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O leão e o sigma: a crítica de Plinio Corrêa de Oliveira ao movimento integralista

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Academic year: 2021

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O leão e o sigma: a crítica de Plinio Corrêa de Oliveira ao movimento integralista

Víctor Almeida Gama

Universidade Federal Fluminense

O objetivo deste trabalho é apresentar o debate e as relações de tensão entre o pensamento contrarrevolucionário, representado por Plinio Corrêa de Oliveira e o pensamento integralista, de Plinio Salgado, buscando compreender as aproximações e contradições de dois movimentos conservadores no que toca ao problema do modelo de sociedade católica pensado a partir da doutrina Social da Igreja por Oliveira e Salgado.

A partir da compreenção dos modelos de sociedade propostos pelos dois expoentes do conservadorismo brasileiro do século XX, de modo especial o de Plinio Corrêa de Oliveira, identificar as críticas que o pensador católico apresentava às representações integralistas do pensamento católico.

Plinio Correa de Oliveira, líder e intelectual político-religioso de destaque no catolicismo brasileiro, fundador da Sociedade Brasileira de defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP), teve um papel preponderante nos meios político-religiosos do país, especialmente a partir de 1960, ano da fundação da TFP. Sua carreira de polemista católico, porém, se inicia já na década de 1930 no movimento do jornal O Legionário, que reunia um grupo de leigos engajados oriundos de tradicionais famílias paulistas, que formavam um núcleo compenetrado do pensamento católico conservador.

Este pequeno grupo compreendia haver uma luta constante entre a Revolução, um processo plurissecular que buscava destruir o Cristianismo e a Contrarrevolução, entendida como a reação católica tradicionalista, antiliberal, antissocialista, anticomunista e anti-maçônica. Por possuir um entendimento muito particular do espectro político da direita, que compreenderia a seu ver uma clara postura confessional católica, não alinhada aos valores do mundo moderno, Plinio Corrêa de Oliveira via a necessidade de combater aquelas forças que entendia serem os motores do processo revolucionário.

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É nesse momento da história do ainda pequeno grupo do jornal O Legionário que surgem os pontos de tensão entre Plinio Corrêa de Oliveira e seu pensamento contrarrevolucionário com Plinio Salgado e seu Integralismo.

Contra o Integralismo, Plinio Corrêa contestava sua Filosofia da História com o que considerava uma concepção evolucionista do processo histórico, a forma nebulosa como o Integralismo consideraria o conceito de Deus, a neutralidade em matéria religiosa e a consequente liberdade dos cultos.

Plinio Corrêa manteve o tema do Integralismo sempre presente nas páginas d’O Legionário, especialmente em seus próprios artigos durante toda a década de 1930, momento auge do movimento integralista

Atribui-se a Oliveira um estudo aprofundado sobre os elementos de contradição entre o pensamento contrarrevolucionário e o integralista, na forma de uma carta pastoral assinada por do Gastão Liberal Pinto, bispo de São Carlos – SP com o objetivo de pleitear a condenação pelo clero católico ao movimento integralista. A carta seria subscrita por outros bispos com a finalidade de colocar os católicos em prevenção contra o crescimento do integralismo, uma vez que nesse momento o movimento vivia seu apogeu.

A carta em questão nunca foi tornada pública, mas manifestava certa indisposição e preocupação de setores do clero com o crescimento do pensamento de Plínio Salgado.

A disputa, entretanto, se dá em termos de projetos de sociedade. O pensado por Plinio Corrêa de Oliveira nasce a partir de uma visão modulada pela religião. Entende que a Igreja é a grande artífice da civilização ocidental ou, nas suas próprias palavras, da civilização cristã. Em função dessa relação que poderíamos chamar de umbilical entre o mundo ocidental e a Igreja, seria preciso estabelecer um vínculo por onde a grande razão de ser do Estado, seria o estabelecimento do reino de Deus na Terra.

Como o Integralismo não se reduziria apenas a uma doutrina política, mas também social, econômica, filosófica, moral, nas palavras do próprio Plinio Salgado, e por penetrar em tantas esferas das relações sociais, ela deveria ter, para o pensador católico, uma nota claramente confessional, uma vez que o catolicismo seria parte da identidade nacional. Essa relação

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confessional seria a condição para que um movimento nacionalista possuísse também como distintivo a fé católica.

Plínio Salgado, por sua vez, fundador e líder da Ação Integralista Brasileira (AIB), inspirada nos princípios do fascismo italiano. Deputado por dois mandatos e candidato a presidente no pleito de 1955, possuía, em função de as carreira na vida pública, um olhar mais amplo sobre os setores da sociedade onde seu ideal poderia se estabelecer. Por essa razão, o se modelo de sociedade não possui a marca confessional tão reclamada por Oliveira como necessária a um movimento de cunho nacionalista.

