigatória

(9)

Discutiremos não mais questões relativas ao direito formal, mas questões relativas a uma validez material do direito, ou seja, os usos e costumes. Vamos começar a perceber um grande problema: o direito tutela um valor, mas será que esse valor da norma encontra correspondência com os valores da sociedade? Esse valor da norma é um valor respeitado ou rejeitado pela sociedade?

Parte-se da percepção de que o valor da lei as vezes encontra-se em descompasso com os valores da sociedade (exemplo: questão do jogo do bicho). Isso torna necessário um movimento de retorno, ou seja, em vez de focarmos nossa atenção exclusivamente no direito posto, voltarmos o olhar para os conflitos que suscitaram a criação desse direito.

Para que o direito funcione existem algumas regras básicas de natureza formal, como por exemplo a que determina a igualdade de todos perante a lei. Mas cabe questionar se todos são materialmente iguais. Ademais, uma norma pode fazer sentido em uma região mas não em outra, ou em um meio social mas não em outro, visto a o grande leque de variedades regionais, culturais e inclusive temporais (as vezes a lei é feita em um contexto e aplicada em outro) que temos no Brasil. Isso tudo torna necessária uma interpretação mais aberta do direito.

O ensino do direito, pela forte influencia kelseniana formalista, na busca da especificidade jurídica, praticamente ignora a política, a economia, a antropologia, etc. Através da ideia de norma fundamental, de uma norma que não é posta, mas pressuposta, já olhamos o poder como se ele fosse juridificado. Essa visão é de viés estrutural. Todavia, quando temos um contexto diversificado como o brasileiro, como lidar adotando uma visão meramente dogmática? É preciso começar a olhar o ordenamento, a história desse ordenamento. É necessário ter uma visão mais ampla, de natureza funcional, preocupada também com a eficácia, com a defasagem das normas diante de questões culturais, regionais, temporais, etc. Assim, a visão estrutural não é suficiente para analisar o direito na sociedade brasileira atual.

Seminário 1 – As transformações Contemporâneas no Universo Jurídico

Bibliografia: João Pedroso, “As profissões jurídicas entre a crise e a renovação: o impacto do processo de

desjudicialização”.

Há uma relação ambivalente entre juridificação e desjudicialização. Ao mesmo tempo em que existem novas regulações, existe também a necessidade de se transferir competências para outros órgãos não judiciais. Essas transferências são alternativas ao judiciário para desafogá-lo.

Paralelamente a esse processo social, ocorrem mudanças nas próprias profissões: intensifica-se a especialização profissional (advogados que só sabem fazer fusões e aquisições, por exemplo). Isso cria uma estratificação social. Criam-se imagens diferentes da profissão dentro da própria profissão.

O mercado tornou-se globalizado, a justiça e o direito tiveram a necessidade de atingir essa universalidade. Atualmente, não existe mais pessoalidade nas relações entre advogados e clientes: elas se

(10)

despersonalizaram. Com o advento de novas tecnologias, há também a entrada de novos profissionais (por exemplo os paralegais) e a transferência de competências, que antes eram apenas dos advogados, para eles. Essa transferência é vista pelos advogados como uma afronta, porque tira seu monopolismo no desempenho da profissão. Ademais, com a atual facilidade no acesso de informações, não existe mais o monopólio da informação. Essa facilidade possibilita a massificação do ensino e, consequentemente, seu sucateamento.

O autor faz um diagnóstico esmiuçado dessa condição pós-profissionalismo do direito: novas possiblidades, novas técnicas, aumento de profissionais, novas competências, etc. Essas transformações foram recebidas com muita cautela pelo ordem dos advogados, que perde sua exclusividade.

Não se espera mais que o advogado tenha um conhecimento fechado do direito, espera-se que ele saiba economia, sociologia, administração, etc. Percebeu-se que esses cursos são essenciais para desenvolver capacidades. A profissão portanto também ganha um caráter de multidisciplinaridade. Os próprios escritórios atualmente têm uma demanda complexa, vinda dos clientes, que envolve essas várias áreas do conhecimento, e por isso não querem mais o modelo rígido tradicional de conhecimento exclusivamente jurídico. Desse processo de transformação chegamos a um novo paradigma de justiça, mais aberto e permeável a modificações, e que apesar das várias críticas por parte dos advogados, é positivo pois democratiza os processos de justiça, pois cria um maior acesso da população ao direito, à informação.

É importante perceber que desjudicialização é diferente de desjuridificação. O processo de desjudicialização consiste na transferência de competência a outros profissionais (exemplo: mediadores, juízes de paz, árbitros), na possibilidade de se fazer esses procedimentos em outros espaços que não na justiça. Assim, há menos formalidade e mais tecnologias, além de formas alternativas que dão mais celeridade à profissão.

Aula 2 – Visões do Direito

Como visto na primeira aula, o Direito é fruto de conflitos, e a finalidade dos mecanismos de poder é mapear esses conflitos de valor, hierarquizá-los por critério de importância, selecioná-los e, pela avaliação das alternativas em jogo, responder normativamente. A norma é a opção por um desses valores, e comunica um comportamento.

V

ISÕES DO

D

IREITO

(11)

Visão Estrutural

Visão Funcional

Concepção do

Sistema Jurídico Fechada, acrítica Aberta

Racionalidade Formal Material

Natureza da

Ciência Positivista, normativista e legalista Pragmática, tópica, teoria da argumentação e da decisão

Método Lógico dedutivo Problematizante e sociologizante Contraponto

sociológico Ordem (Durkheim)

Conflito e equilíbrio (Marx e Weber)

Abordagem Estrutural Processual

Finalidade do

conhecimento profissionalizante Qualificador e Formativo e militante

1. Visão estrutural: é a visão formalista, dogmática, kelseniana. Parte de um processo de compreensão de um poder juridificado previamente, ou seja, parte da norma fundamental. Através dessa norma pressuposta, começamos a trabalhar a teoria geral do direito: um visão interna. É uma concepção do sistema fechado, do sistema considerado completo. A racionalidade é exclusivamente formal, portanto não se preocupa com questões de conteúdo – mas apenas com questões de validez formal, da legalidade. O raciocínio do positivismo é fundi-las, pois entendem que a legalidade impede o arbítrio, e é o arbítrio que gera ilegitimidade, portanto havendo legalidade há necessariamente legitimidade.

