• Nenhum resultado encontrado

MATÉRIA DE FACTO MERA DETENÇÃO OCUPAÇÃO DE IMÓVEL

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "MATÉRIA DE FACTO MERA DETENÇÃO OCUPAÇÃO DE IMÓVEL"

Copied!
5
0
0

Texto

(1)

Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 05B877

Relator: MOITINHO DE ALMEIDA Sessão: 12 Maio 2005

Número: SJ200505120008772 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: AGRAVO.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

CONCEITO JURÍDICO MATÉRIA DE DIREITO

MATÉRIA DE FACTO MERA DETENÇÃO OCUPAÇÃO DE IMÓVEL

Sumário

I - As expressões « não era arrendatário" e "arrendatário" podem, em certos casos, revestir a natureza de conceitos de facto e, noutros, de direito.

II - A inércia do proprietário, após tomar conhecimento da ocupação, não confere ao ocupante qualquer direito, apenas podendo ser qualificada como mera tolerância.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. A Fundação Dr. A intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra B, pedindo que seja declara legítimo dono do prédio urbano que identifica e a condenação da Ré a reconhecer esse direito bem como a restituir-lhe o andar em causa livre de coisas e de pessoas.

Alegou para o efeito e em substância que é proprietária do imóvel e que a Ré o ocupa sem qualquer título. O andar fora arrendado ao avô da Ré C. Este,

porém, em data imprecisa, foi viver para uma aldeia do concelho de Celorico da Beira e os pais da Ré ocuparam então o andar.

Quando estes adquiriram casa própria, a Ré veio instalar-se nesse andar.

Não só não existe qualquer arrendamento em nome da Ré como , atentos os factos expostos, não pode considerar-se que o arrendamento do avô para ela

(2)

fora transmitido.

A acção foi considerada procedente quanto ao primeiro pedido e improcedente quanto ao segundo.

Por acórdão de 25 de Maio de 2004, a Relação de Coimbra concedeu

provimento ao recurso de apelação interposto pela Autora, considerando que a Ré não é arrendatária do andar em causa e que não se verifica qualquer abuso de direito.

Inconformada, interpôs a Ré recurso de agravo, invocando terem sido indevidamente anulados os quesitos 13° e 14° bem como as respectivas

respostas. Fundou a admissibilidade do recurso no disposto no artigo 754°, n°

2, última parte do Código de Processo Civil, alegando a oposição de julgados.

O recurso foi admitido com fundamento no n°3 do mesmo artigo.

Apresenta a Recorrente as seguintes conclusões:

1. Os termos e expressões "não era arrendatário" e "actual arrendatária era a Ré" inseridos nos quesitos 13 e 14 da Base Instrutória, entraram na linguagem comum e vulgar e passaram a ter significado de facto.

2. Os quesitos 13 e 14 da Base Instrutória exprimem matéria de facto que, por ser controvertida, foi bem seleccionada e levada à Base Instrutória nos termos do n°1 do Art°. 511° do C.P.Civil.

3. Pelas mesmas razões as respostas aos quesitos 13 e 14 não merecem qualquer censura.

4. O Acórdão em recurso do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra está em oposição com o Acórdão da mesma Relação de 08/11/83, cuja certidão foi junta aos Autos, sendo certo que os mesmos foram proferidos no domínio da mesma legislação.

5. Deverão, pois, os Senhores Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça proferir Acórdão que revogue o Acórdão recorrido da Relação de Coimbra mantenha (sic) os quesitos 13 e 14 da Base Instrutória e respectivas respostas e confirme a sentença da 1ª Instância, fixando jurisprudência e interpretando a Lei no sentido exposto.

6. Mesmo sem os quesitos 13 e 14 e respectivas respostas, atendendo à restante matéria provada e não posta em causa pelo Venerando Tribunal, designadamente as respostas aos quesitos 10 e 10 A, é legítimo considerar a

(3)

existência de um verdadeiro contrato de arrendamento do andar em causa celebrado entre a Ré e o então Senhorio Dr. E.

7. Tal arrendamento não permite a restituição do andar à Autora, que também sempre constituiria abuso de direito nos termos do Art°.334° do C. Civil e uma violação do Art°. 65° da C.R.P.

8. O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra violou e interpretou erradamente o disposto no Art.° 1° do R.A.U., Art°. 511°, n°1 do C.P.Civil, Artigos 334° e 1057° do Código Civil e 65°, n°1 da Constituição da República Portuguesa disposições legais que devem ser interpretadas no sentido

exposto.

2. Importa ter em conta os seguintes factos dados como provados:

3. A Autora emitiu o recibo de renda n°3, datado de 7/9/2000, junto a fls. 84-4, onde se lê "recebi do Sr. C a quantia de 2.000$00 pelo arrendamento da casa na Rua da Fraternidade n°18.

4. Os avós da Ré passaram a habitar na Rua do Espírito Santo, na conhecida casa onde morava o padre Isidro, do qual aqueles eram trabalhadores e governantes.

5. O então proprietário, dito Dr. E, e os pais da Ré acordaram na cedência do gozo da casa para os pais da Ré, tendo estes sempre pago a renda em nome de C.

6. A Ré e o marido ainda viveram com os respectivos pais e sogros cerca de um ano na mesma casa, na Guarda..

8. Em 1981, os pais da Ré mudaram a sua residência para o Bairro da Luz.

9. A Ré e o seu ex-marido continuaram a habitar a casa referida em 1) com conhecimento e consentimento do Dr. E.

10. E pagando a respectiva renda mensal, o que faziam em nome de C, passando os então senhorios, Dr. E e irmã, os recibos da renda.

11. O Dr. E e sua irmã conheciam perfeitamente o Sr. C, o SR. D e a mulher e a filha B ora Ré, sendo a casa do Dr. E e irmã frequentada pelos pais da Ré.

