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FAMIG - FACULDADE MINAS GERAIS JÚLIA RICCI RODRIGUES. SUICÍDIO ASSISTIDO: direito à morte digna

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FAMIG - FACULDADE MINAS GERAIS JÚLIA RICCI RODRIGUES

SUICÍDIO ASSISTIDO: direito à morte digna

Belo Horizonte

2019

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JÚLIA RICCI RODRIGUES

SUICÍDIO ASSISTIDO: direito à morte digna

Monografia apresentada a Famig – Faculdade Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Rosilene da Conceição Queiróz

Belo Horizonte

2019

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JÚLIA RICCI RODRIGUES

SUICÍDIO ASSISTIDO: direito à morte digna

Monografia apresentada a Famig – Faculdade Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________

Prof. Dr. (Nome do Professor) Orientador (Instituição de Origem)

___________________________________________________________________

Prof. Dr. (Nome do Professor) Membro (Instituição de origem)

___________________________________________________________________

Prof. Dr. (Nome do Professor) Membro (Instituição de origem)

Belo Horizonte, xx de julho de 2019

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AGRADECIMENTOS

Se eu fosse agradecer a cada um que contribuiu de forma direta ou indiretamente para este momento final que se aproxima, com certeza esse agradecimento ficaria maior que o próprio texto da monografia rs. Durante esses anos muitas pessoas cruzaram o meu caminho e cada uma me trouxe um aprendizado diferente, sou eternamente grata a tudo que vivi.

Mas... Não posso deixar de tecer alguns agradecimentos em especiais.

Agradeço a Deus, por ter permitido que tudo acontecesse como foi, não só ao longo da minha vida, como também nesses quase 5 anos de faculdade, por ter me dado saúde e força para superar as dificuldades ao longo dessa caminhada.

A minha mãe, pela paciência comigo nos momentos de estresse e ansiedade, por todo amor e carinho, por ter me dado colo, atenção e incentivo nas horas mais difíceis, de desanimo e cansaço. (Love you to the moon and back)

Ao João Paulo, pai que a vida escolheu para mim, pelo amor incondicional e por ter me inspirado através de gestos e palavras.

Aos amigos que fiz durante essa jornada, que conseguiram tornar a graduação um caminho muito mais suave e alegre, os momentos vividos em sala de aula e os extraclasse serão inesquecíveis!!

Aos profissionais da área com quem tive oportunidade de fazer estágio, em especial a Ada, que além dos ensinamentos me motivou a sempre ir além.

Aos professores que acompanharam a minha jornada acadêmica de perto e não somente por terem me ensinado, mas por terem me feito aprender.

A minha orientadora, Rosilene, por ter topado a discussão sobre um tema tão

espinhoso e delicado, pelas suas correções е considerações.

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O meu muito obrigado a todos que torceram e vibram com a minha conquista.

Julia Ricci Rodrigues

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RESUMO

O objetivo geral deste trabalho é verificar se o suicídio assistido nos casos de enfermidade incurável está em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, marco teórico deste estudo, utilizando-se o método de pesquisa dedutivo e análise qualitativa de informações obtidas através de pesquisa bibliográfica e documental. Não há nada mais controverso na sociedade que a origem da vida e o seu fim, sendo assunto tratado como tabu. Para o Estado, atentar contra a vida significa ferir princípios constitucionais e morais. A importância do tema se justifica pela situação em que se encontram os doentes terminais que anseiam pelo fim do sofrimento, refletindo o direito a uma vida digna. Partiu-se da hipótese de que o ser humano tem a sua dignidade garantida durante toda sua vida e assim também deve ser no momento da morte, pois a obrigação de viver nesta situação pode significar um martírio muito maior do que a própria morte, ferindo o seu direito à dignidade e à autonomia. Sendo assim, no primeiro capítulo, buscou-se abordar os aspectos legais do direito à vida na legislação vigente e sua acepção frente ao princípio da dignidade da pessoa humana. No segundo capítulo, será realizada a distinção entre os institutos da Eutanásia, Distanásia, Ortotanásia e Suicídio Assistido que são formas de abreviar a vida. No último capítulo, serão discutidos os institutos do suicídio assistido e a situação jurídica penal no Brasil.

Palavras - chave: Dignidade da pessoa humana. Autonomia da vontade. Suicídio

assistido

(7)

ABSTRACT

The general objective of this study is to verify if the assisted suicide in cases of incurable disease is in accordance with the principle of the dignity of the human person, theoretical framework of this study, using the method of deductive research and the qualitative analysis of information obtained through bibliographical and documentary research. There is nothing more controversial in society than the origin of life and its end, and the subject is treated as taboo. For the state, to attempt against life means to violate constitutional and moral principles. The importance of the subject is justified by the situation of the terminally ill and who yearn for the end of their suffering, reflecting the right to a dignified life. It was based on the hypothesis that the human being has his dignity guaranteed throughout his life and so must also be at the moment of death, since the obligation to live in this situation can mean a martyrdom far greater than death itself, rights to dignity and autonomy. Thus, in the first chapter, we sought to address the legal aspects of the right to life in the current legislation and its acceptance of the principle of the dignity of the human person. In the second chapter, a distinction will be made between the institutes of Euthanasia, Dysthanasia, Ortotanasia and Assisted Suicide, which are ways of shortening life. In the last chapter, the institutes of assisted suicide and the criminal legal situation in Brazil will be discussed.

Key words: Dignity of the human person. Autonomy of the will. Assisted suicide

(8)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...

8

2 O DIREITO À VIDA NA LEGISLAÇÃO VIGENTE ...

11

2.1 Do direito à vida e dignidade da pessoa humana ...

13

2.2 Da autonomia da vontade versus autonomia privada ...

18

2.3 Dos Direitos de Personalidade ...

22

3. DIREITO À MORTE DIGNA ...

28

3.1 Eutanásia ...

29

3.2 Distanásia ...

31

3.3 Ortotanásia ...

32

3.4 Suicídio Assistido ...

34

4 SUICÍDIO ASSISTIDO: AUTONOMIA PARA MORRER COM DIGNIDADE ...

37

4.1 O direito à morte digna e o princípio da autonomia da vontade ...

37

4.2 Relação entre os princípios da autonomia e os princípios da bioética ...

45

4.3 Projetos de Lei em tramitação referente ao suicídio assistido ...

48

4.4 O suicídio assistido no direito comparado e os casos concretos...

50

5 CONCLUSÃO...

55

REFERÊNCIAS ...

58

(9)

1 INTRODUÇÃO

Não há nada mais controverso na sociedade que a origem da vida e nada mais inaceitável para, pelo menos algumas pessoas, o fim dela. Viver é sempre sinônimo de alegria, saúde e vitalidade, contudo há pessoas em situações de enfermidade em que a realidade é completamente distinta.

A morte e o morrer são tratados ainda com um tabu na sociedade e a discussão em torno desses assuntos serão sempre complexas. Cada qual tem suas crenças, valores e ideais que os acompanharão durante toda uma vida. Há quem consiga imaginar essa realidade que os cerca e a aceita de forma bem tranquila e serena, pois o morrer é a parte final do ciclo da vida.

Há aqueles que a temem, sofrem antecipadamente e veem a morte como um inimigo a ser enfrentado, se prendem a vida de todas as formas possíveis, até não restar mais alternativas a não ser se sucumbir ao evento morte.

E ainda, existem aqueles que não a desejam, mas que vivem em constante sofrimento porque estão sob as garras da morte e assim, anseiam que ela os leve o quanto antes, pondo fim ao sofrimento incessante. Para estes, o último suspiro de dignidade é poder optar pela antecipação da morte, garantindo um final sem dor e sem sofrimento, uma morte condizente com a vida que vivera e com seus valores.