Essa visão funciona em sociedades com altas taxas de crescimento econômico, emprego abundante, estabilidade social, etc. Em suma, é o direito estável pra uma sociedade estável. Como aplicar essa visão à sociedade brasileira? Há graves problemas que levam a uma limitação na aplicação e compreensão do direito a partir de uma visão estrutural.

2. Visão funcional: exige que nós compreendamos: Qual é a sociedade que gera o conflito? Como esse conflito é gerado a partir de lutas concretas ao longo da história? Como eles são decididos? Como essa resposta normativa se volta para a sociedade, e qual impacto causa? Essa visão, portanto, volta-se para a formação dos conflitos, e para a decisão desses conflitos, fazendo um raciocínio indutivo. Acepção de sistema jurídico como um sistema aberto, cheio de lacunas.

Diferentemente da visão dogmática, não se preocupa apenas com questões de legalidade, mas de legitimidade, que é uma questão valorativa (por que sigo um comando?).

(12)

Na sociedade Brasileira, percebemos a necessidade que a magistratura tem de caminhar para uma interpretação mais adaptativa, baseada em uma visão mais funcional. O problema da visão funcional é que a maioria esmagadora dos cursos de direito no Brasil desprezam matérias como a sociologia e a antropologia, focando-se em uma visão estrutural. É preciso começarmos a perceber a necessidade de uma advocacia mais alargada, a advocacia estruturante, e não a advocacia que trabalha a partir de normas inflexíveis e imutáveis.

Essa advocacia estruturante, tão necessária atualmente, é uma advocacia que tenta a reforma do arcabouço jurídico, que é capaz de dialogar com diferentes áreas do conhecimento e de reconstruir o sistema jurídico.

A mentalidade positivista é subordinada a um viés acrítico, extremamente fechado. A geração mais tradicional de civilistas como o Washington de Barros, o Silvio Rodrigues e o Caio Mário, olha para a sociedade brasileira como se ela fosse estável (Durkheim), não são capazes de perceber o dinamismo da sociedade. Isso não significa que na abordagem funcional despreza-se a dogmática jurídica, muito pelo contrário! É necessário conhecer o direito positivo, mas isso não basta, é preciso também ter uma visão aberta. Essa abordagem funcional começa a introduzir, ao lado da racionalidade formal, questões de racionalidade material. Ao lado da questão da legalidade, introduz-se questões relativas à legitimidade.

A analise weberiana valoriza muito a ideia da burocracia, da racionalidade material e formal. A analise marxista trabalha com o estudo dos movimentos de negação da ordem anterior e a criação de uma nova ordem, a luta de classes, etc. Em ambas essas análises, trabalhamos com a ideia de que a sociedade é conflitiva e que esse equilíbrio que o direito dá é sempre precário.

Essa divisão pode ser feita em termos weberianos, mas a separação entre abordagem estrutural e funcional é muito menos clara na vida social.

D

ESENGATE

E

STRUTURAL

Dependendo da dinâmica social, da estrutura social, posso ter mais ou menos conflitos e litígios, além de modificar o perfil qualitativo dos litígios. A sociologia trabalha muito com a ideia de que quando aumenta-se a quantidade, muda-se também a qualidade.

Valores morais surgem a medida que a sociedade se industrializa. Em um contexto em que não há recursos para todos, há grupos sociais que competem para "pegar sua fatia" desses recursos escassos. Se não nos mobilizarmos não conseguiremos atender às necessidades mínimas da população.

À medida em que tenho crescimento econômico, tenho inclusão social e os índices de criminalidade caem. A partir de 1980 a industrialização diminuiu seu ritmo no Brasil, mas a urbanização não. Diante disso, há um aumento da exclusão social e há também um aumento quantitativo dos conflitos, que por sua vez mudam de caráter, tornando-se massivos.

(13)

Em outras palavras, os conflitos têm deixado de ser conflitos interindividuais. Hoje há novos tipos de conflito, há os crimes coletivos por exemplo. Como trabalhar com eles se a nossa legislação penal foi feita para crimes individuais? À medida em que a sociedade muda o perfil dos conflitos, se não mudo paralelamente o direito (principalmente o processual), há um desengate estrutural, ou seja, um desacoplamento entre estrutura jurídica e a estrutura social. Esse descompasso, característico no Brasil atual, causa um potencial de crise.

E

XPLOSÃO DE

L

ITIGIOSIDADE

A justiça mais demandada atualmente é a justiça estadual, que lida com os conflitos mais próximos do cidadão comum - é aquela com que a população tem um contato mais direto com os tribunais.

O judiciário não está apto a lidar com esse aumento de recursos – há assim um congestionamento da justiça. Portando, o processo dramático de explosão de litigiosidade colapsou o judiciário - na medida em que estão entrando cada vez mais processos do que estão saindo. Estamos começando a perceber essa crise do judiciário no país, e isso leva a uma série de fatores que vão modificar o dia a dia do direito no Brasil.

Por que temos uma explosão de litigiosidade? Na justiça do trabalho, temos que julgar dissídios

coletivos das categorias trabalhistas. Há um processo de produção desordenada de regras: quanto maior o número de problemas maior o de regras, mas essas não dão conta dos problemas, que mudam muito rapidamente. Quanto mais o Estado intervém numa sociedade dinâmica mais ele se desmoraliza.

Caímos portanto em um ciclo vicioso, o judiciário não da conta de resolver os conflitos e por isso há uma produção desenfreada de regras, que, por sua vez, não dão conta de solucionar os problemas da sociedade.

Seminário 2 – Objeto, Problemas e Dilemas da Sociologia Jurídica

Bibliografia: F. C. Santiago Dantas, “A Educação jurídica e a crise brasileira” e Luciano de Oliveira,

“Direito, Sociologia Jurídica e Sociologismo”.

