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Classificação de dunas em áreas urbanas a partir do valor de relevância de suas funções ambientais - estudo empírico em Natal/RN

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

MARCEU DE MELO

CLASSIFICAÇÃO DE DUNAS EM ÁREAS URBANAS A PARTIR DO VALOR DE RELEVÂNCIA DE SUAS FUNÇÕES AMBIENTAIS – ESTUDO EMPÍRICO EM

NATAL/RN

Natal/RN 2020

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

MARCEU DE MELO

CLASSIFICAÇÃO DE DUNAS EM ÁREAS URBANAS A PARTIR DO VALOR DE RELEVÂNCIA DE SUAS FUNÇÕES AMBIENTAIS – ESTUDO EMPÍRICO EM

NATAL/RN

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, para obtenção do título de doutor em Geografia.

Área de Concentração: Dinâmica Geoambiental, Riscos e Ordenamento do Território.

Orientador: Prof. Dr. Luiz Antonio Cestaro.

Natal/RN 2020

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Melo, Marceu de.

Classificação de dunas em áreas urbanas a partir do valor de relevância de suas funções ambientais - estudo empírico em Natal/RN / Marceu de Melo. - Natal, 2020.

180f.: il. color.

Tese (doutorado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020.

Orientador: Prof. Dr. Luiz Antonio Cestaro.

1. Dunas - Tese. 2. Funções ambientais - Tese. 3. Análise sistêmica - Tese. 4. Conservação - Tese. 5. Relevância- Tese. I. Cestaro, Luiz Antonio. II. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 911.2(813.2)

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DEDICATÓRIA

(5)

AGRADECIMENTOS

À minha família pelo amor, compreensão e incentivo.

Ao professor doutor Luiz Antônio Cestaro, pela orientação, confiança e autonomia durante toda a minha caminhada acadêmica.

Aos professores do Departamento de Geografia e de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte pelo compartilhamento do conhecimento.

À Secretaria de Estado da Educação, da Cultura, do Esporte e do Lazer do Rio Grande do Norte por ter concedido a licença para cursar o doutorado.

Aos amigos e colegas da Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal pelas contribuições, especialmente aos da Supervisão de Fiscalização Ambiental e do Grupo de Trabalho das Dunas.

À essencial colaboração da bióloga Ana Advíncula do Setor de Arborização, Departamento de Ação Socioambiental da SEMURB, pelas informações compartilhadas, idas a campo e identificação das espécies vegetais.

Ao Grupamento de Ações Ambientais da Guarda Municipal de Natal pelo acompanhamento em algumas das atividades de campo.

Aos 55 especialistas, espalhados por 19 países dos cinco continentes, por compartilharem um pouco do seu tempo ao responderem o questionário sobre o valor de relevância das funções ambientais. Vários não apenas responderam, mas deram palavras de incentivo, sugestões e recomendaram referências úteis ao desenvolvimento dessa tese.

(6)

Mais do que simples espaços territoriais, os povos herdaram paisagens e ecologias, pelas quais certamente são responsáveis, ou deveriam ser responsáveis. Desde os mais altos escalões do governo e da administração até o mais simples cidadão, todos têm uma parcela de responsabilidade permanente, no sentido da utilização não-predatória dessa herança única que é a paisagem terrestre. Para tanto, há que conhecer melhor as limitações de uso específicas de cada tipo de espaço e de paisagem. Há que procurar obter indicações mais racionais, para preservação do equilíbrio fisiográfico e ecológico. E, acima de tudo, há que permanecer equidistante de um ecologismo utópico e de um economismo suicida (Walder Góes, 1973 apud AB’SÁBER, 2003, p. 10)

(7)

RESUMO

As funções ambientais estão diretamente relacionadas à qualidade de vida e ao bem-estar social, sobretudo em áreas urbanas, onde são ainda mais importantes devido à grande variedade de estressores ambientais (poluição e degradação) e sociais (segregação e desigualdades) presentes nesses espaços. A cidade do Natal, área de experimentação, tem como elemento paisagístico mais representativo as dunas, feições que desempenham uma série de funções ambientais com destacada importância para a sociedade. Apesar do reconhecimento da importância das dunas, há um conflito entre usos, ocupação e preservação, resultando em recorrentes casos de degradação, em virtude da expansão urbana sobre um sítio com ampla distribuição dessas feições geomorfológicas. O presente trabalho defende a hipótese que as funções ambientais desempenhadas pelas dunas podem ser qualificadas, quantificadas e hierarquizadas de forma a orientar e disciplinar a tomada de decisão sobre os tipos de usos e ocupações permitidos e adequados para esses ambientes. Teve como objetivo propor uma metodologia integradora para a aplicação prática do conceito de funções ambientais e para a caracterização do status de conservação das dunas (SCD), úteis para o planejamento, gestão e tomada de decisão, tendo como elementos de análise e experimentação 57 dunas não situadas em zonas de proteção ambiental do município de Natal/RN, englobando as 53 dunas identificadas na Resolução CONPLAM nº 001/2018 e outras quatro situadas no limite com o Oceano. Foi realizada uma apresentação e discussão de vários termos e conceitos associados à essa temática, como serviços ecossistêmicos, funções da paisagem, serviços geossistêmicos. O termo funções ambientais foi escolhido como o mais adequado aos objetivos propostos. O trabalho identificou 25 funções ambientais associadas às dunas e contou com a participação de 55 especialistas de 19 países para a definição do valor de relevância dessas funções (VRFA). Os maiores VRFA foram identificados nas dunas situadas no limite com o Oceano, devido às funções associadas à proteção costeira e proteção à cunha salina. O SCD foi baseado em critérios quantitativos e qualitativos como área, transformação morfológica, cobertura vegetal e visibilidade cênica. Os resultados obtidos apontaram para uma relação entre o status de conservação das dunas e a quantidade de funções ambientais, pois quanto maior o SCD maior a quantidade de funções registrada. A metodologia mostrou-se válida para as dunas do município de Natal, uma vez que conseguiu distribuir as dunas em um gradiente classificatório, considerando o VRFA como um indicador útil para tomada de decisão.

(8)

ABSTRACT

Environmental functions are directly related to quality of life and social welfare, especially in urban areas, where they are even more important due to the wide variety of environmental (pollution and degradation) and social (segregation and inequality) stressors present in these spaces. In the city of Natal, experimentation area, the dunes are the most representative landscape element, features that perform a series of environmental functions with outstanding importance for society. Despite the recognition of the importance of the dunes, there is a conflict between use / occupation and preservation, resulting in recurrent cases of degradation due to urban expansion over a site with wide distribution of these geomorphological features. The present work defends the hypothesis that the environmental functions performed by the dunes can be qualified, quantified and hierarchized in order to guide and discipline the decision making about the permitted and appropriate types of uses and occupations for these environments. The objective was to propose an integrative methodology for the practical application of the concept of environmental functions and for the characterization of dune conservation status (SCD), useful for planning, management and decision-making, using 57 dunes for analysis and experimentation not located in environmental protection zones of the city of Natal / RN, encompassing the 53 dunes identified in CONPLAM Resolution nº 001/2018 and four others located on the border with the Ocean. A presentation and discussion of various terms and concepts associated with this theme (ecosystem services, landscape functions, geosystem services, etc.) was presented and the term environmental functions was chosen as the most appropriate to the proposed objectives. The study identified 25 environmental functions associated with dunes and 55 experts from 19 countries participated in the definition of the relevance value of these functions (VRFA). The largest VRFA were identified in the dunes at the edge of the ocean, due to the functions associated with coastal protection and saline wedge protection. The SCD was based on qualitative criteria such as area, morphological transformation, vegetation cover and scenic visibility. The obtained results pointed to a relation between the conservation status of the dunes and the number of functions, since the highest amounts were found in dunes with medium and high conservation status. The methodology proved to be valid for the dunes of the city of Natal, since it managed to distribute the dunes in a grading gradient, considering the VRFA as a useful indicator for decision-making.

