MÚSICA NO ENSINO E APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA: UMA ABORDAGEM DIDÁTICA
Valdir de Sousa Cavalcanti Universidade Estadual da Paraíba valdirsc@hotmail.com
Abigail Fregni Lins Universidade Estadual da Paraíba Bibilins2000@yahoo.co.uk
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo apresentar uma pesquisa de mestrado em andamento, que propõe desenvolver uma abordagem didática utilizando a música na aprendizagem da Matemática, em composição de paródias, compostas por 100 alunos de quatro turmas do terceiro ano do Ensino Médio de uma Escola Estadual de Campina Grande, PB. A pesquisa tem como enfoque os conteúdos de probabilidade, números complexos, circunferência e polinômios. Matemática e Música estão sendo tratadas aqui sob a perspectiva da Teoria das Inteligências Múltiplas e sua aplicação no Ensino Médio com relação às habilidades e a construção de competências. A coleta dos dados se deu em sala de aula, final de 2008. O método utilizado foi o estudo de caso. Os instrumentos utilizados foram questionários, entrevistas semi-estruturadas, listas de exercícios sobre os conteúdos trabalhados, fotos, áudio, vídeo e estúdio. O artigo apresenta os resultados referentes ao Questionário II, os quais mostram que a maioria dos alunos acredita que compor paródia com letras voltadas a conteúdos matemáticos é algo interessante. Os alunos se sentem realizados ao perceber que são capazes de compor e que o envolvimento com a Matemática melhorou ao compor as paródias. Para a maioria dos alunos uma aula de Matemática com o conteúdo abordado por meio da música torna-se uma aula estimulante.
Palavras-Chave: Educação Matemática. Música. Ensino Médio. Inteligências Múltiplas.
Introdução
Atualmente existem diversas definições para música. Mas, de um modo geral, ela é considerada ciência e arte, na medida em que as relações entre os elementos musicais são relações matemáticas e físicas; a arte manifesta-se pela escolha dos arranjos e combinações. Houaiss apud Bréscia (2003, p. 25) conceitua a música como “[...]
combinação harmoniosa e expressiva de sons e como a arte de se exprimir por meio de sons, seguindo regras variáveis conforme a época, a civilização etc.”.
Faria (2001) define a música como um importante fator na aprendizagem, pois a criança desde pequena já ouve música, a qual muitas vezes é cantada pela mãe ao dormir, conhecida como cantiga de ninar. Segundo a autora, a música é muito importante na aprendizagem, pois o aluno convive com ela desde muito pequeno.
Snyders (1992) comenta que além de contribuir para deixar o ambiente escolar mais alegre, podendo ser usada para proporcionar uma atmosfera mais receptiva à chegada dos alunos, oferecendo um efeito calmante após períodos de atividade física e reduzindo a tensão em momentos de avaliação, a música também pode ser usada como um recurso no aprendizado de diversas disciplinas.
Inicialmente a pesquisa em questão, dizia respeito a interesse e motivação com relação à Matemática. A pesquisa sofreu algumas mudanças, passando agora a ter como objetivo desenvolver uma abordagem didática para conteúdos matemáticos na tentativa de
estimular as habilidades e promover a construção de competências de alunos do último
ano do Ensino Médio via composição de paródias.
Sendo assim, hoje a pergunta que norteia a pesquisa é se envolver música
compondo paródias pode vir a ser um meio de se estimular habilidades e construir competências em relação a conteúdos matemáticos?
Anterior a discussão do Questionário II, um breve relato sobre o conceito de inteligência e inteligência musical difundido por Gardner (1994) e aspectos sobre habilidades e competências (ALVES, 2003).
Para maior esclarecimento de como a pesquisa em questão está sendo trabalhado, a seguir, o referencial teórico que a fundamenta, anterior às questões metodológicas.
INTELIGÊNCIA MUSICAL
A pesquisa se fundamenta na Teoria das Inteligências Múltiplas de Gardner (1994), que argumenta que o ser humano possui um conjunto de diferentes capacidades, entre elas, a musical, associada à capacidade de se expressar por meio da música.