As transformações da educação jurídica e do ensino de direito estão intimamente ligadas às transformações sociais.

O texto deixa claro que a sociologia jurídica não é meramente uma apuração do contexto, mas uma análise crítica da sociedade. Sem essa crítica, há o perigo de cairmos no sociologismo, ou seja, de considerar que tudo que é legitimado em certo contexto é válido. Nesse raciocínio, acabaríamos por

(14)

equiparar questões como o jogo do bicho e a violência da rota. Só porque essa violência é legitimada, tem que ser válida? A legitimidade da violência tem um motivo, não é mero fato posto.

É preciso, portanto, saber a diferença entre colher dados passivamente e olhar para a sociedade de maneira crítica, buscando não apenas uma fotografia estática da sociedade, mas as raízes da legitimidade. Caso contrário, temos o risco de negligenciar o caráter de transformação social e emancipação que o direito pode ter.

Aula 3 – Funções do Direito e Tipos de Norma

Como vimos, do ponto de vista dos litígios, nós tivemos um grande aumento de novos processos protocolados na justiça estadual, federal e na justiça do trabalho. Ao mesmo tempo, nós também percebemos que do ponto de vista das respostas normativas, principalmente do ponto de vista do processo legislativo, nesses últimos 20 anos nós saímos de aproximadamente 66 mil leis para 150 mil.

Temos nesse momento um fenômeno de dinamismo da sociedade que de um lado gera o aumento quantitativo dos litígios, mas ao mesmo tempo também vai alterando qualitativamente o perfil desses litígios, com um crescente complexidade deles. Isso gera desafios à governabilidade. Ao enfrenta-los, o legislador começa a legislar de uma maneira absolutamente desenfreada, e com isso temos um excesso de leis, o que não necessariamente significa mais segurança jurídica. Pelo contrário, quanto mais o sistema jurídico produz leis, mas insegurança ele gera. Quanto mais ele intervém, mais provoca situações de incerteza que o desmoraliza.

Destarte, podemos dizer que o Estado não se desmoraliza quando ele diminui seu potencial de intervenção. Essa seria uma estratégia de resgatar uma coerência sistêmica, adotada nas propostas dos organismos multilaterais, notadamente a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o Banco Mundial, etc.

F

UNÇÕES DO

D

IREITO E

T

IPOS DE

N

ORMA

(15)

A visão estrutural atêm-se à função instrumental do Direito. Esta é uma função dupla, de um lado decide conflitos, e de outro lado, por meio de normas que permitem, proíbem, ou facultam, o Direito estrutura a vida social.

Quando olhamos a experiência jurídica a partir de uma abordagem mais funcional, percebemos que quando o Direito decide um conflito, ele responde de forma direta ou indireta ajudando na manutenção da estabilidade social, ou seja, mantendo a sociedade coesa. Ou seja, quando o judiciário funciona bem, quando o juiz cumpre de maneira eficiente o seu papel, ele contribui juridicamente para a manutenção da estabilidade, coesão e, consequentemente, do controle social.

O direito tem também uma função de calibrar as expectativas, ou seja, ele prepara a sociedade para que ela tenha uma capacidade pasteurizada de reação aos estímulos jurídicos que ela recebe por parte dos tribunais, do poder executivo e legislativo. Fazendo com que as pessoas tenham as mesmas expectativas jurídicas.

Ou seja, o direito calibra as expectativas jurídicas, fazendo com que as pessoas, apesar de serem diferentes, tenham as mesmas aspirações jurídicas, tenham as mesmas expectativas em relação às decisões normativas do legislativo ou às decisões judiciais dos tribunais. E com isso percebemos que quando os sujeitos de direito são estimulados a reagir de maneira uniforme a determinados fatores jurídicos, faz-se com que eles acabem acatando o direito de maneira espontânea (eles acreditam no direito, acreditam na jurisdição), o que leva a mais ordem e mais estabilidade social, a um custo de imposição política muito baixo. FUNÇÕESDO DIREITO Instrumental Decidir conflitos Criar e evitar soluções Política Mecanismo de coesão social Mecanismo de controle social Simbólica Calibrar as expectativas jurídicas Reforçar padrões de legitimidade

(16)

Legitimidade aqui, do ponto de vista da sociologia, é um conceito que diz respeito à pergunta "por que obedecemos a determinadas ordens?", por que eu obedeço a um professor, a um guarda, à autoridade paterna, a um sujeito armado que me pede a carteira? Como visto, do ponto de vista estrutural a legitimidade confunde-se com a legalidade. Na visão funcional, separamos a legalidade (encaixe lógico-formal das normas) e a legitimidade (racionalidade material – valores que nos levam a obedecer espantaneamente a determinadas ordens).

Quando olhamos o sistema jurídico, que é de natureza sistêmica, vemos que ele se expressa por meio de repostas normativas aos conflitos sociais, ou seja, opera por meio de normas. Que tipos de

normas podemos postular?

Tipo

Função

Objetivo a

priori

Objetivo a

posteriori

Sanção

C

ONDUTA Controle Proibir e

previnir Reprimir Penal

O

RGANIZAÇÃO Direção Promover e

estruturar Recompensar

Penal ou premial

P

ROCESSUAL Procedimental Prazos e

recursos Garantismo Nulidade

P

ROGRAMÁTICA Calibração Balizar as

expectativas

Ponderar e

estimular Simbólica

Cada uma dessas normas tem um papel específico, e são combinadas pelo direito, que funciona a partir delas.

Os códigos de processo são normas procedimentais, são as normas do devido processo legal, trabalham com a ideia de garantismo, que quando não é observado leva à nulidade das ações. Os códigos civil, tributário e penal são corpos gerais de normas de conduta. As normas de conduta estabelecem o que nós somos obrigados ou proibidos de fazer. A Lei de execução penal, por exemplo, é uma norma de organização.

As normas de organização regulamentam, condicionam, legitimam, tutelam o exercício das normas de conduta.