(9)

LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Esquemas estruturais de geossistema e ecossistema 20

Figura 02 – Estrutura para ligar ecossistemas ao bem-estar humano 26

Figura 03 – O modelo cascata 27

Figura 04 – Além da cascata 29

Figura 05 – Processo de movimentação dos sedimentos em uma duna 56

Figura 06 – Fluxograma dos procedimentos metodológicos 67

Figura 07 – Mapa de localização das 57 dunas analisadas (área de estudo) 69

Figura 08 – Área em hectares das 57 dunas analisadas 70

Figura 09 – Área em hectares das 57 dunas analisadas agrupadas em 4 classes 70

Figura 10 – Quantidade de funções das 57 dunas analisadas 88

Figura 11 – Frequência dos valores de relevância das funções ambientais das dunas analisadas

88

Figura 12 – Distribuição das classes dos valores de relevância das funções ambientais das dunas analisadas

89

Figura 13 – Área em hectares das dunas analisadas – distribuição das classes do SCD 90 Figura 14 – Vista parcial da Duna 15, maior duna analisada (21,3 hectares). Em

01/11/2019

90

Figura 15 – Vista da Duna 41, menor duna analisada (0,48 hectare). Em 08/10/2019 91 Figura 16 – Percentual da área que sofreu transformação morfológica nas dunas

analisadas – distribuição das classes do SCD

92

Figura 17 – Duna 48, que registrou a maior área de transformação morfológica. Em 10/04/2019

92

Figura 18 – Praça dos Esportes e da Cultura, construída parcialmente sobre a Duna 10, ao fundo. Em 01/11/2019.

93

Figura 19 – Casas construídas sobre a Duna 12, em 01/11/2019 93

Figura 20 – Aterro irregular sobre a Duna 12, em 01/11/2019 93

Figura 21 – Cobertura vegetal das dunas analisadas – distribuição das classes do SCD 94 Figura 22 – Tipo de vegetação das dunas analiasadas – distribuição das classes do

SCD

95

Figura 23 – Espécie em extinção ou endêmicas nas dunas – distribuição das classes do SCD

96

(10)

Figura 25 – Conexão com área relevante das dunas analisadas – distribuição das classes do SCD

97

Figura 26 – Dunas 42 e 43, muito próximas e conectadas a ZPA-05. Em 10/04/2019 98 Figura 27 – Duna 39, situada entre a Lagoa do Pirangi e a Lagoa da Ayrton Senna,

bairro de Neópolis, em 08/10/2019

98

Figura 28 – Deposição de resíduo/lançamento de efluente nas dunas analisadas – distribuição das classes do SCD

99

Figuras 29 e 30 – Deposição de resíduos diversos, área queimada na Duna 52 e detalhe da possível origem do incêndio (queima de pneus). Em 08/10/2019

99

Figura 31 – Construção sobre a Duna 01, área sem rede de coleta de esgotos,

ilustrando a contaminação do solo e lençol freático pela infiltração dos efluentes. Em 10/09/2019

100

Figura 32 – Construções sobre a Duna 01, área sem rede de coleta de esgotos,

ilustrando a contaminação do solo e lençol freático pela infiltração dos efluentes. Em 10/09/2019

100

Figura 33 – Movimento de massa nas dunas analisadas – distribuição das classes do SCD

101

Figura 34 – Construções na base da Duna 11, Rua 1º de Maio. Em 01/11/2019 101 Figura 35 – Construções na base da Duna 11, Rua Santa Célia. Em 01/11/2019 102 Figura 36 – Deslizamento de sedimentos da Duna 11 sobre a Avenida Norte e em

direção aos imóveis da Rua 1º de Maio. Em 01/11/2019

102

Figura 37 – Visibilidade cênica das dunas – distribuição das classes do SCD 102 Figura 38 – Duna 05, exemplo de média visibilidade cênica. Em 17/12/2019 103 Figura 39 – Duna 11, exemplo de alta visibilidade cênica. Em 13/11/2019 103 Figura 40 – Duna 31, exemplo de alta visibilidade cênica. Em17/09/2019 104 Figura 41 – Panorama geral do status de conservação das dunas – distribuição de

classes do SCD

104

Figura 42 – Correlação linear entre a quantidade de funções ambientais e o Status de Conservação das Dunas.

106

Figura 43 – Distribuição de classes do Status de Conservação das Dunas (SCD – classes)

(11)

Figura 44 – Distribuição das classes do Valor de Relevância das Funções Ambientais (VRFA – classes)

106

Figura 45 – VRFA das dunas com baixo SCD 107

Figura 46 – Número de funções das dunas com baixo SCD 107

Figura 47 – VRFA das dunas com médio SCD 107

Figura 48 – Número de funções das dunas com médio SCD 107

Figura 49 – VRFA das dunas com alto SCD 108

Figura 50 – Número de funções das dunas com alto SCD 108

LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Terminologia encontrada na literatura para as funções/serviços fornecidos pelo “ambiente”.

32

Quadro 02 – Definições propostas para funções ambientais 32

Quadro 03 – Definições propostas para serviços ambientais 34

Quadro 04 – Definições propostas para funções ecossistêmicas 36

Quadro 05 – Definições propostas para serviços ecossistêmicos 37

Quadro 06 – Definições propostas para serviços ecológicos 42

Quadro 07 – Definições propostas para funções e serviços da paisagem 43

Quadro 08 – Definições propostas para paisagem 44

Quadro 09 – Definições propostas para funções e serviços geossistêmicos / serviços ecossistêmicos abióticos

46

Quadro 10 – Definições propostas para serviços da biodiversidade 48

Quadro 11 – Definição proposta para funções de uso da terra 49

Quadro 12 – Definição proposta para funções da terra 50

Quadro 13 – Funções ambientais prestadas pelas dunas 63

Quadro 14 – Matriz de ocorrência das funções ambientais prestadas pelas dunas e parâmetros indicadores utilizados para a verificação

73

Quadro 15 – Questionário enviado aos especialistas para atribuição dos valores de relevância das funções ambientais das dunas.

75

Quadro 16 – Indicadores avaliativos do status de conservação das dunas 77 Quadro 17 – Moda dos valores de relevância das funções ambientais das dunas

atribuídos pelos especialistas

(12)

Quadro 18 – Critérios utilizados para o Indicador de Funções Ambientais do

Relatório SEMURB 2017 e para o Status de Conservação das Dunas do presente estudo

108

LISTA DE SIGLAS ANA – Agência Nacional de Águas

APP – Área de Preservação Permanente

CAERN – Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte CDPD – Campo de Dunas do Parque das Dunas

CDPP – Campo de Dunas Pirangi/Potengi CDZN – Campo de Dunas da Zona Norte

CICES – Common International Classification of Ecosystems Services CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente

CONPLAM – Conselho de Planejamento Urbano e Meio Ambiente de Natal - RN EEA – European Environment Agency

FAO – Food and Agriculture Organization of the United Nations IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor IFA – Indicador de Funções Ambientais

MEA – Millenium Ecosystem Assessment MEC – Ministério da Educação

MMA – Ministério do Meio Ambiente MP – Ministério Público

MS – Ministério da Saúde

ONU – Organização das Nações Unidas

PPGE – Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia/UFRN RCC – Resíduos da Construção Civil

RN – Rio Grande do Norte

SCD – Status de Conservação das Dunas

SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo TEEB – The Economics of Ecosystems and Biodiversity

UC – Unidade de Conservação

(13)

UN – United Nations

UNEP – United Nations Environment Programme

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura VRFA – Valor de Relevância das Funções Ambientais

WHO – World Health Organization ZPA – Zona de Proteção Ambiental

(14)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 15

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 18

2.1. Análise Geográfica Integrada 18

2.2. Terminologia e Definições 22 2.2.1. Adjetivação do Termo 30 2.2.1.1. Funções Ambientais 32 2.2.1.2. Serviços Ambientais 34 2.2.1.3. Funções Ecossistêmicas 36 2.2.1.4. Serviços Ecossistêmicos 37 2.2.1.5. Serviços Ecológicos 42

2.2.1.6. Funções e Serviços da Paisagem 43

2.2.1.7. Funções e Serviços Geossistêmicos / Serviços Ecossistêmicos Abióticos

46

2.2.1.8. Serviços da Biodiversidade 48

2.2.1.9. Funções de Uso da Terra 49

2.2.1.10. Funções da Terra 50

2.2.1.11. Considerações sobre os termos 51

2.3. Dunas 51

2.3.1. Dunas – Revisão Conceitual 52

2.3.1.1. Ondulações (ripples) 52

2.3.1.2. Lençóis de Areia (sand sheets) 53

2.3.1.3. Dunas (dunes) 54

2.3.1.4. Mares de Areia (sand seas) e Campos de Dunas (dunefields)

56

2.3.1.5. Considerações sobre as feições arenosas eólicas 57

2.3.2. Dunas – Funções Ambientais 58

2.3.2.1. Funções de Provisão 58

2.3.2.2. Funções de Regulação e Manutenção 59

2.3.2.3. Funções Culturais 62

2.3.2.4. Considerações sobre as funções ambientais das dunas 63 2.3.3. Dunas – Funções Ambientais e Planejamento Territorial 63