Os quesitos em causa estavam assim redigidos:

13° "Ao emitir o recibo descrito em R) a Autora tinha conhecimento que o C não era arrendatário, há cerca de 40 anos?",

14° "E sabendo que a actual arrendatária era a R.?"

3. O acórdão recorrido considerou o quesito 13° em contradição com a matéria de facto provada e designadamente a resposta ao quesito 2° nos termos da qual "C, avô da ré, foi arrendatário desse prédio e há cerca de 39 anos deixou o arrendado, mantendo-se na fracção predial o seu filho F, que

(4)

pagava a renda em nome de seu pai C".

Quanto às expressões "não era arrendatário" e "arrendatária", elas surgem no presente caso como conceitos de direito.

Assim, para se considerar que o avô da Recorrente "não era arrendatário"

"ponto é que se tivesse provado factos subsumíveis a alguma das formas legais de cessação do respectivo arrendamento urbano para habitação, seja

denúncia, resolução, caducidade, revogação por acordo, despejo, seja por outras causas determinadas na lei".

E a consideração da Ré como "arrendatária" envolve, no presente caso, um conceito de direito. Para se chegar a tal conclusão implica verificar se existiu um contrato de arrendamento e em que termos foi concluído, o que constitui o objecto do litígio.

Concorda-se com o assim decidido.

Com efeito, é jurisprudência deste Tribunal que um conceito é de direito quando exprime um juízo derivado de uma norma ou de construção doutrinal;

é de facto quando exprime uma realidade factual, assim percebida pela

generalidade das pessoas. "¨Por outras palavras, estamos perante um conceito jurídico, ou de facto, conforme resulta ele do discurso jurídico, ou do discurso comum. Assim, a mesma expressão pode valer, o que aliás é a regra, como conceito de direito e também como conceito de facto. Só que essas valência não são simultâneas. O seu significado é relativo e depende do contexto discursivo em que se insere" (entre outros, o acórdão de 17 de Fevereiro de 2005, revista n°3859/04).

As expressões "não era arrendatário" e "arrendatário" podem, em certos casos, revestir a natureza de conceitos de facto. Mas, pelas razões invocadas pelo acórdão recorrido não é o que acontece no presente processo.

4. A Recorrente pretende ainda que, mesmo a entender-se que os

mencionados quesitos devam ser dados como não escritos, da restante matéria de facto resulta ter-se provado o arrendamento e, em qualquer caso, a Autora agiria com manifesto abuso de direito.

A este respeito importa observar que ao interpor o presente recurso de

agravo, a Recorrente expressamente o limitou à questão processual relativa à supressão dos dois mencionados quesitos. Mas ainda a admitir-se que

pretendia igualmente discutir o mérito da causa e que, assim, o presente

(5)

recurso devesse ser admitido como revista, não tem razão.

Com efeito, o acórdão recorrido entendeu que o senhorio considerava C como arrendatário, até Setembro de 2000, pois que tomava as rendas como sendo devidas por este, não podendo, assim, concluir-se que considerava ou

reconhecesse outrem como arrendatário. E acrescenta: "Nenhum facto provado inculca, até Setembro de 2000 que a Ré tenha agido perante o

senhorio como titular do direito de gozo do prédio, como arrendatária deste ou que tenha sido reconhecida como tal.

Ora, esta constatação é pura matéria de facto cujo controlo escapa ao Supremo Tribunal de Justiça.

E, no que respeita ao abuso de direito, a Relação citou o acórdão deste Tribunal de 1/1/2000 (revista n°1105-1ª Secção) onde se entendeu que a

inércia do proprietário, após tomar conhecimento da ocupação, não confere ao ocupante qualquer direito, apenas podendo ser qualificada como acção de mera tolerância. Para fazer cessar essa tolerância, o proprietário, ao

reivindicar o direito de propriedade limita-se a exercer o seu direito, sem que isso represente um exercício abusivo do mesmo.

Nestas circunstâncias, que coincidem com a dos presentes autos, não existe qualquer confiança legítima cuja violação se traduza num venire contra factum proprium.

Concorda-se com esta fundamentação.

E também não se vê como o disposto no artigo 65°, n°1 da Constituição imponha uma resposta diferente às questões que a Recorrente suscita.

Nega-se, pois, provimento ao agravo.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 12 de Maio de 2005 Moitinho de Almeida,

Ferreira de Almeida, Abílio Vasconcelos.

Referências

Documentos relacionados

contrato de empreitada, como atrás se demonstra, bem como da prova de que o recorrente não executou as referidas obras em regime de voluntariado, nem em cumprimento do contrato

interposto pelo arguido, declarando verificado, na sentença recorrida, o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e determinando, após o trânsito em

havia liquidado e recebido as quantias referidas de terceiros (clientes), a título de IVA, com obrigação de as entregar nos cofres do Estado, a quem pertenciam, agindo da forma

9. Inconformada com a decisão dela apelou a Autora, impugnando a decisão sobre a matéria de facto, concretamente impugnando essa decisão na parte em que julgou não provado que

III - Deve ser recusado o registo da marca «CONTAL» por risco de confusão com a marca «COMPAL», anteriormente registada, dada a semelhança gráfica e fonética (com relevo para

O incumprimento, pela recorrente, deste ónus de especificação dos concretos meios probatórios que impõem decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da

5.ª E que "o arguido não autorizou expressamente a recolha de sangue para a realização do exame pericial cujo resultado consta do relatório de fls.11”. 6.ª Não tendo

D) O Tribunal a quo deveria ter julgado não provado que “Os interessados informaram a autora que não poderiam comprar o imóvel pelo preço exigido pela ré por não obterem