As normas programáticas são aquelas que enunciam intenções, que trabalham com o “politicamente correto”, com conceitos utópicos e deliberadamente vagos. É uma estratégia retórica pela qual o legislador, em determinado momento da história, procura atrair a atenção do sujeito de direito, falando aquilo que ele quer ouvir. É uma estratégia de persuasão, fala-se o que a sociedade quer ouvir. Em outras palavras, legisla-se a partir do que a maioria difusa da sociedade imagina que é a maneira mais correta.

(17)

Ao elaborar as normas de conduta, organização e processuais o legislador trabalha em cima daquilo que tem maioria absoluta na vida social, trabalha em cima de comportamentos sedimentados. Todavia, existem momentos na vida social em que surgem fatores novos, e o legislador não tem segurança nem experiência para lidar com isso, não tem uma posição firme. A sociedade fica fragmentada axiológico e ideologicamente, ela não sabe o que quer e portanto não há uma maioria clara. Nesses momentos o legislador ganha tempo jogando normas programáticas, essas normas de calibração que buscam envolver moralmente o sujeito de direito, fazendo com que ele tenha suas expectativas balizadas. Consistem em uma argumentação imprecisa mas persuasiva, e tentam dar conta dessas situações limite de desordem nas quais as normas de conduta são insuficientes.

A

S

N

ORMAS AO LONGO DA

H

ISTÓRIA

O Direito funciona portanto com 4 tipos de norma que têm papeis específicos. Elas estão sempre presentes, e o que muda ao longo da história é o peso delas. Exemplos:

Estado liberal clássico: trabalha com as liberdades públicas e com a ideia de que o Estado tem que ser controlado através de declarações de direitos, de uma constituição. Ele combina as quatro normas mas atribui maior peso às normas de conduta e às de procedimento. Ao olharmos a ideia de liberdade negativa do Estado liberal, vemos que ele intervém, e naquilo que ele intervém ele é forte, mas libera o resto para a sociedade e a para o mercado. Essa valorização das normas de conduta e processuais é característica também de governos neoliberais, como o governo de Reagan nos Estados Unidos e da Margaret Tatcher na Inglaterra.

Estado de bem-estar social: temos um planejamento econômico, um compromisso com a distribuição de renda, um compromisso com a qualidade de vida e com o pleno emprego. Nesses estados, de caráter social democrata, a combinatória valoriza mais as normas de organização em detrimento das de conduta, e mais as normas programáticas, em detrimento das processuais.

Vemos, assim, o Direito como sendo capaz de reagir aos desafios das estruturas sociais por meio de quatro tios de normas. Essa combinatória de normas tem que guardar um certa correspondência com as estruturas sociais. Em outras palavras, tem que haver um acoplamento, um engate estrutural entre direito e sociedade. Como se dá essa relação ao longo da história?

SOCIEDADE

D

IREITO

Estável

Em mudança

Estável

1

2

(18)

A hipótese número

1

consiste no encaixe lógico perfeito entre direito e sociedade, e não é confirmada historicamente. Essa hipótese é apenas uma condição axiológica para a nossa análise.

O padrão de normalidade na vida social é a hipótese

2

. Nessa hipótese, temos o direito exercendo um papel de conservação das estruturas sociais, mas essas são naturalmente dinâmicas. Essa relação gera uma certa tensão. A ponte entre o direito e a sociedade é feita pelo juiz, através de interp extensivas,

preter legis. Essa é a hipótese dos países mais avançados. É natural que o direito exerça esse papel

conservador, mas também é natural que as estruturas sociais tentem mudar.

A hipótese número

3

é o inverso: o direito muda mas a sociedade é estável. Ela é localizada na história nos anos 60 e 70 na América Latina, na África e no Irã. Houve nessa época uma tentativa dos generais nos regimes militares, da equipe econômica da ditadura militar, de utilizar o direito para dar um choque de modernidade em economias atrasadas. Ou seja, usam autoritariamente o direito pra estimular as sociedades a mudarem.

Os atos institucionais do regime militar: O primeiro ato institucional foi praticamente uma cópia de todo um debate de direito constitucional para a direita na Alemanha na altura de 1920, 1930. Segundo Karl Schmidt, todo processo revolucionário destrói a ordem constitucional anterior e cria uma nova ordem jurídica. Todo processo revolucionário é também um poder constituinte originário inaugurando uma nova ordem constitucional. Isso é dito no preâmbulo do Ato 1 e repetido no do Ato 2. Em 1968 vem o Ato 5, que é o mais arbitrário ato da ditadura militar brasileira. É o momento mais dramático, o “golpe dentro do golpe”. Esse ato traz um problema: os comunistas e os adversários do governo utilizaram os direitos que os militares deram à sociedade para se voltarem contra o governo. Ou seja, a oposição utilizou os direitos criados pra travar a governabilidade no país. Nesse momento, os militares dão um novo golpe e, se autointitulando o poder revolucionário decide criar uma nova ordem jurídica. Essa ordem terá uma característica: eles impõe essa ordem a toda a sociedade, mas não se submetem a ela, se colocam acima da lei. Essa é uma postura antiliberal do ponto de vista jurídico. Essa é a hipótese número 3! É a hipótese de utilização do Direito como uma ferramenta autoritária por parte de governos militares. Utilização de conceitos novos do direito, principalmente do direito econômico, pra provocar processos de desenvolvimento. Uma das características da ditadura brasileira é que ela nega as liberdades públicas, os direitos civis, mas ao mesmo tempo ela gera direitos econômicos e direitos sociais.

No caso do Irã houve uma situação semelhante. Havia um ditador iraniano, o Reza Pahlav, com uma forte influência ocidental e cultura francesa, que fez um diagnóstico do atraso iraniano, dizendo que o excesso de fanatismo religioso no país impedia as novas gerações de se formarem em ciências exatas e biomédicas. E com isso o Irã não tinha uma massa de engenheiros, não tinha químicos, médicos, e não conseguia se desenvolver. Assim, afirmava que o excesso de dependência ao Alcorão tornava a sociedade subdesenvolvida: o fator religioso seria um fator de alienação. Diante disso, Pahlav acreditava que era preciso desenvolver nas novas gerações uma mentalidade menos religiosa e mais racional. A estratégia para isso foi copiar a legislação francesa civil pra ocidentalizar as relações no Irã. Ou seja, ele importou um arcabouço jurídico francês e cartesiano e tentou aplica-lo em uma sociedade intensamente marcada

(19)

pelo seu fervor religioso. Resultado: ele foi deposto e o regime iraniano volta a tornar-se ainda mais fechado.