(15)

3.1. Área de Estudo 67

3.2. Identificação das Dunas 72

3.3. Matriz de Ocorrência das Funções Ambientais e Parâmetros Indicadores

72

3.4. Valor de Relevância das Funções Ambientais das Dunas (VRFA) 74

3.5. Status de Conservação das Dunas (SCD) 76

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 82

4.1. Valor de Relevância das Funções Ambientais das Dunas (VRFA) 82 4.2. Valor de Relevância das Funções Ambientais das dunas analisadas 86

4.3. Status de Conservação das Dunas (SCD) 89

4.3.1. Panorama Geral do Status de Conservação das Dunas 104

4.4. Status de Conservação das Dunas e Funções Ambientais 105

4.5. Comparação com o Relatório SEMURB 2017 108

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 112

REFERÊNCIAS 114

APÊNDICE A – Informações dos especialistas que responderam ao questionário sobre o Valor de Relevância das Funções Ambientais

137

APÊNDICE B – Respostas dos especialistas ao questionário sobre o Valor de Relevância das Funções Ambientais (VRFA)

139

APÊNDICE C – Valor de Relevância das Funções Ambientais das dunas analisadas

140

APÊNDICE D – Ocorrência e referências das espécies vegetais comestíveis e fornecedoras de fibras identificadas nas dunas analisadas

141

APÊNDICE E – Ocorrência e referências das espécies vegetais com aplicação farmacêutica/bioquímica/medicinal, identificadas nas dunas analisadas

143

APÊNDICE F – Quadro avaliativo do Status de Conservação Ambiental (SCD) e demonstrativo da quantidade de funções ambientais, do Valor de Relevância das Funções Ambientais (VRFA) e dos resultados do Relatório SEMURB (2017)

153

APÊNDICE G – Informações gerais das dunas analisadas 154

ANEXO 1 – Lista preliminar das espécies da flora encontradas nas dunas analisadas (SEMURB, 2017)

(16)

ANEXO 2 – Lista preliminar das espécies da fauna encontradas nas dunas analisadas (SEMURB, 2017)

(17)

1. INTRODUÇÃO

As áreas costeiras são reconhecidas pela variada beleza encontrada nos diversos ambientes que abrigam como praias, dunas, falésias e mangues, bem como pelas múltiplas pressões exercidas sobre eles. As pressões decorrem, sobretudo, da concentração urbana e industrial em estreitas faixas territoriais, que repercutem na modificação e degradação dos sistemas naturais, sem a adoção, na maioria dos casos, de medidas mitigadoras adequadas ou mesmo reconhecimento dos prejuízos relacionados à perda de funções fornecidas pelos sistemas naturais (PYE e ALLEN, 2000; NORDSTROM, 2000, 2008; BIRD, 2008; DAVIDSON-ARNOTT, 2010).

Segundo dados da World Health Organization1 (WHO), em 2014 a população urbana

mundial foi estimada em 54% e continua crescendo. No Brasil, segundo dados do censo demográfico IBGE (2010), cerca de 84% da população vive em áreas urbanas. A concentração populacional em municípios da zona costeira do Brasil é de 26,58%, equivalente a mais de 50 milhões de habitantes (IBGE, 2011, p. 117).

O aumento da população urbana exige um crescimento da infraestrutura, que transforma a paisagem e muitas vezes acarreta, por exemplo, a perda de áreas verdes, perda que tem sido relacionada à diminuição da saúde e qualidade de vida da população (BROWN et al. 2014, p. 34; MEA 2005, p. 44; CHIESURA 2004, p. 129).

Esse quadro de alterações na paisagem e de concentração populacional na zona costeira apresenta uma perspectiva de aumento contínuo, pois tanto a população mundial quanto o processo de urbanização e o padrão de consumo tendem a continuar aumentando, resultando em intensificação das pressões do uso da terra na zona costeira em áreas urbanizadas (GUEDES e SEEHUSEN, 2011, p. 11; SCHLACHER et al., 2014, p. 38; LITHGOW et al., 2014, p. 175; CABRAL et al., 2015, p. 1; NEHREN et al., 2016, p. 401-404).

As dunas costeiras são ambientes particularmente frágeis, estão entre os ecossistemas mais ameaçados e mais intensamente utilizados do planeta, sofrendo severa pressão através da urbanização, turismo, indústrias, mineração, expansão agrícola, dentre outros, situação explicada pela gestão inadequada no passado que persiste até os dias atuais, resultando em progressiva degradação que têm como consequência o comprometimento das funções por elas desempenhadas (CARBONI et al., 2009, p. 17; MUÑOZ-VALLÉS e CAMBROLLÉ, 2014, p. 415; NEHREN et al., 2016, p. 401-403; CICARELLI et al., 2017, p. 84;

1 Disponível em: http://www.who.int/gho/urban_health/situation_trends/urban_population_growth_text/en/.

(18)

REVELO et al., 2018, p. 76; GARCIA-LOZANO e PINTÓ, 2018, p. 519; DELGADO-FERNANDEZ et al., 2019, p. 643).

A perda de áreas de dunas é preocupante, pois elas se destacam pela grande quantidade de funções que desempenham, como filtro para poluentes, recarga do aquífero subterrâneo, hábitat para flora e fauna, que são perdidas através da degradação (MARTÍNEZ, et al., 2004, p. 4; AMARAL et al., 2005, p. 111; NORDSTROM e JACKSON, 2013, p. 17; LITHGOW et al., 2013, p. 214; MEIRELES, 2014, p. 318-322; GARCIA-LOZANO e PINTÓ, 2018, p. 519). As funções ambientais, entretanto, não são as mesmas para todas as dunas, bem como as dunas não são todas iguais. Tal situação, por conseguinte, pode trazer problemas de interpretação e de gestão, sobretudo quando as dunas estão incluídas em legislação ambiental.

É necessário, portanto, dotar a gestão pública, responsável pela administração urbana e das faixas litorâneas, de instrumentos que permitam decidir sobre o tipo de uso/ocupação a que se destinam esses espaços, garantindo a sustentabilidade das funções ambientais das dunas e o uso adequado desses espaços.

Este estudo visa demonstrar que as dunas podem ser diferenciadas a partir do valor de relevância das suas funções ambientais, defendendo a hipótese que as funções ambientais desempenhadas pelas dunas podem ser qualificadas, quantificadas e hierarquizadas de forma a orientar e disciplinar a tomada de decisão sobre os tipos de usos e ocupações permitidos e adequados para essas feições.

O objetivo geral do trabalho é propor um sistema de classificação de dunas que leve em consideração o valor de relevância de suas funções ambientais com a finalidade de planejamento, gestão e tomada de decisão, tendo como elementos de análise e experimentação as dunas do município de Natal/RN situadas fora das ZPA.

Os objetivos específicos são:

1 – Identificar as funções ambientais desempenhadas pelas dunas.

2 – Estabelecer uma metodologia de classificação das dunas segundo suas funções ambientais.

3 – Avaliar o status de conservação de dunas do município de Natal.

4 – Verificar a existência de relação entre o status de conservação e as funções ambientais.

O trabalho aqui apresentado seguiu o caminho da discussão internacional sobre a temática dos serviços ecossistêmicos/funções ambientais, realizando uma revisão e discussão teórica/metodológica a partir de uma aplicação prática.

(19)

O estudo empírico foi realizado no município de Natal, Rio Grande do Norte, Brasil. Tendo como área de estudo 57 dunas, sendo 53 identificadas pela Resolução CONPLAM nº 001/2018 e outras quatro identificadas por este estudo, situadas no limite com o Oceano.

A pesquisa desenvolvida foi norteada pela premissa de que o conhecimento das dinâmicas e das interações naturais-sociais é importante para auxiliar a tomada de decisão e o planejamento da cidade, devendo priorizar o benefício social mais amplo e duradouro, pois, pessoas melhor informadas tomam melhores decisões e o meio ambiente é melhor protegido (DAILY et al., 2009, p. 22, 23 e 26).

