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Relatório: De Seattle ao Occupy Wall-Street: as possibilidades de resistência

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Relatório: De Seattle ao Occupy Wall-Street: as possibilidades de resistência

Tiago Marmund, Manoella Molla, Victor Sakamoto e Aishat Apena

Entre os dias 28 de outubro e 01 de novembro de 2013, a Faculdade Santa Marcelina sediou a XVI Semana de Relações Internacionais, que tinha como tema a Democracia e Deslocamentos Transterritoriais: ordens/desordens no século XXI. O ciclo de palestras buscou discutir as manifestações que tomaram conta das ruas de diversos países, sejam as atuais ou as que já ocorreram há um tempo, como por exemplo, os protestos de Seattle.

No dia 31 de outubro, a primeira mesa, intitulada Globalização e Resistências: de Seattle a Occupy Wall Street, contou com a presença do Prof. Acácio Augusto, Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP e professor da casa, e a convidada Rebecca D`Ippolito, ex-aluna da FASM e Mestre pela Universidade de Londres. Rebecca buscou fazer uma breve recapitulação dos movimentos antiglobalização, desde Seattle em 1999 até os movimentos mais atuais como Los Indignados, na Espanha. De início, Rebecca trouxe à mesa um trecho do filme A Batalha

de Seattle como modo de fazer uma breve

introdução aos movimentos. O trecho em questão focou em como a manifestação pacífica se transformou em uma batalha com alta repressão policial, além de mostrar o aparecimento midiático dos Black Blocs, no momento em que estes se focaram na destruição de patrimônios públicos e no enfrentamento direto com a polícia como forma de resistência ao capitalismo atual e à violência perpetrada pela polícia e pelo Estado.

Como também afirmou o cientista político e pesquisador do anarquismo, Saul

Newman, numa entrevista recente sobre os black blocs, apesar das pessoas que se utilizam da tática serem ainda uma minoria até mesmo no próprio movimento anarquista, estes são um importante modo de resistência na política antiautoritária atual, simbolizada, segundo ele, pela ação direta, o anonimato e a vontade de enfrentar a violência policial; deste modo, “a face oculta tornou-se a imagem que define o ativismo político radical contemporâneo. É possível ver isso no Occupy, na Primavera Árabe, em protestos e manifestações em todos os lugares”.38 Além disso, Newman sugere que a tática black bloc cria um “contraespetáculo que tem um intuito de subverter e sabotar o espetáculo midiático que a política democrática se tornou.”39

Isto posto, as ruas de Seattle foram tomadas como um modo de impedir as reuniões da Organização Mundial do Comércio (OMC) que tinham como objetivo lançar uma nova rodada multilateral de negociações comerciais e ampliar a área de atuação da própria OMC. Os manifestantes lá reunidos, em torno de 50-100 mil, em sua maioria eram defensores dos direitos humanos, estudantes, ambientalistas, líderes religiosos, ativistas em prol dos direitos dos trabalhadores, além da presença dos adeptos da tática black bloc. Todos eles buscavam alertar a comunidade internacional sobre as condições dos trabalhadores em países pobres, a exploração excessiva do meio

38

Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/ sociedade/201cblack-blocs-sao-minoria-mas-simbolo-importante-da-resistencia201d-6046.html Acesso em 13 dez. 2013.

39 Idem.

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ambiente, a possibilidade de criação do livre-comércio para a bio-tecnologia e os alimentos geneticamente modificados, entre outros temas. A pressão feita sobre as lideranças mundiais foi tão grande a ponto de que as reuniões que deveriam ocorrer foram canceladas; a repercussão foi bastante negativa, tanto dentro da OMC como do lado de fora, já que a cobertura midiática teve um papel importante por ser a primeira manifestação antiglobalização realizada e por expor a brutal repressão policial que tomou conta das ruas naqueles dias.

Seguindo uma ordem cronológica, Rebecca expôs alguns pontos-chave do que ocorreu na cidade de Gênova em 2001, na qual a cúpula do G-8 se reuniu para discutir políticas globais de âmbito social e ecológico. Gênova foi um acontecimento importante para as mobilizações antiglobalização tendo em vista os protestos de Seattle e a celebração do primeiro Fórum Social Mundial (2001) sediado em Porto Alegre. As manifestações em Gênova foram marcadas pela forte repressão policial italiana aos manifestantes, que ao fim levou à morte de Carlo Giuliani, um garoto de 23 anos, morto a queima-roupa por um tiro da polícia.