A hipótese número 3 é uma hipótese associada a regimes ditatoriais, já superada pela história. Sobra a hipótese número 4, na qual tudo muda. O problema é saber se há ou não uma sincronia entre essas mudanças, se o modelo de reforma jurídica é plasmada por uma grande maioria social, ou se há uma diacronia (o direito muda de uma maneira, e a sociedade de outra).

D

IREITO E

S

OCIEDADE NO

B

RASIL

O Brasil está hoje passando por um processo de reforma jurídica: está simultaneamente trocando o Código de Processo Civil, o Código Penal, o Código de Processo Penal, o Código de Defesa do Consumidor, o Código Ambiental... Está também discutindo a questão do pré-sal, que por sua vez vai exigir uma reforma da estrutura tributária, etc. Ou seja, o Brasil está trocando os pilares do seu arcabouço jurídico. Olhando o Brasil historicamente percebemos um dado perturbador. Faremos primeiro um panorama geral, e depois discutiremos questões específicas do Brasil:

1989 – 1999:

diversos Estados da ONU reformularam suas constituições e arcabouços jurídicos. Por que?

1978/80 – 1990/2000:

temos nesse ínterim o período crítico da reestruturação dos padrões capitalistas modernos. Com o término da Segunda Guerra Mundial, o Plano Marshall na Ásia, os projetos de reconstrução da Europa, e de expansão da economia americano, são geradas altas taxas de crescimento econômico.

1870 – 1913:

temos nesse período um processo de turbulência da economia europeia, que vai inclusive levar à implosão da economia cafeeira no Brasil. Esse período é também um período de turbulência política na Europa, de crise econômica mundial, e isso abre caminho para a deflagração da Primeira Guerra Mundial. O país que teve a maior taxa média de crescimento foi os Estados Unidos, com uma taxa de 4.2, enquanto o Brasil tinha uma taxa de 2.3. Dentre os países periféricos, era o que possuía a maior taxa de expansão do PIB.

1913 - 1950:

esse período foi marcado pelas duas grandes guerras, e culmina no Acordo de

Breton Woods, que criou o Banco Mundial, a OMC e o Fundo Monetário Internacional. Nesse período, o Brasil foi o país com a maior taxa de crescimento do PIB: 4.9.

1950 - 1973:

temos um período de ascensão da social-democracia, das políticas keynesianas, e por fim a crise do petróleo. O Brasil pula de 4.9 para 7.5 na taxa de crescimento.

1973 - 1977:

é o período da crise do petróleo, de travamento do comércio mundial, e nesse contexto o Brasil retroage à taxa de 4.9, enquanto a China passa para 7.1. Ao longo de 100 anos temos uma forte expansão da economia brasileira. Havia no Brasil uma estrutura econômica fortemente dinâmica, havia uma agenda política de reformas. Percebemos que tínhamos uma sociedade em mudança.

(20)

Notadamente depois da revolução industrial há uma discussão pra um projeto de poder no Brasil. Com a Revolução de 30 temos a negação, por parte das elites que estavam se formando, contra o patriciado rural. A partir daí temos um período de turbulência.

A partir do golpe do Getúlio Vargas, em 1937, inaugura-se o Estado Novo, e isso implica a intensificação do debate a respeito de um projeto econômico para o Brasil. A resposta encontrada era que se o Brasil quisesse se tornar um país desenvolvido, precisava ultrapassar os limites de uma economia rural, se industrializar. Esse debate, do ponto de vista doutrinário, vai tonalizar a agenda brasileira no período de 1930 a 1950.

Eugênio Gudin defendia a possibilidade da economia de mercado, e Roberto Simonsen defendia que se o Estado não interviesse na economia, não conseguiríamos avançar na industrialização. Ao lado desse debate, há um segundo debate entre Oliveira Viana e Valdemar Martins Ferreira Mello. À medida em que o Brasil se industrializava, surgia a discussão sobre a modernização dependente e periférica, mas também, à medida que a industrialização avançava, iam ficando mais claros os problemas de distribuição de renda, de desequilíbrios regionais, as pressões sociais, os problemas rurais, fundiários, de moradia urbana, os conflitos sindicais. Ganha extrema relevância a questão das reformas de base.

20 anos depois, já na Ditadura Militar, chega-se à conclusão de que nós não tínhamos capacidade de formar, espontânea ou compulsoriamente, poupança. De um lado, temos os líderes sindicais pedindo a distribuição de renda, e de outro os militares afirmando que não tinham renda para distribuir: as rendas

A

NOS

1930/1940

A

NOS

1950/1960

A

NOS

1980

A

NOS

1990

A

NOS

2000

Roberto Simonsen Eugênio Gudin Sociedade agrária/industrial

Capitais industriais e reformas de base

Governalibidade / inflação Legitimidade /

reconstitucionalização

Reformas macroeconômicas Inclusão e exclusão social

Reformas Microeconômicas Protecionismo e BNDES Sobre o capitalismo tardio Modernização e dependência Transição democrática Globalização econômica Crise financeira e crescimento

(21)

escassas que tinham era para financiar a infraestrutura. Em 20 ou 30 anos, quando houvesse o retorno desse investimento, então seria possível distribuir renda. Aqui temos portanto uma discussão entre governabilidade e legitimidade, que em um determinado momento deflagra a campanha pela redemocratização no Brasil.

Os anos 1990 são os anos do Plano Real, das reformas macroeconômicas mediante a privatização das empresas estatais, mediante as estratégias de enxugamento do Estado, mediante as reformas de segunda geração do Banco Mundial. Entrada do Brasil em uma economia que se globaliza.

Dos anos 2000 pra cá discutiam-se as reformas microeconômicas, principalmente as jurídicas, e ao mesmo tempo a tentativa do BNDES para tentar voltar a intervir na economia financiando as “empresas campeãs”. A agenda volta a girar em torno de questões fundamentalmente econômicas.