(20)

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. Análise Geográfica Integrada

O trabalho está pautado no conceito de sistema, tendo em vista a complexidade da temática e as vantagens que o conceito apresenta para a análise. Ao dividir o todo em componentes menores a observação dos elementos e a visualização de suas interações é facilitada, no entanto, não se pode perder de vista a totalidade (complexa, única e organizada), pois existem qualidades próprias ao sistema que se somam àquelas inerentes aos elementos que o formam (BERTALANFFY, 1975; CHRISTOFOLETTI, 1999; RODRIGUEZ et al, 2007).

Objetivando entender e analisar as relações existentes entre os diversos componentes da natureza, pesquisadores como Dokuchaev, Troll, Sotchava, Bertrand e Tricart desenvolveram teorias integradoras, propondo uma visão holística das relações existentes no ambiente. Os autores citados, dentre outros, contribuíram para o desenvolvimento do conceito de geossistema que se transformou em uma abordagem largamente utilizada na Geografia Física.

Um dos primeiros trabalhos relacionados as teorias integradoras discutido no Brasil foi o artigo de Georges Bertrand de 1968, Paysage et Geographie Physique globale. Esquisse méthodologique. Neste trabalho, Bertrand propõe um sistema de classificação que comporta seis níveis temporo-espaciais (zona, domínio, região natural, geossistema, geofácies e geótopo), ou seja, o geossistema era considerado uma unidade taxocorológica ou uma unidade de paisagem.

Sobre este artigo, o próprio Bertrand comenta (BERTRAND e BERTRAND, 2009 p. 31):

Entre 1964 e 1966, preparamos, a partir de uma série de seminários o artigo “Paisagem e geografia física global”, publicado tardiamente (1968)... Nós o consideramos como o mais fundador de nossa tentativa, no entanto, ele foi recusado pelo comitê de redação dos Annales de Geógraphie pelo motivo que o método proposto era muito complicado e não suficientemente geográfico. Fracasso disciplinar. Pelo contrário, estas proposições foram bem acolhidas nas outras disciplinas, tanto ao lado das ciências da natureza como das ciências sociais. O artigo foi traduzido em muitas línguas.

Alguns anos após a publicação deste material, em um artigo escrito em parceria com o geógrafo russo Nicolas Berutchachvili, Georges Bertrand muda seu ponto de vista e reconhece o geossistema não como uma unidade taxocorológica, mas como uma abstração e um conceito. Por meio de uma nota de rodapé, G. Bertrand diz: “Em um esforço de uniformização conceitual e de simplificação da linguagem, nós nos reunimos com o CIMA para uma definição mais lógica, como a de V. B. Shochava, que faz do geossistema, como o ecossistema, uma abstração

(21)

e um conceito.” (BERTRAND e BERUTCHACHVILI, 1978, apud BERTRAND e BERTRAND, 2009, p. 90/91).

Bertrand e Berutchachvili dizem que o conceito de geossistema foi utilizado pela primeira vez por V. B. Sotchava em 1960 e o definem como “um ‘sistema geográfico natural homogêneo associado a um território’. Ele se caracteriza por uma morfologia, isto é, pelas estruturas espaciais verticais (os gehorizontes) e horizontais (os geofácies)”, sendo o geossistema “um conceito territorial, uma unidade espacial bem delimitada e analisada a uma dada escala” (BERTRAND e BERTRAND, 2009, p. 93).

Nos anos 1960 Sotchava definiu de forma mais precisa os conceitos de modelo e sistema dentro da Ciência da Paisagem e, em 1963, definiu o conceito de geossistema (BOLÓS, 1992, p. 18).

Sotchava (1977, p. 141) defende que a principal concepção do geossistema é a conexão da natureza com a sociedade, pois “embora os geossistemas sejam fenômenos naturais, todos os fatores econômicos e sociais, influenciando sua estrutura e peculiaridades espaciais, são tomados em consideração durante o seu estudo”.

Complementando a ideia exposta pelos autores acima, Monteiro (1978 apud CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 43), diz que o geossistema constitui um “sistema singular, complexo, onde interagem os elementos humanos, físicos, químicos e biológicos, e onde os elementos socioeconômicos não constituem um sistema antagônico e oponente, mas sim estão incluídos no funcionamento do sistema”.

Na mesma linha de raciocínio Christofoletti (1999, p. 43) diz que “nos geossistemas, os produtos do sistema socioeconômico entram como inputs e interferem nos processos e fluxos de matéria e energia, repercutindo inclusive nas respostas da estruturação espacial do geossistema”.

A mudança conceitual do geossistema para Bertrand o levou a ampliar e aplicar o conceito de paisagem proposto no artigo de 1968 ao geossistema, como veremos nas citações abaixo.

A paisagem não é a simples adição de elementos geográficos disparatados. É, em uma determinada porção do espaço, o resultado da combinação dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, fazem da paisagem um conjunto único e indissociável, em perpétua evolução (BERTRAND, 1968, p. 250).

O geossistema é o conceito central e centralizador da Geografia Física “integrada”. É uma porção de espaço, homogênea na escala considerada, que se caracteriza por uma combinação dinâmica, portanto instável, entre elementos abióticos (rocha, água, ar), elementos bióticos (vegetais, animais) e elementos antrópicos (impacto das sociedades). Reagindo uns sobre os outros, estes diversos elementos fazem do

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geossistema um “sistema geográfico” indissociável que evolui em bloco (BERTRAND e BERTRAND, 2009, p. 141).

O reconhecimento do geossistema como conceito ou abstração e não como uma unidade taxocorológica nos permite concebê-lo em diferentes escalas e com diferentes áreas territoriais, como confirma Bertrand na citação acima.

O geossistema, como o ecossistema, é um modelo e um conceito teórico aplicável a qualquer paisagem, de qualquer tamanho (BOLÓS, 1992, p. 18). A paisagem deve ser entendida como um sistema, cujo sistema modelo é o geossistema, enquanto que o ecossistema é o sistema modelo da parte biótica do geossistema (BOLÓS, 1992, p. 47).

Christofoletti (1999, p. 42) propôs um esquema para a diferenciação entre o geossistema – aspectos integrados dos elementos naturais numa dinâmica espacial, e o ecossistema – dinâmica biológica (Figura 01).

Figura 01 – Esquemas estruturais de geossistema e ecossistema. C = clima; A = água; R = relevo; B = biosfera; S = sociedade; PL = pedosfera/litosfera.

Fonte: Adaptado de Christofoletti, 1999, p. 42.

Um breve esclarecimento se faz necessário, em um tópico mais adiante o assunto será tratado de maneira mais completa. Alguns autores utilizam as adjetivações ecossistêmico e ambiental, bem como outros termos, de maneira sinônima ou sem considerar os conceitos de maneira adequada. Nas citações a seguir, para preservar a ideia do autor, foi mantido o termo original, apesar de defendermos que o termo ambiental é o mais adequado por abranger conceitualmente os aspectos bióticos e abióticos, de maneira que os aspectos ecossistêmicos estão englobados no termo ambiental, mas o contrário é passível de questionamento. Assim, quando uma citação se referir a funções ou serviços ecossistêmicos, defendemos a aplicação da mesma às funções ou serviços ambientais.

Considerando essa visão integradora, vários autores defendem que a geografia possui as condições necessárias para realizar a análise biofísica das funções, serviços e bens fornecidos pelos ecossistemas, pelo ambiente, pela natureza, por ser uma análise espacial, ou seja,

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geográfica (BOYD, 2008; POTSCHIN e HAINES-YOUNG, 2011; KOZAK et al., 2011; GRAY et al., 2013). A Geografia possui conceitos e abordagens essenciais para a discussão das funções ecossistêmicas/ambientais e seu rebatimento no planejamento e desenvolvimento social e territorial.

Para Boyd (2008, p. 11), o estudo dos serviços ecossistêmicos envolve duas missões e a Geografia é essencial em ambas:

The first is a biophysical one associated with ecology, hydrology, and the other natural sciences. How can we protect—or, ideally, enhance— the biophysical goods and services necessary to our wellbeing? If we want clean air and water, healthy and abundant species populations, pollination, irrigation, protection from floods and fires, how can we take action to preserve these things? The second is an economic mission to measure and communicate the value of those goods and services. Quantitative measures help justify interventions to protect natural resources and systems. They also spur government and other decisionmakers to take ecological gains and losses into account2 (BOYD, 2008, p. 11).