A teoria predispõe que não existe um conceito único de inteligência, pois inteligência é um conjunto de habilidades que podem ser estimuladas no contexto social. Na oportunidade de explorar e realizar atividades diversificadas, um indivíduo “entende” sempre que é capaz de aplicar conhecimentos, conceitos ou habilidades adquiridas em qualquer ambiente ou situação-problema. As habilidades de cada indivíduo se combinam de forma única em cada pessoa.
Aquilo que se teorizou como inteligência musical é descrito como "habilidade para apreciar, compor, produzir e/ou reproduzir música.
De acordo com Alves (2003), Gardner, ao referir-se à inteligência musical, inclui a música como componente importante na educação. A estratégia consiste em reconhecer que o ritmo e a harmonia podem penetrar em sala de aula e podem estabelecer um alto grau de equilíbrio entre corpo e mente.
Segundo Alves o Brasil tem um amplo repertório de músicas que podem ser utilizadas no ensino. As letras das músicas poderão conter informações do currículo e se tornam, assim, instrumentos didáticos. Não se faz necessário muito talento para compor canções adequadas para cada disciplina ou conteúdo. Para a autora, quando estimulados, os alunos poderão compor o que entendem de determinado conteúdo.
O advento da nova estrutura curricular do Ensino Médio gerou a necessidade de se elaborarem procedimentos didáticos para professores das três áreas do conhecimento do atual Ensino Médio. A referida estrutura considera a importância de desenvolver competências de formação geral, levando em consideração a pluralidade de habilidades dos alunos.
O conceito de competência enfocado pressupõe uma análise mais detalhada. Segundo Perrenoud, competência é uma capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles. (PERRENOUD, 1999, apud ALVES). Para se pôr em ação uma competência humana, coloca-se em sinergia várias habilidades e recursos cognitivos. Portanto, antes de se desenvolver competências, desenvolvem-se habilidades.
A seguir discussão do Questionário II, após descrição de alguns aspectos metodológicos da pesquisa
ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA
Essa pesquisa se configurou a partir do trabalho que desenvolvemos voltado a Matemática e a Música com alunos do Ensino Médio, tendo início em agosto de 2008. É uma pesquisa de cunho qualitativo (BOGDAN e BIKLEN, 1994), sendo assim, o método de pesquisa utilizado foi o estudo de caso. Os instrumentos utilizados foram questionários e entrevistas semi-estruturadas, listas de exercícios matemáticos, fotos, áudio, vídeo e estúdio. A pesquisa envolveu quatro turmas do terceiro ano do Ensino Médio, totalizando em 100 alunos, da Escola Estadual de Ensino Médio e Educação Profissional Dr. Elpídio de Almeida, Estadual da Prata, Campina Grande, Paraíba. Fui eu o professor pesquisador. No momento estamos trabalhando na análise dos dados coletados.
A pesquisa constou de oito momentos, sendo eles:
(i) Conteúdos Matemáticos - Foram trabalhados os conteúdos probabilidade, números complexos, circunferência e polinômios em sala de aula, sendo eu o professor pesquisador. As aulas se deram na forma expositiva tradicional. Os conteúdos foram trabalhados de abril a setembro de 2008. Ao longo das aulas se propôs o trabalho e todos os alunos das quatro turmas aceitaram e foram divididos em doze grupos de 8 a 10 alunos.
(ii) Questionário I- Foi aplicado um Questionário I, para todos os alunos das quatro turmas, totalizando por volta de 100 alunos. Neste questionário foram investigadas questões sobre o perfil dos alunos com relação à Matemática. O mesmo constou de doze perguntas, dez objetivas e duas subjetivas.
(iii) Produção das Paródias - Cada grupo foi responsável por produzir e desenvolver sua paródia sobre um dos conteúdos matemáticos trabalhados e sorteados pelo grupo. As paródias compostas pelos alunos, a partir de uma música escolhida pelo grupo, foram gravadas em CD, em um estúdio. O período de composição, gravação e apresentação das paródias se deu entre os meses de outubro e novembro, finalizando o trabalho em 47 dias. No decorrer da realização do trabalho, as turmas tiveram aulas regulares dando sequência aos conteúdos programáticos do ano letivo.