De certo modo, nós vivemos em uma sociedade que conseguiu caminhar na linha de uma forte turbulência do ponto de vista social, cultural, político, em função de um padrão de desenvolvimento que surge a partir do Estado Novo. Percebemos um diagnóstico: se o Estado não intervier, o Brasil não consegue dar o salto da industrialização. Por outro lado, para intervir o Estado deve escolher uma área, e ele escolhe a da infraestrutura. O desenvolvimento brasileiro desde o Estado Novo até o período juscelinista envolveu o setor automotriz, e se dá dentro da estratégia do capitalismo tardio.

O

C

APITALISMO

T

ARDIO

O capitalismo de mercado é um sistema extremamente competitivo. Nele temos a figura do empresário que disputa avidamente parcelas de mercado e lucros. Schumpeter mostra que em uma economia de mercado, quando as empresas disputam o consumidor, elas são obrigadas a reduzir a

TIPO DE CAPITA- CARAC- LISMO TERÍSTICA DO

DESENVOLVIMENTO

Clássico Tardio*

Força Motivadora Empresário Estado

Processo Inovação tecnológica Reserva; Assimilação

Mercado Aberto Fechado

Objetivo predominante Lucro Desenvolvimento

E segurança

Direito Privado Público

*Consequências: urbanização, migração, mudanças geoocupacionais, choques culturais, crise fiscal, conflitos culturais

(22)

margem de rentabilidade para poderem obter parcelas de mercado. Mas a tendência é a concorrência ficar cada vez mais feroz, e chega um momento em que as empresas param em seus custos fixos de produção. Nesse momento ou elas se recriam, ou criam produtos ou marketings novos, novas fontes de matéria prima, ou elas quebram. No capitalismo de mercado, o que os empresário querem é principalmente um direito que garanta a sua propriedade material, intelectual (que patenteie as suas descobertas), e que permita a segurança jurídica pra fazer investimentos e disputar o mercado.

O capitalismo tardio não é de mercado, é de Estado: esse começa a intervir na economia, nos setores de infraestrutura básica (Getúlio investiu em setores de minérios, siderurgia e petróleo). É o sistema em que o Estado traz pra si o papel de promover a infraestrutura. Ao mesmo tempo ele elege os grupos industriais como “empresas campeãs”, que serão as parceiras das empresas estatais, e com isso ganham a possibilidade de terem o monopólio.

Surge no Brasil o chamado “anel burocrático”, que é um circulo formal ou informal de negociação de preços e salários entre empresários favorecidos pelo governo. Eles negociam com uma empresa estatal preços para o seu setor, ou seja, os preços são administrados pelo Estado, e não ditados pelo mercado. Isso se dá em nome da aceleração do desenvolvimento (JK), e isso geral no Brasil o advento do Direito Público.

O

D

IREITO E O

A

UTORITARISMO

Os raros professores de direito que fazem uma análise política do Brasil separam a história em dois períodos: de democracia e autoritarismo. Esses professores satanizam o período getulista e enaltecem a democracia, o que demonstra uma falta de distanciamento crítico e objetividade. Com isso não percebem que o Direito que ensinam fundamentalmente foi feito a partir de períodos totalitários.

Todavia, percebemos que há uma brutal expansão no direito brasileiro nas duas ditaduras (varguista e militar). No início dos dois processos de redemocratização temos assembleias constituintes, nelas, todas as demandas sociais reprimidas aparecem ao mesmo tempo e o Estado não tem condições políticas e econômicas de atender a todas elas.

Os professores de direito privado e comercial no Brasil, de 1950 até mais ou menos 1980, ensinaram o Direito dentro de um viés de capitalismo clássico. Eles não eram capazes de perceber a reforma do arcabouço jurídico brasileiro nos dois momentos ditatoriais.

(23)

*Com o fenômeno da conurbação, gera-se problemas de gestão entre municípios e estados e a Federação, o que culmina com a criação do direito urbanístico.

C

ONSEQUÊNCIAS DO

C

APITALISMO

T

ARDIO NA

S

OCIEDADE

B

RASILEIRA

O capitalismo tardio tem uma série de sequencias diferentes das do capitalismo clássico. O último, em termos weberianos, trabalha com a ideia de industrialização, na qual quanto maior a velocidade maior a alteração da identidade geocupacional. Ou seja, há o advento de uma população empregada nos setores secundário e terciário em detrimento do primário. No momento em que a industrialização gera sindicatos, temos o advento do operariado organizado, o que gera conflitos de classe e polarização ideológica entre esquerda e direita.

No Brasil é diferente! Temos primeiro uma grande discussão de projetos: que tipo de Brasil nós queremos além dos anos 1930? O que é a industrialização brasileira? Nesse ponto percebemos um confronto entre os neoliberais paulistas e os positivistas gaúchos, no qual vai prevalecer um Estado desenvolvimentista autoritário, que vai levar a industrialização brasileira no setor siderúrgico e

Código de Processo Penal e Civil, Código Penal, CLT, Lei das Sociedade Anônimas, Lei de Falências, 1a geração de Direito Administrativo

-> modernização jurídica do Estado e sociedade brasileiros

Advento do Direito Tributário, Econômico, início da CDM, reestruturação do Direito Administrativo, Lei do divórcio, novo Código de

Processo Civil, nova lei das S/As, reforma da providência, Direito urbanístico*

Política

Na visão

conservadora

Autoritarismo

Democracia

1930

1945

1946

1964

1968

1985

1988

2013

Redemocratização

Redemocratização

(24)

automotriz. Isso vai levar a mudanças geocupacionais até o momento em que surge um grande confronto político, que culmina no Golpe de 1964 e no Plano Real.

Quais são as consequências que temos desse processo?

1. Na medida em que o Brasil se industrializa, ele vai sofrer um processo de deslocamento espacial da população. Isso altera o perfil geocupacional do Brasil (diminuição da população empregada no campo e aumento nos setores industrial e comercial).