Entretanto, para o Estado, atentar contra a vida fere os princípios constitucionais, além de morais, sendo a prática considerada homicídio, mesmo que privilegiado ou auxílio ao suicídio. A autonomia de quem vive um momento delicado de enfermidade não é levada em consideração, pois a vida humana sempre será protegida a qualquer custo.

A magnitude deste tema se justifica pela situação em que se encontram os doentes

terminais e que anseiam pela prática do suicídio assistido. A legislação brasileira, em

nenhum momento, faz menção ao suicídio assistido em si, contudo, tipifica o auxílio

ao suicídio, no art. 122 do Código Penal, com previsão de penas que variam de um a

seis anos de reclusão, dependendo da gravidade da conduta.

(10)

Nesse sentido, pretende-se com o presente trabalho verificar se o suicídio assistido viola direitos fundamentais constitucionalmente assegurados ou se, ao contrário, é um meio de exercício da autonomia da vontade, assegurada pelo princípio da dignidade da pessoa humana, refletindo o direito a uma vida digna.

Para responder ao problema, levantou-se a seguinte hipótese: se o ser humano tem a sua dignidade garantida durante toda sua vida, assim também deve ser no momento de sua morte. Nesta hora, em que a vida já perdeu grande parte da importância que detinha, a obrigação de viver do enfermo, que não mais deseja estar vivo, pode ser um martírio muito maior do que a própria morte. Esta sobrevida, quando não desejada pelo paciente e a ele é imposta, fere fatalmente seus direitos à dignidade e à autonomia.

Para o desenvolvimento deste tema, o trabalho fora dividido em três capítulos, e que em suma, versam sobre o direito à vida na legislação pátria, o direito à morte e o suicídio assistido, propriamente dito.

No primeiro capítulo, buscou-se abordar os aspectos legais do direito à vida na legislação vigente e sua acepção frente ao princípio da dignidade da pessoa humana, bem como verificar os preceitos do princípio da autonomia da vontade e da autonomia privada e sua influência no exercício do direito à vida. Torna-se necessário também apontar os aspectos envolvidos nos direitos de personalidade que se concretizam com o nascimento com vida.

Em seguida, no segundo capítulo, será realizada a distinção entre os institutos da Eutanásia, Distanásia, Ortotanásia e Suicídio Assistido que são formas de abreviar a vida. Esta diferenciação é necessária visto que cada uma possui sua peculiaridade, o que influenciará na criminalização ou não da conduta pelo direito penal brasileiro.

Por fim, no último capítulo, serão discutidos os institutos do suicídio assistido e a

situação jurídica penal no Brasil, apresentando os argumentos favoráveis e contrários

a prática, trazendo o suicídio assistido como solução para pacientes em estado

terminal, demonstrando que o instituto está em consonância com o princípio da

(11)

dignidade da pessoa humana e permite o exercício pleno da autonomia da vontade.

Neste capítulo será demonstrado também como essa prática é adotada em outros países e casos reais em que o suicídio assistido foi autorizado pela legislação do país.

Com o intuito de atingir o objetivo geral deste estudo, que é verificar se o suicídio assistido está em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, marco teórico deste estudo, o método empregado nesta pesquisa é o dedutivo, pelo qual se fez a análise partindo de argumentos gerais para argumentos particulares.

Além disso, a pesquisa elaborada foi do tipo qualitativo devido à abstratividade do tema em estudo.

Para a elaboração da pesquisa, foram utilizadas técnicas bibliográficas e documentais, as quais se desenvolvem por consultas em doutrina, artigos, sítios especializados, legislação e jurisprudência de tribunais que contribuem para a composição do tema proposto.

Com o presente trabalho, espera-se poder contribuir para a compreensão do que é o

suicídio assistido e como esse procedimento deve ser tratado pelo ordenamento

jurídico pátrio, ressalvando que não se pretende esgotar o tema proposto, para o que

seria necessária uma análise mais ampla e aprofundada.

(12)

2 O DIREITO À VIDA NA LEGISLAÇÃO VIGENTE

A maior preocupação do legislador quando da elaboração da Carta Magna de 1988 era assegurar a ampliação da liberdade para os civis, bem como os seus direitos e garantias individuais. O momento em que o Brasil acabara de sair, após 21 anos de regime militar, fez com que a nova constituinte fosse pautada pela reestruturação política e social.

Visando à proteção dos direitos individuais e sociais outrora negligenciados, a Constituição Federal, promulgada em 1988, buscou pacificar os conflitos e interesses de grupos diversos, promovendo a ordem econômica e social.

A preocupação para que fossem assegurados os direitos fundamentais, com ênfase na proteção da dignidade da pessoa humana era tamanha que já no preâmbulo da Constituição é demonstrado tal propósito quando a Assembleia Nacional Constituinte institui o Estado Democrático de Direito para “assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e justiça” que foram definidos no texto constitucional como “valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos” com fundamentos na “harmonia social” (BRASIL, 1988).

Denominada de Constituição Cidadã, a Carta Magna, logo em seus primeiros títulos, buscou enumerar um extenso rol de princípios, direitos e garantias fundamentais, que marcariam o início de uma nova era social no país.

Tendo como objetivo abolir os traumas e as arbitrariedades decorrentes do regime

militar, a Constituição Federal de 1988 trouxe em seu art. 1º, III, a dignidade da pessoa

humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, consagrando-

o como um princípio inerente a todas as pessoas sem qualquer distinção, cabendo ao

Estado garantir a sua efetiva aplicação e aos demais cidadãos pautarem suas

condutas dentro dos limites legais estabelecidos.

(13)

Neste mesmo sentido, a Constituição Federal de 1988 expõe que o direito à vida, estabelecido como um dos bens jurídicos mais importantes, conforme o caput do art.

5º, alcança a todos os brasileiros bem como aos estrangeiros residentes no país:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. (BRASIL, 1988)

Verifica-se que a vida é um bem que possui ampla proteção no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que predispõe o exercício de todos os outros direitos garantidos pela legislação. Qualquer atentado à vida é passível de sanção, como a tortura (art.

5º, III, CF/88), a imposição de penas de caráter perpétuo, de trabalho forçado ou cruéis (art. 5º, XLVII, ‘b’, ‘c’, e ‘e’, CF/88), a eutanásia e o homicídio (art. 121, CP).

A discussão sobre os aspectos que envolvem a proteção à vida é marcada por grande divergência em todas as áreas, seja na esfera jurídica, científica, filosófica ou religiosa, pois não há consenso acerca do exato momento em que o ser humano se torna titular dos direitos e garantias fundamentais.

Nesse sentido, a doutrina apresenta três teorias para estabelecer o momento em que o indivíduo adquire personalidade jurídica, passando a ser sujeito de direitos.

Conforme Pablo Stolze (2012), para os adeptos da teoria concepcionista, influenciada pelo Direito francês, a personalidade jurídica do nascituro é adquirida no momento da concepção, o que garante o direito a alimentos, por exemplo.

Para a teoria concepcionista, o momento da concepção marca a aquisição da personalidade jurídica, tornando o nascituro sujeito de direitos, inclusive os de ordem patrimonial.

Já para a teoria da personalidade condicional, de acordo com Pablo Stolze (2012), os

direitos do nascituro estão garantidos, porém sob a condição suspensiva do

nascimento com vida. Essa teoria não atribui personalidade ao nascituro, excluindo-

se os efeitos patrimoniais caso a condição não seja cumprida.

(14)

A teoria da personalidade condicional reconhece que o nascituro merece proteção, porém caso o feto não chegue a viver não haverá efeitos patrimoniais, diferente da teoria concepcionista que não impõe nenhuma condição para que isso ocorra.