(iv) Lista de Exercícios - Os alunos responderam a uma lista de questões voltadas aos conteúdos matemáticos abordados nas paródias para que se investigasse o conhecimento matemático alcançado por eles. A lista foi entregue aos alunos uma semana anterior as apresentações ocorridas na Escola.
(v) Entrevista I – No dia da apresentação das paródias foi realizada a Entrevista I, na qual cada grupo descreveu o envolvimento dos mesmos na composição de suas paródias voltados aos conteúdos matemáticos abordados.
(vi) Apresentação das Paródias - As apresentações se deram em duas tardes das 13 h às 17 h. Cada grupo fez sua apresentação na Sala de Vídeo da Escola. Os doze grupos se intitularam por Probabilidade; Amor em Probabilidade; Me Explica; Circunferência;
Extra Circunferência; Circle Music; Rockcomplexos; Balança Complexos; Os Complexos 2008; Descomplicando os Polinômios; Festa dos Polinômios e Estudando Polinômios.
(vii) Questionário II - O Questionário II foi aplicado após a apresentação das paródias, com o objetivo de investigar se o envolvimento com a Música desenvolveu as habilidades e a construção de competências matemáticas dos alunos, em relação aos conteúdos trabalhados nas letras das músicas e na lista de exercícios.
(viii) Entrevista II - Dois alunos de cada grupo, os que mais dissertaram sobre o trabalho realizado foram escolhidos para a Entrevista II, que se deu nos dias 02 e 04 de dezembro de 2008, das 9h ás 12 h e das 14h ás 17 h, com o objetivo de aprofundar os dados obtidos pelos questionários aplicados.
Com relação aos dados, à análise quantitativa diz respeito aos Questionários I e II. Já o aspecto qualitativo da análise diz respeito ao conhecimento matemático alcançado pelos sujeitos nas letras das composições das paródias e nas listas de exercícios, assim como os resultados alcançados nas duas Entrevistas, I e II. Discutiremos a seguir as questões objetivas do Questionário II e análise preliminar das mesmas.
Estrutura do Questionário II e análise preliminar
Composto de nove perguntas, sendo seis objetivas e três subjetivas.
1- Para você, o compor uma paródia com letra voltada ao conteúdo matemático foi?
( ) Fácil ( ) Normal ( ) Difícil ( ) Interessante 2- Para você, ter trabalhado em grupo foi? ( ) Desestimulante ( ) Motivador ( ) Interessante ( ) Difícil
3- Como você se sentiu após ter sido capaz de
6- O assunto matemático abordado na paródia ,para você:
( ) tem importância para a vida ( ) atribui melhoras na aprendizagem ( ) faz o currículo mais interessante ( ) torna a aula mais estimulante
As questões 1, 3 e 4 tiveram como objetivos colher informações sobre aspectos relevantes a composição da letra. A primeira pergunta foi Para você, o compor uma paródia com letra voltada ao conteúdo matemático foi? Resultando em:
Respostas Quantidade Respondida Resultado em %
Fácil 3 3% Normal 5 6% Difícil 23 26% Interessante 57 65% Não Respondeu Total 88 100%
Tabela I: Pergunta (1) do Questionário II
Surpreendentemente, 65% dos alunos responderam interessantes sendo que sabemos que a maioria dos alunos acha conteúdos matemáticos como algo difícil.
Na terceira pergunta Como você se sentiu após ter sido capaz de compor a paródia? O resultado foi:
Respostas Quantidade Respondida Resultado em %
Normal 10 11%
Surpreso 18 21%
Realizado 31 35%
Não Respondeu
Total 88 100%
Tabela II: Pergunta (3) do Questionário II
Para 35% dos alunos, ao ser capaz de compor a paródia, ou seja, passar pelo processo de construção de competências sentiu-se realizado.
Sobre a quarta pergunta Você acredita que ao compor a paródia o seu envolvimento com a Matemática melhorou? O resultado foi:
Respostas Quantidade Respondida Resultado em %
Sim 61 69% Não 3 3% Indiferente 4 5% Muito 19 22% Não Respondeu 1 1% Total 88 100%
Tabela III: Pergunta (4) do Questionário II
Para 69 % dos alunos, o envolvimento com a Matemática melhorou ao trabalhar composição de músicas em forma de paródias, o que mostra o quanto o trabalho de compor música, paródia, estimulou as habilidades dos alunos.