O uso da terra e sua gestão influenciam as propriedades, processos e componentes dos sistemas naturais e, consequentemente, as funções por ele fornecidos. Por esse motivo, as decisões a respeito das substituições envolvidas na cobertura da terra e nas mudanças do seu uso devem ser pautadas nas relações entre a gestão do ecossistema e os serviços e valores por ele gerados (DE GROOT et al, 2010, p. 264).

A decisão de ocupar ou não um lugar, bem como as localizações mais adequadas para as variadas atividades, deve ser tomada com base em critérios que considerem as relações funcionais na matriz biofísica, ou seja, os elementos bióticos e abióticos que a área possui, as características fundamentais para sua própria manutenção e para a sustentabilidade do território (TARDIN, 2008, p. 189).

Apesar do reconhecimento crescente de sua importância, os serviços ecossistêmicos, frequentemente são subvalorizados no planejamento do uso da terra e na tomada de decisão, priorizando lucros econômicos imediatos para poucos em troca de custos do bem estar de muitos a longo prazo (DE GROOT et al., 2010, p. 265; SUMMERS et al., 2012, p. 328). Um dos motivos que explica essa negligência pode ser o fato de um indivíduo ou grupo se beneficiar do fornecimento de um bem ou serviço que é pago por outro(s), conceito denominado como “free-rider” por Landell-Mills e Porras (2002, p. 221).

2 Tradução nossa: “A primeira é biofísica e está associada à ecologia, hidrologia e outras ciências naturais. Como

podemos proteger – ou, idealmente, aumentar – os bens e serviços biofísicos necessários para o nosso bem estar? Se queremos água e ar puros, abundantes e saudáveis populações de espécies, polinização, irrigação, proteção para enchentes e incêndios, como podemos agir para preserver essas coisas? A segunda é uma missão econômica de medir e comunicar o valor dos bens e serviços. Medidas quantitativas ajudam a justificar intervenções para proteger recursos e sistemas naturais. Eles também incentivam os governantes e os tomadores de decisão a considerar as perdas e os ganhos ecológicos.”

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A ideia de “free-rider” também é discutida por Everard et al. (2010, p. 484) que dizem que muitos dos serviços ecossistêmicos não estão sujeitos ao mercado, de maneira que os beneficiários podem nem estar conscientes do seu ganho com a existência de uma função, pois muitas vezes são bens públicos ou de uso comum, assim, a comunidade como um todo não tem como apreciar a perda.

Outro aspecto que explica a desconsideração à importância dos serviços ecossistêmicos na tomada de decisão é o fato de que muitas decisões sobre educação, moradia, saúde e segurança são vistas como não relacionadas ao meio ambiente e o papel dos serviços ecossistêmicos acaba sendo ignorado (SUMMERS et al., 2012, p. 332). Tal falha pode resultar em consequências prejudiciais não intencionais durante o processo de tomada de decisão. O uso dos serviços ecossistêmicos, portanto, deve objetivar minimizar a incerteza das consequências não intencionais e saber como as ações afetarão outros seres (SUMMERS et al., 2012, p. 336).

Uma declaração que resume a importância das dunas é encontrada em Martínez et al. (2004, p. 355): “Coastal dunes are highly valuable multifunctional ecosystems that occupy a unique natural niche”3. As dunas desempenham muitas funções ambientais que resultam em

benefícios às populações humanas: defesa costeira, captação de água, agricultura, mineração, moradia, turismo, recarga de água subterrânea, proteção à intrusão da cunha salina (MARTÍNEZ et al., 2004, p. 05).

Desenvolver estratégias para o gerenciamento das dunas envolve a identificação e a avaliação sistemáticas dos diversos serviços ecossistêmicos/funções ambientais fornecidos pelas dunas, bem como uma avaliação do corrente status de degradação, ambas consideradas as bases científicas que devem ser apresentadas aos gestores públicos como úteis na definição de prioridades para ações e intervenções nesses ambientes (NEHREN et al., 2016, p. 402 e 404).

2.2. Terminologia e Definições

O entendimento de que a sociedade humana se beneficia de maneiras diversas da natureza, do ambiente e dos ecossistemas não é novo e pode ser verificado ao longo de milênios. George Perkins Marsh já destacava no século XIX que os insetos “render an important service

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to man by consuming dead and decaying animal and vegetable matter, the decomposition of which would otherwise fill the air with effluvia noxious to health”4 (MARSH, 1867, p. 107).

Vários termos foram utilizados nos trabalhos pioneiros para descrever essa mesma ideia: “environmental services” (WILSON e MATTHEWS, 1970 apud SCHÖßER et al., 2010, p. 161), “public services of the global ecosystem” (EHRLICH, EHRLICH e HOLDREN 1977, p. 621), “nature’s services” (HOLDREN e EHRLICH, 1974, p. 282; WESTMAN, 1977, p. 960) “ecosystem services” (EHRLICH e EHRLICH, 1981, p. 26).

O conceito moderno surgiu na década de 1970 como “environmental services”, renomeado na década de 1980 para “ecosystem services” e ganhou maior impulso a partir do final da década de 1990 com a publicação de muitos trabalhos por vários autores importantes (LELE et al., 2013, p. 343). Esses serviços envolvem a regulação climática, fornecimento de água potável, produção de alimentos, fornecimento de matéria-prima, polinização, controle da erosão, recreação, dentre outros.

A intenção inicial do conceito de serviços ecossistêmicos era ser uma ferramenta de comunicação e educação para dar suporte aos esforços da conservação da diversidade biológica, no entanto, o foco mudou para o papel desempenhado pelas espécies e ecossistemas de assegurar nossos meios de subsistência e tem se mostrado muito promissor em atrair a atenção da sociedade em geral para a biodiversidade (MONONEN et al., 2016, p. 27).Os trabalhos de Costanza et al. (1997) e Daily (1997) podem ser considerados marcos na pesquisa sobre “ecosystem services”, pois contribuíram para uma discussão global sobre o tema (BURKHARD et al., 2009, p. 02; SCHÖßER et al., 2010, p. 161 e 162). Nos últimos anos, a temática dos serviços ecossistêmicos recebeu atenção crescente de pesquisadores ao redor do mundo, pois passou a ter a ONU como instituição aliada na divulgação e produção, a partir da Millenium Ecosystem Assessment (MEA), repercutindo em um aumento exponencial das publicações sobre o assunto (DE GROOT et al., 2002, p. 393; TERMORSHUIZEN e OPDAM, 2009.p. 1042; KIENAST et al., 2009, p. 1100; POTSCHIN e HAINES-YOUNG, 2011, p. 579; ANDRADE et al., 2012, p. 706). Apesar da ampla literatura sobre as funções, bens e serviços do ecossistema, há falta de consenso sobre a definição e tipologia e, considerando a complexidade das interações homem-meio ambiente, é provável que nunca haverá (DE GROOT e HEIN, 2007, p. 17). A base conceitual segue não pacificada, havendo muita discussão sobre a melhor forma de distinguir entre funções e serviços do ecossistema e como classificar os serviços de maneira quantificável e consistente (DE GROOT et al., 2010, p. 261;

4 Tradução nossa: “prestam um serviço importante ao homem consumindo matérias animais e vegetais mortas e

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BASTIAN et al., 2012, p. 9). De maneira que a natureza abrangente do conceito e a falta de tipologias concretas têm sido um desafio na transformação do conceito serviços ecossistêmicos em uma ferramenta prática na formulação de políticas (MONONEN et al., 2016, p. 27). A operacionalização do conceito ainda engatinha, tendo como maior desafio a seleção de indicadores cientificamente defensáveis, politicamente relevantes e largamente aceitos (HEINK et al., 2016, p. 18).