A terceira onda de protestos antiglobalização que Rebecca trouxe à mesa foi o movimento Occupy Wall Street, em Nova Iorque, Occupy London e Los

Indignados, na Espanha, em 2011. Em sua

abordagem, ela destacou cinco figuras que tiveram uma participação ativa nos protestos: Manuel Castells, Noam Chomsky, Slavoj Zizek, e Todd Gitlin. O primeiro deles, Manuel Castells, analisa o movimento los indignados como parte de um ciclo de indignação global que compunha os movimentos sociais, no qual cada território

tem seu foco de revolta. Segundo sua análise, a tecnologia de informação tem um papel importante para este grupo, já que as mídias sociais levaram milhares de pessoas às ruas de forma surpreendente em mais de 50 cidades, nas quais a população não se sentia representada pelo governo e pelas Organizações Internacionais.

Para Todd Gitlin, a cobertura da mídia sobre o movimento Occupy foi terrível, ou como prefere o autor, preguiçosa40, pois o Occupy não era manchete nas mídias tradicionais e sim nas mídias mais de esquerda e/ou com um posicionamento contra o capitalismo; segundo ele, o Occupy é mais um momento do que um movimento, no entanto, o movimento não acabou e deixará um legado. Além disso, Occupy Wall Street buscava uma reestruturação social e econômica, e para isso buscava expor a grotesca forma em que a democracia atual se transformou, ao se tornar um objeto político nas mãos das grandes corporações internacionais e bancos, e o modo como Wall Street criou um colapso econômico que gerou uma grande recessão nos Estados Unidos.41 O movimento Occupy Wall Street, influenciado pela onda de protestos no mundo Árabe a favor da democracia direta e que derrubou ditadores ao longo do ano de 2011, buscava expor a desigualdade social e econômica, a ganância e a corrupção presente no governo norte-americano; para isto, os manifestantes que tomaram as vias públicas de assalto – compostos por estudantes, anarquistas,

40

Disponível em: http://www.poynter.org/latest- news/top-stories/149139/gitlin-media-coverage-of- occupy-wall-street-is-predictably-lazy-but-likely-to-improve/ Acesso em 06 dez13

41

Disponível em: http://occupywallst.org/about/ Acesso em 06 dez 2013.

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esquerdistas etc. – ocuparam o parque Zuccotti, situado bem no distrito financeiro de Manhattan.

Já segundo Noam Chomsky, em sua intervenção pública feita no acampamento Occupy Boston42, o movimento é um acontecimento importante e que pode trazer significados notáveis para a história dos Estados Unidos, em especial. Occupy Wall Street é um movimento, para o autor, sem precedentes e que está criando novas comunidades cooperativas no país e no mundo, e, para isso, seria preciso se organizar de forma disciplinada e sustentável, ao mesmo tempo em que se deve criar uma ampla base popular de apoio ao mostrar às pessoas o que é o movimento.

Outra figura presente no Zuccotti Park e trazida a análise por D`Ippolito é o esloveno Slavoj Zizek. Este também foi um grande apoiador do Occupy Wall Street; em seu discurso para os manifestantes43 em 2011, Zizek deixou claro que se deve ter atenção que o tabu já fora rompido, que o mundo atual com todos os seus problemas já está exposto a todos, e o que se deve pensar agora é o tipo de organização social a ser buscada após o fim do sistema capitalista que trouxe todos à crise atual. É preciso pensar alternativas e não se apaixonar por si mesmos.

O segundo palestrante da noite, Acácio Augusto, buscou analisar os movimentos de antiglobalização e resistência a partir da utilização das Novas Tecnologias

42 Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2011

/11/02/index.php?section=opinion&article=023a1mun Acesso em 06 dez 2013.

43

Disponível em: http://blogdaboitempo.com.br/2011 /10/11/a-tinta-vermelha-discurso-de-slavoj-zizek-aos-manifestantes-do-movimento-occupy-wall-street/ Acesso em 06 dez 2013.

de Informação e Comunicação (NTIC). Há, portanto, uma via de mão dupla no modo em que se usa a internet atualmente: por um lado ela serve para reunir dados, controlar, registrar, mapear, enfim, vigiar a população; e por outro lado é usada para convocar cidadãos às manifestações públicas, promover ataques a sites do governo e até mesmo participar de abaixo-assinados.