2. Essa industrialização brasileira tira o homem do campo e o leva para a cidade – isso mexe com a pauta moral brasileira, com seus padrões éticos. Esse choque cultural modifica o perfil da família brasileira.

A descoberta do sexo, a escolaridade da mulher, a dissolução dos laços conjugais, tudo isso de alguma maneira é fruto de um processo de migração que muda a pauta moral, as expectativas morais da sociedade brasileira. A mulher sai da posição de relativamente incapaz, aumenta de escolaridade, vai para o mercado de trabalho, ganha consciência dos seus direitos e isso leva a uma mudança drástica no perfil familiar brasileiro. Consequentemente, temos o advento de um novo padrão de conflituosidade.

Com a crescente independência da mulher e a aceitação do divórcio, gera-se uma sociedade com famílias monoparentais, o que ocasiona novos problemas de direito de família levados aos tribunais. Nesse ponto, um dos grandes problemas que surgem é o conflito geracional entre juízes de 1a instância (postura mais moderna) e desembargadores de 2a instância (visão católica e reacionária acerca do divórcio). Esses últimos não foram capazes de perceber a industrialização brasileira e os problemas que

Capitalismo

Clássico Industrialização geocupacionais Mudanças Conflitos de classe Ideologias previdenciário Estado

Capitalismo Tardio Ideologias Estado desenvolvimen-tista Industrialização Mudanças

geocupacionais Ação Política

Sequências Causais

(25)

ela trouxe, e que nos períodos autoritários temos a renovação do ordenamento jurídico e um forte processo de feminização de certas profissões.

P

ROBLEMAS DE

G

OVERNABILIDADE

Como vemos na tabela, essa alteração da identidade geocupacional no Brasil se deu em apenas 40 anos. Países como a Inglaterra levaram cerca de 120 anos para realizar essa alteração! Essa mudança drástica tão rápida ocasionou diversos problemas. Com o aumento brutal da população surge a questão: será que tenho PIB capaz de gerar emprego pra absorver essa explosão demográfica? Surgem então problemas de governabilidade. Essa transformação rápida altera significativamente o perfil das estruturas sociais, de forma tão explosiva que acaba por alterar também as estruturas do direito.

Seminário 3 - A Sociologia Jurídica e o Pluralismo Normativo

Bibliografia: Boaventura Santos, “Notas sobre a história jurídico-social de Pasárgada.

Distribuição da

População

1940

1960

1980

1990

Rural

68,8

55,3

32,4

24,5

Urbana

31,2

44,7

67,6

75,5

• Avanço da industrialização em torno do setor automobilístico • Intensa urbanização

Industrialização

• Com a mudança da população do campo para a sociedade, há um choque cultural. • O perfil das famílias

muda.

Mudanças no Perfil

moral

• Com essas mudanças, muda o panorama dos conflitos familiares levaodos aos tribunais. • Há um conflito

geracional entre juízes.

Mudança no perfil

de conflituosidade

(26)

Boaventura fundou a sociologia jurídica brasileira: foi o 1o sociólogo que realmente foi a campo, podendo assim auferir de fato com sua pesquisa a pluralidade de ordens jurídicas.

A emergência do direito como conhecemos hoje está intrinsecamente ligada à necessidade capitalista de se proteger a propriedade, garantindo as trocas, etc. A ilegalidade da propriedade no caso de Pasárgada extrapola a ilegalidade e antijuricidade e mostra uma lacuna total da existência do Estado no território. Ele não tinha interesse nesse espaço, o que gerava uma ausência total de serviços públicos.

O pluralismo político é um subproduto dessa ausência do Estado. Existiam lá duas ordens jurídicas: contrapondo-se à ordem estatal, havia a associação de moradores, que era a ordem que de fato resolvia os problemas na favela.

É interessante observar que, no texto, não fala em nenhum momento de crime organizado. Nessa época ainda não existia essa situação. Por outro lado, atualmente, essa lacuna deixada pelo Estado foi preenchida justamente pelo crime organizado. Este possui poder de coerção, e é muito mais presente e ativo. Por conta dessa presença mais intensa, nos últimos 30 anos esse pluralismo ficou mais evidente. Ademais, hoje há movimentos como o MST, que têm buscado acesso à ordem jurídica estatal. Ou seja, eles não querem participar de uma ordem jurídica paralela, querem participar da ordem estatal.

Entra em conflito o conceito de direito alternativo e o de uso alternativo do direito. O uso alternativo do direito quer dizer utilizar, a partir da ordem jurídica existente, os meios disponíveis para transformar o próprio direito, fazer um direito mais real, mais inserido, que funcione melhor no contexto em que é aplicado. Já direito alternativo refere-se a uma outra ordem, diferente.

Aula 4 – A Formação dos Litígios no Brasil

A desburocratização do processo é no fundo uma perda de prestígio do campo profissional do processualista. Ontem tomou posse uma comissão de 19 juristas para reformularem a Lei de Mediação e Arbitragem. Essa é uma das leis modernas que o Brasil tem. Os próprios árbitros profissionais dizem que não há a necessidade dessa reforma. Sempre que olhamos as práticas jurídicas, a agenda jurídica no Brasil percebemos implicações corportivas, ideológicas, tráficos de influência, etc.

Começamos o curso vendo que podemos pensar a relação entre direito e sociedade a partir da ideia de engate entre a estrutura social e jurídica. Não adianta ter um direito desenvolvido em uma sociedade tribal, por exemplo. Depois vimos que essa relação entre direito e sociedade se dá em quatro situações. Vimos que no Brasil temos um forte dinamismo social, uma sociedade que muda de forma acentuada. Fizemos um corte metodológico a partir da Revolução de 1930 para tentarmos entender melhor as feições institucionais, políticas e sociais do Brasil contemporâneo.

Vimos também que o Brasil teve um capitalismo de natureza tardia, que acabou, a partir principalmente do Estado Novo, imprimindo uma transformação estrutural da economia brasileira. Essa

(27)

foi uma transformação induzida de cima para baixo, elaborada com base na premissa de que a economia brasileira, por ser uma economia rural e dependente da exportação de produtos primários, jamais conseguiria dar início à industrialização pela iniciativa privada. Ou o Estado começava a investir em infraestrutura, ou o Brasil continuaria sendo uma economia periférica.