Ainda conforme Pablo Stolze (2012), a teoria adotada pelo Código Civil de 2002 é a natalista. De acordo com esta teoria, a personalidade jurídica é adquirida com o nascimento com vida, possuindo o nascituro mera expectativa de direitos. Antes do nascimento com vida o nascituro não é considerado pessoa, mas tem resguardados seus direitos desde a concepção.

Sendo assim, de acordo com a legislação brasileira todas as formas de vida devem ser protegidas, ou seja, a proteção normativa ocorre não somente após o nascimento com vida, mas também, a partir de sua concepção, garantindo direitos aos nascituros, conforme disposto no art. 2º do Código Civil Brasileiro de 2002, o que justifica a existência de sanção penal para a prática do aborto, nos termos do art. 124 do Código Penal Brasileiro.

2.1 Do direito à vida e dignidade da pessoa humana

A vida é um direito de primeira dimensão ou geração, constituindo o bloco de liberdades públicas que engloba os direitos civis e políticos. A vida, junto à liberdade, à segurança e a igualdade, constituem as liberdades clássicas desta dimensão.

Conforme Sylvio Motta (2018) os direitos de primeira dimensão são de caráter negativo, exigindo abstenção do Estado, limitando o poder de legislar e de intervir na esfera privada dos administrados.

Para André Carvalho Ramos (2017), os direitos de primeira dimensão incumbem ao

Estado a função de proteger a esfera de autonomia do indivíduo, e por isso são

denominados direito de defesa, colocando o estado em uma posição de sujeito

passivo, devendo se abster da prática de determinadas condutas em relação ao

indivíduo, sujeito ativo que poderá exigir do Estado garantias para que possa exercê-

lo de forma plena.

(15)

De acordo com Sylvio Motta (2018), a necessidade de garantia e proteção aos direitos civis e políticos surgiram por influência dos ideais iluministas, tendo como marco principal a teoria do Contrato Social desenvolvida por Rosseau.

Ainda conforme o mesmo autor, os direitos civis e políticos surgiram em resposta ao Estado Absolutista, onde o rei ditava as regras, constituindo-se a representação de Deus na terra, o que justificava as arbitrariedades por ele cometidas. A partir dos ideais iluministas de igualdade, liberdade e fraternidade o Estado Absolutista deu lugar ao Estado Liberal, que teve como marco as revoluções liberais do século XVIII que ocorreram na Europa e nos Estados Unidos, como o fim de limitar o poder irrestrito do rei.

Dessa forma, houve um rompimento com o regime absolutista e o exercício indiscriminado do poder pelo rei, dando origem a um novo estado onde buscava-se maiores garantias aos indivíduos, limitando, dessa forma, a atuação do Estado sobre o exercício de alguns direitos.

De acordo com Sylvio Motta (2018), existem doutrinadores que entendem que o surgimento dos direitos fundamentais ocorreu com a publicação da Magna Carta, promulgada em 1215 na Inglaterra, porém o entendimento predominante é de que o primeiro instrumento a positivar esses direitos foi a Declaração dos Direitos do Bom Povo da Virgínia, de 1776.

O direito à vida e a dignidade da pessoa humana, ambos fundamentos principais da Constituição Federal de 1988, andam em conjunto uma vez que, doutrinariamente, o direito à vida se subdivide em duas acepções, sendo o direito de continuar vivo, e o direito em ter uma vida digna.

A idealização de uma vivência digna foi construída, principalmente, ao final da 2ª Guerra Mundial, que durou de 1939 a 1945, período marcado por graves violações aos direitos humanos. Após o fim da guerra as nações se voltaram a necessidade de estabelecer mecanismos e normas para proteção da vida humana em âmbito global.

Este contexto deu origem a Declaração dos Direitos Humanos de 1948, com o objetivo

(16)

de ampliar e efetivar a aplicação e os conceitos inerentes ao princípio da dignidade da pessoa humana, por ser o verdadeiro fundamento de direitos como a liberdade e a vida. A Declaração dispõe em seu artigo III que “todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal” (ONU,1948).

Dessa forma, verifica-se que o princípio da dignidade da pessoa humana, que tem como uma de suas vertentes o direito à vida, passou se destacar no cenário mundial após as nações perceberem que era necessário tomar alguma medida para evitar que as conquistas do passado não fossem apagadas diante das violações sofridas.

Nesse sentido, Leslei Lester Dos Anjos Magalhães leciona que:

O princípio da dignidade humana é o fundamento filosófico e jurídico dos direitos humanos e se expressa nestes direitos, funciona também como metanorma, indicando como devem ser interpretadas e aplicadas as outras normas e princípios, em especial as normas definidoras de direitos fundamentais, ampliando o seu sentido, reduzindo-os ou auxiliando em conflitos entre direitos fundamentais. A dignidade da pessoa humana é a chave de interpretação material das demais normas jurídicas. (MAGALHÃES, 2012, p. 150)

Entende-se que o princípio da dignidade da pessoa humana é o fundamento de validade de todos os outros direitos e garantias inerentes aos indivíduos, extraindo-se dele os preceitos interpretativos das demais normas jurídicas protetoras desses direitos para dirimir eventuais conflitos.

Nessa mesma linha, o professor José Afonso da Silva, entende que a dignidade da pessoa humana é um valor intrínseco a todos os direitos fundamentais, tendo em vista sua amplitude:

Dignidade da pessoa humana é o valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. Concebida como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma ideia qualquer apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a no casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir `teoria do núcleo da personalidade` individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana (SILVA, 2014, p.107).

(17)

A dignidade da pessoa humana, como princípio constitucional, tem como principal função nortear a interpretação e a aplicação dos demais princípios, visto que não são absolutos, havendo necessidade de, em certos casos, fazer uma ponderação entre os bens jurídicos envolvidos.

Ainda sobre o conceito dignidade da pessoa humana, Anderson Schreiber (2013, p.127), colaciona que se trata de “valor síntese da condição humana”, que soma os atributos específicos do ser humano. “É cláusula geral que permite uma releitura da ordem jurídica brasileira em proteção da condição do ser humano que valoriza as diferentes manifestações do humano. ”

O princípio da dignidade da pessoa humana se constitui como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito estabelecido pela República Federativa do Brasil.

Está disposto no inciso III do art. 1º da CF/88 com a seguinte redação:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. (BRASIL, 1988)

O direito a uma vida digna envolve duas dimensões distintas, sendo que a primeira está associada ao direito de continuar vivo, relaciona-se com o corpo físico do indivíduo e a garantia de sua integridade. Na segunda dimensão encontra-se o direito a ter uma vida digna, apresentando conceito mais amplo e complexo que a primeira.

Nesse mesmo contexto, Nathalia Masson (2016), entende que a primeira acepção

consiste no direito de o ser humano estar vivo e continuar vivendo, garantindo sua

existência física, que não poderá ser violada pelo Estado e nem por outros

particulares. Já a proteção à vida digna, vai além do corpo físico, expandindo o

conceito de viver para além da simples subsistência física, tendo uma correlação com

o princípio da dignidade da pessoa humana.