Foram propostas várias maneiras de classificar os serviços ecossistêmicos, entre as quais destacamos:

- Costanza et al. (1997) – agruparam os serviços ecossistêmicos em 17 categorias gerais e estimaram o valor econômico desses serviços para 16 biomas em um valor médio anual de US$ 33 trilhões de dólares, quase o dobro do Produto Interno Bruto Global (US$ 18 trilhões por ano), destacando a relevância dos serviços ecossistêmicos (COSTANZA et al., 1997, p. 253 e 254);

- Millenium Ecosystem Assessment (MA ou MEA) – em 2000, o Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, fez uma convocação com o objetivo de avaliar as consequências das mudanças nos ecossistemas para o bem-estar humano e a base científica necessária para melhorar a conservação e uso sustentável desses sistemas e sua contribuição para o bem-estar humano. O estudo envolveu mais de 1.360 especialistas em todo o mundo e distribuiu os serviços ecossistêmicos em quatro categorias: “provisão”, “regulação”, “suporte” e “cultural” (http://www.millenniumassessment.org/en/About.html#1, acesso em 21 fev 2018; MEA, 2003, p. 25);

- The Economics of Ecosystems and Biodiversity (TEEB) – em 2007, os ministros de meio ambiente dos países do G8 + 5 concordaram em analisar o benefício econômico global da diversidade biológica, os custos da perda da biodiversidade e da falta de medidas de proteção em relação aos custos de conservação efetiva. A iniciativa identificou e definiu 17 serviços ecossistêmicos que foram agrupados em quatro categorias: provisão, regulação, habitat ou suporte, e culturais (TEEB, 2010, p. 3 e 33);

- Common International Classification of Ecosystems Services (CICES) – desenvolvida pela European Environment Agency (EEA) com o objetivo de ser uma classificação internacional comum para auxiliar a medir, contar e avaliar os serviços ecossistêmicos. A CICES utilizou como ponto de partida a tipologia do MEA e focou na identificação dos ‘serviços finais’, em uma estrutura hierárquica

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(seção, divisão, grupo, classe, tipo de classe) passível de acomodar diferentes temáticas e escalas espaciais. A CICES agrupou os serviços ecossistêmicos em três seções: provisão, regulação e manutenção, e cultural. Atualmente a CICES está na versão 5.1 e tem sido largamente utilizada em pesquisas sobre serviços ecossistêmicos para projetar indicadores, mapeamento e avaliação (http://cices.eu/, acesso em 21 fev 2018; HAINES-YOUNG, 2018, p. iii, 1 e 9). Um pluralismo de tipologias é importante, podendo ser útil para diferentes propósitos, assim, não devemos buscar uma única maneira de classificar os serviços ecossistêmicos (ENGLUND et al., 2017, p. 496). Em contrapartida, a coexistência de diferentes termos e definições pode impedir o uso do conceito (ENGLUND et al., 2017, p. 496), contudo, o avanço da CICES poderá ajudar a harmonizar a terminologia e fazer os estudos mais consistentes e comparáveis (ENGLUND et al., 2017, p. 496).

Na tentativa de evitar interpretações equivocadas quanto aos termos, De Groot et al. (2010, p. 261-262) apresentaram a chamada “cascata” (Figura 02) para diferenciar estrutura e processos biofísicos, funções, serviços, benefícios e valores, e não escondem que, embora a proposta geral dessa “cascata” seja aceita, a distinção entre função, serviço e benefício ainda está em debate. Os autores justificam o modelo em cascata explicando que as estruturas e processos biofísicos, chamados “serviços de suporte”, geram as funções ecossistêmicas, que por sua vez geram os serviços ecossistêmicos, assim, as funções ecossistêmicas são intermediárias entre os processos e serviços ecossistêmicos e podem ser definidas como a “capacity of ecosystems to provide goods and services that satisfy human needs, directly and indirectly”5 e o uso atual dos bens e serviços fornecem benefícios (nutrição, saúde, prazer, etc.)

que podem ser valorados em termos econômicos e monetários.

5 Tradução nossa: “capacidade dos ecossistemas fornecerem bens e serviços que satisfaçam as necessidades

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Figura 02 – Estrutura para ligar ecossistemas ao bem-estar humano.

Fonte: Extraído de De Groot, 2010, p. 264.

Os componentes físicos, biológicos e químicos do ecossistema (solos, água, plantas, espécies animais, nutrientes, etc.) interagem entre eles e dentro deles próprios, permitindo que o ecossistema execute determinadas funções, estas, por sua vez, determinam a capacidade do sistema para fornecer serviços e benefícios aos usuários humanos (HAINES-YOUNG e POTSCHIN 2010, p. 7). É essencial distinguir entre funções e serviços e considerar que a capacidade de prestar um serviço independe de alguém querer ou precisar, essa capacidade só se torna um serviço quando algum beneficiário pode ser claramente identificado (HAINES-YOUNG e POTSCHIN 2010, op. cit.). Outra observação é sobre o problema da dupla contagem, que pode ser evitado através de uma clara distinção entre os fenômenos ecológicos (funções), a contribuição direta e indireta para o bem-estar humano (serviços) e os ganhos de bem-estar que eles geram (benefícios) (HAINES-YOUNG e POTSCHIN 2010, p. 8).

Diversos autores discutem os problemas relacionados à definição exata de serviços ecossistêmicos, mas apesar disso, muitos concordam que existe algum tipo de caminho para a prestação desses serviços, onde em uma extremidade estão as estruturas e processos ecológicos e na outra o bem-estar das pessoas (POTSCHIN e HAINES-YOUNG, 2016, p. 26). Os autores (op. cit.), assim como De Groot (2010, p. 264), representam essa “linha de produção” como uma cascata (Figura 03), cujo objetivo é destacar mais claramente a diferença entre os pontos finais e os passos entre eles.

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Figura 03 – O modelo cascata.

Fonte: Extraído de Potschin e Haines-Young, 2016, p. 26.

A estrutura conceitual da cascata serve para vários propósitos tais como: uma ferramenta de comunicação, um ponto de partida para discussão entre especialistas e leigos; uma forma de mapear conceitos básicos; uma maneira de identificar os tipos de evidências considerados relevantes; e colocar o trabalho em uma base analítica mais forte (POTSCHIN e HAINES-YOUNG, 2016, p. 26). Os autores (op. cit.) sugerem que o modelo cascata pode ajudar a pensar sobre as relações entre os cinco conjuntos de ideias chave que definem o paradigma dos serviços ecossistêmicos: processo ou estrutura biofísica, função, serviço, benefício e valor. As funções são definidas como “um subconjunto de características ou comportamentos do ecossistema que determina ou ‘sustenta’ a sua utilidade para as pessoas” (POTSCHIN e HAINES-YOUNG, 2016, p. 26).

Apesar da proposição do modelo cascata como tentativa de esclarecimento e diferenciação dos termos e conceitos, muitas questões ainda são levantadas, como demonstrado a seguir:

- BOYD e BANZHAF (2007, p. 622) sugerem a existência de uma confusão entre os termos “serviço” e “função”, exemplificada com a purificação de água, classificada por alguns autores como serviço, mas que eles denominam como função, pois a purificação é uma função de alguns tipos de cobertura de terra que ajudam a produzir água limpa. Para eles, “a água limpa - em horários e locais específicos - é o serviço e é valorizada por suas conexões com a saúde, recreação e assim por diante”;

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- LELE (2013, p. 345) verifica uma tendência na literatura de confundir os processos internos dos ecossistemas com as funções e os serviços por eles desempenhados, resultando no problema da dupla contagem;

- POTSCHIN e HAINES-YOUNG (2016, p. 27) informam que alguns autores acreditam que o termo ‘função’ é problemático, especialmente em ecologia, e deve ser evitado, no entanto, o termo pode ser especialmente útil para fins de gestão dessas propriedades, mas é necessária clareza sobre as capacidades (propriedades, comportamentos) que os tornam úteis para as pessoas; a sugestão dada é identificá-los como características "funcionais", portanto, um estágio necessário para entender como os ecossistemas e as pessoas estão ligados; - Para MONONEN et al. (2016, p. 30) a função tem a ver com o funcionamento do ecossistema que é necessário para produzir serviços ecossistêmicos;

- Para LA NOTTE et al. (2017) o termo função é geralmente usado indiferentemente entre processo ecológico e/ou serviço ecossistêmico (p. 393). Consideram função como sinônimo de processos biofísicos dinâmicos (p. 397), propõem que as funções ecossistêmicas não são serviços, mas processos ecológicos e que as funções devem ser mantidas para assegurar um fluxo sustentável de serviços (p. 401).