Esse debate marcou profundamente os anos 1930/40. De um lado, estava o fundador da FIESP, o Roberto Simonsen, e de outro o economista Eugenio Gudin. É um debate sobre os limites da intervenção do Estado na economia, que discute os projetos de poder que queríamos para o Brasil, que discute o papel do Estado, da iniciativa privada, do capital externo, estatal e nacional.

Do ponto de vista de sequencias causais, como vimos na última aula, o capitalismo clássico começa exatamente a partir de um processo de industrialização, de um processo schumpeteriano de destruição criadora. Esse processo vai se consolidar e levar uma forte industrialização na Inglaterra. As consequências disso são mudanças geocupacionais profundas. A partir daí, começamos a identificar a criação de um operariado organizado sob a forma de sindicatos, e a perceber uma série de lutas políticas, que por sua vez resultam em uma transformação política. Por exemplo, no século XIX, na Inglaterra, a tipificação dos crimes incluía a formação de sindicados e greves. No século XX isso passa a ser um direito civil. Isso é fruto de conflitos de classe, de confrontos ideológicos (socialismo versus liberalismo, revolução versus reforma) e esses resultam em um grande pacto, que abre caminho para o Estado previdência.

No caso brasileiro, temos em um primeiro momento o confronto ideológico. Isso é decisivo para entender a crise do federalismo brasileiro. A Aliança Liberal em 1930 era uma verdadeira frente ampla, liderada por paulistas, gaúchos e mineiros. Com a vitória da Aliança Liberal, São Paulo tenta derrubar Getúlio e perde, donde ocorre a Revolução Federalista. Parte da elite paulistana é exilada na Europa. Em 1934 há uma proposta de acordo, que Getúlio aceita mas não cumpre, dando enseja à Revolução Constitucional. Em 1935 tivemos a Intentona Comunista, em 1937 o Golpe do Estado Novo. Em suma, essa década é permeada com o confronto ideológico, o que resulta em um Estado desenvolvimentista, que elege o setor siderúrgico como a espinha dorsal do projeto de industrialização. Nesse momento temos a construção da Vale do Rio Doce, da Companhia Siderúrgica Nacional. Em 1952 a criação da Petrobrás, a consolidação do Parque do ABC.

Vimos que a diferença entre o capitalismo clássico e o tardio é que o segundo é um capitalismo de Estado. Esse Estado intervém através de empresas públicas ou estatais na economia, procurando investir no setor de infraestrutura atraindo capital estrangeiro. O Estado brasileiro, para atrair a empresa montadora, tinha que dar alguma coisa em troca, mas ele não possuía poupança suficiente. A forma de atrair utilizada, assim, é a ideia de mercado reservado: o Estado seleciona empresas que, de alguma maneira, se associam às empresas estatais. Por exemplo, a família Klabin com a fábrica de celulose, a família Moraes na petroquímica, etc. A ideia é formar uma aliança entre as empresas estatais e multinacionais, formando uma burguesia industrial nacional de cima para baixo, a partir da eleição de determinadas famílias que teriam condições de desenvolver empresas campeãs.

(28)

Ademais, vimos que com a consolidação do parque automobilístico e as consequentes mudanças ocupacionais, surgem confrontos ideológicos. Os confrontos ideológicos acabaram, por certo tempo, sendo mascarados pela rapidez com que o Brasil se industrializou. A expansão do PIB, de alguma forma, neutralizou as tensões e os conflitos sociais advindos da rapidez com que o Brasil se urbanizou.

A industrialização acelerada provoca migração, alteração da pauta moral do Brasil, traz novos tipos de conflito, sobrecarrega as instituições, que são obrigadas a formular políticas públicas para dar conta dessa sociedade em mudança, etc. Contudo, como tivemos inicialmente também altas taxas de crescimento econômico, conseguimos suportar a explosão demográfica. A partir de 1980 pra 1990 o modelo varguista de substituição de importações começa a apresentar problemas. Vamos identificar alguns desses problemas, principalmente de 1980 pra frente.

P

ROBLEMAS DO

M

ODELO

V

ARGUISTA E O

F

IM DA

D

ITADURA

Entre 1970 e 1980, o PIB cresceu 150%. Na década, o crescimento seguinte despencou pra 3%. Como vimos, o travamento do crescimento econômico, todavia, não é acompanhado de uma desaceleração equivalente do crescimento da população, na velocidade da urbanização e do processo migratório. Nasce então o risco de uma bomba de efeito retardado: o descasamento entre as taxas de crescimento da população e as taxas de crescimento econômico, a médio prazo, acarretaria o desemprego nas novas gerações, que não conseguiriam entrar na economia formal, e uma consequente forte tensão social.

Com efeito, a partir de 1971 temos um período de declínio no ritmo de crescimento econômico. A partir de 1980 temos uma queda extremamente acentuada, e depois um período de tentativa de recuperação do ritmo de crescimento, mas essa recuperação foi ainda muito pequena, e depois a queda continua. Em 1990 há uma nova tentativa de recuperação, que se deu por meio do Plano Collor. Em 1993/94 implementa-se o Plano Real e em 1995, entra em cena o Plano Cruzado. São períodos de “espasmos de crescimento”.

Mas afinal, qual foi o problema? O que limitou o crescimento da economia brasileira de 1980 pra cá? Fundamentalmente, o Brasil de hoje é fruto do que aconteceu nos anos 1970, mais especificamente no 2o Plano Nacional de Desenvolvimento.

Objetivos do 2

o

Plano Nacional de Desenvolvimento

•  Deslocar o eixo do modelo: do setor automotriz ao petroquímico; •  Desenvolver setores de bens de capital e equipamentos pesados; •  Antecipar investimentos em infraestrutura (75-2000);

•  Substituir os setores beneficiários de incentivos fiscais; •  Descongestionar o setor industrial do SE ou NE;

•  Fonte de financiamento: conjugar endividamento externo com empenho das exportações futuras

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