(18)

Cumpre ressaltar que a caracterização de uma vida digna não é baseada apenas no acesso a prestações de educação, saúde e alimentação. A garantia da autonomia individual, liberdade, o acesso ao trabalho e a integridade física e moral também são necessários para que se viva dignamente. Nesse sentido, e sobre a amplitude dos aspectos que envolvem o direito a uma vida digna e o princípio da dignidade da pessoa humana, Ana Paula Barcellos dispõe que:

É certo, porém, que a dignidade humana descreve uma realidade complexa, e essa complexidade é consequência de ao menos duas ordens de razões, que vão refletir sobre a ordem jurídica. Em primeiro lugar, é certo que a dignidade humana não se resume a ter acesso a prestações de educação e saúde, a não passar fome e a ter alguma forma de abrigo. Há, como se sabe, muito mais do que isso. A liberdade em suas variadas manifestações – de iniciativa, de expressão, de associação, de crença etc. -, a autonomia individual, o trabalho, a participação política, a integridade física e moral, entre outros, são elementos indissociavelmente ligados ao conceito de dignidade humana (BARCELLOS, 2018, p. 157).

Dessa forma, verifica-se que o direito a uma vida digna reflete o corolário do princípio da dignidade da pessoa humana, pois envolve um complexo arcabouço de prestações, onde se inclui a liberdade e a autonomia individual.

Apesar de toda a sua importância, o exercício do direito à vida não se dá de forma absoluta, podendo ser restringido ou mitigado em situações específicas, autorizando inclusive, a aplicação da pena de morte em caso de guerra declarada, de acordo com o art. 5º, XLVII, alínea a) da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, Walber de Moura Agra (2018, p. 205), “nenhum direito é absoluto, podendo ser restringido e até mesmo retirado em razão de relevante interesse público, o direito à vida sofre exceção em caso de guerra declarada, havendo a tipificação dos crimes de deserção ou de traição”.

Verifica-se que o princípio da dignidade humana tem status de preceito constitucional

fundamental, tendo como principal função validar todos os demais direitos e garantias

inerentes aos indivíduos, sem qualquer distinção. A vida, como desdobramento deste

princípio é um dos mais importantes direitos humanos pois a partir dele é exercido os

demais.

(19)

É importante ressaltar que o direito à vida exige outras prestações além daquelas básicas, relacionadas à vida, saúde, alimentos, educação entre outros, pois é preciso que garantam ao indivíduo uma vida digna.

2.2 Da autonomia da vontade versus autonomia privada

Autonomia da vontade e autonomia privada são expressões distintas, produzindo cada uma delas uma consequência distinta para o Direito e as relações dos indivíduos, porém alguns doutrinadores, como será descrito, entendem que as expressões são sinônimas.

Disposto no caput do art. 5º da CF/88, o direito à liberdade, na lição de Ana Paula Barcelos, é condição fundamental e intrínseca ao exercício da autonomia individual, autorizando que os próprios indivíduos definam seus objetivos e metas de vida. Daí decorre a autonomia da vontade que é, doutrinariamente, entendida como a liberdade de ação do indivíduo em face da ação do Estado e particulares, ou seja, entende-se que cada pessoa age da maneira que melhor lhe convier, definindo o caminho que seguirá em sua vida.

A Constituição assegura no art. 5º, caput, o direito à liberdade, que vai ser detalhado ao longo do dispositivo em várias liberdades específicas. De forma simples, a liberdade pode ser descrita como o status fundamental pelo qual cada pessoa, como padrão geral, encontra-se livre para agir como lhe parecer por bem, sem dever obediência a quem quer que seja. Está, portanto, diretamente relacionada com a autonomia individual, isto é, com a possibilidade de definir seus próprios projetos de vida. (BARCELLOS, 2018, p. 229)

A autonomia da vontade, decorrente do direito à liberdade, pode ser entendida como um princípio fundamental para as relações e escolhas do ser humano, uma vez que o acompanha em todas as decisões realizadas no decorrer de sua vida.

De acordo com Clóvis do Couto e Silva (1976, p. 17) a autonomia da vontade se refere

à “possibilidade, embora não ilimitada, que possuem os particulares para resolver

seus conflitos de interesses, criar, associações, efetuar o escambo dos bens e

dinamizar, enfim, a vida em sociedade” vinculando-se juridicamente através destas

relações decorrentes da vontade.

(20)

Verifica-se que a autonomia da vontade expressa o direito que o indivíduo possui de conduzir sua vida em sociedade da maneira que julgar conveniente, bem como celebrar acordo de vontade conforme seus interesses.

Para Maria Helena Diniz (2011, p. 40) o princípio da autonomia da vontade representa

“o poder de estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante acordo de vontade, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. ”

A autonomia da vontade, de acordo com Camila Galvão (2016), teve origem nos princípios do Estado Liberal dos Séculos XVIII e XIX, contexto marcado por uma sociedade individualista que colocava o homem no centro das relações jurídicas. O Estado Liberal era pautado pelo princípio da intervenção mínima do Estado nas relações particulares, com o fim de garantir a todos a plena liberdade de contratação e a fixação das condições para celebração dos negócios jurídicos.

Os ideais liberalistas, conforme Fernanda Cadavid Ratti (2015), tiveram forte influência na redação do revogado Código Civil Brasileiro de 1916, que apresentava a autonomia da vontade e a iniciativa privada como suas principais bases. Os preceitos liberalistas, apesar de constituírem o marco de rompimento com o Estado Absolutista, se tornaram fatores impeditivos da consolidação do princípio da dignidade humana, da igualdade e da justiça devido ao impacto social negativo causado pelos contratos celebrados neste contexto.

Sendo assim, a autonomia da vontade trazida pelo Estado Liberal representou um obstáculo para a consolidação do princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que não era considerado na celebração dos negócios jurídicos, prevalecendo o acordo de vontade produzido entre as partes sob o argumento de que não cabia ao Estado intervir nessa seara.

Beatriz França (2006) ensina que o surgimento do Estado Social estabeleceu limites

ao exercício da autonomia privada e ao mesmo tempo, preocupou-se em desenvolver

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políticas públicas de cunho assistencial, superando o individualismo do Estado Liberal, dando lugar a autonomia privada.

Dessa forma, “todos esses movimentos deram ensejo a que surgisse uma nova visão da autonomia da vontade, tão própria que repudiará o termo vontade e colocará em evidência a partícula privada” (RODRIGUES JR, 2004, p. 121).

Sendo assim, a autonomia privada simboliza o abandono do individualismo do Estado Liberal. Nesse contexto a intervenção estatal se limita a garantir o exercício dos direitos e impedir que particulares interfiram na esfera de direito alheia.

Diferenciando o termo autonomia da vontade de autonomia privada, Eurico de Pina Cabral (2004, p. 111) discorre que a autonomia da vontade “relaciona-se com a liberdade de autodeterminação (manifestação da vontade livre) ”, já a autonomia privada refere-se “ao poder de auto-regulamentação (normas estabelecidas no interesse próprio) ”.

Apresentando os pontos principais do conceito de autonomia privada trazidos pelos autores Salvatore Romano, Luigi Ferri, Cariota Ferrara, Santi Romano e Hans Kelsen, Otávio Luiz Rodrigues Junior leciona que:

Os pontos de aproximação entre esses autores estariam nos seguintes aspectos: a) a supremacia do interesse público e da ordem pública sobre o interesse público e da ordem pública sobre o interesse particular e a esfera privada; b) a colocação do negócio jurídico como espécie normativa, de caráter subalterno, mas com caráter normativo; c) a autonomia privada revelando um poder normativo conferido pela lei aos indivíduos que o exerciam nos limites e em razão dessa última e de seus valores; d) a autonomia privada tida como um poder outorgado pelo Estado aos indivíduos (RODRIGUES JR, 2004, p. 121).

Existem alguns doutrinadores que não identificam diferenças entre as expressões, pois ambas se manifestam no negócio jurídico, bem como no direito de se autodirigir.