Em um artigo publicado para avaliar os vinte anos de desenvolvimento do conceito de serviços ecossistêmicos, Costanza, De Groot e outros pesquisadores, criticam o modelo cascata, argumentando que é “at the same time an oversimplification of a complex reality and an unnecessary complication of what is essentially a very straightforward definition”6

(COSTANZA et al., 2017, p. 5). Os autores (op. cit.) questionam a existência de diferença entre serviço e benefício, criticam que a complexidade das conexões são mal representadas no modelo linear da cascata, propõem uma representação que julgam ser melhor, por reconhecer serviços e benefícios, por definição, como iguais e que complexas interações e feedbacks entre o capital construído, humano, social e natural, são necessários a fim de produzir serviços ecossistêmicos. O modelo foi intitulado “beyond the cascade” (além da cascata) (Figura 04) e é definido como

a dynamic system capturing the complex interactions needed to produce ecosystem services at the regional scale, driven by the flows of energy, matter, and information through the system. All depictions of these complex interactions are, of course,

6 Tradução nossa: “ao mesmo tempo uma simplificação excessiva de uma realidade complexa e uma

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oversimplifications, but this diagram recognizes some of that complexity7

(COSTANZA et al., 2017, p. 6).

Figura 04 – Além da cascata.

Fonte: Extraído de Costanza et al., 2017, p. 6.

A ideia geral dos autores consultados é a de que o conceito de serviços ecossistêmicos é inerentemente antropocêntrico, pois os serviços surgem quando as funções ecossistêmicas: são valoradas pelos humanos (DE GROOT et al., 2002, p. 395; TERMORSHUIZEN e OPDAM, 2009, p. 1041); são úteis aos humanos (KREMEN, 2005, p. 468); beneficiam os humanos (MEA, 2003, p. 211; FISCHER et al., 2009, p. 645; MURADIAN et al., 2010, p. 1202; TEEB, 2010, p. 33); produzem uma mudança no bem-estar humano (LA NOTTE et al., 2017, p. 397).

É fato que nos beneficiamos da natureza, do ambiente, da paisagem, do ecossistema e que, independente do termo ou definição adotados, estes são essenciais para a manutenção do nosso bem-estar. É importante ressalvar que não devemos considerar a natureza como uma fornecedora de serviços aos seres humanos, no sentido de moldá-la como um agente ativo e proposital (LELE, 2013, p. 345). Do mesmo modo não podemos pensar os elementos da natureza apenas como recursos, pois os bens e elementos naturais possuem uma dinâmica própria e independente da apropriação social e desempenham um papel fundamental na estruturação do espaço geográfico (MENDONÇA, 2002, p. 138 e 139).

7 Tradução nossa: “um sistema dinâmico que captura as complexas interações necessárias para produzir serviços

ecossistêmicos na escala regional, impulsionados pelos fluxos de energia, matéria e informação através do sistema. Todas as representações dessas interações complexas são, obviamente, super simplificações, mas esse diagrama reconhece parte dessa complexidade”.

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2.2.1. Adjetivação do Termo

Antes da apresentação e discussão das definições é necessário chamar atenção para o fato de vários autores utilizarem de forma sinônima os termos ecossistema e meio ambiente (ou apenas ambiente, MENDONÇA, 2002, p. 125). Essa distinção se faz necessária, pois há diferenças conceituais (PARRON et al., 2015, p. 30 e 31), como será discutido a seguir.

A palavra “ecology” foi utilizada pela primeira vez em 1869 por Ernest Haeckel, biólogo alemão (BEGON, 2006, p. xi). Begon (op. cit.), parafraseando Haeckel, descreve a ecologia como “the scientific study of the interactions between organisms and their environment”8 e propõe que “the environment of an organism consists of all those factors and

phenomena outside the organism that influence it, whether these are physical and chemical (abiotic) or other organisms (biotic)”9. Assim, o foco da ecologia são os seres vivos, pois seu

objeto de estudo são os ecossistemas e esses não existem sem a presença dos seres vivos (CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 35 e 36).

A conceituação do ecossistema o reconhece como “unidade funcional” entre comunidade biológica e ambiente abiótico, na qual o funcionamento e características dependem da cadeia alimentar e do nicho ecológico, como verificado nas definições abaixo.

a dynamic complex of plant, animal, and microorganism communities and the nonliving environment interacting as a functional unit. Humans are an integral part of ecosystems. Ecosystems vary enormously in size; a temporary pond in a tree hollow and an ocean basin can both be ecosystems10 (MEA 2003, p. 3 e 210).

é a unidade funcional básica, uma vez que inclui tanto organismos (comunidade bióticas) como o ambiente abiótico, cada um deles influenciando as propriedades do outro, sendo ambos necessários para a conservação da vida tal como existe na Terra. (ODUM, 2004, p. 12).

the biological community together with the abiotic environment in which it is set. Thus, ecosystems normally include primary producers, decomposers and detritivores, a pool of dead organic matter, herbivores, carnivores and parasites plus the physicochemical environment that provides the living conditions and acts both as a source and a sink for energy and matter11 (BEGON, 2006, p. 499).

O termo meio ambiente foi utilizado pela primeira vez em 1909 (“umwelt”), pelo biólogo e pioneiro da ecologia do Báltico, Jakob von Uexküll (CANALI, 2002, p. 165). Inicialmente, meio era entendido como sinônimo de natural e o homem era visto como externo

8 Tradução nossa: “o estudo científico das interações entre organismos e seu meio ambiente”.

9 Tradução nossa: “o ambiente de um organismo consiste em todos aqueles fatores e fenômenos fora do organismo

que o influenciam, sejam eles físicos e químicos (abióticos) ou outros organismos (bióticos)”.

10 Tradução nossa: “um complexo dinâmico de plantas, animais, comunidades de microrganismos e ambiente

abiótico interagindo como um unidade funcional, sendo os humanos uma parte integral dos ecossistemas

11 Tradução nossa: “a comunidade biológica juntamente com o ambiente abiótico no qual está configurada. Assim,

os ecossistemas normalmente incluem produtores primários, decompositores e detritívoros, um conjunto de matéria orgânica morta, herbívoros, carnívoros e parasitas mais o ambiente físico-químico que fornece as condições de vida e atua tanto como uma fonte como um ralo de energia e matéria”.

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a ele, externo à natureza, contudo, a partir de um envolvimento crescente das atividades humanas, essa compreensão foi mudando, apesar de a concepção naturalista ainda permanecer forte (SUERTEGARAY, 2002, p. 116; MENDONÇA, 2002, p. 124). O ambiente passou a ser visto como o “homem/sociedade e seu entorno” (SUERTEGARAY, 2002, p. 116).

O homem não só está envolvido pelos “objetos e ações”, mas envolve-se com eles, numa integração conflitiva [...] E, na perspectiva da geografia, retoma-se um pensamento conjuntivo, onde meio ambiente vai sendo pensado como ambiente por inteiro, na medida em que em sua análise exige compreensão das práticas sociais, das ideologias e das culturas envolvidas (SUERTEGARAY, 2002, p. 116 e 117).

A definição para meio ambiente proposta pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA, incorporou essa ideia de “ambiente por inteiro” e concebe o homem como um fator/elemento: “conjunto de condições, leis, influência e interações de ordem física, química, biológica, social, cultural e urbanística, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (Resolução CONAMA nº 306/2002).

Destacando a relevância antropogenética e a inter-relação entre os sistemas “naturais” e socioeconômicos, o meio ambiente é “constituído pelos sistemas que interferem e condicionam as atividades sociais e econômicas, isto é, pelas organizações espaciais dos elementos físicos e biogeográficos (da natureza)” (CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 36).

Apesar da evolução do conceito, o substantivo ambiente e o adjetivo ambiental são empregados de forma generalizada e ampla, gerando incoerências e erros grosseiros (CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 36 e 37). O adjetivo ambiental deve ser utilizado para “categorizar os componentes e as características funcionais e dinâmicas dos sistemas que suportam a existência dos seres vivos” (CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 37).

A partir da discussão acima é possível concluir que ambiente é um conceito mais adequado do que ecossistema para tratar os objetivos do presetne estudo, pois o ecossistema depende da inter-relação entre fatores bióticos e abióticos, enquanto que ambiente contempla, mas não exige essa inter-relação, contudo, também podendo abarcar essa inter-relação, por ser um todo funcional e dinâmico. Conceito esse que foi adotado pelo presente trabalho.