O integralismo entende a sociedade como um agrupamento de outras pequenas realidades sociais que formados pelos grupos familiar, profissional, cultural, tem como propósito a busca da integral realização do homem e do seu fim último – Deus. (VASCONCELOS, 1989) Apesar de sua orientação pessoal católica e de ser leitor de Jackson de Figueiredo, expoente do catolicismo intransigente brasileiro, Plínio Salgado não adota uma postura claramente confessional a seu movimento, uma vez que poderia afastar os adeptos de outras tradições religiosas a cerrar fileiras no movimento integralista. Apesar disso, nota-se uma grande preocupação religiosa em Plínio Salgado como elemento formador fundamental do caráter. No Código de Ética do Estudante, logo no seu primeiro artigo, traz como advertência “ Faze da tua crença em Deus e nos destinos sobrenaturais do homem a luz que te guiará no meio da confusão dos desorientados e da corrupção dos costumes.”

Há uma clara preocupação de Plínio Salgado com a difusão da mensagem cristã. Autor do clássico livro "Vida de Jesus”, cuja primeira edição data de 1901, também escreveu inúmeros outros textos esparsos sobre o tema.

Sobre o famoso slogan de Charles Maurras, líder da Action Française, movimento monarquista francês, Plínio Salgado faz sua releitura, pontuando que o que os diferencia é exatamente a importância que cada um dava à questão religiosa:

“Um filósofo francês — e ainda é vivo — lançou um slo gan famoso: "politique d’abord". Eis que chegado é o momento em que nós, católicos, devemos lançar outro, mais avançado e corajoso, dizendo: "Christ d'abord".

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Sim; Jesus antes de tudo: o mais virá por acréscimo. As nações esqueceram-se disso. A culpa não cabe apenas aos que esqueceram-se educaram fora do rebanho do Mestre Divino. Cabe também a certo cristianismo que não tem dado exemplo de confiança em nosso Pai Celeste e transige com os que proclamam o primado do económico sobre o espiritual. (SALGADO, 1979, p. 16-17) Fica claro, então, que Plínio Salgado entendia a difusão da fé cristã como elemento essencial da boa formação do caráter.

Já Lúcio José dos Santos, ao expor sua compreensão pessoa da relação entre catolicismo e integralismo, aponta as razões de por que, na sua opinião de católico integralista, não haver nenhuma discrepância entre o projeto corporativista do movimento e a doutrina social da Igreja, especialmente exposta na Rerum Novarum (1891) e na Quadragesimo Anno (1931).

O Integralismo afirma a existência de Deus e a imortalidade da alma. Compreende a família e a autoridade segundo os ensinamentos cristãos. Reconhece, no homem, “uma tríplice aspiração: material, intelectual e moral”. É contra os ódios e as lutas de classe. Para ele, a sociedade é “a reunião de seres humanos, que devem viver em harmonia, segundo os destinos superiores do homem”. No entender dele, a nação é “como uma sociedade de famílias, vivendo em determinado território, sob o mesmo governo, sob a inspiração das mesmas tradições históricas e com as mesmas aspirações e finalidades”. Para o Integralismo, “os elementos morais da Nacionalidade são a Religião e a Família”. O conceito que ele forma da propriedade é o mesmo de Leão XIII e Pio XI.

Até aqui só encontramos acordo entre o Integralismo e a Doutrina Católica, acordo franco e explícito nos pontos mais importantes e mais graves, nos pontos essenciais. (SANTOS, 1937)

O cerne da doutrina de Plínio Salgado, que norteia todo seu pensamento, é a idéia do homem integral. "Acima dos regimes, que tudo prometem, existe o próprio homem, cuja personalidade cumpre preservar, e acima do homem existe o seu criador, para cujo seio devemos dirigir os nossos passos na terra, através de tão curta passagem por este mundo" (SALGADO, 1945, p.380)

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Num momento em que a atmosfera anti-comunista estava irradiada, o movimento integralista aparece como sendo uma reação plausível e, por essa razão, ganha espaço inclusive nos meios católicos. Sobre essa inopinada adesão, diz Plinio Corrêa de Oliveira:

“Alguns elementos excelentes, próximos de nosso grupo, de primeira ordem, pessoas bem inteligentes, se bandearam nessa época para o Integralismo, apesar de todo meu esforço para os manter no nosso movimento. O Integralismo levou muitos e muitos dos nossos elementos e dos melhores. Diziam que não queriam ser congregados marianos, porque a Congregação Mariana era uma bobagem, enquanto que o Integralismo é que era positivo”. (IPCO, 2015, p. 174)

Nota-se por esse trecho também uma grande preocupação pela evasão de pessoas dos movimentos católicos comandados por Plinio Corrêa de Oliveira para o Integralismo. Tanto o movimento do jornal O Legionário como a AIB disputavam o mesmo público, uma das razões da reação de Oliveira, tendo em vista recuperar especialmente o público católico que se esvaía para as fileiras integralistas.