Para Carlos Alberto Mota Pinto (2005) não há diferença entre as duas expressões que

para o autor descrevem o negócio jurídico como manifestação tanto do princípio da

autonomia privada como da autonomia da vontade. Ainda conforme o autor, ambas

(22)

as expressões reconhecem o direito dos particulares de auto-regulamentação e autogoverno de seus interesses.

Corroborando o exposto, Luiz Edson Fachin (1988) entende que a autonomia da vontade é uma forma de expressão da autonomia privada que se vincula a faculdade que o indivíduo possui para dispor sobre seus interesses dentro dos limites estabelecidos pela lei.

Para os autores citados acima, autonomia da vontade e autonomia privada são expressões semelhantes que designam a liberdade garantida ao indivíduo de se auto governar, de dirigir sua vontade e interesse sem interferência do Estado, desde que respeitem os limites existentes, não interferindo na esfera de terceiros.

Nesse sentido, e de acordo com Ana Paula Barcelos, o direito à vida em sua dimensão existencial relaciona-se intimamente com a autonomia, condição esta que garante ao indivíduo a liberdade para atribuir valor e significado a sua própria vida, de acordo com suas experiências pessoais, influenciando ainda na formação do conceito individual de dignidade.

A primeira categoria congrega direitos e liberdades que formam um espaço de autonomia do indivíduo em face da ação do Estado e também de particulares. (…) A vida envolve uma dimensão física – conectando-se aqui com o direito à saúde (art. 196) – mas também uma dimensão existencial: na experiência humana, cada pessoa dá a sua vida um significado, uma dignidade, um valor próprio e particular, de modo que o direito à vida envolve também a autonomia para definir seus próprios projetos de vida.

(BARCELLOS, 2018, p. 229)

Desta forma, verifica-se que a autonomia da vontade resguarda ao indivíduo a sua liberdade para agir como entender, conferindo-lhe uma ideia de autogestão e autodeterminação.

A autonomia privada, ainda que resguarde a liberdade do indivíduo, visa a aplicação da vontade humana em face às necessidades e expectativas da sociedade em geral.

É importante ressaltar que este princípio não é absoluto e aplica-se nos limites

estabelecidos pela legislação vigente tendo como base a influência que causará na

vida de terceiros interessados ou não interessados.

(23)

2.3 Dos Direitos de Personalidade

Os direitos de personalidade estão dispostos no Capítulo II, do Livro I, no Título I da Parte Geral do Código Civil de 2002, e compreende-se por serem tudo aquilo que é atinente à pessoa no seu estado físico, mental e moral.

Os direitos de personalidade são dotados de características particulares que conferem ao indivíduo a integridade da sua esfera extrapatrimonial, sendo adquirida a partir do nascimento com vida, conforme preleciona a teoria natalista adotada pelo Código Civil de 2002.

Neste sentido, é o ensinamento de Carlos Roberto Gonçalves que dispõe que:

O conceito de personalidade está umbilicalmente ligado ao de pessoa. Todo aquele que nasce com vida torna-se uma pessoa, ou seja, adquire personalidade. Esta é, portanto, qualidade ou atributo do ser humano. Pode ser definida como aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações ou deveres na ordem civil. É pressuposto para a inserção e atuação da pessoa na ordem jurídica. (GONÇALVES, 2017, p. 95)

Da mesma forma, para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2010), os direitos de personalidade são aqueles em que o indivíduo vê tutelado seus valores não redutíveis pecuniariamente, como a vida, a integridade física, a intimidade, a honra, entre outros.

Todo e qualquer cidadão é detentor de direito de personalidade como razão da sua própria existência, independente de idade, sexo, crença e cor, por esse motivo, não se pode confundir os direitos de personalidade com direitos patrimoniais, que podem ser adquiridos ou não.

O art. 11 do Código Civil de 2002 determina que, com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo seu exercício sofrer limitação voluntária.

Classificam-se os Direitos de Personalidade em intransmissíveis, irrenunciáveis,

indisponíveis, segundo o Código Civil, contudo a doutrina se encarrega de trazer

(24)

outras características, como ilimitados, absolutos, extrapatrimoniais, impenhoráveis, imprescritíveis e vitalícios.

Neste sentido, Gonçalves (2012) esclarece que são intransmissíveis porque os direitos de personalidade não podem ser transferidos para outra pessoa. Isso significa dizer que outra pessoa não poder exercer direito a que não lhe pertence.

Os direitos de personalidade também são irrenunciáveis porque o titular não pode abdicar desses direitos, assim “não podem os seus titulares deles dispor, transmitindo- os a terceiros, renunciando ao seu uso ou abandonando-os, pois nascem e se extinguem com eles, dos quais são inseparáveis” (GONÇALVES, 2012, p. 181).

Os direitos são caracterizados como ilimitados porque não há número certo de direitos da personalidade, não podendo ser quantificados. Neste sentido, esclarece Carlos Roberto Gonçalves que:

É ilimitado o número de direitos da personalidade, malgrado o Código Civil, nos arts. 11 a 21, tenha se referido expressamente apenas a alguns. Reputa- se tal rol meramente exemplificativo, pois não esgota o seu elenco, visto ser impossível imaginar-se um numerus clausus nesse campo.

(

GONÇALVES, 2012, p.182

).

Desta forma, pode-se dizer que os direitos de personalidade não são taxativos, pois é impossível que o legislador pudesse prever todas as formas de violação deste direito bem como um rol que os limite.

São caracterizados, também, como absolutos, porque oponíveis erga omnes, ou seja, todos deverão observar os direitos de personalidade para que sejam eles assegurados, desta forma “tal característica guarda íntima correlação com a indisponibilidade, característica estudada abaixo, uma vez que não se permite ao titular do direito renunciar a ele ou cedê-lo em benefício de terceiro ou da coletividade”

(STOLZE E PAMPLONA, 2012, p.167).

Esta característica demonstra que o direito de personalidade não pode ser

relativizado, devendo ser respeitado por toda coletividade, atingindo também o próprio

(25)

titular do direito, o que justifica a sua indisponibilidade, garantindo uma ação negativa do Estado e dos particulares.

São direitos definidos como indisponíveis porque o ser humano não pode dispor da forma que bem entender dos seus direitos de personalidade. “A indisponibilidade significa que nem por vontade própria do indivíduo o direito pode mudar de titular, o que faz com que os direitos da personalidade sejam alçados a um patamar diferenciado dentro dos direitos privados. ” (STOLZE E PAMPLONA, 2012, p.168).

A indisponibilidade dos direitos de personalidade significa que o indivíduo não poderá se desfazer destes deliberadamente, mesmo que por vontade própria, atribuindo a outrem sua titularidade.

Em continuidade, são caracterizados como extrapatrimoniais, haja vista não estarem inseridos na esfera patrimonial do indivíduo e não estão sujeitos a aferição econômica.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2012, p.168) assim lecionam que “uma das características mais evidentes dos direitos puros da personalidade é a ausência de um conteúdo patrimonial direto, aferível objetivamente, ainda que sua lesão gere efeitos econômicos”.

Além disso, são impenhoráveis porque não servem como garantia de pagamento de dívidas e nem podem ser aferidos monetariamente. É importante ressaltar que a impenhorabilidade não é absoluta, pois direitos como imagem e autorais, por exemplo, podem ser cedidos.

Sendo inerentes à pessoa humana e dela inseparáveis, e, por essa razão, indisponíveis, os direitos da personalidade certamente não podem ser penhorados, pois a constrição é o ato inicial da venda forçada determinada pelo juiz para satisfazer o crédito do exequente. (GONÇALVES, 2012, p.156)

Os direitos de personalidade também são imprescritíveis porque, segundo Gonçalves

(2012), podem ser exercidos a qualquer momento, pois não se extinguem pelo seu

uso no tempo e nem pela inércia do titular em razão da pretensão de defendê-los.