Muitos são os termos e definições associados às contribuições do “ambiente” – paisagem, ecossistema, geossistema, biodiversidade, terra, dentre outros – para o bem-estar da sociedade humana. Em uma pesquisa realizada em livros e artigos científicos que tratam da temática foram encontrados 13 termos (Quadro 01) e 52 definições distintas, que serão discutidos a seguir. Esse levantamento, apesar de não esgotar as referências existentes, serve de parâmetro para analisar o ponto de vista de diversos autores, verificar a adequação dos usos propostos e sugerir possíveis retificações.

(34)

Quadro 01 – Terminologia encontrada na literatura para as funções/serviços fornecidos pelo “ambiente”.

Fonte: Elaborado pelo autor.

2.2.1.1. Funções Ambientais

Quadro 02 – Definições propostas para funções ambientais.

Termo Definições Referências

Fu nç õe s am bi en ta is

“(i. e. natural goods and services) are at least as important to human welfare as man-made goods and services and should, therefore, be

included in economic accounting procedures”12

De Groot (1987, p. 105) “the capacity of natural processes and components to provide goods

and services that contribute to human welfare, directly and indirectly”13

“the capacity of natural processes and components to provide goods and services that satisfy human needs (directly and/or indirectly)"14

De Groot (1994, p. vii e 317)

“possible uses of the natural, biophysical surroundings that are useful for humans. Uses can be either passive or direct and practical. The ‘services’ of environmental functions are defined as their possibilities

or potential to be used by humans for whatever end. Some functions can be conceived as consumption goods, others as capital goods.”15

Hueting (1998, p. 31)

Fonte: Organizado pelo autor.

12 Tradução nossa: “(ou seja, bens e serviços naturais) são pelo menos tão importantes para o bem-estar humano

quanto bens e serviços produzidos pelo homem e, portanto, devem ser incluídos nos procedimentos de contabilidade econômica”.

13 Tradução nossa: “a capacidade dos processos e componentes naturais de fornecer bens e serviços que contribuem

para o bem-estar humano, direta e indiretamente”.

14 Tradução nossa: “a capacidade dos processos e componentes naturais de fornecer bens e serviços que satisfaçam

as necessidades humanas (direta e/ou indiretamente) ".

15 Tradução nossa: “possíveis usos do ambiente natural e biofísico que são úteis para os seres humanos. Os usos

podem ser passivos ou diretos e práticos. Os 'serviços' de funções ambientais são definidos como suas possibilidades ou potencial para serem utilizados pelos seres humanos para qualquer fim. Algumas funções podem ser concebidas como bens de consumo, outras como bens de capital”.

FUNÇÕES

ambientais ecossistêmicas da paisagem geossistêmicas do uso da terra da terra

SERVIÇOS

ambientais ecossistêmicos ecossistêmicos abióticos ecológicos da paisagem geossistêmicos da biodiversidade

(35)

No artigo “Environmental functions as a unifying concept for ecology and economics” publicado por De Groot em 1987, o autor destacou a importância das funções ambientais (bens e serviços naturais) para o bem-estar humano, que devem ser consideradas pelo menos tão importante quanto os bens e serviços feitos pelo homem, o que justificaria serem incluídas nos procedimentos de contabilidade econômica. A proposta do autor é substituir o termo recursos naturais por funções ambientais, justificando que o primeiro é limitado e que as funções ambientais podem fornecer um princípio unificador, integrando a qualidade ambiental e a qualidade de vida (DE GROOT, 1987, p. 105 e 107). O argumento é reforçado pela ideia de que uma visão mais ampla sobre as muitas inter-relações entre o homem e o ambiente natural seria útil para criar mais consciência sobre a contribuição dos ecossistemas naturais e seminaturais para o bem-estar humano (DE GROOT, 1987, p. 108).

Reconhecer que as funções ambientais são “pelo menos tão importantes quanto os bens e serviços feitos pelo homem” é o mínimo, pois, até o momento, para a maioria destas não existe um substituto artificial e podem ser comprometidas irreversivelmente. Além disso, “os sistemas ambientais são os responsáveis pelo fornecimento de matéria e energia dos sistemas socioeconômicos e deles recebem os seus produtos (edificações, insumos, emissões, dejetos, etc)” (CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 36 e 37), ou seja, fornecem os inputs e recebem os outputs dos sistemas socioeconômicos.

A definição de função ambiental proposta por De Groot (1994, p. vii e 317) enquanto capacidade dos processos e componentes naturais fornecerem bens e serviços que contribuam para o bem-estar humano ou que satisfaçam necessidades humanas e a definição proposta por Hueting (1998, p. 31) seguem um caminho semelhante, por considerarem o uso em potencial, os possíveis usos do ambiente biofísico natural úteis aos humanos, de forma direta ou indireta. E permitem um claro entendimento da função enquanto uma capacidade, ou seja, um serviço em potencial, em consonância com a proposta do modelo cascata apresentado anteriormente.

A CICES deixa clara a ênfase na contribuição da biodiversidade para o bem-estar humano, mas reconhece que as características e comportamentos físicos também são importantes e que há uma estreita associação entre os serviços bióticos e abióticos, demonstrando isso na versão 5.1 que passou a apresentar ambos em uma única tabela (HAINES-YOUNG e POTSCHIN, 2018, p. 4 e 6).

O presente estudo optou por não diferenciar a origem das funções (bióticas ou abióticas), pois os objetivos do trabalho não exigem essa especificação, estando ambas abarcadas no termo função ambiental, definido aqui como a capacidade, ou seja, um serviço em potencial, do ambiente contribuir de maneira direta ou indireta para o bem-estar humano.

(36)

2.2.1.2. Serviços Ambientais

Quadro 03 – Definições propostas para serviços ambientais.

Termo Definições Referências

Se rv iç os A m bi en ta is

“des services rendus par la nature à l’homme, non produits par

celui-ci.”16 Aznar (2002, p. 29)

“a measurable, end-use product of ecosystem processes, such as drinking water quality, bird population levels, or acres of open space

in a metropolitan area”17

Smith (2006, p. 1167) “is a term widely commonly used in the engineering profession to refer

to the professional services that engineers provide to mitigate environmental damage”18

“However, in this paper we ascribe to the environmental economist’s concept of environmental service as a positive benefit that people obtain from the environment. That is, an environmental service is generated when an economic activity in one place, controlled by one economic agent, has positive spillover effects on other consumers or

producers, often in other places.”19

Swallow et al. (2007, p. 27)

“...may be purely abiotic in origin such as minerals extracted from the

ecosystem.”20 Brown et al. (2011, p. 6)

“as atividades antrópicas (práticas conservacionistas, de manejo e mudanças no uso da terra, por exemplo) com potencial para aumentar

a oferta de serviços ecossistêmicos”

Simões e Andrade (2013, p. 77) “O bem-estar da sociedade depende significantemente dos serviços

ambientais fornecidos pela natureza, que incluem a regulação do clima na Terra, a formação dos solos, o controle contra erosão, o armazenamento de carbono, a ciclagem de nutrientes, o provimento de

recursos hídricos em quantidade e qualidade, a manutenção do ciclo de chuvas, a proteção da biodiversidade, a proteção contra desastres

naturais, elementos culturais, a beleza cênica, a manutenção de recursos genéticos, entre muitos outros.”

“Nesta publicação, optou-se usar a terminologia de serviços ambientais, considerando que eles englobam tanto os serviços proporcionados ao ser humano por ecossistemas naturais (os serviços

ecossistêmicos), quanto os providos por ecossistemas manejados ativamente pelo homem.”

Guedes e Seehusen (2011,

p. 11 e 17)

Fonte: Organizado pelo autor.

16 Tradução nossa: “serviços prestados pela natureza ao homem, não produzidos por ele”.

17 Tradução nossa: “um produto mensurável de uso final dos processos do ecossistema, como qualidade da água

potável, níveis de população de aves ou acres de espaço aberto em uma área metropolitana”.

18 Tradução nossa: “é um termo amplamente usado na profissão de engenheiro para se referir aos serviços

profissionais que os engenheiros prestam para mitigar os danos ambientais”.

19 Tradução nossa: “No entanto, neste artigo, atribuímos ao conceito de serviço ambiental do economista ambiental

como um benefício positivo que as pessoas obtêm do meio ambiente. Ou seja, um serviço ambiental é gerado quando uma atividade econômica em um local, controlada por um agente econômico, produz efeitos colaterais positivos em outros consumidores ou produtores, geralmente em outros locais”.

Referências

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