A questão (2) teve como objetivo saber a opinião dos alunos sobre a forma de trabalhar em grupo. Para você, ter trabalhado em grupo foi? Resultando em:
Respostas Quantidade Respondida Resultado em %
Desestimulante 4 4,5 % Motivador 45 51% Interessante 27 31% Difícil 11 12,5% Não Respondeu 1 1% Total 88 100%
Tabela IV: Pergunta 2 do Questionário II
Para 51% dos alunos o trabalho em grupo foi motivador. Observamos que essa atividade despertou o estudar entre eles como também os aproximou, uma vez que só desenvolviam suas atividades de forma individual.
As questões (5) e (6) tiveram como objetivos abordar a opinião dos alunos ao trabalhar a Matemática por meio da música e sua importância em relação ao conteúdo matemático abordado na música. Na quinta pergunta Uma aula de Matemática com o assunto abordado por meio da música torna-se? O resultado foi:
Respostas Quantidade Respondida Resultado em %
Interessante 37 42 % Estimulante 51 58% Indiferente Desestimulante Não Respondeu Total 88 100%
Tabela V: Pergunta 5 do Questionário II
Para 58 % dos alunos, ou seja, mais da metade, acham que uma aula de matemática com o conteúdo abordado por meio da música torna uma aula estimulante. Isso nos leva a uma reflexão da nossa prática pedagógica, para os alunos não é interessante ou estimulante a aula apenas na exposição dos conteúdos.
Já na sexta pergunta O assunto matemático abordado na paródia, para você? Os alunos tiveram como opções:
Opção1: tem importância para a vida; Opção 2: atribui melhoras na aprendizagem; Opção 3: faz o currículo mais interessante; Opção 4: torna a aula mais estimulante. O resultado foi:
Respostas Quantidade Respondida Resultado em %
Opção 1 7 8% Opção 2 47 54% Opção 3 1 1% Opção 4 32 36% Não respondeu 1 1% Total 88 100%
Tabela VI: Pergunta 6 do Questionário II
Para 54% dos alunos, o assunto abordado na paródia atribui melhoras na aprendizagem. Observamos que trabalhar por meio de uma abordagem didática envolvendo Música pode vir a contribuir com o processo de ensino e aprendizagem da
Matemática, como também estimular as habilidades e promover a construção de competências.
Comentários Finais
Os resultados referentes ao Questionário II mostram que a maioria dos alunos acredita que compor paródia com letras voltadas a conteúdos matemáticos é algo interessante. Os alunos se sentem realizados ao perceber que são capazes de compor e que o envolvimento com a Matemática melhorou ao compor as paródias. A maioria dos alunos acha estimulante uma aula de Matemática com o conteúdo abordado por meio da Música e que o conteúdo abordado na paródia atribui melhoras na aprendizagem.
Cabe ressaltar que na pesquisa em questão não se pretendeu, e nem se pretende, fazer com que a Música explique completamente a Matemática, mas sim estudar as possíveis aplicações das relações entre a Matemática e a Música na construção do processo de ensino e aprendizagem da Matemática.
Referências Bibliográficas
ALVES, Solange Vitória. Trabalhando as Inteligências Múltiplas em Sala de Aula. Brasília: Plano Editora, 2003.
BOGDAN, Robert e BIKLEN, Sari. Investigação Qualitativa em Educação, Uma introdução à teoria e aos métodos, Porto, Porto Editora, 1994.
BRÉSCIA, Vera Lúcia Pessagno. Educação Musical: bases psicológicas e ação preventiva. São Paulo: Átomo, 2003.
FARIA Márcia Nunes. A música, fator importante na aprendizagem. Assis chateaubriand – PR, 2001. 40f. Monografia (Especialização em Psicopedagoga) – Centro Técnico-Educacional Superior do Oeste
Paranaense – CTESOP/CAEDRHS.
GARDNER, Howard. Estruturas da mente: a teoria das inteligências múltiplas. Porto Alegre: Editora Artmed, 1994.