(26)

E, finalmente, vitalícios porque acompanham a pessoa do seu nascimento até o momento da sua morte, são inatos e permanentes. Ressalta-se que nem todos os direitos da personalidade vão se exaurir no momento da morte do titular, pois alguns deles poderão ser resguardados inclusive após a morte, como a honra e o direito moral do autor. (STOLZE E PAMPLONA, 2012, p.170).

Existem três categorias de direitos de personalidade, sendo eles, direito à integridade física, direito à integridade psíquica e os direitos morais.

O Código Civil de 2002, fundado nos direitos fundamentais da pessoa humana, garante a todos o direito à integridade física. O art. 13 estabelece que “salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”.

(BRASIL, 2002).

Apesar de o Código Civil de 2002 vedar a disposição do próprio corpo no seu aspecto físico, a doutrina apresenta o entendimento de que a interpretação do art. 13 deve ser ampliada no sentido de contemplar também outras formas de violação do corpo humano, além dos relacionados à integridade psicofísica do indivíduo.

Este é o posicionamento apresentado por Anderson Schreiber ao discorrer que o legislador poderia ter incluído outros aspectos ao dispositivo legal:

O Código Civil de 2002 poderia ter contribuído de modo mais significativo para esse propósito. Limitou-se, contudo, a contemplar o direito à integridade psicofísica sob um único aspecto: o dos atos de disposição do corpo humano.

Em outras palavras, a codificação veio cuidar tão somente da relação entre a proteção ao corpo e a vontade do seu titular, procurando determinar em quais circunstâncias pode uma pessoa dispor, no todo ou em parte, do seu próprio corpo. (SCHREIBER, 2013, p. 33)

O direito à integridade física também está tutelado no art. 14, do Código Civil de 2002.

Nele está disposto que “é válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição

gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte”. (BRASIL, 2002).

(27)

Por este dispositivo entende-se que, apesar de existir vedação em relação à disposição do próprio corpo quando esta implicar em qualquer diminuição de caráter permanente da integridade física, o ato será permitido por motivo altruístico ou científico, após a morte.

Em vida, a disposição do próprio corpo também é permitida, desde que ocorra para fins de transplante, conforme dispõe o parágrafo único do art. 13 do Código Civil de 2002.

Em relação ao direito a honra, a preservação da boa fama e da respeitabilidade, bem como a utilização da imagem para fins comerciais, o art. 20 do mesmo diploma legal estabelece que é proibida “a divulgação de escritos, a transmissão de palavra, ou a publicação a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa”, sendo cabível indenização pela violação do direito. Em contrapartida, caso exista autorização do titular do direito, “ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública” a divulgação, transmissão ou publicação será legal (BRASIL, 2002).

O direito à integridade psíquica também está garantido no Código Civil brasileiro, conforme disposto no art. 21 que determina que “a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”. (BRASIL,2002)

Desta forma, verifica-se que os elementos intrínsecos do indivíduo são evidenciados, sob a premissa de que há necessidade jurídica de proteger a mente humana em sua essência, além do aspecto físico, garantido o direito a indenização nos casos de violação destes direitos.

Nesse sentido, Pamplona e Stolze (2012) afirmam que a proteção garantida ao

indivíduo deve ser ampla e estendida aos elementos físico e psíquico. O elemento

psíquico possui como atributos a inteligência e o sentimento, pois a integridade mental

é a base do ser humano, de onde se originam os demais. Essa concepção justifica a

proteção a incolumidade da mente humana bem como a rigorosa punição para a

tortura psicológica.

(28)

A proteção a integridade mental é condição para que o ser humano possa desfrutar dos demais direitos que lhe são inerentes, não se admitindo no direito brasileiro qualquer conduta que possa violar o indivíduo psicologicamente.

Além do exposto, o art. 5º da Constituição Federal de 1988 dispõe sobre os direitos morais que englobam o direito à reputação, direito moral, o respeito, a consideração, a boa fama e a estima que a pessoa desfruta em suas relações sociais, sendo

“umbilicalmente associada à natureza humana, a honra é um dos mais significativos direitos da personalidade, acompanhando o indivíduo desde seu nascimento, até depois de sua morte” (STOLZE E PAMPLONA, 2012, p.189).

Os direitos de personalidade são protegidos de duas formas, sendo a primeira preventiva, ou seja, antes mesmo de haver concretização da ameaça, e a segunda repressiva, através da imposição de sanção civil, como o pagamento de indenização ou sanção penal, em caso de a lesão já haver ocorrido.

Neste sentido, esclarece Carlos Roberto Gonçalves (2012) que, o ofendido tem o direito de buscar reparação do dano decorrente da violação dos seus direitos de personalidade, visando resguardar a dignidade humana. A proteção poderá ocorrer de forma preventiva através de medida cautelar para evitar que a ameaça a lesão se concretize. Caso a lesão já tenha se concretizado, o ofendido poderá ajuizar ação de indenização por danos materiais e morais, atuando de forma repressiva.

Dessa forma, a importância dos Direitos da Personalidade se revelam nas

prerrogativas individuais inerentes à pessoa humana, quanto ao nome, à identidade,

à honra, à moral, à integridade física e psíquica, na proteção da intimidade e da

disposição do próprio corpo.

(29)

3. DIREITO À MORTE DIGNA

Em análise ao capítulo anterior, verifica-se que a proteção à vida e a dignidade humana são matérias de discussão intensa, sendo consideradas, em conjunto, os maiores bens que o indivíduo possui, dentre todos os direitos a ele assegurados.

Porém, além de garantir uma vida digna, cabe ressaltar que para cada indivíduo é necessário assegurar o direito a uma morte digna. Parafraseando a Doutora Ana Cláudia Quintana Arantes (2016), médica paliativa do Hospital das Clínicas FMUSP,

“a morte é um dia que vale a pena ser vivido”.

Sendo o destino para qual todos estão fadados, a morte ainda é considerada um assunto delicado e polêmico para alguns, uma vez que é acompanhada de medo, tristeza e sentimento de solidão para aqueles que ficam. Desta forma, não há maneira de se preparar para o inevitável, e a falta de discussão acerca das hipóteses de interrupção da vida resultam em um assunto controverso.

No decorrer das décadas, a ciência e o acesso à informação avançaram satisfatoriamente, erradicando doenças e aumentando as possibilidades de tratamento para melhoria da qualidade de vida do indivíduo. Porém, ainda hoje não se vive em uma situação de saúde totalmente resguardada pela medicina.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, mais de 800 mil pessoas morrem em decorrência do suicídio todos os anos no mundo, sendo em média uma morte a cada 40 segundos. No Brasil, cerca de 11 mil pessoas morrem todos os anos, em média 32 casos por dia.

Em 2015, a revista inglesa The Economist produziu uma pesquisa que tinha o intuito

de avaliar a qualidade dos cuidados oferecidos no fim da vida e num ranking com mais

de 70 países o Brasil ficou em 42º lugar, atrás de países como Argentina, Uruguai e

Chile. Significa dizer que o Brasil ainda tem muito o que desenvolver no que diz

respeito à morte digna.

(30)

Neste momento torna-se imprescindível esclarecer os conceitos dos seguintes institutos: Eutanásia, Distanásia, Ortotanásia e Suicídio Assistido para desmistificar o assunto.

3.1 Eutanásia

A palavra eutanásia tem origem grega, significando morte sem sofrimento, morte piedosa, a qual o paciente em estado terminal ou portador de enfermidade incurável, que esteja em sofrimento constante vem a óbito por intermédio de alguém por sentimento de piedade.