Por tratar-se de uma publicação de curto alcance e pequena tiragem, é possível acreditar que o próprio Plinio Salgado não tenha recebido as repercussões dos artigos críticos escritos por Plinio Corrêa, uma vez que o jornal O Legionário estava circunscrito ao território da paróquia de Santa Cecília, em São Paulo.

Apesar da falta de respostas seja de Plinio Salgado ou mesmo do próprio movimento integralista, Plinio Corrêa de Oliveira continua a publicar artigos ora como elogios, ora como críticas agudas ao movimento.

Em 1934 Plinio Corrêa escreve um artigo intitulado “Pela união dos católicos”, onde faz menção elogiosa a uma entrevista de Alceu Amoroso Lima sobre o Integralismo em que

“o extraordinário pensador católico brasileiro não podia deixar de mencionar como primeira condição para a participação dos católicos, num movimento de natureza política ‘a preeminência de sua consciência católica sobre sua consciência política’, uma vez bem compreendido esse princípio, com toda a

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extensão que ele importa ninguém poderá fugir aos compromissos supremos com a sua consciência ditados pela religião”. (Oliveira, 1934)

O cuidado dos interesses da religião católica parece ser uma motivação frequente para que Plinio Corrêa trate do Integralismo e da forte adesão da opinião pública católica ao movimento. Em algumas situações pouco menos frequentes, Plinio Corrêa saía em defesa do Integralismo contra acusações que julgava injustas. É o caso, por exemplo, do artigo publicado em 9 de dezembro de 1934, em que rejeita o epíteto de “extremista” para o movimento.

“com a mesma franqueza com que tenho assinalado aos meus numerosos amigos integralistas, as omissões e as indefinições ainda tão frequentes na sua doutrina, insurjo-me agora contra a designação genérica de “extremistas” com que se pretender irmaná-los com os mais irredutíveis adversários da ordem social.” (Oliveira, 1934)

Entende-se por esse trecho que a ordem social pensada por Plinio Corrêa de Oliveira e aquela defendida pelo Integralismo, seriam a mesma. O ponto de distanciamento se estabelece no problema da liberdade religiosa e a característica não confessional do Integralismo.

A partir do final da década de 1940 Plinio Salgado e o Integralismo desaparecem das publicações de Oliveira. Num breve intervalo de tempo entre 1948 e 1951, o pensador católico perde a direção do jornal O Legionário, o que o deixa sem meios de comunicar suas opiniões até a fundação do jornal Catolicismo, em janeiro de 1951. Desde a fundação do referido jornal, cessam as referências a esse movimento político que, mesmo com o enfraquecimento, ainda ostenta inúmeros intelectuais de respeito e projeção no cenário nacional, como foi Miguel Reale.

Essa preocupação cessa ao mesmo tempo em que Plinio perde o comando da junta arquidiocesana de Ação católica e das Congregações Marianas, o que permite pensar que a fuga de membros destes movimentos católicos para o Integralismo fosse, na realidade, o principal motivo dos frequentes ataques no antigo jornal O Legionário.

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Por tratar-se de uma pesquisa ainda não definitiva, não há por ora uma conclusão objetiva sobre as considerações de Oliveira sobre o movimento integralista e seu fundador. Muito do que se tem acesso faz parte da obra pública de Plinio Corrêa de Oliveira, disponível inclusive na internet. Quanto à Plínio Salgado, aparentemente não teria tomado conhecimento das críticas de Oliveira, uma vez que ainda não foi identificada nenhuma menção dele ao diretor d’O Legionário ou ao seu movimento, o que faz crer que esses artigos não o tenham alcançado. Num primeiro momento, o que se pode notar dessa questão ideológica é a preocupação de Plinio Corrêa de Oliveira e de setores do clero católico com a filiação dos católicos ao movimento integralista, por ver nele uma reação à invectiva política do Comunismo. Como medida de contenção, o alerta sobre a incompatibilidade do modelo de sociedade católica e o panorama social representado pelo Integralismo era reafirmado, especialmente na carta pastoral de dom Gastão Liberal Pinto que, por razões desconhecidas, percorreu apenas internamente entre o clero católico, não alcançando o grande público.

Bibliografia

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Fontes da internet:

CARTA DE DOM GASTÃO LIBERAL PINTO AOS BISPOS DO BRASIL SOBRE O

INTEGRALISMO. Disponível em: <

http://www.pliniocorreadeoliveira.info/BIO_19370826_Integralismo_cartaDomGastaoLibera lPinto.htm#.WyZuWdQvzIV > acesso em 18 de junho de 2018

CÓDIGO DE ÉTICA DO ESTUDANTE disponível em <

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