Do ponto de vista político, o fim do século XX e início do século XXI foi uma época que passou por uma transformação importante, já que com o fim da Guerra Fria o capitalismo liberal democrático se estabeleceu como a melhor forma de governo. É exatamente nesta época, início dos anos 1990, que Acácio, ao seguir uma análise metodológica indicada por Michel Foucault na década de 197044, trouxe uma importante questão que devemos nos atentar: seja um posicionamento de direita ou de esquerda, ambas se complementam e por isso não existe nenhuma diferenciação radical entre elas; pelo contrário, tanto a esquerda como a direita mantêm uma posição política voltada ao Estado, uma racionalidade neoliberal.

A explosão dos protestos em 1999 na cidade de Seattle trouxeram, segundo a análise de Augusto, uma nova possibilidade de se fazer política que vá além da tradicional política estatal. Os protestos, portanto, são uma nova forma política, a política radical que com a ajuda da internet traz novos cenários no momento que combate os governos, ONGs e a velha prática política, como já dito. Assim, o papel da internet nestes protestos serviria como uma ajuda no enfrentamento ou seria apenas um reforço a

44

Em sua exposição, Acácio Augusto cita em especial o curso Segurança, território, população e Nascimento

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uma formação política baseada na democracia, na extensão da vigilância e nas punições?

A análise feita por Acácio acerca da internet é bastante interessante, pois mostra que a partir da expansão na década de 1990 para fins comerciais e pessoais, houve também o fortalecimento da cultura da participação ao mesmo tempo em que proporcionou o compartilhamento de informações e dados num espaço que atualmente alcança, para além da própria internet, o ciberespaço. Deste modo, não é possível que haja uma politização na internet; pelo contrário, a politização ocorre na rua em meios aos combates, lutas e confrontos. A internet seria então um paradoxo: ao mesmo tempo em que serve e ajuda as manifestações chamando mais pessoas para as ruas, ampliando os inúmeros meios de participação, ela também funciona como um meio para apenas dar uma nova roupagem às práticas políticas já antigas e, de certa forma, decadentes, mantendo no final tudo como está, além de servir como um meio de espionagem e vigilância por meio dos Estados. O importante, como deixou claro Acácio Augusto na sua fala, é notar que o que rompe com o comodismo e desestabiliza fluxos computo-informacionais são as táticas usadas pelos black blocs pela primeira vez em Seattle.

Em suma, ficou nítido, durante as exposições de ambos os palestrantes, que é urgente a necessidade de renovação das práticas governamentais e/ou do sistema ineficaz, que leva jovens por todo o planeta às ruas para protestarem por diversas causas. Seja por meio da utilização da internet como uma ferramenta para as manifestações, por meio de ocupações e acampamentos como

ocorreu em Nova Iorque, Londres e na Espanha, ou por meio do uso da tática black bloc como um modo de enfrentamento à violência policial e de subversão à democracia atual, o importante é continuar resistindo a fim de criar espaços verdadeiramente livres.

Tiago Marmund é estudante do 4º ano do

curso de Relações Internacionais da FASM, tendo feito intercâmbio na Universidade de Coimbra, em Portugal.

Victor Sakamoto é estudante do 3º ano do

curso de Relações Internacionais da FASM.

Manoella Molla é estudante do 2º ano do

curso de Relações Internacionais da FASM.

Aishat Apena é estudante do 2º ano do curso

de Relações Internacionais da FASM.

Referências Bibliográficas:

CHOMSKY, Noam. Ocupemos el futuro. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/ 2011/11/02/index.php?section=opinion&articl e=023a1mun. Acesso em 06 dez 2013.

GITLIN, Todd. Media coverage of Occupy

Wall Street is predictably lazy, but likely to improve. Disponível em: http://www.poynter.

org/latest-news/top-stories/149139/gitlin- media-coverage-of-occupy-wall-street-is-predictably-lazy-but-likely-to-improve/ Acesso em 06 dez 2013.

NEWMAN, Saul. Black blocs são minoria,

mas símbolo importante da resistência.

Disponível em: http://www.cartacapital.com.

(5)

br/sociedade/201cblack-blocs-sao-minoria-57

mas-simbolo-importante-da-resistencia201d-6046.html Acesso em 06 dez 2013.

ZIZEK, Slavoj. A tinta Vermelha. Tradução Rogério Bettoni. Disponível em:

http://blogdaboitempo.com.br/2011/10/11/a- tinta-vermelha-discurso-de-slavoj-zizek-aos- manifestantes-do-movimento-occupy-wall-street/. Acesso em 06 dez 2013.

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