Neste mesmo sentido, é a conceituação de Luis Jiménez de Asúa:

Eutanásia significa boa morte, mas em sentimento mais próprio e estrito é a que outro proporciona a uma pessoa que padece de uma enfermidade incurável ou muito penosa, e a que tende a truncar a agonia excessivamente cruel ou prolongada. (ASUA, 2003, p. 30).

Esta prática ainda possui vedação no direito brasileiro, pois entende-se que a conduta de abreviar a vida do indivíduo, configura crime de homicídio, tipificado no art. 121 do Código Penal.

Este é o sentido explanado na Exposição de Motivos da Parte Especial do CP, Decreto-Lei nº 2.848/40, onde, em seu tópico 39 dispõe, in verbis:

39. Ao lado do homicídio com pena especialmente agravada, cuida o projeto do homicídio com pena especialmente atenuada, isto é, o homicídio praticado

“por motivo de relevante valor social, ou moral”, ou “sob o domínio de emoção violenta, logo em seguida a injusta provocação da vítima”. Por “motivo de relevante valor social ou moral”, o projeto entende significar o motivo que, em si mesmo, é aprovado pela moral prática, como, por exemplo, a compaixão ante o irremediável sofrimento da vítima caso do homicídio eutanásico.

(BRASIL, 1940)

Desta forma, ainda que seja considerada uma prática com finalidade benevolente, a

legislação brasileira tipifica a conduta como homicídio, sendo penalizado nos termos

do art. 121, §1º, do Código Penal que criminaliza a conduta de matar alguém “se o

agente é impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de

(31)

violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima”, sendo esta circunstância causa de diminuição de pena de um sexto a um terço (BRASIL, 1941).

O Código de Ética Médica, resolução CFM nº 1.931/09, veda, em seu art. 41, a abreviação da vida do paciente, ainda que o pedido seja realizado pelo próprio paciente ou por seu representante legal. O parágrafo único deste artigo dispõe ainda que o médico deverá oferecer ao portador de doença terminal ou incurável, os cuidados paliativos disponíveis para amenizar o sofrimento do paciente, abstendo-se de empregar ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, observando sempre a vontade expressa do paciente ou de seu representante legal.

Mas, ainda que o conhecimento público geral seja de que a eutanásia é a prática da boa morte, findando a vida do paciente de forma rápida e indolor, há a existência de três espécies deste instituto, sendo eles eutanásia voluntária, não voluntária e involuntária.

Entende-se por eutanásia voluntária, de acordo com Pedro Lenza (2018), “quando há expresso e informado consentimento”, ou seja, é necessário que o paciente apresente desejo inequívoco de pôr fim à sua vida.

Há, também, a existência da eutanásia não voluntária, que é entendida, nas palavras de Pedro Lenza (2018), como a realização da prática sem o consentimento do paciente ou manifestação expressa de sua vontade, sendo realizada, portanto, de maneira oculta.

Diogo Edilton Bernardino apresenta alguns exemplos que caracterizam a eutanásia não voluntária:

A eutanásia não voluntária ocorre quando a pessoa está inconsciente ou é incapaz de tomar decisão por si só, (por exemplo, um bebê muito jovem ou uma pessoa de inteligência extremamente baixa) esses não podem fazer a escolha significativa entre viver e morrer, e uma pessoa tem que tomar a decisão apropriada em seu nome. A eutanásia não voluntária inclui os casos em que a pessoa é uma criança que é mentalmente e emocionalmente capaz de tomar a decisão, mas não é considerada na lei como tendo idade suficiente para tomar uma decisão como a eutanásia, dessa forma assim para a lei, alguém deve tomar a decisão em seu favor. (BERNARDINO, 2013, p. 8)

(32)

Dessa forma, a eutanásia não voluntária ocorrerá quando inexistir consentimento ou manifestação do indivíduo em relação ao momento de sua morte, quando estiver em estado de inconsciência ou com alguma incapacidade para proferir tal decisão.

A terceira espécie é denominada de eutanásia involuntária, que não se confunde com a espécie previamente mencionada. Esta prática é explicada por Pedro Lenza (2018) como eutanásia feita contra a vontade do paciente, estando presente um relevante e adequado consenso jurídico quanto ao seu caráter criminoso, uma vez que é realizada mesmo após a proibição do paciente.

Sendo assim, a eutanásia voluntária ocorre quando o paciente deseja sua morte e expressa essa vontade de forma livre e consciente. Já na eutanásia involuntária a prática ocorre contra a vontade do paciente, restando claro a negativa em pôr fim a sua própria vida. Na eutanásia não voluntária não há manifestação de vontade positiva ou negativa do paciente ou consentimento para a prática do ato, uma vez que sua anuência ou discordância ficam prejudicadas pelo fato de estar em estado de inconsciência ou em condição que impossibilite exprimir sua vontade, como o estado de coma, por exemplo.

A eutanásia visa proporcionar ao indivíduo uma morte tranquila, digna e sem dor, libertando-a de uma vida vegetativa ou prolongada através de técnicas paliativas, afetando apenas a pessoa interessada, sem acarretar danos a terceiros.

3.2 Distanásia

O presente instituto é visto como o contrário da eutanásia, uma vez que consiste no

ato de estender ao máximo a vida do indivíduo e, consequentemente, a prolongação

de seu sofrimento. Para o pneumologista, Dr. Daniel Deheinzelin a distanásia é

manutenção da vida de uma forma artificial em quadros onde não há perspectiva de

melhora definitiva (UNIFESP, 2002).

(33)

Para Luciana Dadalto (2018) tem-se a ideia de que tudo que se faz para lutar contra a morte é correto, mesmo que essa tentativa implique em sofrimento físico para aquele paciente.

De maneira prática, a distanásia visa a proteção da vida do indivíduo, ainda que não priorize a dignidade de sua existência, conforme preleciona Maria de Fátima Freire de Sá e Diogo Luna Moureira:

Como se disse, na eutanásia o ato médico tem por finalidade acabar com a dor e a indignidade na doença crônica e, no morrer, eliminando o portador da dor. A preocupação primordial é com a qualidade da vida humana na sua fase final. A distanásia, por sua vez, dedica-se a prolongar, ao máximo, a quantidade de vida humana, combatendo a morte como grande e último inimigo. (SÁ; MOUREIRA, 2012, p. 90).

Ainda que seja a realização de uma prática que confere sofrimento ao paciente e seus entes próximos, não há proibição legal quanto a prática.

Conforme Lopes, Lima e Santoro (2012) a distanásia é um procedimento onde a equipe médica adota medidas terapêuticas de caráter excessivo em casos onde não há possibilidade de cura. Na lição dos autores, a distanásia viola o princípio da dignidade humana por permitir a prolongação da vida através de medidas fúteis e até mesmo desproporcionais, à medida em que não proporciona qualidade de vida ao paciente, mas somente o distancia sem motivo justificável de um fim inevitável.

Verifica-se que a distanásia visa única e exclusivamente a prolongação da vida do paciente a qualquer custo, mesmo que os procedimentos necessários lhe causem dor ou sofrimento, pois a morte é vista como um inimigo que deverá ser combatido através dos meios disponíveis na medicina. Quando realizada contra a vontade do paciente torna-se um procedimento cruel que acaba por provocar uma morte mais lenta e que não proporciona qualquer qualidade de vida para o indivíduo que se encontra em estado terminal, sem nenhuma chance de cura.

3.3 Ortotanásia

(34)

Indo em direção oposta às práticas supracitadas, a ortotanásia consiste na realização de uma conduta de aceitação da situação atual do indivíduo, ou seja, não há a tentativa de abreviar ou postergar sua morte através de práticas médicas.

Doutrinariamente, existem duas espécies desta prática, sendo a eutanásia ativa indireta, e a eutanásia passiva. Ainda que possuam o mesmo nome, em nada se confundem com a prática da eutanásia previamente explicada.

De acordo com Pedro Lenza (2018), eutanásia ativa indireta consiste na remoção dos mecanismos de sustentação artificial da vida do indivíduo, como por exemplo, o desligamento de aparelhos. Em contrapartida, a eutanásia passiva, consiste na ausência de ação médica, sendo a morte um resultado da omissão de cuidados.

Esta medida é respaldada pela Resolução nº 1.805/06, do Conselho Federal de Medicina que dispõe em seu art. 1º que o médico possui permissão para suspender ou limitar os procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do indivíduo acometido por doença em fase terminal, grave e incurável, garantindo-lhe os cuidados necessários para o alívio do sofrimento, respeitando a vontade do paciente ou de seu representante legal.

A ortotanásia consiste, portanto, no ato de paralisar as atividades ou tratamentos que prolonguem a vida de forma artificial, em casos em que o paciente se encontre em coma ou estado vegetativo, não havendo tendência para que recupere seu estado a quo.

Na seara do Direito Penal, esta conduta não é tida como crime, pois não há o dolo de matar e por ser a atuação correta frente a morte. O médico nessa ocasião tenta apenas reduzir o sofrimento daquele que não tem chances de cura e interrompe tratamentos ineficazes.

Para Luciana Dadalto (2018) a vida não tem que ser abreviada e nem prolongada a

qualquer custo, tem que ser respeitado o curso natural das coisas. Por consequência,

(35)

verifica-se a realização de um processo de humanização da morte, realizando de maneira natural e indolor.

Dessa forma, a ortotanásia não tem objetivo de prolongar a vida do indivíduo ou abreviá-la, mas visa tão somente deixar que a morte ocorra de forma natural, suspendendo tratamentos paliativos e aplicando apenas métodos para deixar o doente mais confortável.

3.4 Suicídio Assistido

Como última prática a ser tratada neste capítulo, entende-se, por sua vez, que suicídio assistido é o instituto pelo qual a pessoa que deseja vir a óbito, executa todos os atos preparatórios e, com o auxílio de um terceiro, concretiza a sua pretensão.

O suicídio assistido, também chamado de auto eutanásia, consiste, na lição de Lopes, Lima e Santoro (2012, p. 65), em um “comportamento em que o próprio indivíduo dá fim a sua vida sem a intervenção direta de terceiro na conduta que o levará à morte”, a participação do terceiro ocorrerá por motivos humanitários, “prestando assistência moral ou material para a realização do ato”.

No Brasil, o induzimento, a instigação ou o auxílio ao suicídio é crime previsto no art.

122 do Código Penal, com a seguinte redação:

Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

Parágrafo único - A pena é duplicada:

Aumento de pena

I - se o crime é praticado por motivo egoístico;

II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência (BRASIL, 1940).

O crime previsto no art. 122 é classificado como de ação múltipla ou conteúdo variado

por apresentar mais de uma conduta em seu preceito primário (induzimento,

instigação ou auxílio ao suicídio).

(36)

Conforme Nélson Hungria (1981), poucas são as diferenças entre induzimento e instigação. O induzimento ocorre quando o sujeito ativo participa na formação da vontade do sujeito passivo, já na instigação, o sujeito passivo já possui a ideia pré- concebida para a prática do suicídio e o sujeito ativo somente reforça e estimula essa ideia.

A instigação e o induzimento são formas de participação moral na prática do crime. Já o auxílio configura hipótese de participação material, onde o agente ativo fornece ao suicida instrumentos para cometer o ato ou esclarece como utilizá-los. (GRECO, 2013, p. 297).

Dessa forma, o suicídio assistido se amolda ao crime previsto no art. 122 do Código Penal na modalidade “auxílio para que o faça”, mesmo que o auxílio tenha ocorrido por motivos humanitários, uma vez que, para que se concretize é necessário que o terceiro que auxilia, apesar de não intervir diretamente no ato, preste algum tipo de ajuda material, visto que a ajuda moral configura o crime na modalidade instigação ou induzimento. Sendo assim:

O suicídio assistido, ou o auxílio ao suicídio, é também crime. Ocorre com a participação material, quando alguém ajuda a vítima a se matar oferecendo- lhe meios idôneos para tal. Assim, um médico, enfermeiro, amigo ou parente, ou qualquer outra pessoa, ao deixar disponível e ao alcance do paciente certa droga em dose capaz de lhe causar a morte, mesmo com a solicitação deste, incorre nas penas do auxílio ao suicídio. A vítima é quem provoca, por atos seus, sua própria morte. Se o ato que visa à morte é realizado por outrem, este responde por homicídio, não por auxílio ao suicídio. A solicitação ou o consentimento do ofendido não afastam a ilicitude da conduta (MARINHO, 2011, p. 21).

O suicídio assistido, ainda que seja semelhante à eutanásia, uma vez que consiste na abreviação da vida de um paciente com uma doença incurável, se diferencia pelo fato de que, na eutanásia, um terceiro realiza o ato que provoca a morte, já no suicídio assistido é o próprio paciente que efetua a conduta que o leva a morte, seja por dosagem de medicamento ou por bomba de infusão (DADALTO, 2018).

A sociedade atual ainda não consegue enxergar com bons olhos e de forma altruísta

o fato de uma pessoa querer tirar a própria vida, mesmo que ela esteja em profundo

sofrimento físico e mental.

(37)

Para que o suicídio assistido se torne uma prática aceitável e não criminalizada são

necessárias mudanças quanto a políticas públicas e culturais. O término da vida é

assunto que deve ser posto em discussão a todo o momento para que as novas

gerações se conscientizem que o fim virá para todos.

(38)

4 SUICÍDIO ASSISTIDO: AUTONOMIA PARA MORRER COM DIGNIDADE

Antes de adentrar ao cerne do trabalho importante reforçar que o significado da expressão dignidade, embora seja qualidade moral que infunde respeito; consciência do próprio valor; honra e etc., é um termo subjetivo, pois para aquele enfermo que há anos sofre com uma doença terminal a acepção é muito mais simples tendo em vista a condição que lhe acometera. A dignidade da pessoa humana deve permear toda a vida de um cidadão, inclusive em seus dias finais.

A forma como cada pessoa deseja morrer deve ser respeitada, e tratada na legislação brasileira, uma vez que não cabe ao Estado determinar como cada indivíduo deverá agir em um momento tão íntimo e pessoal.

A realização do suicídio assistido possui uma classificação limitadora no ordenamento jurídico, uma vez que se caracteriza como crime de auxílio ao suicídio previsto no art.

122 do Código Penal, desconsiderando a possibilidade de acompanhamento médico para a realização dos procedimentos para a morte.

4.1 O direito à morte digna e o princípio da autonomia da vontade

A vida é o bem mais precioso que uma pessoa pode possuir, devendo ser preservada e mantida de forma que possa fornecer felicidade, bem-estar físico e mental. Porém, ainda que o bem jurídica vida disponha de extensa normatização e atividades protetoras de maneira ampla, a morte também requer atenção de igual forma.

O princípio da dignidade humana é a base para aplicação dos demais princípios. Por ser um dos fundamentos da República ele é erigido como valor supremo para a garantia dos demais princípios como liberdade, igualdade, autonomia da vontade, personalidade, entre outros.

Sobre o princípio da dignidade da pessoa humana e sua relevância no direito

brasileiro, Anderson Schreiber discorre que:

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